sábado, 9 de agosto de 2025

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Quarteto Fantástico (II)

Recentemente, estreou o filme do Quarteto Fantástico no MCU, sobre o qual eu provavelmente vou falar aqui no átomo, se algum dia eu fizer uma série de posts falando sobre a Fase 6. Esse já é o quinto filme do Quarteto, que, apesar de terem sido os primeiros super-heróis da Marvel nos quadrinhos, realmente não vinham dando sorte no cinema. A razão pela qual vocês estão lendo esse post, porém, é que, mesmo com grande parte da parcela mundial os considerando ruins, eu adoro os filmes do Quarteto Fantástico da Fox, especialmente o primeiro, que eu acho super divertido e bastante fiel aos quadrinhos - exceto o Dr. Destino, já que não tem cabimento o maior vilão da Marvel ganhar superpoderes e ainda assim ser tão patético. Por causa disso, depois que eu falei sobre os filmes dos X-Men, talvez influenciado pela estreia do novo, me deu vontade de falar sobre os do Quarteto também. Assim, hoje, mais uma vez, é dia de Quarteto Fantástico no átomo!

A primeira tentativa de se fazer um filme do Quarteto Fantástico ocorreria lá na década de 1980: em 1983, o produtor alemão Bernd Eichinger, dono da Constantin Film, iria até a casa de Stan Lee em Los Angeles negociar pessoalmente uma licença para a produção de um filme da equipe para o cinema. A negociação duraria três anos, e somente em 1986 a Constatin obteria a licença, por um valor que Eichinger descreveu como "não sendo enorme", e noticiado na época como 250 mil dólares, uma verdadeira pechincha. Com a tecnologia da época, entretanto, duplicar os poderes do Quarteto Fantástico em um filme seria caríssimo, e a Constatin preferiria negociar com um grande estúdio, cedendo os direitos em troca de participação na bilheteria. A Warner Bros. e a Columbia se diriam interessadas, mas ambas recuariam após o orçamento do filme ser calculado - segundo a Columbia, havia a possibilidade de o filme ser o mais caro de todos os tempos.

O contrato assinado entre a Marvel e a Constantin previa que, se o filme não entrasse em produção até 31 de dezembro de 1992, os direitos voltariam para a Marvel e a Constantin perderia o dinheiro já investido. Para que isso não acontecesse, Eichinger procuraria o famoso diretor de filmes B Roger Corman, que concordaria em produzir o filme com orçamento máximo de 1 milhão de dólares, e distribuí-lo através de sua empresa, a New Horizons Pictures. A produção começaria em 28 de dezembro de 1992, três dias antes do fim do prazo, com direção de Oley Sassone, que, até então, só havia dirigido videoclipes, e roteiro de Craig J. Nevius e Kevin Rock, contratados por Corman. O filme seria integralmente filmado nos estúdios da Concorde Pictures, em Venice, Califórnia, também de propriedade de Corman, exceto pela cena da queda da nave após o Quarteto ganhar seus poderes, filmada na cidade vizinha, Agoura; a cena da explosão do laboratório de Victor Von Doom, filmada na Universidade de Loyola-Marymount; e da cena final, filmada no antigo prédio da Pacific Stock Exchange, em Los Angeles.

Ao todo, as filmagens durariam apenas 21 dias - embora algumas fontes digam 25. Apesar da produção mambembe e a toque de caixa, tudo seria feito com muito cuidado: os figurinos ficariam a cargo do interessantemente chamado Réve Richards, que não conhecia o Quarteto, e, enquanto estava comprando dezenas de revistas em quadrinhos para usar como inspiração, deixaria escapar que estava trabalhando no filme, sendo cercado por fãs que queriam saber se ele seria fiel aos quadrinhos. O dublê Carl Ciarfalio, que vestia uma roupa de borracha para interpretar o Coisa, trabalharia junto ao ator Michael Bailey Smith, que interpretava Ben Grimm, para que seus maneirismos fossem os mesmos. Os efeitos de computação ficariam a cargo de Scott Billups e da empresa Optic Nerve, e a maquiagem ficaria a cargo de John Vulich e Everett Burrell. E os produtores musicais David e Eric Wurst pagariam 6 mil dólares do próprio bolso para que a trilha sonora contasse com uma orquestra de 48 instrumentos.

A data de estreia do filme seria inicialmente marcada para setembro de 1993, com trailers sendo exibidos nos cinemas em julho, mas nem a Constantin nem a New Horizons queriam gastar um centavo em publicidade, com os próprios atores decidindo pagar de seus bolsos para que o filme fosse discutido na Comic-Con de 1993, após a qual ele seria matéria de capa da revista Film Threat, e a data de "estreia mundial" seria confirmada pela Constantin como 19 de janeiro de 1994. No final de 1993, entretanto, os atores receberiam uma ordem judicial para parar de promover o filme, todos os negativos seriam confiscados pela Constantin, e Eichinger informaria Sassone que o filme jamais seria lançado. Várias publicações especializadas começariam a especular que, na verdade, a produção seria uma ashcan copy, um filme produzido sem nenhuma intenção de ser lançado, apenas para que o estúdio não perdesse os direitos. Somente em 2005 Lee confirmaria essa tese, dizendo numa entrevista que Eichinger o havia colocado a par do plano, dizendo que "ninguém jamais veria o filme", mas que, como Corman havia decidido não informar nem o elenco, nem a equipe, que acharam que haveria um lançamento, acabou acontecendo uma promoção jamais programada, o que tornou o "cancelamento" do lançamento mais escandaloso do que deveria ser.

No mesmo ano, Corman, em uma entrevista, desmentiria Lee, dizendo que o contrato que assinou previa o lançamento nos cinemas, mas também previa que ele teria de vender o filme para Eichinger caso ele pagasse o valor da produção, o que o produtor fez no final de 1993, deixando Corman sem escolha. Eichinger, por sua vez, culparia Avi Arad, na época diretor executivo da Marvel, que, temendo que o filme fosse uma bomba e isso afetasse as vendas dos quadrinhos do Quarteto, já extremamente baixas na época, teria dado a Eichinger o dinheiro para que ele comprasse o filme de volta, e ordenado que ele destruísse todos os negativos. Arad não somente confirmaria essa versão, como também diria que, até um fã abordá-lo na rua em 1993 e dizer estar aguardando ansiosamente a estreia, não estava sabendo que um filme do Quarteto estava sendo produzido, que jamais assistiu a esse filme para saber se ele era bom ou não, e que pagou Eichinger em dinheiro vivo. Muitas dessas histórias estariam no documentário Doomed!: The Untold Story of Roger Corman's The Fantastic Four, que fala sobre a produção do filme, lançado diretamente em home video em 2015.

Pelo menos uma cópia do filme sobreviveria, porém, sendo exibida para uma plateia seleta em Los Angeles em 31 de maio de 1994, e podendo ser encontrada no YouTube, no Daily Motion e em torrents. Críticos que viram o filme diriam que, realmente, ele era bem ruim, mas por lembrar uma novela de baixo orçamento com atores iniciantes, não por problemas da produção ou do roteiro. Segundo alguns críticos, com um orçamento maior e um elenco mais experiente, o filme poderia até mesmo ter sido um grande sucesso. No filme, o Quarteto ganha seus poderes ao ser exposto a raios cósmicos durante uma viagem para estudar um cometa, sem saber que sua nave não tinha a proteção adequada devido à remoção de um diamante, que acaba sendo o ponto central da história, já que o Dr. Destino quer usá-lo para energizar um canhão laser que destruirá a cidade de Nova Iorque. O elenco conta com Alex Hyde-White como Reed Richards / Sr. Fantástico, Rebecca Staab como Susan Storm / Mulher Invisível, Jay Underwood como Johnny Storm / Tocha Humana, Michael Bailey Smith como Ben Grimm, Carl Ciarfalio como o Coisa, Joseph Culp como Victor Von Doom / Dr. Destino, Kat Green como Alicia Masters, e Ian Trigger como o vilão Joalheiro, que rouba o diamante da nave do Quarteto - vale citar também Mercedes McNab, posteriormente famosa pelas séries Buffy, a Caça-Vampiros e Angel, que interpreta Sue Storm quando criança.

Retendo os direitos, e com os efeitos especiais ficando mais realísticos e mais baratos a cada ano que se passava, Eichinger seguiria com a intenção de fazer um filme do Quarteto de grande orçamento e com elenco famoso, conseguindo assinar um contrato de financiamento com a Fox em 1995. A Fox conversaria com os diretores Chris Columbus, Peyton Reed e Peter Segal; Columbus seria contratado ainda em 1995, escrevendo um roteiro em parceria com Michael France, mas, em 1996, decidiria deixar o cargo de diretor e ficar apenas como produtor, conseguindo um acordo para que o filme fosse co-produzido pela Constantin e pela 1492 Pictures, da qual Columbus era o dono. Segal concordaria em substituí-lo, sendo contratado em abril de 1997, mas "diferenças criativas" fariam com que ele deixasse o projeto no fim do ano, sendo substituído por Sam Wiseman. Em 1998, a Fox contrataria o roteirista Sam Hamm para reescrever o roteiro de Columbus e France, estimado em 165 milhões de dólares, um absurdo na época.

Pelos termos do contrato original assinado por Eichinger, o "segundo" filme do Quarteto teria que ser produzido até 31 de dezembro de 1999, ou os direitos voltariam para a Marvel; seria em 1999, porém, que ocorreria o já famoso leilão dos personagens da Marvel para os grandes estúdios de cinema, o que daria a Eichinger uma oportunidade: ele abriria mão dos direitos, desde que seguisse como produtor do filme, que seria co-produzido pela Constantin, para que a Fox arrematasse o Quarteto Fantástico no leilão, conseguindo, assim, uma extensão do prazo. Após fazer isso, a Fox daria início à pré-produção do filme, estabelecendo julho de 2001 como data de estreia e contratando Raja Gosnell como diretor. Gosnell, entretanto, deixaria o projeto em outubro de 2000, para dirigir Scooby-Doo, e Reed seria contratado em abril de 2001, trazendo com ele o roteirista Mark Frost, para uma nova revisão. Reed deixaria o projeto em 2003, alegando que a Fox não gostava de nenhuma de suas ideias; segundo ele, várias dessas ideias seriam reaproveitadas para Homem-Formiga e a Vespa: Quantumania, de 2023.

Ao saber que Reed havia pedido demissão, o ator Sean Astin (o Sam de O Senhor dos Anéis) se ofereceria para o cargo; mesmo sem nunca ter dirigido um longa-metragem, e assumindo não conhecer os quadrinhos do Quarteto, ele queria se lançar como diretor, e achava que o filme do Quarteto poderia ser uma catapulta para essa carreira. Astin chegaria a conversar com a Fox - e uma de suas ideias era escalar Christina Aguilera como Sue Storm - mas sua falta de experiência acabariam fazendo com que os executivos do estúdio temessem um fracasso. Outra curiosidade é que o favorito da Fox para interpretar o Dr. Destino era Robert Downey Jr., descartado após pesquisas com grupos de opinião mostrarem que ele ainda tinha má fama devido a seus problemas com drogas no final dos anos 1990.

Em abril de 2004, Tim Story seria oficialmente anunciado como diretor, após a Fox saber que ele era fã dos quadrinhos do Quarteto, e alguns executivos do estúdio se impressionarem com Taxi. Após assistir Os Incríveis, Story pediria que Simon Kinberg, que não seria creditado, reescrevesse partes do roteiro, que ele estava achando muito parecidas com o filme da Disney. Após essa nova revisão, tudo finalmente estaria pronto para o filme entrar em produção, co-produzido pela Constantin Films, 20th Century Fox, Marvel Enterprises e 1492 Pictures, com Eichinger, Arad e Ralph Winter como produtores, roteiro creditado a France e Frost, e orçamento final de 90 milhões de dólares.

O filme tenta ser o mais fiel possível aos quadrinhos, mas erra em colocar Von Doom na nave que é atingida por raios cósmicos e dá poderes ao Quarteto; ao voltar para a Terra, enquanto Johnny se torna uma celebridade e Sue passa por momentos constrangedores com sua invisibilidade, Reed decide devotar todo seu tempo a criar uma máquina que extraia os raios cósmicos do Coisa - que engata um romance com a escultora cega Alicia - para que ele possa voltar a ser Ben Grimm. Paralelamente a isso, a pele de Von Doom começa a descascar, revelando uma estranha segunda pele metálica, e ele descobre ser capaz de lançar raios elétricos pelas mãos; suas empresas começam a perder milhões devido à falha na missão que deu os poderes ao "quinteto", e, culpando Reed, ele bola um plano para usar sua inteligência, seu dinheiro e seus novos poderes para destruí-lo. O elenco conta com Ioan Gruffud como Reed Richards, Jessica Alba como Sue Storm, Chris Evans como Johnny Storm, Michael Chiklis como Ben Grimm, Julian McMahon como Victor Von Doom, e Kerry Washington como Alicia Masters. Exceto por Von Doom, que, no final do filme, passa a se referir a si mesmo como Destino (sem o "Doutor"), nenhum dos personagens usa os codinomes dos quadrinhos no filme, com os nomes Sr. Fantástico, Mulher Invisível, Tocha Humana e Coisa sendo usados sempre em contextos satíricos. Stan Lee faz uma participação como o carteiro Willie Lumpkin, personagem recorrente nas histórias do Quarteto.

A escalação do elenco seria bastante questionada, com Gruffud e Evans sendo considerados muito crus para seus personagens, McMahon sendo considerado muito canastrão, e duas questões raciais: Alba, descendente de dinamarqueses, galeses, alemães e franceses por parte de mãe, mas de mexicanos por parte de pai, e vista nos Estados Unidos como latina, seria alvo da ira de fãs que não se conformaram com sua escolha para interpretar a loura de olhos azuis Sue, e debocharam quando as primeiras imagens do filme mostraram que ela havia tingido o cabelo e estava usando lentes de contato; Washington, que é negra, receberia críticas semelhantes, já que Alicia, nos quadrinhos, é branca. Em versões preliminares do roteiro, o pai de Alicia, o vilão Mestre dos Bonecos, também estaria no filme, assim como o Homem-Toupeira, cujo ataque faria com que o Quarteto agisse pela primeira vez como uma equipe, mas as revisões removeriam esses personagens para que o antagonismo ficasse todo com Destino.

As filmagens ocorreriam majoritariamente no Canadá, nas cidades de Surrey, Toronto e Vancouver, com a Universidade da Columbia Britânica sendo um dos locais onde foram gravadas mais cenas; algumas cenas seriam gravadas em Nova Orleans, Estados Unidos, mas, curiosamente, nenhuma seria filmada em Nova Iorque, onde o filme é ambientado. Os efeitos especiais ficariam a cargo das empresas Giant Killer Robots, Meteor Studios, SW Digital, Soho VFX e Pixel Magic; ainda temendo que o filme pudesse ser comparado a Os Incríveis, Story pediria por um aumento no número de cenas com efeitos especiais em relação ao inicialmente previsto, o que aumentaria o orçamento em cerca de 15 milhões de dólares. Ele faria, entretanto, uma exigência no sentido contrário: Story não queria que o Coisa fosse um personagem digital, como o Hulk do filme de 2003, e optaria por uma roupa de borracha vestida por Chiklis e aprimorada na pós-produção, criada pela empresa Spectral Motion, responsável também por outras maquiagens e próteses do filme, como a pele metálica de Destino.

Quarteto Fantástico estrearia em 8 de julho de 2005, em 3602 salas apenas nos Estados Unidos - número que aumentaria para 3619 na semana seguinte, devido à grande procura - e seria um grande sucesso de público, rendendo 56 milhões de dólares apenas no primeiro fim de semana e 154,7 milhões no total considerando apenas os Estados Unidos - somando o resto do planeta, a bilheteria total seria de 330,6 milhões, tornando-o o filme mais rentável a ser dirigido por um afro-americano até ser ultrapassado por Pantera Negra em 2018. A crítica, por outro lado, o colocaria abaixo dos cachorros, considerando o elenco fraco (com Chiklin sendo o maior destaque, "mesmo soterrado em maquiagem") o roteiro bobo e o final decepcionante; muitos críticos chegaram a dizer que ele era mais um filme B do Quarteto, e que, comparado aos do Homem-Aranha e dos X-Men, parecia "algo esquecido dos anos 1960". Curiosamente, ao longo dos anos, principalmente após o lançamento do filme de 2015, o filme passaria a ter críticas mais favoráveis, embora nunca seja considerado um sucesso.

Outra curiosidade é que, para o lançamento em home video, a Fox alteraria duas cenas do filme, uma na qual Reed e Sue estão no depósito do Edifício Baxter, e, em uma das estantes, pode ser visto o robô H.E.R.B.I.E., que não estava lá nos cinemas, e outra na qual Reed e Sue discutem seu relacionamento, que ficou completamente diferente: nos cinemas, o casal está olhando para a Estátua da Liberdade, mas, em home video, eles estão em um planetário e, ao invés de mudar seu rosto para ficar com o queixo quadrado, Reed imita o rosto de Wolverine. Segundo a Fox, essa cena buscava mostrar que os filmes do Homem-Aranha, dos X-Men e do Quarteto eram ambientados no mesmo universo, com Hugh Jackman indo ao set de filmagens e gravando-a durante a produção; quando uma participação de Jackman como Wolverine em Homem-Aranha 2 foi cancelada, a Fox decidiu remover a cena do filme do Quarteto, gravando a nova com Gruffud e Alba durante a pós-produção, mas depois voltaria atrás e decidiria incluí-la no home video.

Aqui no Brasil, a versão em DVD e Blu-ray é idêntica à dos cinemas, com a cena com Jackman estando presente apenas na "Versão do Diretor", lançada apenas em DVD em 2007. Essa versão traz 20 minutos a mais de cenas originalmente descartadas, nenhuma delas relevante para a história, mas que aprofundam o relacionamento do Coisa com Alicia, mostram estratagemas de Von Doom para separar a equipe, e que o comportamento irresponsável de Johnny nem sempre sai impune.

Mesmo com o fracasso de crítica, a Fox daria a luz verde para uma sequência, aproveitando que os seis atores do elenco principal, mais o diretor Story e o roteirista Frost, tinham todos assinado contrato para três filmes. Frost queria que o filme contasse com dois dos mais famosos personagens das histórias do Quarteto, Galactus e o Surfista Prateado, mas, conhecendo pouco das histórias clássicas da equipe, pediria para que a Fox contratasse um co-roteirista, com o escolhido sendo Don Payne, famoso por ser roteirista da série Os Simpsons, mas que era fã do Quarteto, e decidiu basear o filme em três histórias: a trilogia de Galactus, um arco no qual o Dr. Destino rouba os poderes do Surfista Prateado, e a saga Extinção Suprema, da linha Ultimate. Payne também incluiria no filme o Fantasticarro, e cuidaria para que Alicia tivesse uma participação maior no segundo filme do que teve no primeiro.

Apesar de muita gente achar que o Surfista Prateado era um personagem totalmente digital, Story mais uma vez pediria para que ele, assim como o Coisa, fosse um efeito prático aprimorado. Assim, o Surfista seria interpretado pelo ator Doug Jones vestindo uma roupa prateada especialmente confeccionada pela Spectral Motion, aprimorada na pós-produção pela Weta Digital. Nas primeiras versões do roteiro, o Surfista era mudo, não proferindo uma única palavra durante todo o filme, mas os executivos da Fox não gostaram dessa ideia, pedindo para que ele tivesse diálogos e fosse dublado pelo ator Lawrence Fishburne; segundo boatos, durante as filmagens Jones não sabia que seria dublado, interpretando todas as falas como se sua voz fosse ser usada, somente descobrindo que o Surfista teria a voz de Fishburne ao ler uma matéria sobre o filme em uma revista.

Frost e Payne queriam que Nick Fury estivesse no filme, e convidaram o ator Andre Braugher para interpretá-lo, o que faria com que ele saísse da série ER: Plantão Médico, já que não conseguiria conciliar as filmagens da série com as do filme. Ao contrário do que os roteiristas imaginaram, entretanto, a Fox não tinha os direitos sobre Fury, e a Marvel, já pensando em usá-lo em produções futuras, se recusaria a cedê-los, o que faria com que o personagem de Braugher fosse mudado para o General Hager, um antigo conhecido de Reed, mas com a exata mesma função que Fury teria - algumas falas de Hager no filme, inclusive, são idênticas a falas de Fury em Extinção Suprema.

As filmagens começariam em agosto de 2006 em Vancouver, onde seriam gravadas a maior parte das cenas; outras cidades canadenses nas quais ocorreram filmagens seriam Pemberton e Burnaby. Após críticas ao primeiro filme, a Fox decidiria gravar também algumas cenas em Nova Iorque, chegando a fechar o famoso Lincoln Tunnel para filmá-las. Cenas internacionais seriam gravas na Baía de Suruga, Japão, em Gizé, no Egito, e na Geleira de Russell, na Groenlândia. Além da Spectral Motion e da Weta, trabalharim nos efeitos digitais nada menos que outras 25 empresas, incluindo Hydraulx, The Orphanage, Giant Killer Robots, Hammerhead Productions e Lola Visual Effects. O aumento no número de efeitos especiais e as locações internacionais também aumentariam para 130 milhões de dólares o orçamento final do filme, que seria uma co-produção entre Constantin Film, 20th Century Fox, Marvel Entertainment, 1492 Pictures, Ingenious Film Partners e Dune Entertainment.

A roupa do Coisa seria refeita para que tivesse uma melhor ventilação e para que Chiklis conseguisse tirá-la sozinho nos intervalos das gravações, e um episódio durante as filmagens viraria manchete por motivos inusitados: em uma cena na qual Sue chora, Story teria dito a Alba que a cara dela estava muito feia, e pedido para que ela "chorasse mais bonita", acrescentando que não havia problema se não houvesse lágrimas, pois elas poderiam ser incluídas por computação gráfica na pós-produção. A atriz daria uma entrevista se dizendo horrorizada com o comentário, e que chegaria a questionar se deveria seguir atuando depois disso; o diretor, por outro lado, diria que foi tudo um mal-entendido, e que ele tinha achado que a cena havia ficado "muito real e muito dolorosa para um filme para toda a família", e que sua intenção era que Alba a fizesse mais suave.

Outro incidente bizarro envolvendo o filme foi que a Fox fez um acordo com a Franklin Mint, empresa privada localizada no estado da Pensilvânia que tem um contrato com o governo para fabricar moedas, para que um lote de 40 mil moedas de 25 cents, ao invés de trazerem no verso (o lado da "cara") sua figura tradicional, trouxessem o Surfista Prateado em sua prancha e a URL do site oficial do filme. As moedas foram fabricadas, entraram em circulação em maio de 2007, e logo se tornaram cobiçados itens de colecionador, mas, poucos dias depois, a Franklin Mint seria notificada pela U.S. Mint, órgão do governo que cuida da fabricação de moedas e cédulas em todo o território dos Estados Unidos, de que existe uma lei federal que proíbe "transformar dinheiro encomendado oficialmente pelo governo em propaganda de empresas privadas". A U.S. Mint, contudo, jamais aplicou qualquer punição à Franklin Mint, e essas moedas, se ainda estiverem em circulação, possuem valor legal de 25 cents normalmente.

Apesar de a Fox ter reservado a data de estreia para julho de 2007, em março de 2007 a aparência final de Galactus ainda não estava definida. A Weta chegaria a criar um humanoide de 30 metros de altura, que poderia receber a face de qualquer ator que fosse contratado para interpretar o Devorador de Planetas, ou uma máscara, para que não tivesse face alguma, mas os executivos da Fox acharam que "um gigantão aparecendo no meio de Nova Iorque para comer o planeta" deixaria mais uma vez a produção com cara de filme B, e exigiriam que Galactus não fosse uma pessoa, mas "uma força da natureza". A Weta, então, optaria por fazê-lo como uma tempestade cósmica com uma sombra que lembrasse vagamente o capacete do Galactus dos quadrinhos, e o roteiro seria alterado para que ela jamais alcançasse a Terra, sendo detida ainda no espaço. Essa seria uma das principais reclamações dos fãs, que prefeririam ver mesmo o gigantão comendo o planeta.

No filme, Reed e Sue estão prestes a se casar quando o governo entra em contato com o cientista, pedindo sua ajuda para identificar um misterioso objeto no espaço que ruma em alta velocidade para a Terra. Esse objeto é nada menos que o Surfista Prateado, que está guiando Galactus até o planeta para que ele o devore. Sem saber desse fato e imaginando que o Surfista é uma ameaça cósmica, o Quarteto passa a trabalhar em conjunto com Destino para detê-lo, até o vilão roubar os poderes do Surfista para si e o alienígena revelar que ele não é a verdadeira ameaça. A missão do Quarteto, então, passa a ser recuperar os poderes do Surfista antes que Destino os use para destruí-los, e usá-los para encontrar uma forma de interromper a trajetória de Galactus antes que a Terra seja destruída.

Do primeiro filme retornam Gruffud, Alba, Evans, Chiklis, McMahon e Washington, se unindo a eles Doug Jones como o Surfista Prateado, Laurence Fishburne como a voz do Surfista Prateado, Andre Braugher como o General Hager, e Beau Garrett como Frankie Raye - que, no filme, é capitã do exército, mas nos quadrinhos era uma intérprete da ONU que teve um namoro com Johnny e foi transformada por Galactus em uma arauto chamada Nova, para substituir o Surfista em sua missão de encontrar planetas para o Devorador. Participações especiais incluem Brian Posehn como o celebrante do casamento de Reed e Sue; Vanessa Minnillo como a acompanhante de Johnny para o casamento; Zach Grenier como o Sr. Sherman; e Patricia Harras como a recepcionista do prédio do Quarteto, Roberta. Stan Lee faz uma participação como um convidado barrado no casamento.

Com o nome de Quarteto Fantástico e o Surfista Prateado (Fantastic Four: Rise of the Silver Surfer, no original), o filme estrearia em 15 de julho de 2007 e seria mais uma vez um sucesso de público - renderia 58 milhões de dólares apenas no primeiro fim de semana, dois a mais que o anterior, mas, no total, renderia menos que o primeiro: 131,9 milhões nos Estados Unidos, 301,9 milhões quando somado o mundo inteiro. A crítica seria levemente mais favorável, considerando-o melhor que seu antecessor, mas ainda com pouco a oferecer além de seus efeitos especiais.

Pouco após a estreia, Story teria uma reunião com os executivos da Fox para discutir ideias para um terceiro filme, sugerindo a introdução de Franklin Richards, a transformação de Raye em Nova, e uma participação do Pantera Negra, indicando o ator Djimon Hounsou para o papel. Payne, em uma entrevista, diria não ter conversado nada com a Fox, mas que o universo do Quarteto era vasto de possibilidades para um terceiro filme, que poderia incluir os Inumanos, os Skrulls, e até mesmo o Aniquilador e a Zona Negativa. Conforme a bilheteria do segundo filme se mostrava inferior à do primeiro, entretanto, Story começaria a sentir que a Fox relutava em dar a luz verde para a sequência, até que, em dezembro de 2007, o estúdio declararia que não estava buscando um roteiro no momento. Em uma entrevista de 2008, Evans diria que nada de oficial foi comunicado, mas que o elenco sabia que o segundo filme havia sido o último.

Em agosto de 2009, a Fox anunciaria sua intenção de fazer um reboot do Quarteto Fantástico, contratando o produtor Akiva Goldsman e o roteirista Michael Green. Goldsman queria um elenco estelar, e chegaria a conversar com Adrien Brody e Jonathan Rhys Meyers para o papel de Reed Richards, e considerar Kiefer Sutherland para o de Ben Grimm. Em 2011, alegando que Green era incapaz de escrever um roteiro que o agradasse, Goldsman decidiu contratar Zack Stentz e Ashley Edward Miller, de X-Men: Primeira Classe para escrever um novo, e começar a procurar um diretor. Devido a seu trabalho em Poder sem Limites, Josh Trank seria contratado em julho de 2012, junto com o roteirista Jeremy Slater, que traria ideias ousadas, como abrir o filme com a chegada de Galactus e fazer de Von Doom um espião da Latvéria morando nos Estados Unidos, que conseguiria enganar Galactus para se tornar seu novo arauto, e terminaria o filme usando os poderes concedidos pelo Devorador para se tornar ditador de seu país natal.

Trank rejeitaria todas as ideias de Slater, que reclamaria que o diretor dizia para todo mundo que era fã do Quarteto, mas, para ele, havia confessado que jamais havia lido os quadrinhos, somente assistido ao desenho produzido para a Fox em 1994, e que não tinha interesse em dirigir um filme de super-heróis convencional, achando impossível se identificar com as situações que ocorriam nos quadrinhos. Trank decidiria escrever o roteiro ele mesmo, e acabaria isolando Slater, retendo todas as informações que o estúdio passava para a dupla, até o roteirista se demitir no final de 2012. No início de 2013, a Fox demitiria também Goldsman, trazendo Matthew Vaughn para substituí-lo e Seth Grahame-Smith para "polir" o roteiro de Trank. Em outubro de 2013, achando que o projeto já estava muito atrasado, o estúdio traria também Simon Kinberg, para ser co-produtor e co-roteirista, e tentar agilizar a produção.

Em uma entrevista no final de 2013, Trank diria que o filme teria uma "grande influência" de David Cronenberg, especialmente das obras Scanners: Sua Mente Pode Destruir e A Mosca, e que planejava fazer "uma mistura de Steven Spielberg com Tim Burton". Ele também optaria por um elenco mais jovem, convidando Michael B. Jordan, com quem havia trabalhado em Poder sem Limites para interpretar Johnny Storm - como Jordan é negro, logo começariam as discussões sobre se Sue também seria negra ou se Johnny seria adotado, com as expectativas sendo subvertidas após o anúncio de Reg E. Cathey para o papel do Dr. Storm, pai de Sue e Johnny, e de Kate Mara para o de Sue, o que indicava que ela é que seria a adotada. A escalação de Jordan seria justificada por Trank como "uma forma de fazer com que a adorada equipe dos quadrinhos ficasse mais fiel à demografia do mundo real", mas causaria revolta entre os fãs, com o diretor chegando a receber ameaças de morte, e revelando em entrevistas que dormia com um revólver 38 na mesa de cabeceira, que teria devolvido à loja ao final da produção. Trank também diria em entrevistas que discutiu com a Fox para que não somente Johnny, mas também Sue e um eventual Franklin Richards em um segundo filme fossem negros, com os executivos do estúdio sendo inflexíveis quanto a "manter a etnia de Sue". Ele também diria ter pensado em abandonar o projeto após não conseguir uma Sue negra, mas que teria decidido tocá-lo até o final sem aceitar a renovação para um segundo filme caso fosse proposta.

Reed, Ben e Von Doom também seriam interpretados por atores jovens; achando "Von Doom" um nome ridículo (embora seja um sobrenome que existe no mundo real), Trank mudaria o nome do personagem para Victor Domashev, com "Dr. Doom" sendo um apelido que Sue deu a ele por ser muito pessimista. Essa mudança também causaria revolta entre os fãs, mas, como não foi amplamente divulgada, só foi descoberta pela maioria nos cinemas, ao assistir o filme. Diante da repercussão negativa, a Fox chamou os atores de volta para regravar algumas cenas e redublar outras, para que o nome do personagem voltasse a ser Victor Von Doom. Como algumas cópias já haviam sido vendidas para o mercado internacional antes disso, ele acabou sendo Domashev em alguns países - incluindo aqui no Brasil; eu me lembro que tomei um susto no cinema, e foi a primeira coisa que comentei no Twitter quando cheguei em casa, que tinham mudado o nome do Dr. Destino.

Pela primeira vez, o Coisa seria um personagem totalmente digital, ficando até bem diferente dos quadrinhos, já que a Fox não queria "um humano gigante de pedra, e sim uma criatura que lembrasse uma pedra viva". Também diferentemente dos outros filmes, o Coisa nesse é pelado - mas, felizmente, não tem genitais aparentes. A criação do Coisa ficaria a cargo da empresa Moving Pictures Company, que também cuidaria das chamas do Tocha Humana; os efeitos elásticos de Reed ficariam a cargo da Weta. Outras empresas que trabalhariam no filme seriam a Pixomondo, responsável pelos poderes de Sue e do Dr. Destino, e a Rodeo FX. A Fox planejava converter o filme para 3D durante a pós-produção, mas Trank foi terminantemente contra, alegando que desejava que o filme ficasse "o mais puro possível para as plateias".

Querendo um filme mais grandioso que os dois anteriores, a Fox reservaria um orçamento de 155 milhões de dólares, e determinaria que as filmagens ocorressem no estado da Louisiana, devido a isenções fiscais que permitiriam que sobrasse mais desse dinheiro para outras coisas. Durante as filmagens, que começariam em maio de 2014, Hutch Parker (que acabaria não creditado) e Kinberg, sem o conhecimento de Trank, reescreveriam o roteiro e mudariam várias coisas das quais os executivos da Fox não haviam gostado, mudando, inclusive, o final. Ao ver a primeira versão editada, a Fox exigiria mais mudanças, alegando que o filme parecia uma continuação de Poder sem Limites, o que levaria aos atores serem chamados para gravar novas cenas em janeiro de 2015. O final seria mudado tantas vezes que acabaria sendo uma colagem de cenas das versões originais do roteiro com outras escritas por Kinberg enquanto elas estavam sendo gravadas; Trank daria várias sugestões para o final, todas ignoradas pela Fox.

Trank, evidentemente, ficaria extremamente irritado com as mudanças, que, segundo ele, mexeram em pontos centrais de sua história, descaracterizando totalmente o filme; o diretor acabaria renegando o filme, jamais o incluindo em sua filmografia oficial - nem mesmo editar o filme após a primeira edição a Fox permitiria que Trank fizesse, com a edição final ficando a cargo de Stephen E. Rivkin, que Trank diria ser "o verdadeiro diretor do filme". Ainda segundo Trank, uma "versão do diretor" seria impossível, já que muitas das cenas originalmente escritas por ele sequer seriam filmadas, e outras seriam destruídas após a segunda edição; o ator Toby Kebbell declararia em entrevistas que a primeira edição era muito melhor que a versão final, mas que ninguém jamais iria vê-la. Kate Mara também reclamaria após a estreia do filme, dizendo que cada refilmagem o deixava pior, e lamentando que ela não teve coragem de se opor às mudanças cada vez que o estúdio a chamava novamente.

Na versão final do filme, Reed é um jovem e talentoso cientista que, desde a adolescência, trabalha em um projeto de teletransporte com seu amigo Ben. Ele acaba chamando a atenção do Dr. Storm, que o contrata para um de seus projetos, onde ele trabalhará com sua filha adotiva, Sue, e seu jovem protegido Victor - seu filho Johnny é um bon vivant que só quer saber de gastar dinheiro e irritar o pai. O projeto do Dr. Storm visa se teleportar não para outro local da Terra, mas para uma dimensão paralela que ele chama de Planeta Zero (e que seria equivalente à Zona Negativa dos quadrinhos). Reed e Victor imaginam que estarão dentre os escolhidos para a primeira viagem, mas a NASA, que financia o projeto, decide mandar astronautas experientes; assim, Reed, Victor, Johnny e Ben, muito inteligentemente, decidem invadir o laboratório na calada da noite e fazer a primeira viagem por conta própria - e, evidentemente, dá tudo errado, eles têm de ser salvos por Sue, e Victor fica preso no Planeta Zero. Após retornarem, os três descobrem que manifestaram estranhos poderes, e até passaram alguns para Sue; Reed se torna um fugitivo, caçado pelo governo, enquanto Ben e os irmãos Storm se tornam cobaias de inúmeros testes. Mas os quatro têm de se unir quando Victor retorna, também com superpoderes e querendo vingança por ter sido deixado para trás.

O elenco conta com Miles Teller como Reed Richards / Sr. Fantástico, Michael B. Jordan como Johnny Storm / Tocha Humana, Kate Mara como Sue Storm / Mulher Invisível, Jamie Bell como Ben Grimm / o Coisa, Toby Kebbell como Victor Von Doom / Dr. Destino, Reg. E. Cathey como o Dr. Franklin Storm, e Tim Blake Nelson como o Dr. Harvey Allen, que trabalha para a NASA no projeto do Dr. Storm - Harvey Allen, nos quadrinhos, é o nome do Homem Toupeira, um indicativo de que ele também poderia ganhar poderes no Planeta Zero e se tornar o vilão do segundo filme. Dan Castellaneta faz uma participação especial como um professor de Reed; os pais de Reed são interpretados por Tim Heidecker e Mary Rachel Dudley; e Chet Hanks interpreta o irmão mais velho e abusivo de Ben, Jimmy Grimm.

Com roteiro creditado a Trank, Slater e Kinberg, co-produzido por Vaughn, Kinberg, Gregory Goodman, Hutch Parker e Robert Kulzer, oficialmente uma co-produção entre 20th Century Fox, Constantin Film, Marvel Entertainment, Marv Films, Kinberg Genre, TSG Entertainment e Moving Picture Company, e com o bizarro nome original de Fant4stic Four, Quarteto Fantástico (que aqui no Brasil não tem número nenhum no título) estrearia em 4 de agosto de 2015 e seria um imenso fracasso de publico e crítica. Nas bilheterias, ele renderia apenas 56,1 milhões nos Estados Unidos e 167,9 milhões ao somar o mundo inteiro, dando prejuízo para a Fox; a crítica o consideraria insosso e triste, e uma tentativa equivocada de se adaptar para um filme de super-heróis cínicos uma equipe que sempre foi famosa nos quadrinhos pelo clima de família. Até mesmo os efeitos especiais seriam considerados sem imaginação e abaixo da média se comparados a outros filmes de super-heróis da época.

Até o lançamento do filme, a Fox planejava fazer uma sequência, que estrearia em 2017, com os cinco atores principais tendo assinado para dois filmes; a baixa bilheteria, as críticas pesadas e, principalmente, as baixas vendas do home video - que alguns executivos da Fox ainda tinham esperança de salvar a situação - levariam o estúdio a suspender a produção por tempo indeterminado - oficialmente, ela ainda seria feita, só não se sabia quando. Vaughn diria em entrevistas estar disposto a dirigir um novo reboot, com o mesmo elenco ou não, para desfazer a má impressão deixada pelo último filme. Tudo isso deixaria de ser relevante, porém, em março de 2019, quando a Disney comprou a Fox e os direitos sobre o Quarteto Fantástico voltaram para os Marvel Studios, que finalmente puderam colocá-los no Universo Cinematográfico Marvel. Mas isso, como eu disse lá no primeiro parágrafo, é assunto para outro post.
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sábado, 2 de agosto de 2025

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Contos de Fadas BLOGuil (VIII)

E vamos a mais um dos Contos de Fadas BLOGuil, que, para quem está chegando agora, são versões bem-humoradas de contos de fadas que eu escrevi para meu primeiro blog, o BLOGuil, e posteriormente revisei e modifiquei para serem republicados no Crônicas de Categoria, sendo apresentados aqui no átomo em sua versão mais recente.





Chapeuzinho Vermelho

Era uma vez uma menininha muito bonitinha, que vivia do Lado de Cá da Floresta. O nome dessa menininha não é importante para a história, mas seu apelido era Chapeuzinho Vermelho, pois ela sempre ia a todo lugar com um boné do MST, que ganhara de um menino com quem fez amizade quando as terras de seu vizinho Coronel Totonho foram ocupadas no último verão. A polícia chegou e expulsou todo mundo a bala, mas Chapeuzinho guardou o boné como lembrança daquela época tão feliz.

Mas isso também não é importante para a história. O que importa é que Chapeuzinho recebeu de sua mãe, Dona Chapeuzona, uma importante missão: levar para sua Vovó uma Cesta de Café da Manhã, como presente de aniversário por seus inúmeros anos que nem mesmo a família sabia mais quantos eram. A Vovó de Chapeuzinho decidiu morar do Lado de Lá da Floresta, onde o aluguel era mais barato, portanto, para cumprir sua missão, Chapeuzinho teria de atravessar a floresta, que não tinha nome e era conhecida simplesmente como Floresta, em uma caminhada de várias horas. Provavelmente isso constitui exploração infantil, mas os pais de Chapeuzinho estariam trabalhando naquele dia, então sobrou para a doce garotinha levar a doce cesta para a doce Vovó. Que também não tem nome, sendo conhecida simplesmente como Vovó.

Mas, além da caminhada extenuante, havia outra complicação: na Floresta, morava um lobo, que também não tinha nome, e era conhecido simplesmente como Lobo. Este Lobo era chocólatra, de forma que, ao sentir o aroma das guloseimas presentes na cesta, fatalmente viria ao encontro de Chapeuzinho, e, como todo mundo sabe, Lobos, além de chocólatras, possuem o péssimo hábito de comer criancinhas. A mãe de Chapeuzinho, temendo pela integridade física de sua pimpolha, recomendou que ela não desse trela a qualquer criatura estranha que se aproximasse, principalmente se tal criatura perguntasse sobre o conteúdo da cesta e a finalidade de sua viagem. Só para garantir, ela também deu a chapeuzinho um spray de pimenta.

E assim lá se foi Chapeuzinho. Ao invés de ir quieta para não chamar atenção, a burralda decidiu ir berrando aos quatro ventos que ia sozinha, levava doces para a vovozinha, e que o caminho era longo e deserto. Isto acabou por chamar a atenção do Lobo, que se aproximou sorrateiramente e tentou descobrir o conteúdo da cesta. Chapeuzinho, lembrando-se das recomendações de sua mãe, sprayzou a cara do Lobo, que saiu correndo urrando de dor. Mal sabia chapeuzinho que isso só iria maximizar a ira do canídeo, que agora tramava uma vingança: ele sabia onde morava a Vovó, e iria até lá esperar por Chapeuzinho.

Ao chegar à casa da Vovó, o Lobo bateu à porta, e se identificou como vendedor do Carnê do Baú da Felicidade. Animada com a possibilidade de ganhar prêmios, a Vovó abriu a porta. Foi quando o Lobo saltou sobre ela e a engoliu inteira. Muitos se perguntam como um Lobo pode engolir um ser humano bem maior que ele inteiro, mas a verdade é que a mãe do Lobo era uma Cobra, portanto ele possuía mandíbulas flexíveis e um estômago dilatado. Muitos também se perguntam se depois de comer um ser humano inteiro o Lobo não teria que ir hibernar ou coisa parecida, mas ele estava tão sedento de vingança contra a Chapeuzinho insolente que nem considerou este pormenor. O Lobo simplesmente foi até o guarda-roupa da Vovó, escolheu uma camisola, e se deitou na cama, esperando por sua vítima.

Após alguns momentos, Chapeuzinho chegou à Casa da Vovó e bateu à porta, recebendo instruções para entrar. A "Vovó" estava deitada na cama, alegando que estava muito doente, e pediu para que Chapeuzinho se aproximasse. A menina sentiu que algo estava estranho. Tudo bem que ela não via a avó há anos, mas ela parecia muito gorda e peluda. Ao se aproximar, Chapeuzinho teve uma surpresa: não se tratava da Vovó, mas do Lobo! Ao saltar da cama, a primeira providência do Lobo foi zunir o spray de pimenta de Chapeuzinho pela janela. A segunda foi começar a correr atrás da menina, buscando devorá-la. Felizmente, por ter acabado de engolir a Vovó, o Lobo estava pesado, o que dava uma vantagem a Chapeuzinho na corrida.

Para sorte da menina, passava ali por perto um caçador, que também não tinha nome, e era conhecido simplesmente como Caçador. Após um dia inteiro no mato sem encontrar nenhuma caça, o Caçador estava com sede, e foi até a Casa da Vovó para beber um copo d'água e bater um papinho, quem sabe até assistir a uma novela. Aproximando-se, porém, o Caçador ouviu os gritos desesperados de Chapeuzinho e a risada maligna do Lobo. Compreendendo o que acontecia, o Caçador enfiou o pé na porta e deu um tiro de escopeta no meio dos cornos do Lobo, em uma cena de violência desnecessária jamais vista naquela Floresta. Cansada, suja de sangue e miolos, e traumatizada para toda a vida, Chapeuzinho correu para abraçar seu salvador. Foi quando todos ouviram os gritos da Vovó, que ainda estava viva na barriga do Lobo. Sacando de sua faca estilo Rambo, o Caçador, que também era um exímio cirurgião obstetra, abriu a barriga do vilão, salvando a Vovó antes que esta fosse digerida.

Após um longo banho, Vovó, Chapeuzinho e Caçador desfrutaram de um belo café da manhã com o conteúdo da cesta. E todos viveram felizes para sempre. Exceto o Lobo.
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sábado, 26 de julho de 2025

Escrito por em 26.7.25 com 0 comentários

Stargirl

Eu costumo dizer que comecei a ler DC depois de velho; a razão é que, na minha adolescência, eu só comprava revistas da Marvel (e algumas da Image), e só lia histórias da DC muito raramente, quando algum amigo me emprestava. A primeira revista da DC que eu comprei foi Watchmen, quando a Editora Abril a relançou, em 1999, e somente depois dos 30 anos eu decidi passar a comprar encadernados das histórias mais famosas da DC para ler e guardar. Hoje, a maior parte da minha coleção ainda é Marvel, mas já posso incluir algumas histórias da DC dentre as minhas favoritas.

Se eu tivesse que escolher a minha favorita de todas, excluindo Watchmen, creio que escolheria a fase da Sociedade da Justiça escrita por Geoff Johns. Por várias vezes eu pensei em fazer um post sobre a Sociedade da Justiça só para falar dela, até que essa semana eu optei por algo parecido: falar sobre uma heroína criada por Johns, que é peça fundamental em sua passagem pela SJA. Hoje é dia de Stargirl no átomo.

Mas, antes de falar de Stargirl, é preciso voltar bastante no tempo, para falar um pouco sobre outro herói da DC, o Sideral. Criado por um dos co-criadores do Superman, o roteirista Jerry Siegel, em parceria com o desenhista Hal Sherman, Sideral, cujo nome em inglês era Star-Spangled Kid, era o adolescente milionário Sylvester Pemberton Jr., que decidiu assumir uma identidade secreta para combater o nazismo. Uma das suas principais características, entretanto, era que ele tinha um parceiro adulto, Pat Dugan, o motorista da família Pemberton, que usava o codinome Listrado (Stripesy em inglês), e o acompanhava em todas as missões, mas não tinha nada de figura paterna, tutor ou mentor, tratando Sideral como um igual e frequentemente discutindo com ele que o nome da dupla deveria ser "Listrado e Sideral" ao invés de "Sideral e Listrado", já que ele era mais velho. Em inglês, os nomes de Sideral e Listrado eram uma referência aos dois apelidos da bandeira dos Estados Unidos, Star-Spangled Banner (algo como "a faixa estrelada") e Stars and Stripes ("estrelas e listras").

Nem Sideral, nem Listrado tinham qualquer superpoder, mas ambos eram extremamente competentes no combate corpo a corpo, com Sideral sendo muito ágil e Listrado muito forte; seu treinamento consistia em criar acrobacias que tirassem o melhor de suas habilidades individuais agindo em conjunto, o que permitia que eles saíssem dando saltos e piruetas pelo campo de batalha enquanto nocauteavam seus inimigos. A dupla estrearia na revista Star Spangled Comics número 1, de outubro de 1941, e teria aventuras publicadas até a edição 86, de novembro de 1948 - com Robin passando a ser o astro da revista a partir da edição 87 - além de aparecer esporadicamente, entre 1942 e 1945, na World's Finest Comics, como parte das equipes Sete Soldados da Vitória e Comando Invencível. Com o fim da Segunda Guerra Mundial e da Era de Ouro dos Quadrinhos, entretanto, os dois desapareceriam das publicações da DC, retornando apenas na década de 1970, quando foi revelado que os Sete Soldados da Vitória haviam ficado presos no passado durante uma aventura com viagem no tempo, sendo salvos pelo Lanterna Verde.

Sideral, então, se uniria à Liga da Justiça substituindo Starman, que estava se recuperando de ferimentos sofridos em uma missão, e passaria a usar seu Cajado Cósmico; quando Starman se recuperasse e voltasse à equipe, ele estudaria o Cajado e criaria um Cinturão que dava a ele os poderes de voo, projeção energética e transmutação da matéria. Sideral se aposentaria temporariamente da vida de super-herói para assumir os negócios do pai, que, como ele estava desaparecido, foram parar nas mãos de um sobrinho corrupto, mas retornaria em 1986, adulto, com o codinome de Skyman e liderando a equipe Corporação Infinito. Ele acabaria morto pelo vilão Sr. Bones dois anos depois, em 1988, e permanece morto desde então.

Dez anos depois, em 1998, Johns decidiria criar um novo personagem para assumir o manto de Sideral, e, com o desenhista Lee Moder, criaria Courtney Whitmore, que tinha o mesmo nome, aparência e personalidade da irmã do roteirista, Courtney Johns, que havia falecido aos 18 anos, em 1996, em um desastre aéreo. Nos quadrinhos, a mãe da adolescente Courtney se casa com Pat Dugan, e a família se muda de Los Angeles para a pequena Blue Valley, no interior do Nebraska. Ressentida pelo novo casamento da mãe e pela mudança de cidade, Courtney faz de tudo para atazanar Dugan, até que encontra o Cinturão e um antigo uniforme de Sideral dentre os pertences do padrasto, e decide vesti-lo para provocá-lo. Gostando de ser uma super-heroína e combater o crime, Courtney logo modifica o uniforme para uma versão mais feminina, e passa a enfrentar os maiores vilões de Blue Valley, com sua arqui-inimiga sendo Shiv, que também é adolescente, além de filha do vilão Rei Dragão. Como ela é iniciante e não tem as manhas da profissão, Dugan, que já está com mais de 40 anos e não tem mais a agilidade de outrora, decide criar uma armadura robótica, que chama de F.A.I.X.A., para poder acompanhar Courtney durante as missões.

Após uma aparição relâmpago na revista DCU Heroes: Secret Files & Origins número 1, de fevereiro de 1999, Courtney faria sua estreia oficial na Stars and S.T.R.I.P.E. número 0, de julho. Ela seguiria usando o codinome Sideral até 2003, quando receberia o Cajado Cósmico de Jack Knight, filho do Starman original (que se chamava Ted Knight) e segundo Starman; cansado da vida de super-herói, Jack decidiria se aposentar e, sem um herdeiro, consideraria Courtney a escolha perfeita para manter vivo o legado de Starman. Assim, após mais algumas aventuras, na JSA: All Stars número 4, de outubro de 2003, ela decidiria adotar o nome de Stargirl.

Além de viver aventuras solo, Courtney se tornaria membro da Sociedade da Justiça, se unindo a heróis veteranos como Pantera, Dr. Meia-Noite, Homem-Hora e os Lanterna Verde e Flash da Era de Ouro, e a novatos como Jakeem Thunder e o Esmaga-Átomo. Suas aventiras com a equipe seriam narradas principalmente nas revistas da Sociedade da Justiça, como Justice Society of America, JSA e JSA: All Stars, com algumas participações especiais em outras publicações, especialmente Trinity - a revista que tinha como protagonistas Superman, Batman e a Mulher Maravilha.

Ao longo de seus anos como membro da Sociedade da Justiça, Stargirl criaria uma inimizade com Solomon Grundy, que se tornaria obcecado por derrotá-la, e teria um relacionamento amoroso com o Capitão Marvel - extremamente criticado por ser "um adulto namorando uma adolescente", o Capitão Marvel decidiria desmanchar o romance e deixar a equipe, não querendo revelar que sua identidade secreta, Billy Batson, tinha mais ou menos a mesma idade de Courtney. Durante os eventos da Crise Infinita, Stargirl faria parte de uma equipe que reuniria alguns membros da Sociedade da Justiça, dos Jovens Titãs e da Patrulha do Destino que teria como missão impedir Superboy de destruir Smallville. Depois disso, ela desfaria sua parceria com F.A.I.X.A., se tornaria uma universitária, e faria uma modificação no Cajado para que ele pudesse encolher e ficar mais portátil, sendo carregado com ela durante todo o dia.

Durante a saga Um Ano Depois, apesar da pouca idade, Stargirl se tornaria uma espécie de mentora para super-heroínas mais jovens, como a Ciclone, neta da Tornado Vermelho original, e Rajada, filha do Raio Negro. Por causa disso, quando um racha dividiria a Sociedade da Justiça em duas, Stargirl seria convencida a integrar a equipe mais jovem, liderada pela Poderosa, mesmo se sentindo mais à vontade dentre os membros mais velhos.

Então viria a saga Os Novos 52, que faria um reboot no Universo DC, e Stargirl passaria a ser membro da Liga da Justiça, vivendo aventuras nas revistas Justice League of America e Justice League United. Nessa nova versão, ela já é Stargirl desde o início, tendo encontrado o uniforme e o Cajado dentre os pertences de Dugan após ele se casar com sua mãe, e a princípio os usando para ficar famosa na internet. Ela seria escolhida por Amanda Waller para ser a relações-públicas da equipe, e estaria dentre os heróis que enfrentariam o Dr. Manhattan na Lua, dando origem à saga Renascimento. A principal aventura de Stargirl pós-Renascimento seria a minissérie Stargirl: The Lost Children, em 6 edições lançadas entre janeiro e julho de 2023, com roteiro de Johns e arte de Todd Nauck, na qual ela deve resgatar 13 parceiros de heróis que foram removidos da Linha do Tempo pelos Mestres do Tempo.

E agora chega a parte em que eu confesso que decidi escrever esse post sobre Stargirl não somente por causa de sua carreira nos quadrinhos, mas principalmente por causa de sua série de TV. Criada por Johns, a série seria originalmente produzida para o serviço de streaming DC Universe, criado pela Warner Bros., dona da DC Comics, não somente para a exibição de filmes e séries, mas também para a disponibilização em formato digital de revistas em quadrinhos da DC - pagando apenas uma mensalidade, os assinantes teriam acesso aos quadrinhos digitais, a filmes e séries antigos com personagens da DC, e a novas produções, criadas especificamente para o serviço. Stargirl seria a quarta série inédita com atores de carne e osso do DC Universe, após Titãs, Patrulha do Destino e Monstro do Pântano.

Na série, após combater o crime ao lado de Pat Dugan como Sideral e Listrado, tanto como uma dupla quanto como membro dos Sete Soldados da Vitória, Sylvester Pemberton recebe o Cajado Cósmico das mãos de Ted Knight, passa a adotar o nome de Starman e se une à Sociedade da Justiça. Um dia, a Sociedade é atraída para uma emboscada por seus maiores inimigos, a Sociedade da Injustiça da América (sério, quem é que inventa para si mesmo um nome desses? Só não é pior que Brotherhood of Evil Mutants) e todos são mortos, exceto Listrado, que, após uma briga com Starman, fica "de castigo" no quartel general da equipe, somente chegando quando já é tarde demais para salvá-los. Na mesma noite, uma Courtney Whitmore ainda criança espera, em vão, pela chegada de seu pai, que nunca mais aparece, deixando sua mãe sozinha para criá-la.

Dez anos se passam, e Courtney está levemente insatisfeita, não somente porque sua mãe decidiu se casar de novo, com Dugan, que já tem um filho de um relacionamento anterior, mas também porque ela decide aceitar uma sugestão do novo marido e ir morar na minúscula Blue Valley, no interior do Nebraska, completamente diferente da enorme Los Angeles onde Courtney cresceu. Por uma dessas coincidências que só ocorrem nesses casos, Blue Valley também é a sede de operações da Sociedade da Injustiça, que, após eliminar a Sociedade da Justiça, passou a viver escondida à plena vista, com seus membros se tornando cidadãos responsáveis e valiosos para a comunidade - mas isso também sendo parte de um plano, segundo o qual eles usarão um equipamento eletrônico para controlar as mentes dos habitantes de grande parte do país.

Courtney descobre esse plano acidentalmente, após encontrar por acaso o Cajado Cósmico dentre os pertences de Dugan. Inativo desde a morte de Starman, o Cajado estabelece uma ligação com Courtney, o que leva a menina a, após confrontar Dugan e descobrir a história da morte da Sociedade da Justiça, concluir que seu pai desaparecido era ninguém menos que Starman. Assim, ela decide modificar um uniforme antigo de Starman, e usar ele e o cajado para se tornar Stargirl - mas, como a ameaça da Sociedade da Injustiça é grande demais para ela combater sozinha, ela decide recriar a Sociedade da Justiça, entregando equipamentos como a máscara do Pantera, a ampulheta do Homem-Hora e os óculos do Dr. Meia-Noite para seus amigos de escola, que passam a combater o crime a seu lado. Usando uma armadura robótica que Courtney chama de F.A.I.X.A., Dugan também auxilia a equipe, embora Courtney constantemente rejeite seu papel de mentor do grupo, se vendo como a líder.

Johns seria consultor e um dos principais roteristas da série, escrevendo o piloto, o segundo episódio e o último da primeira temporada. Ele declararia querer fazer uma série de aventura adolescente semelhante em tom a produções dos anos 1980 como E.T.: O Extra-Terrestre e De Voilta para o Futuro, mostrando os novos membros da Sociedade da Justiça aprendendo a usar seus poderes ao mesmo tempo em que passam por provações típicas da adolescência, como bullying, dificuldades de relacionamento com os pais e pressão social. A decisão de matar os membros originais da Sociedade da Justiça seria tomada para que os novos não vivessem à sua sombra, embora respeitassem seu legado, e para que os espectadores não ficassem frequentemente se perguntando coisas como "por que o Lanterna Verde e o Flash não ajudaram nessa batalha?".

O elenco principal conta com Brec Bassinger como Courtney Whitmore / Stargirl; Yvette Monreal como Yolanda Montez, colega de escola de Courtney atlética e determinada, mas de família conservadora, que vê sua vida desmoronar após fotos íntimas serem divulgadas online, e é escolhida para receber a máscara do Pantera; Anjelika Washington como Beth Chapel, menina estudiosa com dificuldades de relacionamento na escola e com os pais, que entra para a equipe após surrupiar os óculos do Dr. Meia-Noite; Cameron Gellman como Rick Tyler, filho do Homem-Hora original, ressentido por ter sido criado por um tio abusivo após seus pais morrerem no que aparentemente havia sido um acidente, e que entra em uma espiral de vingança após descobrir que eles foram mortos pela Sociedade da Injustiça, usando a ampulheta do Homem-Hora, que confere uma hora de superpoderes por dia, para enfrentá-los; Meg DeLacy como Cindy Burman / Shiv, garota mais popular da escola e filha do Rei Dragão, que fez vários experimentos bizarros em seu corpo ao longo de sua vida, que logo se torna rival de Courtney e arqui-inimiga de Stargirl; Jake Austin Walker como Henry King, Jr., capitão do time de futebol americano da escola, ex-namorado de Yolanda, atual de Cindy, e filho do vilão Onda Mental, mas que acha que o pai é apenas um bem-sucedido médico; Trae Romano como Mike, filho de Dugan cuja mãe é ausente e tem como maior desejo se unir à nova Sociedade da Justiça para provar ao pai que é útil; Hunter Sansone como Cameron Mahkent, menino sensível e artístico por quem Courtney fica interessada romanticamente, sem saber que ele é filho do vilão Geada; Amy Smart como Barbara Whitmore, mãe de Courtney; e Luke Wilson como Pat Dugan / Listrado.

A Sociedade da Injustiça é liderada por Jordan Mahkent / Geada (Neil Jackson), que tem o poder de congelar o ar a seu redor, e posa como um bem-sucedido empresário, CEO da American Dream, onde Barbara trabalha, que tem um ambicioso plano de revitalização de Blue Valley. Seus demais membros são Henry King, Sr. / Onda Mental (Christopher James Baker), que tem o poder de controlar as mentes alheias e é um dos médicos mais respeitados da cidade; Lawrence Crock, apelido Crusher (Neil Hopkins), e sua esposa, Paula Brooks (Joy Osmanski), que posam como donos de uma academia de ginástica, mas são na verdade os vilões Mestre dos Esportes e Tigresa; Stephen Sharpe / Jogador (Eric Goins), mestre das probabilidades e responsável por gerir as finanças da equipe; o Dr. Shiro Ito / Rei Dragão (Nelson Lee), cientista mestre da genética vivo há centenas de anos graças a inúmeras modificações que fez em seu corpo; Anaya Bowin / Violinista (Hina X. Khan), diretora da escola onde Courtney e seus amigos estudam, capaz de realizar vários efeitos sinistros com os sons de seu violino; William Zarick / Mago (Joe Knezevich), atualmente um vereador, anteriormente um mágico profissional, que tinha poderes mágicos sem que ninguém soubesse; e Solomon Grundy, um morto-vivo gigantesco, pouco racional e extremamente forte, que Geada consegue controlar, mas cujas origens jamais são explicadas.

Já a Sociedade da Justiça original, que aparece em flashbacks, conta com Sylvester Pemberton / Starman (Joel McHale), Ted Grant / Pantera (Brian Stapf), Charles McNider / Dr. Meia-Noite (Henry Thomas, que também faz a voz da inteligência artificial dos óculos do herói, a quem Beth chama de "Chuck"), e Rex Tyler / Homem-Hora (Lou Ferrigno, Jr.). Outros personagens que merecem ser citados são os pais de Beth, James Chapel (Gilbert Glenn Brown), que trabalha na American Dream, e a Dra. Bridget Chapel (Kron Moore), que trabalha no mesmo hospital que Onda Mental; Artemis Crock (Stella Smith), filha do Mestre dos Esportes e de Tigresa e ás dos esportes, cotada para ser a primeira quarterback feminina em um time de futebol americano universitário; Isaac Bowin (Max Frantz), filho da Violinista, com aptidão para vários instrumentos musicais; Joey Zarick (Will Deusner), filho do Mago, que fica amigo de Courtney; Denise Zarick (Cynthia Evans), esposa do Mago e mãe de Joey; Zeek (King Orba), mecânico amigo de Dugan que acaba descobrindo acidentalmente que é ele quem pilota o F.A.I.X.A. e se tornando um membro não-oficial da nova Sociedade da Justiça; Justin (Mark Ashworth), o zelador da escola, que tem amnésia e um segredo em seu passado; Matt Harris (Adam Aalderks), tio de Rick, que o criou; os pais de Geada, Sofus (Jim France) e Lily Mahkent (Kay Galvin); e Maria (Maria Sager), a garçonete do diner da cidade, onde Yolanda trabalha e os demais personagens costumam se encontrar, de propósito ou acidentalmente.

Johns diria que a parte mais difícil da produção seria a escolha da atriz que interpretaria Courtney, com centenas sendo testadas, e ele tendo certeza de que a novata Brec Bassinger era perfeita para o papel assim que viu seu teste. A equipe de figurinos tentaria fazer os uniformes o mais parecidos possível com os dos quadrinhos, mudando apenas detalhes que prejudicassem os movimentos dos atores. As filmagens ocorreriam na região metropolitana de Atlanta, com quase todos os locais e prédios de Blue Valley existindo em pequenas cidades da região, como Marietta, Duluth e Lithia Springs; as cenas em estúdio seriam gravadas em Dallas. O treinador de dublês Walter Garcia seria contratado especificamente para trabalhar com Bessinger e suas dublês, fazendo as coreografias de suas cenas de luta com o intuito de que o Cajado parecesse vivo e ajudando Courtney em seus movimentos, ao invés de simplesmente uma arma empunhada por ela.

Os efeitos especiais ficariam a cargo da Zoic Studios; a pedido de Johns, Stargirl seria a primeira série para a TV produzida pela Warner a usar o recurso da previsualização, normalmente reservado para produções de cinema, já que aumenta o custo final, mas que permitiu que a série tivesse "efeitos jamais vistos em séries de super-heróis". Os dois maiores destaques seriam o Cajado Cósmico, que existia em uma versão cenográfica, mas era alterado digitalmente na pós-produção, e Solomon Grundy, que era um personagem 100% digital. O robô F.A.I.X.A., assim como o Cajado, existia em uma versão cenográfica, criada pela Legacy Effects, que tinha movimentos limitados e contracenava com os atores, mas cenas que envolviam movimentos mais complexos, ou nas quais ele aparecia voando, usavam um modelo digital inserido na pós-produção.

Stargirl estrearia no DC Universe em 18 de maio de 2020, com um total de 13 episódios, um lançado por semana até 10 de agosto; através de um acordo, o canal a cabo The CW também exibiria os episódios, com cada um estreando no dia seguinte ao de sua disponibilização no streaming - cada episódio no CW, porém, tinha alguns minutos a menos em relação aos do streaming, para que pudessem ser exibidos comerciais, com Johns supervisionando quais cenas poderiam ser cortadas sem que a história fosse prejudicada. A partir de 1 de dezembro de 2020, a série também seria disponibilizada como parte do catálogo do novo serviço de streaming da Warner, o HBO Max. A Warner jamais divulgou os números da audiência no streaming, mas no CW eles eram excelentes, rivalizando com os das séries do Arrowverso, carro-chefe do canal na época.

Em junho de 2020, porém, pouco após a estreia de Stargirl, a Warner decidiria descontinuar o DC Universe, que sairia totalmente do ar em 21 de janeiro de 2021, criando um novo serviço de quadrinhos digitais, chamado DC Universe Infinite, e movendo todos os seus filmes e séries, originais ou não, para o HBO Max, que havia estreado em 27 de maio de 2020, uma semana após a estreia de Stargirl. Com essa decisão, Stargirl, assim como havia ocorrido com Monstro do Pântano um ano antes, seria cancelada após apenas uma temporada, com apenas Patrulha do Destino e Titãs seguindo em produção para serem exibidas na HBO Max. O CW, entretanto, estava tão satisfeito com a audiência de Stargirl que faria à Warner uma proposta: financiaria a produção de uma segunda temporada, desde que ela fosse exibida com exclusividade pelo canal a cabo.

Assim, em 10 de agosto de 2021, estrearia no CW a segunda temporada, com o título de Stargirl: Summer School ("curso de verão", a "recuperação" nas escolas dos Estados Unidos, onde os alunos que não passaram de ano, como Courtney, têm de frequentar aulas especiais durante as férias de verão) e 13 novos episódios, exibidos um por semana até 2 de novembro. A temporada completa seria disponibilizada na HBO Max em 10 de dezembro, mas, dessa vez, não haveria diferenças entre os episódios exibidos no streaming e na TV.

Após a Sociedade da Injustiça ter sido desmantelada na primeira temporada, na segunda a ameaça é o vilão Eclipso, banido anos atrás para uma dimensão paralela pela Sociedade da Justiça original, e que agora busca se utilizar do desejo de vingança de Cindy contra Courtney para escapar. Para detê-lo, a nova Sociedade da Justiça terá um aliado improvável, o vilão Penumbra, que saiu da Sociedade da Injustiça após se desentender com Geada, usa fumaça e sombras para se teletransportar e atacar seus inimigos e compartilha uma ligação com a dimensão para onde Eclipso foi banido.

Novos nomes da segunda temporada incluem Nick E. Tarabay como Eclipso; Jonathan Cake como Richard Swift / Penumbra; Ysa Penarejo como Jennifer-Lynn Hayden / Jade, filha do Lanterna Verde original, que usa o anel do pai e vem a Blue Valley tentando encontrar seu irmão desaparecido; Alkoya Brunson como Jakeem Williams, colega de Mike na escola e como entregador de jornais; Randy Havens como Paul Deisinger, professor de artes na escola de Courtney; Keith David como o Sr. Bones, que tem a pele transparente e cujo toque pode matar qualquer ser vivo; e Lynne Ashe como a Enfermeira Louise Love, que trabalha para uma instituição onde Jade acredita que seu irmão está sendo mantido contra a sua vontade. Outros membros da Sociedade da Justiça original que aparecem em flashbacks são Jay Garrick / Flash (John Wesley Shipp), Johnny Trovoada (Ethan Embry) e seu parceiro, o gênio Relâmpago (voz de Jim Gaffigan). Alicia Witt faz uma participação especial como a mãe de Mike, Maggie, e Alex Collins substituiria Henry Thomas como Chales McNider / Dr. Meia-Noite.

A primeira temporada de Stargirl já havia sido aclamada pela crítica, que elogiaria principalmente o texto de Johns, as atuações de Bassinger e Wilson e o clima leve dos episódios, diferente das demais produções de super-heróis da época; a segunda temporada traria um clima mais pesado, mas mais uma vez seria aclamada, com o tom mais adulto sendo considerado uma evolução natural em relação ao que havia sido mostrado um ano antes. Antes mesmo da estreia da segunda temporada, a CW conseguiria um acordo com a Warner, que garantia não somente sua exibição na HBO Max, mas também uma parceria no financiamento de uma terceita temporada - como o último episódio da segunda ainda não havia sido filmado, Johns aproveitaria e incluiria uma cena que já preparava o terreno para a terceira, estabelecendo qual seria sua história.

Basicamente, a terceira temporada lidaria com a redenção dos vilões: após Penumbra decidir abrir mão de suas atividades criminosas e se estabelecer como um cidadão respeitável de Blue Valley; Crusher e Paula abandonam suas vidas duplas, se mudam para a casa vizinha à de Courtney e fazem de tudo para serem os novos melhores amigos de Dugan e Barbara; Cindy e Artemis (usando os equipamentos do pai e o nome de Mestra dos Esportes) decidem se unir à nova Sociedade da Justiça; o Jogador decide abrir mão de seus esquemas fraudulentos e investir seu dinheiro para reencontrar sua filha e fazer as pazes com ela; e até mesmo Geada retorna se dizendo arrependido e querendo reparar os erros que cometeu como líder da Sociedade da Injustiça. Mas o assassinato do Jogador joga uma sombra sobre os vilões redimidos, levando a crer que pelo menos um deles não abandonou seus antigos hábitos, e fazendo com que a Sociedade da Justiça tenha de encontrar o assassino. Paralelamente a isso, Mike e Jakeem, que acidentalmente se torna o novo parceiro de Relâmpago, se ressentem por não poderem fazer parte da Sociedade da Justiça, tentando formar sua própria equipe, o Comando Juvenil; e Starman aparentemente retorna dos mortos, passando a compartilhar o cajado com Courtney e a trazer muita tensão para o relacionamento dela com Dugan, que ele ainda vê como seu parceiro.

Com o nome de Stargirl: Frenemies (algo como "aminimigos"), a terceira temporada, de mais 13 episódios, seria exibida pelo CW entre 31 de agosto e 7 de dezembro de 2022, e disponibilizada na HBO Max em 6 de janeiro de 2023. Os únicos novos nomes de peso do elenco são Tïm Gabriel como Todd Rice / Obsidiano, o irmão de Jade; e Seth Green, que substituiria Gaffigan como a voz de Relâmpago, que seria mais um personagem totalmente digital. A terceira temporada não conseguiria manter os mesmos níveis de audiência das duas primeiras, e seria considerada bastante inferior a elas pela crítica, que reclamaria dos clichês do "quem matou" e do "retorno dos mortos"; por causa disso, enquanto ela ainda estava no ar, o CW cancelaria a série, não renovando-a para uma quarta temporada.

Johns ficaria decepcionado com o cancelamento, principalmente porque, devido a uma cena de um dos episódios da primeira temporada ter aparecido no crossover do Arrowverso Crise nas Infinitas Terras, em janeiro de 2020, ele tinha esperança de escrever um episódio crossover entre as séries Stargirl e The Flash - com Bassinger declarando em entrevistas que gostaria de ver Stargirl e Supergirl lutando lado a lado, para que ela pudesse contracenar com Melissa Benoist, e Shipp sendo escolhido especificamente para interpretar o Flash na segunda temporada de Stargirl por já ter interpretado Garrick em The Flash, estabelecendo uma ligação entre as duas séries. Johns ainda tentaria convencer a Warner a financiar uma quarta temporada para exibição na HBO Max, mas desisitiria após ser informado de que isso poderia fazer com que o crossover com The Flash ficasse ainda mais difícil, já que o Arrowverso era produzido pelo CW sem interferência direta da Warner. O máximo em matéria de crossover que ele conseguiria seria Bassinger interpretar Stargirl em um episódio da quarta temporada de Titãs.

Como o cancelamento ocorreria após todos os episódios da terceira temporada já terem sido filmados, a história ficaria com algumas pontas soltas; Johns conseguiria, entretanto, autorização do CW para filmar uma nova cena final para o último episódio, ambientada muitos anos no futuro, e, dos atores da série, contava apenas com a participação de Cake - mas ajudava a deixar claro que a Sociedade da Justiça fundada por Courtney se tornaria uma força do bem não só em Blue Valley mas em todo o planeta, alcançando um legado comparável ao da equipe original.
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sábado, 19 de julho de 2025

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Studio Ghibli (IV)

E vamos a mais um post da série sobre as produções do Studio Ghibli!

Pom Poko: A Grande Batalha dos Guaxinins
Heisei Tanuki Gassen Ponpoko
1994

Antes de mais nada, é preciso explicar que, apesar do que diz o subtítulo e do que aparece nas legendas da versão em português (e talvez na dublagem, mas não tenho certeza, porque jamais assisti dublado), os animais desse filme não são guaxinins, e sim tanukis, canídeos nativos do Japão que lembram guaxinins por ambos terem uma pelagem preta em torno dos olhos parecida com uma máscara, mas que não são parentes deles. No folclore japonês, tanukis (e raposas) são criaturas com poderes místicos, capazes de se assumir outras formas, inclusive de seres humanos, principalmente para causar confusão; para se transformar, os tanukis colocam uma folha verde na cabeça, e sua transformação preferida é em estátua de Ojizo-sama, divindade que costuma ser encontrada em templos budistas. O nome do filme, Pom Poko, é uma referência ao barulho que os tanukis fazem batendo em suas próprias barrigas em um popular poema infantil escrito por Ujo Noguchi em 1919, que se tornou uma cantiga de roda em 1925.

Hayao Miyazaki e Toshio Suzuki teriam a ideia de fazer um filme sobre tanukis em 1992, mas, envolvido com a produção de Porco Rosso, Miyazaki decidiria convidar Isao Takahata para escrever e dirigir o projeto. A princípio, Takahata pensaria em adaptar a história de Heike Monogatari, livro que relata a luta entre os clãs Taira e Minamoto pelo controle do Japão no final do século XII, mas substituindo os humanos por tanukis; como isso estava dando muito trabalho e não estava ficando do jeito que ele queria, ele decidiria perguntar a Miyazaki e Suzuki se, quando eles o convidaram, já tinham algo em mente, ou se queriam simplesmente uma história envolvendo tanukis. Suzuki diria ter pensado em ambientar a história na região de Tama New Town, nos arredores de Tóquio, que, antigamente, contava com uma grande população de tanukis, expulsos de lá após um boom imobiliário, e Miyazaki diria que sua ideia era que os tanukis usassem seus poderes de transformação para tentar frear a invasão dos humanos.

Assim, o filme começa nos anos 1960, quando os tanukis viviam livres nas florestas e com bastante espaço, até começar a construção de Tama New Town, quando eles foram sendo empurrados para espaços cada vez menores. Após um salto no tempo para os anos 1990, quando o filme é efetivamente ambientado, os tanukis de dois clãs rivais, que vivem brigando, percebem que, se não se unirem, Tama New Town ocupará todo o seu espaço, e eles ficarão sem ter onde morar. Sua melhor chance é usar seus poderes de transformação para sabotar as obras, mas eles estão há tanto tempo sem usá-los que os mais jovens sequer sabem como fazê-lo. Os anciões, então, desenvolvem um plano em duas partes: enquanto os jovens são treinados pelos mais velhos para dominar suas transformações e usá-las para atrapalhar o serviço dos humanos e afugentá-los, emissários serão enviados em busca dos grandes mestres da transformação, que vivem em regiões mais afastadas da civilização, e possuem poderes capazes de impedir a expansão dos humanos de uma vez por todas.

Pom Poko seria o primeiro filme com roteiro original de Takahata, e o primeiro do Studio Ghibli com um roteiro original que não fosse de Miyazaki. Os roteiristas de mangá Shigeru Sugiura, Hisashi Inoue e Shigeru Mizuki seriam creditados como "equipe adicional", segundo Takahata, por ele ter se baseado em várias obras deles para criar sua história; embora não tenha adaptado uma história específica, Takahata se inspiraria tanto no trabalho de Mizuki que decidiria incluir no filme um personagem (humano) feito à sua imagem e semelhança.

Ao todo, três equipes de animação seriam usadas no filme, cada uma responsável por um nível de realismo dos tanukis: quando eles não estão "ocultos dos olhos humanos", são extremamente realísticos, como se o filme fosse um documentário; na maior parte do tempo, porém, eles se parecem com animais antropomórficos fofinhos característicos de desenhos animados; exceto quando estão muito felizes ou empolgados, quando seus traços ficam ainda mais simples, ao estilo dos desenhos produzidos para crianças bem pequenas. Pom Poko seria o primeiro filme do Studio Ghibli a usar computação gráfica, embora apenas em algumas cenas e somente o recurso da tinta digital, que facilitava o trabalho dos coloristas e proporcionava maior uniformidade ao filme; e o segundo a fazer referência a filmes anteriores através de personagens: na cena em que os grandes mestres da transformação criam um desfile de youkai ("espíritos"), em meio às criaturas, cruzando a tela rapidamente, podem ser vistos Totoro, montado num pião e segurando um guarda-chuva; Kiki, voando em sua vassoura; a versão de 10 anos de Taeko, nadando como se estivesse em uma piscina; e Porco Rosso, voando em seu avião. Caso alguém esteja se perguntando, o primeiro seria O Castelo no Céu, no qual, em Laputa, são encontrados vários animais idênticos ao que Lorde Yupa deu de presente para Nausicaä em Nausicaä do Vale do Vento.

Pom Poko também seria o primeiro filme do Studio Ghibli a contar com um narrador, com esse papel cabendo ao famoso contador de histórias Kokontei Shincho, e o primeiro no qual um dos personagens "quebra a quarta parede" e fala diretamente com a audiência, numa cena em que o tanuki Ponkichi pede para que as pessoas evitem destruir o habitat natural dos animais nativos de suas regiões. Finalmente, ele é o único do Studio Ghibli até hoje a contar com uma cena gravada com atores de carne e osso: há um momento em que os tanukis estão assistindo televisão e, na tela, aparece um programa no qual um cozinheiro está preparando tempura. Originalmente, esse programa seria feito com animação, como o resto do filme, mas Takahata acharia que o tempura "não parecia delicioso o suficiente", e pediria para que uma cena com atores fosse usada. Ao invés de catar uma de algum outro filme ou comercial, a equipe de produção decidiria filmar uma especialmente para a ocasião, usando a cozinha e um dos cozinheiros do restaurante Kappo Sushi Funawa, no qual eles costumavam almoçar.

Pom Poko estrearia nos cinemas japoneses em 16 de julho de 1994, distribuído pela Toho, e seria um gigantesco sucesso, rendendo 4,47 bilhões de ienes nas bilheterias, se tornando o filme nacional mais assistido no Japão e o segundo filme de animação mais assistido no país naquele ano, atrás apenas de O Rei Leão. A crítica ficaria encantada, elogiando principalmente a qualidade da animação e a mensagem ecológica do filme. Pom Poko ganharia o o prêmio de Melhor Filme de Animação no festival de cinema da Mainichi Shimbun, e seria incrito para concorrer ao Oscar de Melhor Filme em Língua Estrangeira, mas não ficaria dentre os finalistas.

Internacionalmente, aliás, o filme sofreria com problemas de distribuição por causa de uma questão inusitada: os tanukis machos têm bolsa escrotal ("saquinho") e, inclusive, conseguem transformá-los em outros objetos usando seu poder de transformação - em uma determinada cena, um dos grandes mestres transforma seu saquinho em um navio e sai navegando com ele por um rio. Essa particularidade faria com que fosse difícil encontrar um distribuidor na Europa, e com que a primeira vez em que Pom Poko estivesse disponível fora do Japão fosse em 2005, quando a Disney o lançaria em DVD nos Estados Unidos, em um combo com Meus Vizinhos, os Yamadas; no ano seguinte, ele seria lançado também em DVD no Reino Unido. A versão Disney conta com vozes, dentre outros, de J.K. Simmons, Olivia d'Abo, Clancy Brown, Tess MacNeille, Brian Posehn, Kevin Michael Richardson e John DiMaggio.

Sussurros do Coração
Mimi wo Sumaseba
1995

Shizuku Tsukishima é uma estudante de 14 anos que mora no subúrbio de Tóquio com seus pais e sua irmã universitária, sendo que seu pai trabalha na biblioteca pública. Introvertida mas muito criativa, Shizuku gosta de escrever poemas, contos e letras de música, mas seu principal hobby é ler, principalmente livros de aventura que pega na biblioteca da escola. Um dia, acidentalmente, ela descobre que todos os livros que ela pega já foram lidos anteriormente pela mesma pessoa, um menino chamado Seiji Amasawa, e começa a imaginar como seria ser amiga de um menino que tem o mesmo gosto literário que ela.

A vida de Shizuku muda num dia em que, levando o almoço para seu pai, ela se distrai com um gato (que mais tarde ela descobre se chamar Moon) e acaba indo parar em um bairro no qual nunca esteve antes, onde descobre uma loja de antiguidades, ficando encantada por conhecer "um lugar onde as histórias começam". Ela faz amizade com o idoso dono da loja, que tem como objeto preferido uma estatueta de um gato, de pé como se fosse uma pessoa e vestindo roupas, que ele chama de Barão. Ao voltar para casa, ela descobre que o neto do dono da loja é um menino com quem ela não se dava bem na escola, e, convivendo com ele, descobre que ele é mais sensível e profundo do que ela imaginava, inclusive sabendo fabricar violinos e tendo o sonho de se tornar um lutier. Da amizade com o senhor e seu neto, Shizuku tira a inspiração para escrever um livro, protagonizado pelo Barão.

Essa é a história de Sussuros do Coração, adaptação do mangá Mimi wo Sumaseba (algo como "ouça com cuidado"), escrito pela autora Aoi Hiiragi e publicado na revista Ribon entre agosto e novembro de 1989, ganhando uma continuação, Mimi wo Sumaseba: Siawase na Jikan ("tempos felizes"), publicada na Ribon Original em agosto de 1995, pouco após o lançamento do filme. Segundo as más línguas, Miyazaki, após a produção de Eu Posso Ouvir o Oceano, ficaria com a ideia fixa de escrever e dirigir ele mesmo uma história de romance adolescente, sem elementos fantásticos, para ser lançada nos cinemas, com o intuito de que Eu Posso Ouvir o Oceano, que estreou diretamente na televisão, não entrasse para a história como o único filme de romance adolescente do Studio Ghibli. Línguas mais maldosas ainda diriam que ele se ressentia por ter planejado escrever e dirigir Eu Posso Ouvir o Oceano, mas sido impedido por Suzuki, que queria que uma equipe jovem assumisse o projeto.

Seja como for, Miyazaki leria o mangá e negociaria com Hiiragi a adaptação, escrevendo ele mesmo o roteiro e planejando dirigi-lo, mas decidindo abrir mão da direção para que essa coubesse a Yoshifumi Kondo, animador que Takahata trouxe da Nippon Animation para trabalhar em Túmulo dos Vagalumes. Considerado extremamente talentoso tanto por Miyazaki quanto por Takahata, Kondo seria treinado pelos dois para se tornar o terceiro diretor principal do Studio Ghibli, e, um dia, sucedê-los; Sussurros do Coração, porém, acabaria sendo seu primeiro e último filme, já que Kondo faleceria prematuramente, aos 47 anos, de um aneurisma na aorta, em 1998.

Como de costume, Miyazaki mudaria algumas coisas na história, para que o filme ficasse mais com a cara do Studio Ghibli; a principal delas seria a introdução na trilha sonora, criada pelo compositor Yuji Nomi, em sua estreia no Studio Ghibli, da canção Take Me Home, Country Roads, de John Denver. Na história, Shizuku faz uma paródia da música, chamada "estradas de concreto", com letra em japonês, que fala sobre o lugar onde ela mora, Tama New Town, e essa paródia tem papel importantíssimo na história, sendo tanto o motivo pelo qual ela desgosta do neto do dono da loja quanto o pelo qual ela se aproxima dele. A letra da paródia seria criada pela filha do produtor Toshio Suzuki, Mamiko, sendo revisada e ajustada na métrica por Miyazaki. A música original em inglês, no filme, é cantada por Olivia Newton-John, e a paródia por Yoko Honna, a dubladora de Shizuku.

Sussuros do Coração seria extremamente elogiado pela beleza dos seus cenários, que mostravam uma Tóquio um pouco diferente da real - no Japão, é considerado desrespeitoso retratar em obras de animação cidades japonesas de forma idêntica a como elas são na realidade - mas ainda assim reconhecível. As antiguidades da loja também seriam bastante inspiradas, algumas copiadas do mangá, outras criadas especialmente para o filme, como uma xilogravura - aquela placa de madeira com uma figura, que depois será coberta de tinta e usada para impressão, bastante usada no Japão, na China e no Brasil, na literatura de cordel - de um violinista, criada pelo filho de Miyazaki, Keisuke, que, na vida real, é xilógrafo.

O filme também chamaria atenção por suas sequências de sonho, aquelas nas quais Shizuku imagina estar dentro da história que está escrevendo, protagonizada por Barão. Essas sequências seriam animadas por uma equipe diferente da que fez o restante do filme, e teria lindíssimos planos de fundo pintados por Naohisa Inoue, autor do conto Hoshi o Katta Hi ("o dia em que eu comprei uma estrela"), que Miyazaki adaptaria para um curta, em exibição exclusiva no Museu Ghibli desde 2006. O sucesso de Hoshi o Katta Hi chamaria antenção para o trabalho de Inoue, que seria convidado para escrever e dirigir Iblard Jikan, filme lançado diretamente em DVD e Blu-ray em 2007, composto por várias cenas do mundo imaginário de Iblard, criado por Inoue, animadas pelos profissionais do Studio Ghibli e com trilha sonora de Kiyonori Matsuo, sem enredo ou diálogos.

Sussuros do Coração seria o primeiro filme na história do cinema japonês a usar o formato de som Dolby Digital; para aproveitar a ocasião, a banda japonesa Chage and Aska faria uma parceria com o Studio Ghibli, que criaria em animação um videoclipe para a música On Your Mark, exibido antes de cada sessão do filme, que estrearia nos cinemas japoneses em 15 de julho de 1995, distribuído pela Toho. Mais uma vez, o filme seria o nacional mais assistido no Japão naquele ano, rendendo cerca de 3,15 bilhões de ienes de bilheteria. A crítica também ficaria encantada, considerando-o "uma bela e provocativa história adolescente sobre anseios e aspirações".

No exterior, o filme só começaria a ser lançado a partir de 2003, acreditem ou não, por problemas de licenciamento de Take Me Home, Country Roads, que Miyazaki não aceitava remover ou substituir. Na Europa e Ásia o filme teria um lançamento limitado nos cinemas - e, mesmo assim, somando todas as sessões fora do Japão, renderia mais 34,9 milhões de dólares - mas, nos Estados Unidos, seria lançado diretamente em home video pela Disney em 2006, com a dublagem trazendo Brittany Snow como Shizuku. Embora o filme japonês tenha o mesmo título do mangá, as versões internacionais têm como título versões nos idiomas locais de Sussuros do Coração (por exemplo, em inglês o título é Whisper of the Heart, e em italiano é I Sospiri del mio Cuore); esse título também seria criado pelo Studio Ghibli, que considerou que o original seria de difícil tradução, e não queria que o filme tivesse um título diferente em cada lugar.

Em 2022, Sussuros do Coração ganharia uma versão com atores de carne e osso, produzida pela Sony e estrelada por Nana Seino (a Sunmi de Tokyo Tribe) e Tori Matsuzaka (o Shinken Red de Samurai Sentai Shinkenger). Com direção de Yuichiro Hirakawa, o filme é ambientado dez anos após os eventos do anime, e traz uma Shizuku de 24 anos trabalhando como editora de livros infantis e tentando fazer funcionar um relacionamento à distância. A produção começaria em janeiro de 2020, mas teria de ser interrompida por causa da pandemia, o que atrasaria a estreia em dois anos em relação à data originalmente prevista. Talvez para evitar problemas, a música principal do filme não é Take Me Home, Country Roads, e sim Tsubasa o Kudasai, cantada por Anne Watanabe. O filme seria um sucesso de público, sendo o quarto mais assistido no Japão em 2022, mas um fracasso de crítica, que o consideraria extremamente nostálgico e com roteiro fraco e previsível.

Para terminar, vale registrar que Sussuros do Coração é o único longa-metragem do Studio Ghibli que ganharia uma "sequência" (na verdade, um spin-off, mas o próprio Studio Ghibli chama de sequência ou continuação) na forma também de um longa metragem: O Reino dos Gatos, de 2002, que nós veremos no próximo post dessa série.

Princesa Mononoke
Mononoke Hime
1997

Em 1980, logo após finalizar Lupin III: O Castelo de Cagliostro, Miyazaki começaria a trabalhar em uma versão da fábula A Bela e a Fera ambientada no Japão Feudal, na qual a "fera" seria um mononoke, espírito animal vingativo que normalmente protege uma floresta, lago ou outra região natural, e a "bela" seria uma filha de um nobre que, após ele desrespeitar o espírito, se veria forçada a se casar com ele para evitar sua vingança. Miyazaki apresentaria o projeto a várias produtoras, mas nenhuma se interessaria, e ele acabaria usando o que já tinha criado no mangá Shuna no Tabi, lançado em 1983, em volume único, pela Tokuma Shoten.

Após a fundação do Studio Ghibli, Miyazaki decidiria revisitar o conceito, mas, sem querer fazer uma adaptação de Shuna no Tabi, ele decidiria se inspirar em Hojoki, obra escrita em 1212 por Kamo no Chomei, que, diante do turbilhão político e de diversos desastres natuais que ocorreram na época, escreveu sobre a efemeridade da vida e a vulnerabilidade da cultura japonesa. Em determinado momento, Miyazaki acharia que o projeto estava se distanciando demais do originalmente pretendido e que não faria sucesso comercialmente e o abandonaria completamente, mantendo, entretanto, sua vontade de fazer um filme ambientado no Japão Feudal.

Em agosto de 1994, depois de concluir o mangá de Nausicaä do Vale do Vento, Miyazaki decidiria retomar os trabalhos em seu filme de A Bela e a Fera, mas adicionando a ele ideias com as quais havia já trabalhado em Meu Amigo Totoro e Porco Rosso. Em dezembro, ele abandonaria tudo novamente, dizendo estar com bloqueio de escritor, e decidiria se dedicar à direção do videoclipe On Your Mark, para arejar as ideias. Em abril de 1995, ele finalmente decidiria retomar a pré-produção, levando toda a equipe de direção de arte para visitar a ilha de Yakushima, relativamente intocada pelo homem, para obter inspiração para os cenários do filme; o diretor de arte Kazuo Oga também decidiria visitar outro local, as montanhas de Shirakami-Sanchi.

Após essa viagem, a história finalmente começaria a se desenrolar na mente de Miyazaki, que começaria a preparar os storyboards - ainda assim, o filme teria a produção mais longa dentre todos do Studio Ghibli, pois frequentemente Miyazaki decidia mudar alguma coisa com a qual não estava plenamente satisfeito. A produção da animação começaria em julho de 1995, sem um roteiro pronto: usando uma técnica comum no mangá, Miyazaki iria inventando a história conforme desenhava os storyboards, o que fez com que toda a história só estivesse completa em janeiro de 1997, e com que as filmagens só fossem concluídas em junho, menos de um mês antes da data prevista para a estreia nos cinemas, que Miyazaki se recusou a adiar.

Essa produção tão longa faria com que Princesa Mononoke se tornasse o filme japonês de animação mais caro de todos os tempos, com custo final de 2,35 bilhões de ienes. Em uma entrevista dada quando o orçamento passou de 2 bilhões, Miyazaki declararia não se importar se o Studio Ghibli fosse à falência, desde que ele conseguisse fazer o filme do jeito que queria. Parte do custo exagerado do filme veio da ideia de Miyazaki de contratar nada menos que cinco diretores de arte, algo sem precedentes na indústria da animação mundial, cada um responsável por uma área em específico - um cuidaria apenas das cenas na floresta, outro apenas das cenas na fortaleza, outro somente das cenas ambientadas durante a noite. O nível de detalhe dos planos de fundo e dos personagens coadjuvantes também seria algo sem precedentes, consumindo mais de 144 mil células de acetato, 80 mil delas retocadas pessoalmente por Miyazaki, que queria que elas ficassem mais detalhadas ainda.

Além de todo esse esforço na animação tradicional, Princesa Mononoke também seria o segundo filme do Studio Ghibli a usar computação gráfica, utilizando principalmente a técnica da tinta digital, usada dali por diante em todos os filmes subsequentes do Studio Ghibli. Seria o colorista veterano Michiyo Yasuda quem convenceria Miyazaki a investir em um departamento de computação gráfica para o Studio Ghibli, inaugurado em 1996; tendo usado a técnica da tinta digital em Pom Poko, Yasuda acreditava que as técnicas de pintura usadas pelo Studio Ghibli já estavam ultrapassadas, e que insistir nelas poderia levar os filmes a ficarem com visual datado e afastar o público. Após a inauguração do departamento de computação gráfica, os animadores aproveitariam para testar outras técnicas variadas de animação por computação; estima-se que cerca de 5 minutos (não contínuos) de Princesa Mononoke, incluindo o primeiro demônio que aparece no filme, tenham sido totalmente produzidos por computação gráfica, sem nenhum traço de animação tradicional.

Miyazaki era conhecido por detestar e renegar o uso da computação gráfica na animação, então foi uma grande surpresa para todos do meio quando foi anunciado seu uso em Princesa Mononoke. Para que a animação por computação gráfica não destoasse da animação tradicional, seria usado um programa que combinaria as duas, desenvolvido pela Microsoft especificamente a pedido do Studio Ghibli. A falta de know how dos animadores do Studio Ghibli também faria com que a produção das cenas em computação gráfica fossem supervisionadas por animadores de outro estúdio mais acostumado com o processo, o Toyo Links. O resultado final ficaria tão harmonioso que os deuses alternam entre versões digitais e tradicionais sem que ninguém consiga identificar com clareza quando é feita a transição.

A produção do filme seria tão desgastante que muitos dos animadores pediriam demissão após sua conclusão; o próprio Miyazaki chegaria a anunciar sua aposentadoria, alegando que jamais iria conseguir trabalhar em outro filme, mas mudaria de ideia em 1998, após a morte de Yoshifumi Kondo, que ele considerava seu sucessor. Apesar de tudo isso, Princesa Mononoke seria considerado um divisor de águas para a carreira de Miyazaki, com seus filmes posteriores sendo considerados muito mais maduros e artísticos; há quem considere, por outro lado, que o filme restringiria sua carreira, já que o diretor se retiraria da vida pública após seu lançamento, e jamais voltaria a fazer os filmes de aventura ao estilo de Porco Rosso que fazia antes, como se achasse que isso seria um retrocesso.

O protagonista de Princesa Mononoke é Ashitaka, príncipe do povo Emishi, que, um dia, é atacado por um demônio. Ao deter o ataque, Ashitaka descobre que o demônio na verdade era Nago, um espírito protetor da floresta, que foi corrompido. Essa corrupção se infiltra no braço de Ashitaka, que passa a ter vontade própria, e acabará se alastrando pelo resto de seu corpo e transformando-o também em demônio. Ashitaka então decide rumar em uma jornada para descobrir a fonte da corrupção de Nago, imaginando que, conhecendo sua causa, poderá reverter o processo.

Durante a jornada, Ashitaka conhece o monge Jigo, que finge ser seu amigo, e vai parar numa fortaleza controlada por Lady Eboshi, que dá abrigo a prostitutas, leprosos e outros párias, em troca de eles trabalharem em sua fábrica de armas de fogo - que ela pretende usar para destruir todos os espíritos protetores da floresta, tendo sido ela a responsável pela corrupção de Nago. Enquanto está na fortaleza, Ashitaka conhece San, humana criada como filha por outro espírito protetor, Moro, que planeja expulsar Lady Eboshi de lá e destruir sua fábrica. San leva Ashitaka até o Espírito da Floresta, que salva sua vida, mas, ao fazê-lo, inadvertidamente coloca sua própria existência em risco, já que o Imperador incumbiu Jigo e Lady Eboshi de cortar a cabeça do Espírito da Floresta e levá-la até ele, acreditando que ela confere a seu portador a imortalidade.

Princesa Mononoke seria mais um dos filmes do Studio Ghibli que coloca a civilização e a natureza em conflito, com forte mensagem ecológica e a favor do ambientalismo, mas com a distinção de não mostrar civilização e natureza como opostos, nem progresso e tecnologia como malignos - o vilão, mais uma vez, é a ganância, não a modernidade. Ashitaka transita entre os dois mundos sem condenar nenhum, e serve de mediador entre os interesses de Lady Eboshi e de San, até descobrir que a primeira tem um propósito egoísta. Essa dicotomia incomum faria com que o filme fosse objeto de vários estudos cinematográficos, literários e até mesmo sociológicos, com artigos científicos que usam o filme como exemplo ou ponto de partida sendo publicados no mundo inteiro. Miyazaki diria que pretendia fazer uma crítica à forma como os problemas ambientais são abordados no Japão, que praticamente exclui os seres humanos da equação, dando a entender que a única forma de a natureza ser preservada é acabando com a civilização.

O filme também ficaria famoso por tocar em pontos espinhosos para a cultura japonesa, como o minzoku, a teoria de que a cultura do Japão é única e derivada de uma só etnia, o povo Yamato; pertencendo ao povo Emishi, antepassado dos Ainu, povo indígena que vive no norte do Japão e é considerado de segunda classe por muitos dos japoneses, Ashitaka é tratado com desdém ou desconfiança pela maior parte dos demais personagens, inclusive os que moram na fortaleza de Lady Eboshi, que dá abrigo a todo tipo de pária - algo que coloca em xeque até mesmo o papel de Eboshi como vilã. Apesar de ser um "filme de época", Princesa Mononoke é essencialmente um filme de fantasia, já que muitos de seus elementos não possuem correspondentes históricos - a fábrica de Lady Eboshi seria inspirada em instalações semelhantes encontradas na China, mas jamais presentes no Japão, e as armas de fogo são as armas preferenciais dos personagens, algo que não ocorria no Japão Feudal.

Muitos críticos também veriam um paralelo entre Princesa Mononoke e o Épico de Gilgamesh, no qual a destruição de um deus leva à ruína da humanidade. Em 1988, o autor japonês Takeshi Umehara escreveria uma peça teatral chamada Gilgamesh, e a ofereceria para que Miyazaki adaptasse; Miyazaki leria o roteiro e não se interessaria, mas diria em entrevistas ter sido possível que ele tivesse inconscientemente incluído temas presentes em Gilgamesh no enredo de Princesa Mononoke durante a produção. Finalmente, Princesa Mononoke chama atenção por ser muito mais tenso e sombrio do que os demais trabalhos de Miyazaki - e por não ter nenhuma sequência na qual os personagens voam, algo que era uma marca registrada do diretor.

A campanha de marketing de Princesa Mononoke seria capitaneada por Suzuki, que planejava valorizar a marca do Studio Ghibli - até então, no Japão, os filmes eram anunciados como "um filme de Hayao Miyazaki", ou "um filme de Isao Takahata", com Princesa Mononoke sendo o primeiro a ser anunciado como "um filme do Studio Ghibli". Suzuki também mudaria o nome do filme, durante a pós-produção; até ele mudar, o título oficial era A Lenda de Ashitaka, que o produtor considerava muito básico e pouco interessante - Miyazaki seria contra a mudança, alegando que não há nenhuma princesa chamada Mononoke no filme, e achando que as plateias não entenderiam que é uma referência ao fato de Sen ter sido criada por um espírito. Considerando fundamental que o filme fosse um gigantesco sucesso, já que foi caríssimo, Suzuki conseguiria patrocínios para que a campanha de marketing fosse mais cara até do que a produção, consumindo 2,6 bilhões de ienes, algo também sem precedentes no cinema japonês. Ele também conseguiria nada menos que 70 sessões para plateias de testes, não para que eles sugerissem mudanças, mas para que fizessem propaganda boca a boca do filme - a título de comparação, o recordista prévio em sessões para plateias de teste no Japão era Porco Rosso, com 23.

Princesa Mononoke estrearia no Japão em 12 de julho de 1997, distribuído pela Toho, em 260 das 1800 salas de cinema disponíveis, e, somente no primeiro final de semana, renderia 1,5 bilhão de ienes. No total, o filme ficaria em cartaz por um ano e arrecadaria 11,3 bilhões de ienes, sendo até hoje o filme de maior bilheteria da história do cinema japonês - estima-se que um décimo da população do Japão foi ver esse filme nos cinemas. A crítica receberia muito bem o filme, elogiando principalmente sua identidade visual; bizarramente, uma das principais críticas negativas seria a de que as personagens femininas "não tinham sex appeal". Princesa Mononoke seria eleito o terceiro melhor filme de animação de todos os tempos pela revista britânica Empire, e ganharia os prêmios de Melhor Filme e de Melhor Filme de Animação no festival de cinema da Mainichi Shimbun e de Filme do Ano pela Academia Japonesa de Cinema.

Através de um acordo entre a Tokuma e a Disney, o filme seria passado para a Miramax, para dublagem e distribuição nos Estados Unidos. Princesa Mononoke seria o primeiro filme a ter de se valer da política estabelecida por Miyazaki de que os filmes do Studio Ghibli não podem sofrer edição ou cortes para serem exibidos internacionalmente: quando Harvey Weinstein, da Miramax, perguntou se poderia editá-lo, para diminuir sua duração (que é de 2 horas e 14 minutos) e remover cenas que os pais norte-americanos poderiam considerar violentas, recebeu de presente de Suzuki uma katana cenográfica com uma inscrição na lâmina que dizia "sem cortes". Weinstein escolheria o escritor Neil Gaiman para adaptar o roteiro após sua tradução, encontrando equivalentes que os norte-americanos compreendessem para termos do folclore japonês, como os próprios mononoke, que viraram "deuses". Em entrevistas posteriores, Gaiman diria que, inicialmente, Weinstein chamaria o diretor Quentin Tarantino, que recusaria e o indicaria, e que ele mesmo não estaria interessado até assistir a uma cena do filme na qual está chovendo e uma pedra está se molhando, tão bela que ele jamais havia visto algo parecido num filme de animação. Assim como ocorreu com Porco Rosso, a versão em inglês de Princesa Mononoke tem falas que não estão presentes no original japonês, proferidas quando os personagens não estão na tela, que, aqui, servem para explicar conceitos da cultura japonesa às plateias norte-americanas.

A adaptação de Gaiman seria acusada de tentar anular as características culturais do filme, transformando-o em um filme de fantasia genérico ao invés de uma história japonesa - toda vez que os personagens falam "saquê", por exemplo, na versão norte-americana eles falam "vinho". Weinstein faria toda a campanha de marketing norte-americana como se o filme fosse um "filme de arte", e não um anime, atrasando a data de estreia para que ele fosse exibido antes, com a dublagem da Miramax, no Festival Internacional de Cinema de Berlim de 1998, e só estreasse nos cinemas dos Estados Unidos em 26 de setembro de 1998, sendo lá um sucesso de crítica, mas um gigantesco fracasso de bilheteria. A dublagem em inglês conta com Billy Crudup como Ashitaka, Claire Danes como San, Minnie Driver como Lady Eboshi, Billy Bob Thornton como Jigo, e Gillian Anderson como Moro. Na Europa, o filme seria lançado pela Disney, mas exclusivamente em home video.

Em abril de 2013, o Studio Ghibli faria uma parceria com a companhia de teatro Whole Hig Theatre para montar uma adaptação do filme para os palcos, que ficaria em cartaz em Londres no primeiro semestre, e em Tóquio no segundo. James Cameron citaria o filme como uma de suas influências para fazer Avatar, e o videogame The Legend of Zelda: Breath of the Wild também é considerado como tendo sido grandemente influenciado. O filme também é considerado, junto com Neon Genesis Evangelion, como um dos responsáveis por uma onda de artigos científicos que passaram a discutir temas presentes nos anime e sua relação com a sociedade.
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