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domingo, 5 de fevereiro de 2023

Escrito por em 5.2.23 com 0 comentários

Cthulhu: Death May Die

Vou me repetir e falar novamente: escrever o Post 1000 me deu ideias para vários outros posts. Quando, nele, escrevi que a categoria Lovecraft ficou anos sem receber novos posts, até eu falar sobre Monopoly Cthlhu, no post sobre jogos de tabuleiro licenciados, me deu vontade de escrever um post falando sobre um outro jogo de tabuleiro que envolve os mitos criados por H.P. Lovecraft: Cthulhu: Death May Die.


Criado pela norte-americana Guillotine Games e produzido pela CMON, empresa sediada em Cingapura que ficou famosa por fazer jogos que contam com miniaturas extremamente detalhadas (embora, infelizmente, não sejam pintadas, sendo cada uma toda de uma cor só), Death May Die tira seu nome de um trecho da história A Cidade sem Nome (The Nameless City), a primeira na qual Lovecraft cita o livro chamado Necronomicon, uma de suas mais importantes criações: that is not dead which can eternal lie, and with strange aeons even death may die ("não está morto aquilo que pode dormir para sempre, e, após muitas eras, até a morte pode morrer", em tradução livre). Trata-se de um jogo cooperativo, ou seja, ao invés de competirem uns contra os outros, os jogadores deverão se ajudar para alcançar um objetivo em comum - no caso, impedir um grupo de cultistas de trazer para a nossa dimensão um dos Antigos, que pode ser Cthulhu ou Hastur. Se os jogadores conseguirem, todos ganham, se não conseguirem, todos perdem.

Outra característica de Death May Die é que o jogo é dividido em episódios: o jogo possui regras gerais, mas cada episódio possui regras específicas que as complementam. Todos os componentes necessários para jogar cada episódio vêm dentro de suas próprias caixas (ou seja, dentro da caixa do jogo, vêm seis pequenas caixas, uma para cada episódio), assim como o necessário para se jogar com cada um dos Antigos (mais duas pequenas caixas, uma para Cthulhu, uma para Hastur), com tanto Cthulhu quanto Hastur podendo ser combinados com qualquer um dos seis episódios - embora, de forma geral, Cthulhu seja "menos difícil", e, portanto, mais apropriado para jogadores iniciantes. Falando nisso, os episódios têm ordem crescente de dificuldade, então é recomendado que o os jogadores comecem pelo episódio 1, e só passem para o episódio seguinte se conseguirem vencer aquele que estão jogando. E, se vocês acham que um jogo com apenas seis episódios será concluído rapidamente e ficar mofando na estante, lembrem-se de que é um jogo que envolve os Mitos de Cthulhu, ou seja, todas as ações beiram o desespero, e terminar os episódios nunca é tão fácil quanto parece, embora perdê-los não chegue a ser frustrante. Os episódios, aliás, atendem pelos simpáticos nomes de Alquimia Blasfema, Tomos da Loucura, Dança Macabra, Ídolos Sobrenaturais, Maré Amaldiçoada e Hora Inominável.

Death May Die é um jogo para de um (embora as regras para um jogador sejam bem picaretas, e mandem o mesmo jogador controlar dois personagens) a cinco jogadores. Somando todos os episódios, a caixa contém: um Tabuleiro da História, 17 peças de cenário dupla-face, 10 miniaturas de investigadores, 10 tabuleiros de investigador, 5 bases coloridas (nas cores amarelo, verde, vermelho, azul e roxo), 30 marcadores de tentáculo (6 em cada uma das cores das bases), 10 miniaturas de cultistas (de dois modelos diferentes, cinco de cada), 23 miniaturas de monstros (5 Abissais, 5 Ghouls, 2 Byakhees, 2 Vampiros de Fogo, 2 Horrores Caçadores, 1 Shoggoth, 1 Ctoniano, 1 Prole Estelar e 4 Discípulos de Hastur), 2 miniaturas de Anciões (Cthulhu e Hastur), 12 cartas de insanidade, 3 dados padrão (de cor preta), 5 dados de bônus (de cor verde), 1 ficha de espaço inicial, 26 fichas de ferimentos, 3 fichas de portal (uma de cada cor, nas cores azul, amarelo e vermelho), 1 ficha de progresso, 2 fichas de escada, 2 fichas de túnel, 6 fichas de habilidade nível 1, 21 fichas de fogo, 5 fichas de laboratório, 4 fichas de tomos da loucura, 8 fichas de conhecimento proibido, 6 fichas de zona, 14 fichas de dançarinos convidados do baile, 4 fichas de feiticeiros convidados do baile, 4 fichas de artefato, 4 fichas de guarda, 1 ficha de sarcófago, 5 fichas de Ancião Allen, 5 fichas de Ancião Marsh, 3 fichas de luz do luar, 1 marcador de fases da Lua, 9 fichas de R'lyeh, 12 fichas de símbolo amarelo, 8 cartas de estágio do Ancião (4 para cada Ancião), 64 cartas do Mito (8 para cada Ancião e 8 para cada episódio), 2 cartas de lacaios (1 para cada Ancião), 6 cartas de monstros (1 para cada episódio), 6 cartas de episódio (1 para cada episódio) e 90 cartas de descoberta (15 para cada episódio).

A primeira coisa a fazer ao jogar é decidir qual será o episódio e qual será o Ancião, e pegar os componentes das duas caixas escolhidas - não é preciso, nem permitido, pegar componentes de nenhuma outra caixa. Cada caixa de episódio vem com uma carta de episódio, que é bem grande, e, para todos os efeitos, é o manual de regras daquele episódio. Na frente, além do nome do episódio, cada carta de episódio traz um texto introdutório, que deve ser lido em voz alta para todos os jogadores, e diz o que está acontecendo com os investigadores e qual seu objetivo; as instruções de como interromper o ritual dos cultistas, ou seja, o que os jogadores devem fazer para vencer o jogo e concluir aquele episódio; as instruções do que acontece quando o Ancião se move no Tabuleiro da História; e duas ações especiais que os jogadores podem realizar naquele episódio.

No verso da carta de episódio há o layout da área de jogo, trazendo quais peças dupla-face serão usadas para montar o cenário daquele episódio, bem como a posição inicial dos investigadores e de quaisquer fichas, cultistas e monstros usados naquele episódio. Cada parte do cenário pode conter de 1 a 3 espaços, sendo as passagens marcadas por flechas e delimitadas por paredes; uma miniatura só pode se mover de um espaço para o outro se houver uma flecha de cada lado - se houver uma flecha apontando para uma parede, ou para fora do cenário, o movimento não pode ser realizado. O movimento é sempre feito de um espaço para outro, não importa o tamanho físico da peça - algumas peças são enormes, mas contam como apenas um espaço - e não há limite para o número de miniaturas que pode ocupar cada espaço. Alguns cenários podem ter escadas ou túneis; para efeitos de regras, dois espaços com uma escada ou dois espaços com um túnel são considerados adjacentes como se estivessem conectados por flechas, mesmo que não estejam um ao lado do outro. Finalmente, cada cenário tem de um a três portais, por onde os inimigos que não começam a partida no cenário entrarão no jogo. Espaços que não tenham nenhum inimigo são considerados "seguros" para efeito de regras, mesmo que tenham um portal.

O Tabuleiro da História é a principal central de informações dos jogadores a cada episódio. Ele possui espaços próprios para a carta de episódio (que, após ser montado o cenário, é colocada no Tabuleiro da História com a frente para cima), para a carta de monstros daquele episódio, para a carta de lacaios do Ancião que está sendo usado, e para a pilha de estágios do Ancião, na qual serão colocadas as quatro cartas de estágio do Ancião, em ordem numérica com a do estágio 1 por cima. A miniatura do Ancião também começa o jogo no Tabuleiro da História: na parte superior, há uma trilha com oito casas, pela qual o Ancião avançará durante o jogo; no início da partida, a miniatura do Ancião deverá ser colocada na primeira casa, aquela mais à esquerda. Quando o Ancião entrar em jogo, sendo colocado no cenário, a ficha de progresso assume seu lugar nessa trilha, e continua andando nela como se fosse a miniatura. Se a ficha de progresso chegar à oitava e última casa, o jogo termina e os jogadores perdem.

Próximo ao Tabuleiro da História devem ser feitas duas pilhas de cartas, a das cartas de descoberta e a das cartas do Mito, ambas bem embaralhadas e colocadas com o verso para cima; ao lado da pilha do Mito também ficará a pilha de descartes. As cartas de descoberta são 15, e específicas de cada episódio, enquanto as cartas do Mito são 16, e vêm 8 da caixa do episódio e 8 da caixa do Ancião; além dessas duas pilhas, próximo ao Tabuleiro da História também fica uma reserva das fichas usadas naquele episódio que não começam a partida no cenário, como fichas de fogo, e as miniaturas dos monstros, cultistas e lacaios que serão usados naquele episódio mas não começam a partida no cenário - falando nisso, o Ancião, seus lacaios, os cultistas e os monstros são todos chamados coletivamente nas regras de "inimigos".

O jogo traz a opção de dez investigadores diferentes, cada um com habilidades próprias; cada jogador escolhe um deles, pega sua miniatura e seu tabuleiro de investigador, escolhe uma cor, pega a base e os tentáculos dessa cor, coloca a base na miniatura e os tentáculos no tabuleiro de investigador. Cada tabuleiro traz uma figura do investigador, um lembrete do que o jogador deve fazer em sua vez de jogar e em que ordem, e seis trilhas: três trilhas de habilidade (diferentes para cada investigador), uma trilha de ferimentos, uma trilha de estresse e uma trilha de sanidade. Cada trilha de habilidade possui quatro níveis, com os marcadores de tentáculo começando o jogo no nível 1 de cada uma das três; cada nível possui uma regra que se aplica somente àquele investigador (ou seja, são três regras ativas de cada vez), e, no decorrer do jogo, cada uma das três habilidades pode ser aprimorada, movendo o marcador para o nível seguinte e ativando uma nova regra - algumas substituem a regra anterior, outras a complementam.

A trilha de ferimentos é a de regra mais simples: cada jogador começa a partida com o marcador no espaço 1, e, toda vez que o investigador sofre dano, move o marcador uma casa para a direita; se o marcador chegar ao espaço 6, o investigador morre. Já a trilha de estresse tem cinco casas, com o marcador começando na 1; em determinadas situações do jogo, o jogador ganhará estresse, movendo o marcador para a direita, e, em outras, perderá, movendo o marcador para a esquerda - além disso, sempre que jogar dados, um jogador poderá aumentar seu estresse em 1 para jogar um dos dados novamente, podendo fazer isso quantas vezes quiser enquanto não chegar ao final da trilha de estresse. Via de regra, ter o estresse no máximo só significa que o jogador não poderá mais aumentá-lo, mas algumas situações podem fazer com que um estresse alto resulte em ferimentos ou em perda de sanidade.

A trilha de sanidade, aliás, é a mais complicada. Ela possui 21 espaços, com o marcador começando no 1; em determinadas situações, o investigador pode perder sanidade, com o marcador se movendo para a direita, e, caso ele chegue na casa 21, o investigador fica insano. As casas 5, 9, 13, 16, 19 e 20 são limiares de insanidade; se um jogador perder sanidade suficiente para que o marcador passe por elas, o marcador, ao invés disso, para nelas. Toda vez que atingir um limiar de insanidade, o jogador poderá escolher uma de suas três habilidades e aumentá-la em um nível; além disso, nas quatro últimas casas de limiar de insanidade, o jogador ganha dados de bônus para adicionar a todas as suas rolagens - ou seja, um jogador com o marcador na casa 20 joga 4 dados a mais em todas as suas jogadas. Finalmente, cada jogador, no início da partida, recebe uma carta aleatória de insanidade; toda vez que o marcador chega a um limiar de insanidade, o efeito dessa carta - que é sempre ruim - é ativado.

Antes de falar sobre os turnos de jogo, vamos falar sobre os dados: toda vez que um jogador tiver que rolar dados, ele rolará os três dados padrão (pretos), acrescentando a eles quaisquer dados de bônus (verdes) aos quais tiver direito - em outras palavras, um jogador rola sempre pelo menos três dados. Cada dado possui quatro resultados possíveis, sendo que um deles, o lado sem símbolo nenhum, não tem qualquer efeito, e o lado com um pentagrama só faz efeito caso o investigador ou inimigo tenha uma habilidade que requeira que saiam "símbolos ancestrais" na rolagem. Os lados que interessam são o que tem um ponto de exclamação e o que tem um tentáculo: o ponto de exclamação significa um sucesso, e cada ação requer um número mínimo de sucessos na rolagem para ser bem sucedida; já o tentáculo significa um fracasso, e o jogador sempre perde um ponto de sanidade para cada tentáculo que sair, avançando seu marcador para a direita na trilha de sanidade, não importa qual era a ação que ele estava tentando executar. Cada dado preto possui duas faces com ponto de exclamação, uma face com pentagrama, uma face sem nada, uma face com um tentáculo, e uma face com um ponto de exclamação e um tentáculo, que conta como um sucesso, mas faz com que o jogador perca sanidade. Os dados verdes não possuem tentáculos, tendo duas faces com ponto de exclamação, duas faces sem nada, uma face com um pentagrama e uma face com um pentagrama e um ponto de exclamação, que serve tanto como sucesso quanto para ativar habilidades.

No início do jogo é determinado o primeiro jogador por um método qualquer, e, a partir dele, os jogadores jogam seguindo o sentido horário. Em sua vez de jogar, cada jogador segue quatro passos, sempre na mesma ordem; o primeiro é realizar três ações, com o jogador podendo escolher de uma lista de seis, das quais quatro estão disponíveis em todos os episódios e as outras duas estão listadas na carta de episódio e são diferentes para cada episódio. Não é necessário realizar três ações diferentes, com o jogador podendo realizar a mesma ação três vezes, ou realizar uma ação duas vezes e outra uma vez, mas é obrigatório realizar três ações. As instruções das ações próprias de cada episódio estão nas respectivas fichas de episódio, então vamos ver só as quatro comuns.

A primeira das quatro ações sempre disponíveis é correr; com ela, o jogador pode mover seu investigador de um a três espaços. Se o investigador sair ou passar por um espaço com inimigos, todos os inimigos desse espaço o acompanham até o espaço no qual ele interromper seu movimento, mesmo que haja outros investigadores em seus espaços originais. Se um investigador sair ou passar por um espaço com fichas de fogo, ele pega uma ficha de fogo da reserva para cada ficha no espaço e as coloca junto a seu tabuleiro de investigador, não fazendo nada com elas por enquanto. As fichas de fogo são infinitas, então, se acabarem as da reserva, pode ser usado outro marcador qualquer. Inimigos nunca pegam fogo, apenas os investigadores.

A segunda ação possível é atacar: o jogador escolhe um, e apenas um, dos inimigos que estiverem no mesmo espaço de seu investigador e rola os dados; cada sucesso representa um dano causado a esse inimigo. O jogador deverá colocar fichas de ferimento em quantidade igual ao dano causado próximas à base do inimigo (e elas se movem com ele quando ele se mover); quando o total dessas fichas de ferimento superar a vitalidade do inimigo (expressa em sua carta de lacaio ou de monstro), ele morre, sendo retirado do cenário. É possível atacar um Ancião (que tem sua vitalidade expressa em sua atual carta de estágio de Ancião), mas somente depois que o ritual for interrompido.

A terceira ação possível é descansar, o que só pode ser feito se o investigador estiver em um espaço seguro. Descansar é a única ação que só pode ser realizada uma vez a cada turno, e, com ela, o jogador pode renovar sua vitalidade ou estresse, andando com o respectivo marcador em suas trilhas para a esquerda até três espaços no total - ou seja, ele pode recuperar 3 de vitalidade, 3 de estresse, 2 de vitalidade e 1 de estresse, ou 1 de vitalidade e 2 de estresse. Não é possível recuperar sanidade descansando. E a quarta ação possível é trocar, com a qual um jogador pode trocar uma de suas cartas de descoberta por uma de outro jogador qualquer (desde que o outro concorde, evidentemente) - veremos mais sobre isso em breve.

Após realizar três ações, o jogador deverá comprar uma carta do Mito: ele simplesmente compra a carta do topo do baralho do Mito, cumpre o que está escrito e a coloca na pilha de descartes. A menos que seja dito o contrário, o efeito da carta do Mito afeta somente o jogador que a pegou; se ela disser que inimigos se movem em direção ao investigador, eles devem sempre se mover usando o caminho mais curto disponível. Algumas cartas do Mito invocam inimigos, dizendo qual tipo de inimigo entra em jogo e qual a cor do portal no qual ele aparece; se não houver nenhum inimigo desse tipo na reserva, ignore o efeito. Finalmente, algumas cartas do Mito possuem o símbolo de invocação do Ancião; ele não faz nenhum efeito quando a carta é comprada, mas, se no final do turno houver três cartas com esse símbolo na pilha de descartes, o Ancião (ou a ficha de progresso) anda uma casa na trilha do Tabuleiro da História - rumo ao fim do jogo.

O terceiro passo após comprar a carta do Mito é investigar ou lutar. Se o investigador estiver em um espaço seguro, ele deverá investigar: pegue a carta de descoberta do topo da pilha e leia as instruções da parte central em voz alta. Cada carta dá duas opções, com o jogador podendo escolher qual delas vai cumprir, resultando em um item, um companheiro ou uma condição; ele então coloca a carta sob seu tabuleiro de investigador, com apenas a parte que escolheu visível - em todas as cartas, uma das opções diz respeito ao texto do lado direito, e a outra, ao do lado esquerdo, devendo o lado escolhido ficar visível. Não há limite para o número de cartas de descoberta que cada jogador pode ter.

Via de regra, condições impõem uma penalidade ao jogador que pegou a carta, enquanto itens e companheiros oferecem bônus. Cada companheiro também possui um valor em vitalidade, e, toda vez que o investigador for sofrer dano, ele pode, ao invés disso, colocar uma ficha de ferimento na carta que representa o companheiro - o que, para efeitos de jogo, ainda conta como o investigador recebendo um dano. Companheiros jamais podem ser curados, e, assim que o número de fichas de dano superar seu valor de vitalidade, eles morrem, devendo a carta de descoberta ser descartada, com o jogador perdendo os bônus. Alguns companheiros também fornecem um nível temporário em uma habilidade, com o jogador movendo seu marcador naquela habilidade de acordo; caso o companheiro morra, o marcador retorna para seu nível original.

Usando a ação de trocar, um jogador pode trocar uma de suas cartas de descoberta por uma de outro jogador; só podem ser trocadas cartas que representem itens ou companheiros, jamais condições, e o lado exposto da carta deve ser o mesmo - se um jogador está pegando uma carta cujo lado exposto era o esquerdo, ele segue tendo acesso apenas ao lado esquerdo. Quando companheiros são trocados, eles levam consigo todas as suas fichas de ferimento, e, se o jogador que o trocou estava se beneficiando de um aumento de habilidade, deve retornar o marcador para sua posição original.

Se o investigador não estiver em um espaço seguro, ele não tem direito a pegar uma carta de descoberta, e ainda é atacado pelos inimigos. Os inimigos, por alguma razão que somente a mente deturpada de seus mestres pode compreender, só atacam o jogador que está em sua vez de jogar, ignorando quaisquer outros investigadores que estejam no mesmo espaço. Também é importante dizer que todos os inimigos que estiverem naquele espaço atacam, inclusive os que entraram no espaço do investigador durante esse passo devido a algum efeito de jogo - em compensação, inimigos que deixarem o espaço do investigador durante esse passo deixam de atacar. Os inimigos atacam um por vez, na ordem em que o jogador quiser, e é o próprio jogador quem rola seus dados; os inimigos rolam uma quantidade de dados especificada em sua carta de monstro, de lacaio ou de Ancião, que varia de acordo com o inimigo. Cada sucesso em um dado inimigo causa 1 de dano ao investigador, e cada tentáculo faz com que o investigador perca 1 de sanidade; pentagramas só fazem efeito caso haja uma habilidade listada na carta do inimigo. O jogador pode aumentar seu estresse para rolar de novo um dado inimigo normalmente.

O quarto e último passo é resolver o fim do turno, que conta com cinco etapas. Primeiro, quaisquer efeitos de jogo, seja de cartas ou de habilidade, exceto do Ancião, que digam que fazem efeito no fim do turno, fazem efeito agora, na ordem em que o jogador escolher. Segundo, o jogador rola um dado preto para cada ficha de fogo em seu tabuleiro e devolve todas elas para a reserva; cada sucesso faz com que ele sofra 1 dano, e cada tentáculo faz com que ele perca 1 sanidade, podendo ser usado estresse para rolar os dados novamente. Em seguida, o jogador checa para ver se há três cartas com o símbolo de invocação do Ancião na pilha de descartes das cartas do Mito; caso não haja, nada acontece, mas, se houver, o Ancião (ou a ficha de progresso) avança uma casa na trilha do Tabuleiro da História. O jogador deve então checar as cartas de estágio do Ancião ativas para ver o que acontece, e executar o que está escrito nelas, se for o caso. Depois disso, todas as cartas do Mito na pilha de descartes são devolvidas à pilha de compras, que é reembaralhada.

A quarta etapa é verificar se o Ancião entrou em jogo, o que acontece caso ele tenha se movido para o primeiro espaço vermelho da trilha ou se o ritual tiver sido interrompido, de acordo com as instruções da carta de episódio. Em caso negativo, nada acontece, mas, em caso positivo, o jogador deve pegar a miniatura do Ancião, colocá-la no cenário no local apropriado, colocar a ficha de progresso na trilha, no local onde estava a miniatura, e revelar a carta de estágio 2 do Ancião - ambas as cartas continuam ativas, ou seja, ambas continuam produzindo efeitos, com a do estágio 1 devendo ser colocada ao lado do Tabuleiro da História, próxima à do estágio 2. A quinta e última etapa é resolver os efeitos que estão listados nas cartas de estágio do Ancião ativas que digam que ocorrem no fim do turno. Depois disso, é a vez do jogador à esquerda.

É importante dizer que o Ancião só pode ser ferido se o ritual for interrompido. Se o Ancião ainda não estava em jogo, assim que o ritual for interrompido ele entra em jogo, e os jogadores poderão atacá-lo normalmente; caso ele alcance a primeira casa vermelha antes de o ritual ser interrompido, porém, ele entra em jogo "imortal", e não pode ser atacado enquanto o ritual não for interrompido - imortal ou não, ele pode atacar os investigadores normalmente, caso eles estejam no mesmo espaço que o Ancião no passo de investigar ou lutar. Começando pela carta 2 de estágio do Ancião, cada carta possui um efeito que acontece apenas uma vez, quando aquela carta é revelada; um efeito que ficará ativo até o fim do jogo; a vitalidade daquele estágio; e quantos dados são rolados a cada ataque do Ancião. Assim como a carta do estágio 1, as demais cartas de estágio devem ser colocadas ao lado do Tabuleiro da História, e permanecem ativas até o fim do jogo. Toda vez que os ferimentos do Ancião ultrapassarem sua vitalidade, um novo estágio é revelado; os ferimentos de um estágio não são levados para o seguinte, mas os dados sim, o que significa que, quanto mais alto o estágio, mais dados o Ancião rola. Quando os ferimentos do Ancião ultrapassarem a vitalidade do estágio 4, ele é banido de nossa dimensão - mas não destruído - e os jogadores finalmente vencem o jogo.

Caso um investigador morra ou perca totalmente sua sanidade antes de o Ancião entrar em jogo, o jogo termina e os jogadores perdem. Porém, se um investigador morrer ou ficar insano depois que o Ancião já tiver entrado em jogo, sua miniatura é removida do cenário, todas as suas cartas de descoberta são descartadas, e seu turno é interrompido imediatamente, apenas verificando se há três cartas do Mito com o símbolo da invocação do Ancião na pilha de descartes e executando os procedimentos apropriados caso haja. Os demais jogadores podem continuar jogando normalmente até vencerem o jogo - ou até que todos morram, fiquem insanos, ou que a ficha de progresso alcance a última casa da trilha, quando, da mesma forma, o jogo acaba e todos perdem.

Criado por Rob Daviau e Eric M. Lang, com arte de Adrian Smith, Karl Kopinski, Richard Wright, Nicolas Fructus e Filipe Pagliuso, Death May Die, assim como os demais projetos da CMON, seria financiado coletivamente através do Kickstarter - a CMON, alías, originalmente era um site, criado em 2001, para o qual entusiastas de miniaturas podiam submeter suas miniaturas, feitas por eles mesmos ou apenas pintadas por eles, para que outros membros as avaliasse, chamado Cool Mini or Not, algo como "essa miniatura é legal ou não?", decidindo em 2011 partir para os financiamentos coletivos para criar seus próprios jogos de tabuleiro e wargames. O financiamento de Death May Die começaria em julho de 2018, com o jogo efetivamente sendo lançado um ano depois, em julho de 2019, após 15.831 apoiadores terem contribuído com 2.412.286 dólares.

Quem apoiou o projeto pelo Kickstarter levou, junto com o jogo, uma décima-primeira investigadora exclusiva, com miniatura e tabuleiro; além disso, os apoiadores poderiam escolher pagar mais caro (bem mais caro, tipo 2,5x mais) para receber um sétimo episódio chamado R'lyeh Rising. Esse episódio não seria entregue com o jogo, mas mais tarde, pois seu principal componente era uma estátua de Cthulhu de 57 cm de altura com base de 44 cm de diâmetro, que servia, também, como cenário do episódio. Além da estátua, os componentes do episódio são um tabuleiro especial de Cthulhu, 8 fichas de descoberta, 8 fichas de destruição, 16 fichas de energia, 3 fichas de portal grande (uma de cada cor), 6 fichas de vórtice, uma carta de episódio, 10 cartas do Mito, 7 cartas de monstro, 2 cartas de estágio do Ancião e um folheto de regras, já que, para derrotar esse Cthulhu gigantesco, não bastará os investigadores causarem dano a ele.

Como todo projeto do Kickstater, Death May Die também teve metas estendidas, novos elementos que eram adicionados conforme mais dinheiro era arrecadado; no final do projeto, a CMON juntou todas elas numa caixa chamada Unspeakable Box, que continha 18 novas miniaturas de investigadores, 18 novos tabuleiros de investigadores, 5 coberturas de plástico para os tabuleiros de investigador, 3 novas miniaturas de monstros (1 Cultmaster X, 1 Lord Nameless, 1 Lord Faceless, 1 Wilbur Whateley, 2 Mi-Go, 2 Yithianos e 3 Servos das Profundezas, cada um com uma aparência diferente), 2 novas miniaturas de ancião (Yog-Sothoth e Dagon), 3 novas cartas de episódio, 45 novas cartas de descoberta, 50 novas cartas do Mito, 8 novas cartas de estágio do Ancião, 2 novas cartas de lacaios, 3 novas cartas de monstros, 15 fichas de inundação, 6 fichas de portal de Yog, 10 fichas de transformação e 12 fichas de mordida. Exceto pelos investigadores, os componentes da Unspeakable Box são divididos em duas caixas de Ancião (Yog-Sothoth e Dagon) e três caixas de episódios, chamados de Episódio Perdido 1 (cujo título pode ser traduzido para "fale fhtagn ou morra"), 2 ("luz brilhante, monstro gigante") e 3 ("amizade e loucura").

A campanha do financiamento também dava ao apoiador a opção de incluir em seu pacote cinco produtos extras; dois deles eram conjuntos de dados, um simples, idêntico ao do jogo, e um perolado, e o terceiro era um livro com toda a arte produzida para o jogo. O quarto, chamado Elder Box: Black Goat of the Woods era uma mini-expansão, contendo todos os componentes necessários para jogar com Shub-Niggurath como Ancião: 1 nova miniatura de Ancião, 6 novas miniaturas de monstros (todas de Dark Youngs), 8 novas cartas do Mito, 4 novas cartas de estágio de Ancião e 1 nova carta de lacaios.


Mas o produto extra principal era uma expansão, chamada simplesmente Cthulhu: Death May Die - Segunda Temporada, que trazia 10 novos investigadores (11 para quem comprasse pelo Kickstater) e 6 novos episódios, chamados Companheiros Estranhos, Floresta sem Nome, Sanctificetur Nomen, Tiroteio no H.P. Corral, Monstros na Cidade do Pecado e A Última Cena. Somando os componentes de todos os episódios, a expansão traz 10 novas miniaturas de investigadores, 10 novos tabuleiros de investigador, 17 novas miniaturas de monstros (5 Tcho-Tchos, 2 Noctétricos, 2 Pólipos Voadores, 2 Vampiros Estelares, 2 Cães de Tíndalos, 1 Yugg, 1 Bokrug, 1 Trôpego Dimensional e 1 Ser Ancestral), 8 novas peças de cenário dupla-face, 6 novas cartas de episódio, 90 novas cartas de descoberta, 48 novas cartas do Mito, 6 novas cartas de monstros, 11 fichas de fogo, 12 fichas de espólio, 3 fichas de identificação de zona, 2 fichas de trancado, 4 fichas de acampamento, 5 fichas de suspeito, 5 fichas de álibi, 1 peça de suspeitos, 1 ficha de artefato, 1 ficha de armadilha, 6 fichas de escavação, 6 fichas da Dona Fortuna, 4 fichas de ator, 6 fichas de vida profana e 1 ficha de líder de culto.

Quando o jogo foi lançado, além de entregá-lo a quem participou do financiamento, a CMON colocou no mercado o jogo original, a expansão da segunda temporada, a mini-expansão Black Goat of the Woods e, por alguma razão, a caixa com os componentes para usar Yog-Sothoth como Ancião, com o nome de Elder Box: Yog-SothotR'lyeh Rising, a Unspeakable Box e o livro da arte jamais foram colocados à venda para o público em geral, exceto em convenções, no stand da CMON ou da Guillotine Games, e sempre por um preço, digamos, exorbitante. No Brasil, Cthulhu: Death May Die e a expansão da segunda temporada foram lançados pela Galápagos. Não se sabe se eles têm autorização para lançar os demais componentes.
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domingo, 19 de setembro de 2021

Escrito por em 19.9.21 com 0 comentários

Jogos de Tabuleiro Licenciados

Alguns jogos de tabuleiro possuem versões licenciadas, ou seja, versões nas quais seus elementos tradicionais são substituídos por equivalentes relacionados a um filme, série ou outro tema qualquer. Embora eu tenha citado algumas dessas versões nos respectivos posts sobre seus jogos originais, nunca me animei a falar sobre elas porque, convenhamos, não iria terminar nunca.

Já há algum tempo, porém - desde que escrevi o terceiro post da série sobre War, pra ser mais exato - eu venho pensando em escrever sobre uma versão licenciada do Risk que eu comprei e da qual gostei muito. Ao escrever o terceiro post da série sobre Carcassonne, fiquei na dúvida se incluía ou não um de seus spin offs que também era uma versão licenciada, e aí acabei tendo a ideia para esse post. Assim como fiz com War e Carcassonne, hoje veremos três jogos, mas, nesse caso, três versões licenciadas de três jogos diferentes. Talvez haja algumas outras versões licenciadas melhores ou mais legais por aí, mas meus critérios para escolha foram bem simples: eu tenho todos os três, e são os únicos três jogos de tabuleiro licenciados que eu tenho.

Monopoly Cthulhu


Nenhum jogo de tabuleiro tem tantas versões quanto Monopoly, e o motivo é muito simples: basta decorar o tabuleiro, mudar os nomes das propriedades, os tokens com os quais os jogadores se movem no tabuleiro, talvez as denominações do dinheiro, e voilà, temos um Monopoly temático. Isso também é relativamente fácil, mas um pouco mais complicado, de se fazer com Risk, que tem muitas versões, mas é um jogo de guerra, e ficaria meio bizarro um Risk: My Little Pony ou Risk: The Beatles. Já com Monopoly, o fato de que o tema do jogo é compra e venda de propriedades pouco interessa, taca uns nomes de uns planetas lá e faz um Monopoly Star Wars, mesmo que não faça o menor sentido comprar um planeta e cobrar aluguel de quem passar por lá só porque ele tem três casas construídas.

Idiossincrasias à parte - e mesmo não sendo, na minha opinião, um jogo muito bom - Monopoly é um jogo absurdamente popular, o que significa que suas versões licenciadas sempre vendem bem. Por causa disso, estima-se que já existam mais de 3.600 delas, embora, evidentemente, nem todas estejam à venda em todos os países nesse momento. E olha que nessa lista não entram três tipos de versões do jogo: as com regras diferentes, como, por exemplo, Monopoly Arcade, Monopoly Velocidade e Ms. Monopoly; as que têm elementos diferentes, mas usam as mesmas regras do original, como Monopoly Cartão Eletrônico, Monopoly Ultimate Banking e Monopoly Júnior; e aquelas que são apenas "traduções", como a versão brasileira, que tem nomes de ruas e bairros do Rio de Janeiro e São Paulo no tabuleiro e cartas escritas em português. Também não entram os "clones", como o nosso Banco Imobiliário, que, apesar de ter (quase) as mesmas regras, não é considerado um Monopoly.

Também é importante dizer que nem todas as versões de Monopoly foram fabricadas pela Hasbro, atual fabricante do jogo original (que, quando foi lançado, era fabricado pela Parker Brothers, comprada pela Hasbro em 1991); a maioria delas foi fabricada por uma empresa norte-americana que tem o bizarro nome de USAopoly, que possui uma licença especial da Hasbro para fabricar versões licenciadas não somente do Monopoly, mas também do Risk e de alguns outros jogos da empresa, como Clue e Trivial Pursuit. Atualmente, do catálogo oficial da Hasbro nos Estados Unidos, constam dez versões: Monopoly Ghostbusters, Monopoly Game of Thrones, Monopoly Marvel 80 Years, Monopoly Fortnite, Monopoly Stranger Things, Monopoly L.O.L. Surprise!, Monopoly Star Wars 40 Years, Monopoly Star Wars Mandalorian Edition, Monopoly Disney Princesses e Monopoly Junior Frozen II Edition. Já o site da USAopoly lista outras 21: Monopoly Elf, Monopoly Godzilla, Monopoly National Parks Edition, Monopoly Dungeons & Dragons, Monopoly Breaking Bad, Monopoly The Goonies, Monopoly Garbage Pail Kids, Monopoly Disney The Nightmare Before Christmas, Monopoly Bob Ross Edition, Monopoly Scooby-Doo, Monopoly Spongebob Squarepants, Monopoly Naruto Shippuden, Monopoly It, Monopoly Disney Lilo & Stitch, Monopoly The Simpsons, Monopoly Beetlejuice, Monopoly Rick and Morty, Monopoly My Hero Academia, Monopoly Metallica World Tour Edition, Monopoly Friends e Monopoly Disney Theme Parks Edition. Ao longo dos anos, centenas de outras versões foram lançadas tanto pela Hasbro quanto pela USAopoly, com algumas se tornando muito famosas e cobiçadas pelos colecionadores, como Monopoly Kiss, Monopoly The Wizard of Oz, Monopoly Star Trek Continuum Edition e Monopoly Coca-Cola.

Uma dessas versões, fabricada pela USAopoly e que não se encontra mais à venda (mas que também não é tão cobiçada pelos colecionadores assim) é o Monopoly Cthulhu, lançado em 2015, e que substitui as propriedades por criaturas das histórias de H.P. Lovecraft. Como eu já disse, não acho Monopoly um jogo muito bom, e pra dizer a verdade não jogo nunca, mas, quando vi esse vendendo na Amazon, na época em que ainda era possível comprar importados nesse país, decidi que teria um na minha coleção, nem que fosse só por ter.

Antes de começar, preciso falar rapidinho que Monopoly tem duas regras diferentes em relação ao Banco Imobiliário (já que foram as regras do Banco Imobiliário que eu expliquei no meu post sobre ele): primeiro, enquanto Banco Imobiliário só tem um montinho de cartas, o de Sorte/Revés, Monopoly tem dois, o de Sorte (chamado em inglês de chance) e o de Cofre (em inglês, community chest), cada um com casas específicas nas quais o jogador, se cair, tira uma carta do monte apropriado. Basicamente, cartas de Cofre dão ou tomam dinheiro do jogador, enquanto cartas de Sorte influenciam em seu movimento, como, por exemplo, mandando que ele avance até uma determinada propriedade - embora algumas cartas de Sorte também deem ou tirem dinheiro do jogador. No meio das cartas de Sorte também estão a cobiçada Saída Livre da Prisão e a temida "Vá para a Prisão sem receber nada". O que a Estrela fez foi pegar todas as cartas de Sorte e Cofre, juntar tudo num baralho só, chamar as que são favoráveis ao jogador de Sorte e as desfavoráveis de Revés. Em segundo lugar, enquanto Banco Imobiliário tem seis companhias de transporte (aviação, viação, táxi, táxi aéreo, navegação e ferroviária), cujo aluguel é o resultado da jogada de dados que levou ao infortúnio de cair ali multiplicado por quatro, Monopoly tem quatro Estações de Metrô, nas quais o aluguel depende de quantas estações pertencem ao mesmo dono, e duas companhias, a Elétrica e a de Saneamento Básico, que, aí sim, o aluguel é o resultado dos dados multiplicado por quatro - mas, se o mesmo jogador for dono de ambas, é o resultado multiplicado por dez.

Pois bem, diferentemente dos outros jogos desse post, Monopoly Cthulhu não tem absolutamente nada de diferente em relação a um Monopoly comum, exceto as mudanças cosméticas necessárias para que ele se torne um jogo temático. As regras são absolutamente as mesmas, sem nenhuma adição ou variação. As principais mudanças são que as Cartas de Sorte se chamam Cartas de Sanidade (Sanity), as Cartas de Cofre se chamam Cartas de Conhecimento (Knowledge), e, ao invés de dinheiro, temos Pontos de Insanidade (Insanity Points) - nas mesmas denominações que o dinheiro do Monopoly original, com todas as "propriedades" tendo os mesmos custos. As casinhas, de cor preta, segundo o manual, são criptas, e os hotéis, de cor dourada, são mausoléus, mas também não têm nenhuma diferença em relação às casinhas e hotéis de um jogo normal.

O tabuleiro, em compensação, tem uma arte belíssima, com as casas trazendo figuras escabrosas das criaturas, também presentes em seus títulos de propriedade. No mundo do jogo, você não "compra" uma criatura, e sim se torna um cultista devotado a ela, pagando-a em pontos de insanidade (deveria ser pontos de sanidade, porque aí quem perde todos fica maluco e sai do jogo, mas tudo bem); a partir de então, jogadores que caiam naquela casa têm de pagar tributo com pontos de insanidade para o jogador que primeiro a descobriu, que, por sua vez, após ter todas as de um grupo (divididos por cores, como no Monopoly original), pode erigir criptas e mausoléus para ela (aparentemente sacrificando vítimas), para aumentar seu poder.

As criaturas, divididas por grupos, são: Azathoth e Cthulhu (azul escuro), Byarkhee, Hunting Horror e Wilbur Whateley (azul claro), Dagon, Yig e Hastur (amarelo), Night Gaunt, Deep One e Ghast (rosa), Rhan-Tegoth, Ghatanothoa e Nodens (vermelho), Elder Things, Shoggoth e Mi-Go (laranja), Shub-Niggurath, Yog-Sothot e Nyarlathotep (verde), Brotherhood of the Yellow Sign e Men of Leng (marrom). Ao invés das Estações de Metrô temos a viagem por barco (Boat), por automóvel (Autmobile), por trem (Train) e pelo mundo dos sonhos (Dreamscape Travel), e ao invés das Companhias Elétrica e de Saneamento Básico temos a Miskatonic University e o Insane Asylum, com as mesmas regras. No lugar da Taxa de Riqueza e do Imposto de Renda temos a taxa de pesquisa (Research Fee) e a taxa de investigação (Investigation Fee). A Prisão, a Parada Livre e a temida casa Vá para a Prisão são iguaizinhas, assim como o Ponto de Partida. Os tokens são temáticos, e representam a Adaga de Dagon, o Amuleto do Cão, a Estatueta de Cthuhlu, o Necronomicon, a Tabuleta dos Cultistas e o Trapezoedro Brilhante.

Antes de terminar, é preciso dizer que nem todas as versões de Monopoly são temáticas de cultura pop, também existindo as temáticas de esportes, representando times do futebol europeu, das ligas norte-americanas (como NBA ou NFL), ou até mesmo as próprias ligas e campeonatos (como o Monopoly World Cup, que às vezes é lançado como produto licenciado da FIFA durante uma Copa do Mundo de Futebol). Na minha opinião, porém, as versões mais interessantes são as que têm como tema uma país, região ou cidade. Normalmente, essas versões só são colocadas à venda no local que representam (se for sobre uma cidade, na cidade em questão; se for um país, no país do qual é tema) e costumam ser compradas não somente pelos moradores locais, mas por turistas interessados em um souvenir e colecionadores que rodam o mundo atrás delas - muitas vezes também vendidas por tempo limitado, algumas dessas versões costumam valer fortunas para os colecionadores. Aqui mesmo já tivemos um Monopoly Brasil, atualmente fora de catálogo, no qual as propriedades representavam pontos turísticos do nosso país, como o Cristo Redentor, Fernando de Noronha e a Chapada dos Veadeiros, escolhidos através de uma votação no site da Hasbro; e vários países europeus, como Alemanha, França e Rússia, têm suas versões nacionais nas quais não somente cada propriedade representa uma cidade diferente daquele país como também os tokens são temáticos (como um pretzel no da Alemanha, um galo no da França ou uma matrioshka no da Rússia).

Em relação às cidades, os campeões são os Estados Unidos, com 42 Monopolys tendo sido lançados representando cidades de lá, seguido do Reino Unido, com 23, e da Alemanha com 18; a maioria dos Monopolys são de cidades europeias, mas algumas outras de destaque, como a Cidade do Cabo, na África do Sul, Tóquio, no Japão, Buenos Aires, na Argentina, e Melbourne, na Austrália, também têm ou já tiveram Monopolys próprios. Um Monopoly de cidade normalmente tem como propriedades os principais pontos de interesse dela, como prédios históricos, estádios esportivos, monumentos e pontos turísticos. Também vale citar o já esgotado Monopoly Edição Mundial, vendido em vários países, incluindo o Brasil, que contava com uma cidade diferente em cada uma de suas propriedades, novamente escolhidas por votação, e, nos países cujas cidades ficaram de fora, vinha com adesivos para substituir duas do tabuleiro por cidades nacionais, bem como seus respectivos títulos de propriedade - a edição vendida no Brasil, por exemplo, vinha com adesivos para colocar Rio de Janeiro e São Paulo no tabuleiro. Eu sei que foi votação, mas o tabuleiro, sem os adesivos, tem três cidades do Canadá (Vancouver, Toronto e Montreal) e duas da China (Pequim e Xangai). Talvez tivesse sido melhor limitar a uma cidade por país, para ficar mais variado.

Risk Doctor Who: The Dalek Invasion of Earth


Assim como Monopoly, Risk tem muitas versões - não tantas, já que não existem as versões de esportes, cidades ou países, e, como já foi dito, nem tudo da cultura pop se encaixa em um jogo de guerra. Sem contar as com regras diferentes, como as que eu já citei nos meus posts sobre War (e sem citar os "clones", como o próprio War), todas as versões temáticas de Risk já produzidas foram fabricadas pela USAopoly, que aparentemente tem um monopólio (desculpem o trocadilho) na produção de Risks temáticos. Atualmente, do catálogo da USAopoly, só constam duas versões, Risk Warhammer 40.000 e Risk Game of Thrones, mas, no passado, já foram produzidos, por exemplo, Risk Star Trek, Risk Transformers, Risk Halo Wars, Risk Starcraft e, o único que eu comprei, Risk Doctor Who, lançado em 2014.

Diferentemente de algumas outras versões (Risk Transformers tem um mapa de Cybertron, Risk Game of Thrones tem um mapa de Westeros), Risk Doctor Who tem um mapa da Terra mesmo, com os mesmos continentes e territórios do Risk original. Isso porque, como o subtítulo do jogo atesta, os Daleks estão invadindo a Terra - o que significa que os exércitos controlados pelos jogadores são exércitos de Daleks. Disponíveis em cinco cores e duas versões diferentes (os de cor cinza, mostarda e preta são mais redondinhos, os de cor amarela e laranja são mais quadradinhos), existem Daleks pequenos que representam um exército cada e Daleks grandes que representam três exércitos cada. Os Daleks são bonitinhos e cheios de detalhes, mas duas coisas eu considero incompreensíveis: primeiro, os mostarda e os amarelos são quase da mesma cor, não custava nada, ao invés de mostarda, terem feito verdes, vermelhos ou azuis; segundo, os grandes são idênticos aos pequenos em todos os aspectos exceto o tamanho, diferentemente do que ocorre em outras versões de Risk. Esses dois detalhes causam uma certa confusão na hora do jogo, e poderiam ter sido melhor pensados.

Ao contrário do que ocorre com Monopoly, todas as versões de Risk possuem algumas regras novas - no caso de Risk Doctor Who, evidentemente, essas regras incluem elementos relacionados a personagens e eventos da série. Por isso, além dos Daleks, das 42 cartas de território, dos três dados de ataque (pretos), dos dois dados de defesa (vermelhos), e, evidentemente, do tabuleiro, o jogo traz 15 cartas de Poder, 10 cartas de Missão, uma TARDIS de plástico e um marcador de papelão com a figura de Clara Oswald - que era a companion do Doutor na época em que o jogo foi lançado. Além disso, no tabuleiro, há uma faixa com 11 casas, cada uma mostrando uma das regenerações do Doutor, a primeira com William Hartnell, a última com Matt Smith. No início do jogo, o marcador de Clara é colocado na primeira casa dessa faixa, e cada jogador recebe duas cartas de Missão e três cartas de Poder.

A maior parte das regras é idêntica às de um jogo de Risk normal: em sua vez de jogar, jogadores recebem novos Daleks, incluindo bônus que tenham direito por controlar territórios ou continentes, de acordo com tabelas impressas no tabuleiro; podem atacar territórios controlados pelo oponente que estejam ligados aos seus por fronteiras ou linhas pontilhadas; podem mover Daleks entre seus territórios; pegam uma carta de território se tiverem conquistado pelo menos um; e podem trocar cartas de território por mais Daleks. As duas diferenças aqui estão nessas trocas, pois cada carta de território tem uma ou duas estrelas, e é o número total de estrelas que determina quantos Daleks o jogador vai receber na troca, sendo necessário pelo menos duas estrelas (e, portanto, sendo possível trocar uma única carta), e no fato de que é possível atravessar territórios com os Daleks na hora de mover (ao invés de só poder movê-los para o imediatamente adjacente), desde que os territórios se comuniquem de forma contínua. Um jogador que fique sem Daleks é eliminado, e o que o eliminou recebe todas as suas cartas de território, Missão e Poder. O jogo termina quando sobra um único jogador no tabuleiro (que será o vencedor) ou quando o Doutor esgota todas as suas regenerações, quando o jogador que tiver mais territórios será o vencedor - havendo empate, ganha o que tiver mais exércitos.

No início de sua vez e jogar, cada jogador revela a carta do topo da pilha de territórios, e coloca a TARDIS no território correspondente à carta revelada; se essa carta tiver a figura de Clara, o Doutor gasta uma regeneração, com o jogador devendo mover o marcador uma casa na faixa das regenerações. Como foi dito, assim que Clara alcança a última casa, o jogo termina, com os pontos sendo contados - em outras palavras, o jogo vai durar no mínimo dez turnos, caso todo mundo revele cartas com Clara na sua vez de jogar. A TARDIS fica no território sorteado até o fim da vez daquele jogador, quando a carta de território será colocada no fundo da pilha, e o jogador seguinte sorteará um novo destino para o Doutor. Quando a TARDIS está parada em um território, nenhuma ação pode acontecer envolvendo aquele território, ou seja, o jogador que controla o território não pode atacar territórios a partir dele, mover Daleks dele, para ele, nem passando por ele - em compensação, ninguém pode atacar um território no qual a TARDIS esteja.

Cartas de Missão funcionam como mini-objetivos, que rendem Daleks de bônus ao jogador que conseguir cumpri-las. Existem no total dez cartas de Missão, e, no início do jogo, cada jogador recebe duas delas. Cada carta de Missão possui um vilão da série e um bônus de dois ou três Daleks. Dez dos territórios do tabuleiro, sendo 4 da Europa, 3 da América do Norte, 2 da Ásia e 1 da África, têm as figuras correspondentes a esses vilões: Rússia (Ice Warrior), Europa do Sul (vampiras), Europa Ocidental (Salamander), Grã-Bretanha (Cybermen), Mongólia (Tegana), China (Yeti), Oeste dos Estados Unidos (The Silence), Leste dos Estados Unidos (Weeping Angels), México (Aztecas) e Egito (Sutekh). No início de sua vez de jogar, quando for ganhar os Daleks a que tem direito, se um jogador controla um território correspondente a uma de suas cartas de Missão, ele pode descartar essa carta e ganhar os Daleks listados nela. Um jogador não é obrigado a usar uma carta de Missão, podendo guardá-la para o futuro, mas só pode usá-la se controlar o território necessário na sua vez de receber Daleks.

Cada jogador também recebe, no início do jogo, três cartas de Poder. Assim como as cartas de Missão, ele não é obrigado a jogá-las, podendo jogar todas as três, só duas, só uma, ou nenhuma. Existem 15 cartas de Poder diferentes, cada uma representando um evento ocorrido em algum episódio da série, e cada uma delas traz escrito, em letras amarelas, o momento certo de jogá-la, que pode ser quando o jogador estiver atacando um oponente, quando o jogador for atacado por um oponente, após o jogador rolar dados em um combate, quando um oponente jogar uma Missão, no início de sua vez de jogar, ou no final de sua vez de jogar. Após jogar uma carta de Poder, o jogador obedece ao efeito que está escrito nela, em letras brancas, que pode ser mudar o resultado de um dado, receber mais exércitos, ou outra coisa qualquer.

Para terminar, a lista dos continentes e territórios. América do Norte (laranja, 9): América Central, Leste dos Estados Unidos, Oeste dos Estados Unidos, Leste do Canadá, Ontário, Alberta, Territórios do Noroeste, Alasca e Groenlândia. América do Sul (vermelho, 4): Brasil, Venezuela, Peru e Argentina. Europa (azul claro, 7): Grã-Bretanha, Islândia, Europa Ocidental, Norte da Europa, Sul da Europa, Escandinávia e Rússia. África (marrom, 6): Norte da África, Egito, Leste da África, África Central, África do Sul e Madagascar. Ásia (verde, 12): Oriente Médio, Afeganistão, Índia, China, Sudeste Asiático, Mongólia, Japão, Irkutsk, Ural, Sibéria, Yakutsk e Kamchatka. Austrália (deveria ser Oceania, mas no tabuleiro está escrito Austrália, azul escuro, 4): Leste da Austrália, Oeste da Austrália, Indonésia e Nova Guiné.

Carcassonne Star Wars


Diferentemente de Monopoly e Risk, Carcassonne não tem muitas versões licenciadas - pra dizer a verdade, Carcassonne Star Wars, lançada em 2015 pela Hans im Glück, é a única. Também é a única desse post que foi lançada aqui no Brasil, pela Devir, embora, até onde eu saiba, no momento esteja fora de catálogo. Curiosamente, apesar de licenciado, o jogo foi criado por Klaus-Jürgen Wrede, o criador do Carcassonne original, que, provavelmente, é fã de Star Wars.

Assim como nos outros spin offs de Carcassonne, as regras são as mesmas do jogo original, com algumas adições e modificações. Pra começar, ao invés de estradas temos rotas comericiais, ao invés de cidades temos campos de asteroides, ao invés de campos temos o espaço sideral, e ao invés de monastérios temos planetas. O jogo traz 76 cartelas para compor o tabuleiro, sendo que uma delas é a cartela inicial e já começa o jogo na mesa, virada pra cima, enquanto as outras 75 são embaralhadas e formarão duas ou mais pilhas, com a face para baixo, das quais os jogadores comprarão para formar o tabuleiro. Em sua vez de jogar, cada jogador compra uma peça e a adiciona ao tabuleiro, colocando-a a o lado de uma peça que já está lá de forma que um de seus lados toque essa outra peça na horizontal ou vertical, nunca na diagonal, e sempre "encaixando" os elementos (rota com rota, campo com campo, espaço com espaço); se isso não for possível, ele descarta essa peça e compra outra.

Após colocar uma peça no tabuleiro, se quiser, o jogador pode colocar um seguidor nela. Cada jogador começa o jogo com cinco seguidores pequenos e um grande; um dos pequenos é usado para marcar os pontos, sendo colocado no tabuleiro de pontuação, e os outros quatro, junto com o grande, vão para a reserva do jogador. Uma curiosidade de Carcassonne Star Wars é que os seguidores são divididos em Aliança Rebelde, Império Galáctico e Caçadores de Recompensa, e contam com decalques com a figura de personagens de Star Wars. A facção e o decalque de cada seguidor depende de sua cor, com as cores disponíveis sendo vermelho (Luke Skywalker, Rebeldes), verde (Yoda, Rebeldes), preto (Darth Vader, Império), branco (Stormtrooper, Império) e laranja (Boba Fett, Caçadores). Após escolher sua cor, cada jogador também recebe uma Carta de Personagem, que serve para lembrar aos outros qual é sua facção.

Ao colocar no tabuleiro uma peça que tenha uma rota comercial, um jogador pode colocar um seguidor nela como mercador. Todas as regras normais de Carcassonne se aplicam, ou seja, não é permitido colocar um seguidor sobre uma rota que já tenha outro seguidor, mas é possível que mais de um seguidor fique na mesma rota após ela ser completada, porque um jogador colocou uma cartela que uniu duas rotas incompletas. Uma rota é completada quando ambos seus lados estão fechados, ou seja, quando estão tocando um planeta, campo de asteroides ou bifurcação. Nesse momento, o jogador que tem um mercador na rota, independentemente de se foi ele quem jogou a peça que completa a rota ou não, ganha um ponto para cada carta que compõe a rota, pega seu seguidor de volta e o coloca em sua reserva. Algumas cartas de rota também possuem símbolos de facção nas rotas, que rendem ao jogador dois pontos adicionais por símbolo, não importando se os símbolos são da mesma facção que o jogador ou não.

Ao colocar no tabuleiro uma peça que tenha um campo de asteroides, um jogador pode colocar um seguidor nela como explorador; mais uma vez, todas as regras normais se aplicam. Um campo de asteroides se completa quando está cercado por espaço sideral por todos os lados, e não tem nenhum espaço vazio (sem cartela) em seu anterior; nesse momento, o jogador que tiver um explorador nesse campo ganha dois pontos para cada carta que compõe o campo, mais dois pontos para cada símbolo de facção dentro do campo, pega de volta o seguidor e o coloca de volta em sua reserva. Antes que eu esqueça, é bom dizer que o tabuleiro de pontuação só vai até 50, então quem tem menos de 50 pontos coloca o seguidor nele de pé, e quem passa de 50 coloca deitado, para não confundir.

Ao colocar no tabuleiro uma peça que tenha um planeta, um jogador pode colocar um seguidor nela como conquistador; um planeta é completado quando sua cartela estiver cercada por todos os lados, na horizontal, vertical e diagonal, com outras cartelas, quando valerá nove pontos, mais dois para cada símbolo de facção na cartela do planeta. Planetas seguem duas regras especiais: primeiro, um jogador que coloque uma cartela no tabuleiro tocando a cartela do planeta, na horizontal, vertical ou diagonal, pode, ao invés de colocar o seguidor na cartela recém-colocada, colocá-lo na cartela do planeta. Segundo, diferentemente das rotas comerciais e campos de asteroides, é permitido colocar um seguidor seu num planeta que já tenha um seguidor de outro jogador.

Uma regra especial de Carcassonne Star Wars é a das batalhas, nas quais são usados seis dados que acompanham o jogo, três verdes e três vermelhos. Toda vez que acontecer de haver seguidores de mais de uma facção em uma mesma rota comercial, campo de asteroides (porque alguém jogou uma peça que conectou dois ou mais incompletos) ou planeta (porque um jogador usou as regras especiais citadas no parágrafo anterior), ocorre uma batalha pela posse do domínio disputado: para cada um dos seguidores pequenos que tiver em uma rota comercial, campo de asteroides ou planeta disputado, o jogador terá direito a rolar um dado; cada símbolo da mesma facção que o jogador na rota, dentro do campo ou na cartela do planeta dá direito a mais um dado; e o seguidor grande dá direito a dois dados ao invés de um - não importa quantos seguidores ou símbolos o jogador tenha, porém, o máximo de dados que ele vai jogar é sempre três. Cada jogador envolvido na batalha rola os dados a que tem direito (sendo possível jogadores diferentes rolarem dados da mesma cor) e anota apenas o maior valor que conseguir. O jogador que tiver o menor valor dentre esses anotados ganha um ponto para cada dado que rolou, mas terá de tirar seu seguidor do domínio e devolvê-lo à sua reserva. Caso haja empate, todos os empatados ganham um ponto cada, e rolam seus dados novamente. Uma batalha continua até que sobre apenas um jogador na rota, campo ou planeta.

É importante ressaltar que a batalha só ocorre se os seguidores forem de facções diferentes; se houver seguidores de mais de um jogador numa rota comercial, campo de asteroides ou planeta, mas todos forem da mesma facção, o jogo segue normalmente, e, na hora de calcular a pontuação, são usadas as regras normais de Carcassonne: ganha os pontos o jogador que tiver mais seguidores, com todos os empatados ganhando o mesmo número de pontos em caso de empate. Antes que alguém pergunte, em Carcassonne Star Wars não é possível colocar seguidores no espaço sideral, então, a rigor, não há um equivalente para os campos do jogo original.

No fim do jogo, cada rota comercial e campo de asteroides incompleto vale um ponto para cada cartela que os compõem, e cada planeta vale um ponto por sua própria cartela mais um ponto para cada cartela que a esteja tocando na horizontal, vertical ou diagonal; assim como na pontuação durante o jogo, cada símbolo de facção numa rota, campo de asteroides ou na cartela de um planeta vale dois pontos a mais. Ganha o jogador com mais pontos, sendo possível o jogo terminar empatado. Carcassonne Star Wars também tem uma regra de jogo em equipes, para quatro jogadores, no qual cada dupla joga com uma facção (uma dupla com os jogadores usando os seguidores vermelhos e verdes, outra usando os pretos e brancos) e os pontos dos dois jogadores de cada dupla sendo somados para determinar a facção campeã. Durante as batalhas, cada equipe só pode rolar no máximo três dados, ficando uma equipe com os dados vermelhos e a outra com os verdes.

Carcassonne Star Wars teve uma expansão, lançada na Alemanha em 2016 com o nome de Carcassonne Star Wars - Erweiterung 1 (Erweiterung significa "extensão"), e que acrescentava uma quarta facção, a Primeira Ordem. Essa expansão trazia 18 novas cartelas, onze delas com o símbolo da Primeira Ordem; seis novos seguidores, cinco pequenos e um grande, na cor azul e com o decalque de Kylo Ren; uma carta de facção para a Primeira Ordem; seis fichas de pontuação dupla-face, uma para cada jogador, com um 50 de um lado e um 100 do outro (com o jogador recebendo sua ficha ao alcançar 50 pontos e virando-a ao alcançar 100, somando o valor da ficha à sua pontuação final, o que eliminava a necessidade de deitar os seguidores no tabuleiro de pontuação); um dado amarelo; e doze tokens, seis representando blasters e seis representando sabres de luz (um de cada para cada jogador). Ao colocar um seguidor no tabuleiro, o jogador pode colocar junto um desses tokens (mas não ambos), que, durante uma batalha, representam vantagens: um jogador que tenha um seguidor com o sabre de luz adiciona 1 ao seu maior resultado, e um seguidor com blaster, ao invés do dado normal, rola o dado amarelo, que tem números entre 3 e 8 ao invés de entre 1 e 6.

Série War

Risk Doctor Who


Série Carcassonne

Carcassonne Star Wars


Banco Imobiliário / Monopoly

Monopoly Cthulhu
Outras variações

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sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Escrito por em 10.8.12 com 3 comentários

Os Fungos de Yuggoth

Como eu já disse aqui uma vez, quando comecei a escrever os posts sobre as histórias escritas por H.P. Lovecraft, meu autor preferido, não era minha intenção falar sobre todas. Quando vi que faltavam poucas, porém, me deu vontade de tentar. Hoje, eu concluo esse objetivo, falando sobre algumas histórias de Lovecraft que não costumam ser muito republicadas, sendo, por isso, consideradas raras e pouco conhecidas.

Das oito histórias que veremos hoje, a primeira e a última jamais foram publicadas oficialmente em língua portuguesa, então serão identificadas por seus nomes originais em negrito, seguido de uma tradução feita por mim em itálico. As outras seis estão disponíveis em Portugal, como parte do quinto volume da série Os Melhores Contos de Howard Phillips Lovecraft, da editora Saída de Emergência; essas estarão identificadas pelos títulos usados nesse livro (com uma pequena adaptação por motivos estéticos em um deles) com o título original seguindo entre parênteses. Depois dessas histórias, terei oficialmente falado sobre tudo o que Lovecraft escreveu no ramo da ficção em prosa; só ficam faltando as poesias e as obras de não-ficção, como ensaios, resenhas e o livro O Horror Sobrenatural em Literatura. Essas, provavelmente, não serão contempladas aqui no átomo: sobre as obras de não-ficção eu realmente não acho graça falar, e as poesias, além de serem mais de duzentas, também não me atraem muito - podem xingar, mas nunca tive muito saco para ler poemas.

Fungi From Yuggoth (Os Fungos de Yuggoth) - E aí, contraditoriamente, eu começo com uma poesia. Mas juro que tenho uma boa explicação.

Diferentemente das demais histórias que veremos hoje - e talvez, assim, demonstrando uma segunda contradição - Fungi from Yuggoth é uma das mais conhecidas e republicadas obras de Lovecraft. Trata-se de um conjunto de 36 sonetos, escritos entre dezembro de 1929 e janeiro de 1930. Originalmente, eles foram publicados todos separadamente, mas acabariam sendo republicados como se fossem uma única obra pela editora Arkham House, no livro Beyond the Wall of Sleep, em 1943.

Nos três primeiros sonetos, um narrador sem nome obtém por acaso um livro de aparência estranha, passando a ser perseguido desde então por uma presença invisível. Os demais sonetos foram escritos de forma que pudessem ser publicados independentemente desses três primeiros, então não possuem o sentido de continuidade que deles se esperaria caso fossem todos realmente parte de uma mesma obra; ainda assim, o terceiro soneto deixa a entender que o estranho livro foi a chave para que o narrador encontrasse um estranho mundo de sonhos, que passa a visitar. Cada soneto é um vislumbre diferente que o narrador tem desse mundo - e alguns deles até fazem referência a elementos de outras obras de Lovecraft, especialmente aos os deuses ancestrais, como Nyarlathotep, e às cidades, como Innsmouth.

Lovecraft se referia aos sonetos de Fungi from Yuggoth como "pseudo-sonetos", pois eles combinavam elementos das duas formas mais tradicionais de soneto, os petrarquianos (duas estrofes de quatro versos cada e duas de três versos cada) e os shakespeareanos (três estrofes de quatro versos cada e uma de dois versos, conhecida como dístico). Lovecraft pretendia concluir a série com 45 sonetos, mas, quando tinha 33, se cansou dela. Quando R.H. Barlow começou a registrar suas obras para a posteridade, Lovecraft decidiu incluir dois de seus outros sonetos, que a princípio não fariam parte da série, como seus dois últimos. Foi Barlow quem deu a ideia de publicar toda a série de uma única vez, como se fosse uma única história; ao prepará-la para tal, Lovecraft decidiria incluir mais um soneto como antepenúltimo, renumerando os dois últimos e fechando a série em 36. Por causa de sua possibilidade de publicação em separado, cada soneto, além de um número - em romanos, como tradicionalmente os sonetos são identificados - possui também um título.

Lovecraft escreveria esses sonetos após um longo hiato sem escrever poesia. Abandonando os poemas mais tradicionais que fazia até então, ele decidiria experimentar com seu universo de horror também nesse formato. Ele publicaria os cinco primeiros sonetos da série juntos, no jornal Providence Journal, ainda em janeiro de 1930. Em seguida, ele ofereceria os sonetos separadamente para diversas revistas. A Weird Tales selecionaria dez deles, os quais publicaria em dez edições diferentes, lançadas entre 1930 e 1932, sempre sob o título Fungi from Yuggoth, também usado por Lovecraft no Providence Journal. Entre 1930 e 1936, as revistas Causerie, Driftwind, Fantasy Fan, Galleon, Interesting Items, Phantagraph, Pioneer, Science-Fantasy Correspondent, Science Fiction Barb e Silverfern também publicariam sonetos da série. As revistas Fantasy Magazine, Fantaisiste's Mirror, Recluse e Ripples from Lake Champlain aceitariam sonetos e pagariam a Lovecraft, mas jamais os publicariam. Alguns sonetos seriam publicados por mais de uma revista, e dois deles também seriam publicados em livros de antologias de poemas (The Canal, número XXIV, apareceria em Harvest: A Shift of Poems, de 1933, publicado pela mesma editora da revista Driftwind, e Harbour Whistles, número XXXIII, em Threads in Tapestry, de 1936), mas um deles, Expectancy, número XXVIII, jamais seria publicado enquanto Lovecraft era vivo.

Logo após publicar os cinco primeiros sonetos no Providence Journal, Lovecraft, satisfeito com sua repercussão, decidiria escrever um conto que expandisse a história dos tais "fungos de Yuggoth". O resultado seria Um Sussurro nas Trevas, que se tornaria uma de suas histórias mais famosas.

O Povo Antiquíssimo (The Very Old Folk) - Originalmente, Lovecraft não escreveu O Povo Antiquíssimo para ser publicada; o texto era parte de uma carta para Donald Wandrei, escrita em 3 de novembro de 1927, na qual ele relata um sonho longo e estranhamente vívido que teve na noite de Halloween, influenciado pela atmosfera do dia e por uma releitura da Eneida. Impressionado com o sonho, Lovecraft o teria contado não somente a Wandrei, mas também a Bernard Austin Dwyer e a Frank Belknap Long. A esse último, ele teria dito ter a intenção de transformar esse sonho em uma história, algo que jamais se concretizou.

Em 1929, Long pediu permissão a Lovecraft para usar os acontecimentos do sonho como parte de sua história The Horror from the Hills, originalmente publicada na revista Weird Tales de janeiro de 1931. Após a morte de Lovecraft, Wandrei, que sempre achou que a parte da carta que relata o sonho já era uma história boa o suficiente em si mesma, decidiria oferecê-la para publicação. A história seria originalmente publicada na revista Scienti-Snaps de agosto de 1940, creditada a Lovecraft.

O Povo Antiquíssimo é ambientada na época da Roma Antiga - segundo o próprio Lovecraft, pouco antes da coroação de Augusto César. Nela, um procurador romano é enviado junto com uma legião para a cidade de Pompelo, onde, a cada ano, na época do Halloween, cidadãos são sequestrados por um estranho povo, aparentemente semi-humano, que vive nas colinas, e é conhecido apenas como Povo Antiquíssimo. Esse ano, entretanto, o Povo Antiquíssimo quer vingança pelo assassinato de alguns dos seus, e os habitantes da cidade imaginam que eles estejam trabalhando em algum ritual sinistro que se realizará na data fatídica. O procurador decide atacá-los para acabar com sua ameaça de uma vez por todas - mas, ao fazê-lo, terá uma desagradável surpresa.

Doce Ermengarde ou O Coração de uma Moça do Campo (Sweet Ermengarde or The Heart of a Country Girl) - Pouca gente sabe, mas Lovecraft também escrevia comédias - e a razão mais provável para isso é que nenhuma delas foi publicada enquanto ele era vivo. De todas as suas obras cômicas, a melhor é essa Doce Ermengarde, estruturada como se fosse uma peça de teatro.

A Ermengarde do título é uma moça de por volta dos 30 anos, mas que engana a todos dizendo que tem 16. Belíssima e filha de um casal pobre de fazendeiros, a moça possui três pretendentes: o riquíssimo Squire Hardman, que ameaça cobrar uma hipoteca da casa de sua família caso ela não aceite se casar com ele; o pobre mas belo e honrado Jack Manly, que decide ir à cidade arrumar emprego para pagar a hipoteca e se casar com Ermengarde; e o aventureiro Algernon Reginald Jones, que ilude Ermengarde e a convence a ir com ele até a cidade, onde ela descobrirá um surpreendente segredo.

A história é uma paródia das histórias de romance publicadas nas revistas da época, nas quais os homens ricos sempre tinham algum defeito que faziam com que as heroínas os rejeitassem, preferindo um outro, cheio de virtudes, mas invariavelmente pobre, e sofrendo durante quase toda a história por conta dessa escolha. Ao escrevê-la, Lovecraft pretendia parodiar as obras de um amigo seu, Fred Jackson, que considerava ter enredos implausíveis, ações demasiadamente guiadas pelo sentimento e reviravoltas absurdas - tudo isso, é claro, abunda em Doce Ermengarde.

Pelas anotações que Lovecraft deixou, é difícil de precisar quando Doce Ermengarde teria sido escrita - estima-se que foi entre 1919 e 1921. Sua primeira publicação só ocorreria na coletânea Beyond the Wall of Sleep, lançada pela Editora Arkham House em 1943.

O Velho Bugs (Old Bugs) - Lovecraft era abstêmio - jamais consumiu álcool em sua vida, e se irritava profundamente quando alguém tentava convencê-lo a experimentar. Uma dessas ocasiões foi pouco antes da entrada em vigor da Lei Seca, quando um de seus amigos, o professor Alfred Galpin, insistiu que Lovecraft deveria experimentar a bebida antes que ela se tornasse proibida.

Em resposta, Lovecraft escreveu O Velho Bugs. Na história, o Velho Bugs é um homem que aparentemente um dia foi de boa estirpe, mas hoje é acabado devido ao vício da bebida, tendo arrumado como único emprego o de faxineiro em um bar ilegal na época da proibição - o que faz com que a história, efetivamente, seja ambientada no futuro. Galpin é um dos personagens da história: um homem brilhante que, consumido pelos maus hábitos e pelo vício da bebida, abandonou sua noiva, Eleanor Wing - nome de uma das alunas de Galpin na vida real. Quando Alfred Trever, o filho de Eleanor com um homem que ela conheceu depois disso, chega ao bar querendo experimentar bebida pela primeira vez, Bugs decide impedi-lo a qualquer custo.

O Velho Bugs é visto como uma sátira e uma paródia - Galpin, aliás, diz que Lovecraft lhe teria entregado o manuscrito com a frase "agora você vai se comportar?" ao final - sendo considerado por muitos de seus estudiosos como uma de suas obras-primas - e eu até entendo; quantas pessoas vocês conhecem que escrevem uma história de respeito só porque algum amigo está enchendo o saco?

Devido à sua própria natureza, Lovecraft jamais submeteu a história, escrita em julho de 1919, para publicação. Sua primeira publicação seria no livro The Shuttered Room and Other Pieces, lançado pela Arkham House em 1959.

Ibid (Ibid) - Mais uma das obras cômicas de Lovecraft, Ibid começa imitando um artigo científico, que se propõe a discutir a obra do acadêmico romano Caius Anicius Magnus Furius Camillus Aemilianus Cornelius Valerius Pompeius Julius Ibidus, mais conhecido como Ibid. A sátira consiste no fato de que ibid. é a abreviação do termo latino ibidem, usado em notas de rodapé a partir da terceira citação seguida da mesma obra. Segundo o "artigo", todas as obras que começam nessas notas de rodapé com ibid. seriam de autoria de Ibid, um dos maiores escritores de sua época. O "artigo" conta até com referências a obras reais e fictícias, algumas atribuídas a autores de nomes inspirados como Bêtenoir (a "fera negra" em francês). A partir da metade, curiosamente, Ibid muda de tom, e passa a discutir a jornada que o crânio de Ibid teria feito após sua morte, passando de mão em mão até ir parar nos Estados Unidos, onde seria descoberto de forma bastante lovecraftiana.

Segundo estudiosos, Lovecraft teria tido a inspiração para a história ao ver um trabalho escrito por um dos alunos de seu amigo Maurice W. Moe, que começava dizendo "como Ibid diz em sua famosa obra..." - mesma introdução de Ibid, aliás. O alvo da sátira, entretanto, não é a falta de atenção ou conhecimento dos alunos, e sim a pompa do mundo acadêmico, que, na opinião de Lovecraft, trazia convenções desnecessárias e que mais atrapalhavam do que ajudavam, sendo o uso de expressões latinas uma delas.

Lovecraft escreveu Ibid em 1928; Moe a adorou, e até pediu para que ele a adequasse para ser submetida a uma revista. Após essa adequação, porém, Moe mudaria de ideia, e tanto ele quanto Lovecraft achariam melhor apenas distribuí-la aos amigos. Isso também nunca seria feito, e Ibid permaneceria inédito até 1938, quando apareceria na revista The O-Wash-Ta-Nong. Não há registro sobre quem a teria oferecido para publicação.

A História do Necronomicon (History of the Necronomicon) - Escrito por Abdul Alhazred, o árabe louco, o Neconomicon é o livro fictício mais famoso criado por Lovecraft. A primeira menção a seu nome foi feita na história O Sabujo, de 1922; desde então, o livro seria citado em Nas Montanhas da Loucura, O Caso de Charles Dexter Ward, O Horror de Dunwich, Um Sussurro nas Trevas, O Assombro das Trevas, A Sombra Fora do Tempo, A Coisa na Soleira da Porta, O Festival, O Livro, O Descendente e O Chamado de Cthulhu. Outros autores, mais notadamente August Derleth e Clark Ashton Smith, também costumavam citar o Necronomicon em suas histórias; Lovecraft aprovava o uso de sua criação por outros, achando que isso lhe conferia uma aparência de verossimilhança, ou seja, que, se ele fosse citado em obras de diferentes autores, os leitores acabariam achando que se tratava de um livro real.

De fato, isso acabou acontecendo. Embora Lovecraft jamais tenha escrito um Necronomicon, muitos acreditam que realmente exista um Necronomicon na vida real. O próprio Lovecraft recebia muitas cartas perguntando onde ele poderia ser encontrado, existem registros de livrarias e bibliotecas que receberam pedidos de encomenda do livro, e um aluno da Universidade de Yale chegou a pregar uma peça inserindo uma ficha para a obra no sistema de classificação da biblioteca local. A partir da década de 1970, algumas editoras resolveram ganhar um dinheirinho em cima da popularidade da obra, e começaram a publicar suas próprias versões do Necronomicon, algumas "traduzidas" para o idioma do país onde se encontra a editora, algumas totalmente escritas em idiomas inventados. A maioria dessas versões é criticada pelos fãs por não trazer um ou mais conteúdos que Lovecraft cita como parte do livro em suas histórias. A "febre dos Necronomicons", aliás, se tornaria tão forte que, em 1998, seria publicado o livro The Necronomicon Files, que reuniria toda a informação existente sobre o livro em uma tentativa de provar de uma vez por todas que este era ficcional.

Lovecraft sempre foi propositalmente vago em toda descrição que fez do livro e seu conteúdo, com a intenção de manter uma aura de mistério sobre a obra. Em 1927, entretanto, ele escreveria A História do Necronomicon, texto de pouco mais de uma página que contava toda a trajetória do livro, desde sua criação por Abdul Alharzed, passando por suas traduções, pela época em que foi banido pela Igreja, até chegar no século XX. Estudiosos acreditam que a intenção de Lovecraft não era publicar esse texto, mas simplesmente mantê-lo como referência para que não se confundisse quando fosse mencionar o livro em suas histórias. De fato, Lovecraft jamais ofereceu A História do Necronomicon para publicação, mantendo-o dentre suas anotações pessoais até sua morte.

Quando Lovecraft faleceu, o texto foi descoberto, e August Derleth o ofereceu à editora Rebel Press, que o publicaria, em 1938, em forma de panfleto, como propaganda para a história A Cidade Sem Nome, que publicou no formato brochura naquele ano. O texto não seria novamente publicado até 1995, como parte da coletânea Miscellaneous Writings, da editora Arkham House. Desde então, tem sido republicado de forma esparsa, normalmente acompanhando outras histórias que citam o Necronomicon.

Uma Reminiscência do Dr. Samuel Johnson (A Riminiscence of Dr. Samuel Johnson) - Escrita em 1917 e publicada em setembro do mesmo ano no periódico United Amateur sob o pseudônimo Humphrey Littlewit, Esq., esta é mais uma das obras cômicas de Lovecraft, embora, dessa vez, o humor seja bem mais sutil. Trata-se do relato de um escritor cujo público acredita ser jovem, mas que na verdade já tem mais de duzentos anos, sobre as memórias que tem de um grande amigo, o Dr. Samuel Johnson, fundador de um clube literário. O texto conta como Littlewit conheceu Johnson, como o clube foi fundado, e descreve algumas tardes no clube, em companhia de diversos de seus membros. Alguns estudiosos acreditam que a história seria uma tentativa de Lovecraft de fazer graça consigo mesmo, já que, desde jovem, sempre teve gostos considerados antiquados.

The Challenge From Beyond (O Desafio do Além) - Essa é uma história no estilo round robin, no qual um dos autores começa e escreve até uma determinada parte, sendo seguido por outro, e mais outro, até que um escreve seu desfecho. É mais ou menos como aquelas brincadeiras de criança nas quais cada um conta um pedaço de uma história que vai ficando cada vez mais sem pé nem cabeça, só que feita de forma séria e visando a pubicação. The Challenge From Beyond foi a única história desse tipo da qual Lovecraft participou, tendo escrito sua parte em agosto de 1935.

A ideia para a história partiu de Julius Schwartz, editor da revista Fantasy Magazine. Por ocasião do aniversário de três anos da revista, o que aconteceria na edição a ser publicada em setembro de 1935, ele contratou vários dos autores que regularmente lhe enviavam histórias para escrever, no estilo round robin, duas histórias chamadas The Challenge From Beyond, uma de horror, outra de ficção científica. O time da história de horror era composto por C.L. Moore, Abraham Merritt, Robert E. Howard, Frank Belknap Long e Lovecraft. A história de ficção científica ficaria a cargo de Stanley G. Weinbaum, Donald Wandrei, E.E. Doc Smith, Harl Vincent e Murray Leinster.

O próprio time de autores achou uma verdadeira proeza que Schwartz tivesse conseguido reunir todos eles para um mesmo trabalho, e uma proeza maior ainda que um dos integrantes do grupo fosse Merritt, único escritor profissional dentre os dez, e conhecido justamente por não gostar de trabalhar com amadores. De fato, devido a um problema com Merritt, quase que a história de horror não saiu.

De acordo com o plano original, Moore começaria a história, seguida de Long, e então de Merritt. Schwartz não fez qualquer exigência quanto ao enredo da história, apenas que fosse no mesmo estilo que os cinco costumavam escrever para a revista. Moore, então, escreveu uma introdução sem muitos detalhes, sobre um homem que, enquanto está acampando, encontra um estranho artefato. Long, a seguir, desenvolveu a história de uma forma que Moore e Lovecraft acharam brilhante, mas que não agradou em nada a Merritt, que achou que Long havia se desviado sobremaneira da proposta original, e o colocado em posição difícil para desenvolver a história propriamente a partir de então. Merritt fez queixa a Schwartz, e chegou a ameaçar abandonar o projeto se a parte escrita por Long não fosse descartada e o próprio Merritt não pudesse seguir o que Moore escreveu. Sem querer perder quem considerava o principal escritor do projeto - afinal, era o único profissional - Schwartz cedeu, e permitiu que Merritt escrevesse um novo segundo trecho, passando Long para o terceiro.

Aí foi Long que, irritado, ameaçou deixar o projeto. Após ler o trecho escrito por Merritt, porém, Lovecraft, que seria o último a escrever, achando que o trecho de Merritt não levava a história em direção nenhuma, decidiu ele mesmo segui-lo, e convenceu Long a continuar no projeto, escrevendo o desfecho após seu trecho e o de Howard. Lovecraft, então, praticamente se apoderou da história - sua seção é mais do que a metade do total, e mais de três vezes maior do que qualquer uma das outras quatro. Lovecraft nem faria muito esforço para escrever sua parte: aproveitando o mote deixado por Moore e Merritt, ele praticamente repetiria sua história A Sombra Fora do Tempo, escrita entre o final de 1934 e o início de 1935.

Howard não gostou muito da direção que Lovecraft deu à história, mas seu amigo o convenceria a continuar no projeto dando-o carta branca para desenvolvê-la como achasse melhor. Howard, então, daria uma guinada inesperada e muito bem vinda por Long, que concluiria a história de forma interessante.

O protagonista de The Challenge From Beyond é George Campbell, um homem que está acampando no Canadá quando encontra um estranho artefato: um cubo translúcido com uma espécie de disco em seu interior, no qual parece estar gravada uma inscrição. Ao examinar o cubo, ele é sugado para seu interior, para um mundo aparentemente completamente vazio. Na verdade, o cubo é criação de uma raça de homens-centopeia alienígenas, e serve como um permutador de mentes, o que significa que a mente de Campbell agora ocupa um dos corpos dos alienígenas em seu planeta natal, enquanto a mente do alienígena ocupa seu corpo na Terra. Ao se dar conta disso, Campbell age de forma completamente inesperada para os alienígenas, demonstrando que sua ideia de trocar de corpos com um humano não foi tão boa assim.

The Challenge From Beyond não costuma ser considerada uma grande história, até por causa dos problemas envolvidos em sua concepção. É vista pelos críticos, entretanto, como um grande exemplo de autores trabalhando juntos sem perder sua própria identidade - todos os cinco mantiveram seus próprios estilos em seus determinados segmentos, sem nada ceder em prol dos outros, o que acabou tendo o efeito colateral de transformar o resultado final em uma curiosa e divertida colcha de retalhos.

Série Lovecraft

Os Fungos de Yuggoth

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segunda-feira, 18 de junho de 2012

Escrito por em 18.6.12 com 0 comentários

O Horror no Museu (III)

Hoje teremos o último post dedicado às histórias de Lovecraft publicadas no livro The Horror in the Museum and Other Revisions, com um total de oito histórias. As duas primeiras estão presentes em todas as edições do livro, e são apresentadas aqui seguindo a ordem em que foram publicadas na primeria edição, de 1970. As quatro seguintes só estão presentes na segunda edição, de 1989, e na terceira, de 2007, e são apresentadas na ordem em que estavam dispostas na segunda edição. Já as duas últimas não estão presentes neste livro, mas, como contam com a participação de Lovecraft, achei que fazia sentido falar sobre elas neste post, ao invés de em um post separado. Aliás, nunca entendi por que elas não fazem parte do livro.

Lembrando que nenhuma das oito histórias que veremos hoje, até onde meu conhecimento alcança, já foi publicada oficialmente em língua portuguesa. Assim sendo, o nome que aparece em negrito é o original, seguido de uma tradução feita por mim entre parênteses.

The Mound (A Colina) - No interior do Oklahoma, há uma pequena cidade, chamada Binger, nos arredores da qual há uma colina. Mistérios e lendas indígenas cercam a colina, na qual, dia e noite, fantasmas atuariam como sentinelas: durante o dia, um homem velho, durante a noite, uma mulher sem cabeça. Todos os que tentaram explorá-la retornaram loucos ou mutilados, de forma que a população preferiu afastar-se dela, considerando-a um local proibido.

Mas o narrador, um arqueólogo, não acredita nessas crendices, e vai até Binger para tentar desvender o mistério da colina. Durante uma de suas escavações, ele encontra um cilindro feito de metal desconhecido, dentro do qual há um texto escrito em espanhol. Traduzindo-o, ele descobre que seu autor se chamaria Pánfilo de Zamacona, e que o teria escrito em 1541. O manuscrito seria uma descrição de como Zamacona descobriu que a colina é, na verdade, a entrada para um mundo subterrâneo chamado K'n-yan, mais antigo que a humanidade, e povoado por seres meio carne, meio espírito, trazidos das estrelas há séculos por deuses ancestrais. Zamacona passa a viver em K'n-yan, relatando tudo o que viu no manuscrito, mas incapaz de retornar à superfície. Cabe ao narrador descobrir se o relato é verdadeiro, ou se tudo não passa de um trote bem elaborado pelos moradores da cidade.

The Mound foi a última das histórias que Lovecraft escreveu como ghost writer para Zealia Bishop. Segundo suas anotações, tudo o que ela lhe forneceu foi "existe uma colina na qual vaga um fantasma de um índio sem cabeça; algumas vezes é uma mulher". Partindo dessa sinopse, em suas palavras, "insuportavelmente dócil e sem-graça", Lovecraft aproveitaria para escrever a história da maneira como bem lhe aprouvesse, incluindo até mesmo referências à sua cosmologia e a Cthulhu - que, talvez para evitar que os leitores reconhecessem a história de pronto como de sua autoria, é chamado nessa história de Tulu. Talvez para não irritar Bishop, Lovecraft ainda tentaria deixar a história parecida com The Curse of Yig, colocando o próprio Yig e o índio Grey Eagle, um dos personagens daquela história, como personagens também desta, além de fazer várias referências ao Oklahoma.

Lovecraft escreveria uma de suas tradicionais histórias de conhecimento proibido, civilizações ancestrais e descoberta de fatos horríveis através de relatos, mas a mascararia com uma profunda crítica social: sua descrição de K'n-yan, que a princípio é vista por Zamacona como uma sociedade sem defeitos, mas depois revela suas mazelas, é justamente a visão que Lovecraft tinha em 1930 - ano na qual a história foi escrita - sobre a civilização ocidental, em sua opinião decadente, estagnada tecnologica e culturalmente, e voltando ao fanatismo religioso. Lovecraft se empolgaria tanto com a história que a deixaria com quase 30 mil palavras, um absurdo para um ghostwriting.

Não se sabe se Bishop não teria gostado da história ou se teria gostado tanto que não quis que ninguém descobrisse que foi Lovecraft que a escreveu, mas ela chegaria a declarar que o verdadeiro autor da história era Frank Bellnap Long, que também atuava como seu agente na época. Para desmenti-la, Long chegou a escrever uma carta pública, na qual negava qualquer envolvimento com a história, e ainda reconhecia Lovecraft como seu único e legítimo autor. Isso estremeceu as relações entre os três, e Bishop jamais procuraria Lovecraft para escrever para ela novamente.

Apesar de ter sido pago por Bishop ao entregar a história - o que, em sua condição de ghost writer já era a recompensa, sendo ela publicada ou não - Lovecraft gostou tanto dela que desejava que ela fosse publicada, e a ofereceu pessoalmente à Weird Tales. A revista, entretanto, passava por dificuldades financeiras, e seu editor, Farnsworth Wright, a rejeitou por ser muito longa e não ter pontos adequados para que fosse dividida e publicada em várias partes. Long chegou a preparar uma versão resumida da história, removendo algumas passagens, mas, ainda assim, ela continuaria longa, e seria mais uma vez rejeitada.

Após a morte de Lovecraft, August Derleth prepararia uma nova versão resumida, mas desta vez alterando várias passagens e mudando acontecimentos inteiros. Essa versão seria publicada como de autoria de Z.B. Bishop na Weird Tales, edição de novembro de 1940, e durante anos seria a única republicada, inclusive na primeira edição de The Horror in the Museum and Other Revisions. Somente em 1989, com o lançamento da segunda edição do livro, é que a história original de Lovecraft seria pela primeira vez publicada, passando a ser republicada no lugar da versão de Derleth desde então - curiosamente, a mesmíssima coisa havia acontecido com outra história escrita por Lovecraft para Bishop, Medusa's Coil.

Two Black Bottles (Duas Garrafas Negras) - Através de uma carta, o narrador é convidado a ir até a cidade de Daalbergen por um membro da congregação de seu tio, que era pastor lá. Aparentemente, o sacristão, que a cidade acredita ter um pacto com o demônio, o enterrou vivo, e desde então coisas estranhas acontecem na igreja. O narrador não acredita nisso, e decide ir até a igreja para conversar com o sacristão. Quando ele chega, o homem está bêbado e morrendo de medo, e lhe conta uma fantástica história.

Two Black Bottles foi publicada pela primeira vez na edição de agosto de 1927 da Weird Tales, creditada apenas a Wilfred Blanch Talman. Um dos muitos correspondentes de Lovecraft, Talman o teria enviado, em julho do ano anterior, um rascunho do início e uma sinopse do restante da história. Escritor iniciante, Talman desejava que Lovecraft o ajudasse a desenvovê-la, mas se irritou com o resultado, especialmente porque, segundo ele, Lovecraft reescreveu os diálogos sem sua autorização, deixando-os truncados - de fato, os diálogos dos habitantes de Daalbergen, cidade de colonização holandesa, são escritos na já característica forma de Lovecraft de transcrever dialetos.

Em represália, Talman teria não somente severamente criticado uma resenha que Lovecraft enviaria para a revista da qual era editor, a De Halve Moon, mas também se esforçaria para diminuir o papel de Lovecraft na revisão, alegando que quase todo o texto era de sua autoria, e que Lovecraft só teria recomendado mudanças estruturais. As correspondências de Lovecraft a Talman, entretanto, demonstram que ele escreveu partes inteiras da narrativa, que de fato apresentam seu estilo.

Seja como for, Two Black Bottles é considerada uma das mais fracas histórias de Lovecraft, falhando em criar uma atmosfera de horror satisfatória, deixando inexplicados alguns detalhes importantes da história e tendo um final meio sem graça. Final este que ninguém sabe se foi de autoria de Lovecraft ou de Talman.

Ashes (Cinzas) - No primeiro post dessa trilogia, vimos três histórias que Lovecraft escreveu junto com seu amigo C.M. Eddy Jr. Na ocasião, eu mencionei que a dupla havia escrito quatro histórias. Eu não errei na conta: Ashes é a quarta.

Na verdade, Ashes foi a primeira história que Lovecraft e Eddy escreveram juntos, quando Eddy o convidou para uma tarde em sua casa em 1923, assim como a primeira a ser publicada, na edição de março de 1924 da Weird Tales. Ela ficaria fora da primeira edição de The Horror in the Museum and Other Revisions, porém, porque apenas em meados da década de 1970 é que seriam descobertas cartas de Lovecraft a seus amigos nas quais ele diz que trabalhou com Eddy na história. Se o próprio Lovecraft não tivesse dito, talvez ninguém tivesse acreditado, pois, apesar de ser uma história de horror, possui elementos de romance totalmente estranhos às obras lovecraftianas. O mais provável é que o envolvimento de Lovecraft tenha sido bem pouco, apenas revisando a história antes de Eddy finalizá-la, talvez até sem alterar nada.

O protagonista de Ashes é Malcolm Bruce, que consegue um emprego como assistente do renomado cientista Arthur Van Allister. Um dia, Allister lhe mostra sua mais recente criação, uma fórmula capaz de transformar qualquer coisa em um pó branco em segundos - inclusive seres humanos. Enquanto trabalha com Van Allister em seus experimentos, Bruce se apaixona por sua secretária, Marjorie Purdy. O casal vive um intenso romance, mas, aos poucos, Bruce começa a desconfiar que Van Allister também está interessado em Marjorie. Um dia, Marjorie desaparece, e Bruce fica horrorizado ao encontrar um jarro de pó branco sobre a mesa do cientista. Imaginando que ele usou a fórmula nela, ele decide se vingar. O final não só é previsível como também meio bobinho, pelo menos na minha opinião.

The Trap (A Armadilha) - Dentre os muitos amigos escritores de Lovecraft, um dos mais queridos era Henry S. Whitehead, que foi pastor anglicano e serviu nas Ilhas Virgens durante dez anos, de onde recolheu muitas lendas do folclore local que passou a usar em suas histórias. Ao retornar das Ilhas Virgens, Whitehead foi morar na Flórida, e recebeu Lovecraft em sua casa entre 21 e maio e 10 de junho de 1931. Durante essa visita, Lovecraft fez uma leitura de Os Gatos de Ulthar no clube de leitura que Whitehead presidia, e o ajudou a escrever The Trap, uma história na qual Whitehead estava trabalhando, mas não estava satisfeito com o clima.

O narrador de The Trap é Gerald Canevin, professor em uma escola particular para rapazes, dono de um antigo espelho dinamarquês que adquiriu em uma barganha durante uma viagem às Ilhas Virgens. Um dia, durante uma sessão de leitura em seus aposentos - motivada pela quebra do sistema de calefação da escola, que deixou as salas de aula muito frias, temperatura à qual Canevin é especialmente sensível - um de seus alunos, Robert Grandison, nota uma estranha imperfeição na superfície do espelho, que só pode ser vista de um único ângulo. Pouco depois, Grandison desaparece sem deixar vestígios. Após o episódio, Canevin passa a ser visitado por Grandison em seus sonhos, e o aluno lhe revela que o espelho é, na verdade, um portal para outra dimensão, na qual ficou preso após tocar na estranha imperfeição, e de onde pode comunicar-se com o professor por telepatia. Canevin, então, passa a ter a missão de encontrar uma forma de libertar o aluno, já que ele não tem como sair por meios próprios.

Estima-se que algo entre a metade e três quartos da história sejam de autoria de Lovecraft, que apenas seguiu a espinha dorsal criada por Whitehead durante sua revisão - elementos típicos das obras de Lovecraft, como o narrador ser sensível ao frio, dão prova de que a revisão foi mesmo extensa. Por cortesia de Lovecraft, que, em sua própria opinião, estava somente ajudando ao amigo, ela seria publicada como sendo de autoria apenas de Whitehead, na edição de março de 1932 da revista Strange Tales. Somente na década de 1970 seriam encontradas cartas de Lovecraft que comprovariam que ele revisou a história, mas não quis o crédito pelo trabalho.

The Tree on the Hill (A Árvore na Colina) - Essa história possui três partes. Na primeira, um narrador identificado apenas como Single viaja através de uma peculiar região montanhosa conhecida como Hell's Acres. Lá, ele encontra uma única árvore solitária no topo de uma colina, e adormece sob sua sombra, tendo estranhos sonhos. Ao acordar, ele tira fotos do local. Na segunda parte, Single conta a história e mostra as fotos a seu amigo, o estudioso de mitologia egípcia Constantine Theunis. A princípio, Theunis não acredita, mas, ao ver as fotos, se assusta, e encontra em sua bilbioteca um antigo livro, A Crônica de Nath, que faz menção a uma espécie de lente, que ele deseja usar para ver as fotografias. A terceira parte traz o resultado do uso de tal lente sobre as vidas de Single e Theunis.

Escrita em maio de 1934, The Tree on the Hill seria publicada pela primeira vez na edição de setembro de 1940 - bem depois da morte de Lovecraft - da revista Polaris, creditada a Duane W. Rimel. Rimel era um jovem escritor que conheceu Lovecraft no início de sua carreira, e, assim como outros da época, resolveu mostrar-lhe algumas de suas histórias, para que Lovecraft dissesse o que achava.

Em uma de suas cartas a Rimel, Lovecraft deixa claro que revisou The Tree on the Hill, elogiando a história por sua capacidade de capturar a essência do bizarro, e lamentando que ela tanda ao anticlímax em certas passagens. Na mesma carta, Lovecraft diz a Rimel que alterou algumas passagens, que tentou fortalecer o final, e que esperava que Rimel gostasse das mudanças que fez.

De fato, o final, que evoca a mudança na vida do protagonista após este travar contato com um conhecimento proibido, é típico de Lovecraft, e estudiosos conjecturam que toda a terceira parte pode ser de sua autoria. Rascunhos também indicam que a citação da Crônica de Nath tambem foi escrita por ele, embora o restante da segunda parte pareça ser de autoria de Rimel. O livro fictício - A Crônica de Nath - parece ter sido inventado por Rimel, não somente porque Lovecraft, já tendo tantos, não precisaria inventar mais um livro místico, como também porque Rimel voltaria a mencioná-lo em muitas outras de suas histórias.

The Disinterment (A Exumação) - O narrador da história, mais uma vez sem nome, contraiu lepra durante uma viagem às Filipinas na qual cuidou de seu irmão, afligido pela mesma doença. Temeroso do estigma que a doença possa lhe trazer, ele concorda em ir morar com e ser tratado por um amigo, o cirurgião de reputação duvidosa Marshall Andrews. Um dia, Andrews viaja ao Haiti, sob o pretexto de estudar tratamentos para a doença, e de lá retorna com uma droga que diz ser capaz de deixar o paciente em um estado de animação suspensa tão perfeito que qualquer exame decreta que ele está morto. Andrews convence o narrador a deixá-lo usar a droga, declará-lo morto, enterrá-lo e mais tarde exumá-lo, "ressucitando-o" e dando-lhe a oportunidade de viver com uma nova identidade. O narrador, relutante, aceita, mas, ao acordar após a exumação, começa a desconfiar que Andrews lhe fez de cobaia em alguma experiência sinistra.

Em uma de suas cartas a Duane W. Rimel - creditado na publicação original como único autor da história - Lovecraft o parabeniza, dizendo que a história é esplêndida, muito bem escrita e uma de suas melhores. Na mesma carta, Lovecraft diz que revisou o manuscrito, aprimorando a fluidez da prosa, e que espera que as "pequenas alterações nos verbos" que fez fiquem do agrado de Rimel. Como tal manuscrito não sobreviveu, é impossível saber o quanto Lovecraft teria alterado a história, mas os estudiosos de sua obra são unânimes em dizer que ele fez muito mais do que "pequenas alterações nos verbos", sendo provável que ele tenha reescrito passagens inteiras, e tenha usado a frase ou como eufemismo, ou como modéstia. Realmente parece pouco provável que Rimel, sem uma interferência maciça de Lovecraft, tivesse conseguido imitar tão bem seu estilo e a atmosfera de suas histórias.

De acordo com a correspondência trocada entre Lovecraft e Rimel, The Disinterment foi escrita em setembro de 1935. Só seria publicada, entretanto, na edição da Weird Tales de janeiro de 1937, pouco antes da morte de Lovecraft.

The Sorcery of Aphlar (A Feitiçaria de Aphlar) - Em um mundo fantástico, o sábio Aphlar é banido pelo Conselho dos Doze, condenado a viver na cidade de Bel-haz-en, na qual nenhum conhecimento florescia, apenas a ignorância e a estupidez. Inconformado com esse destino, Aphlar foge para as montanhas, mas sabe que o Conselho não se conformará com seu desrespeito, e enviará soldados para matá-lo por sua insolência. Aphlar passa seus dias estudando seus muitos pergaminhos, esperando por seu destino. Mas, quando os executores chegarem, terão uma surpresa.

Publicada pela primeira vez na edição de dezembro de 1934 da revista The Fantasy Fan, The Sorcery of Aphlar tem sua autoria creditada apenas a Duane W. Rimel. Alguns estudiosos, entretanto, acreditam que, assim como ocorreu com The Tree on the Hill e The Disinterment, Lovecraft teria tido alguma participação na história.

O tamanho dessa participação, entretanto, ainda é assunto de muito debate. Segundo um manuscrito de R.H. Barlow, Rimel teria escrito a história e Lovecraft apenas a revisado; uma carta do próprio Lovecraft a Rimel, nos mesmos moldes da que enviou após revisar The Tree on the Hill, porém, dá a entender que sua participação tenha sido maior: nela, ele felicita o autor pela história, diz que lendo-a se lembrou de seu ídolo Lord Dunsany, e menciona ter feito algumas modificações que, em sua opinião, ajudariam na criação do clima, como a mudança do nome do protagonista, originalmente Alfred, para Aphlar. O fato de o clima de The Sorcery of Aphlar ser bem parecido com o do Dream Cycle de Lovecraft também parece ser um indicativo de que Lovecraft mexeu na história.

Bothon (Bothon) - Correspondências trocadas entre Lovecraft e Henry S. Whitehead, assim como algumas enviadas por Lovecraft a seus amigos, parecem apontar que The Trap não foi a única história de Whitehead na qual Lovecraft teve uma participação. Em diversas dessas correspondências, Lovecraft faz referência a uma história que ele chama de The Bruise (algo como "a escoriação" ou "o machucado"), que guarda grande semelhança com Bothon, história publicada em agosto de 1946 na revista Amazing Stories, creditada apenas a Whitehead.

Como Lovecraft não fala sobre o assunto claramente nas cartas, existem várias teorias sobre o tamanho de sua participação na história. S.T. Joshi, o maior estudioso da obra de Lovecraft, acredita que tenha sido um "ghostwriting ao contrário", com Lovecraft fornecendo uma sinopse que Whitehead teria transformado em história - algo do tipo já havia sido feito pela dupla em 1932, com Lovecraft fornecendo um fiapo de enredo de seu caderno de anotações, a ideia de um conto envolvendo um homem e seu gêmeo siamês, que Whitehead transformaria na história Cassius. Outros estudiosos sugerem que, partindo de sinopse de Lovecraft ou não, Whitehead a teria escrito e dado para Lovecraft revisar - em uma de suas cartas, inclusive, Lovecraft menciona que The Bruise teria sido rejeitada pela revista Strange Tales por ter um enredo muito raso, e que ele faria modificações para torná-lo mais profundo. Existe ainda uma teoria de que nem Whitehead, nem Lovecraft teriam escrito a história: Whitehead morreu em 1932, cinco anos antes de Lovecraft, e algumas das cartas dão a entender que eles estavam ainda na fase de planejamento da história quando Whitehead faleceu. Segundo essa teoria, August Derleth teria escrito a história no estilo lovecraftiano a partir de uma sinopse que encontrou dentre as anotações de Whitehead. Por que ele a teria submetido à Amazing Stories como sendo apenas de Whitehead - já que assim ela foi creditada - é um fato que não é coberto por essa teoria.

Infelizmente, eu nunca li Bothon. Aparentemente ela não existe gratuitamente em local algum da internet - e não deve ser por não ser de domínio público, já que, como eu já disse, Whitehead faleceu em 1932, então suas histórias são domínio público há uns dez anos - e eu não estou muito a fim de comprar um livro só para ver do que se trata. Tudo o que eu sei é que seu protagonista é um homem que, após receber uma pancada na cabeça, passa a ter memórias de um de seus antepassados, que viveu na mítica terra de Mu há 20.000 anos e lutou contra uma raça subterrânea chamada Gyaa-Hua - tal raça subterrânea, mais os nomes e descrições dos locais de Mu, aliás, seriam os pontos "lovecraftianos" citados por quem alega que The Bruise e Bothon são a mesma história.

Série Lovecraft

O Horror no Museu - Parte 3

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