sábado, 20 de abril de 2024

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Godzilla (XIV)

Quem acompanha o átomo já deve ter lido que eu escrevo os posts com antecedência - esse aqui, por exemplo, estou escrevendo no dia seguinte a Godzilla Minus One ter ganhado um Oscar. Esse Oscar me deixou com vontade de escrever sobre esse filme, e, como há um outro filme japonês de Godzilla que eu não abordei naquela série que eu comecei lá em 2013, decidi escrever um novo post para ela, falando sobre os dois. Hoje, portanto, mais uma vez, é dia de Godzilla no átomo!

Shin Godzilla
2016

Até 2004, os filmes japoneses de Godzilla foram divididos em três séries: a Série Showa, com os filmes lançados durante o reinado do Imperador Hirohito, foi a mais longa, com 15 filmes lançados entre 1954 e 1975. Após um hiato de quase dez anos, começaria a Série Heisei, com 7 filmes lançados entre 1984 e 1995 (mesmo com a Era Heisei, correspondente ao reinado do Imperador Akihito, só tendo começado em 1989). A terceira série, a Série Millenium, teve mais 6 filmes, lançados entre 1999 e 2004. Mais do que especificar em que época os filmes foram feitos, a divisão em séries - retroativamente criada em 1999, por isso a Série Heisei começa antes da Era Heisei - tinha o propósito de agrupar os filmes de acordo com sua continuidade, já que tanto o primeiro filme da Série Heisei quanto o primeiro da Série Millenium eram reboots.

Após o último filme da Série Millenium, Godzilla: Final Wars, entretanto, ocorreria um novo hiato longo, dessa vez de dez anos, que seria quebrado não por um novo filme japonês, mas pelo Godzilla da Legendary Pictures, produzido nos Estados Unidos e lançado em 2014, ano do aniversário de 60 anos do filme original. O Godzilla norte-americano seria um sucesso, o que animaria a Toho a produzir mais um filme para a série, com data de estreia prevista para 2016. Pelos termos do contrato com a Legendary, um novo filme da Toho não poderia ser nem continuação, nem usar nenhum dos elementos do filme norte-americano, e, como a história de Godzilla: Final Wars tinha uma espécie de fechamento, também não interessava ao estúdio japonês fazer uma continuação. A solução, portanto, foi fazer um terceiro reboot, e dar a ele o nome de Shin Godzilla - com shin, em japonês, significando "novo".

Em março de 2015, a Toho surpreenderia e revelaria que Shin Godzilla seria co-dirigido por Hideaki Anno e Shinji Higuchi, a dupla responsável pelo anime Neon Genesis Evangelion, com roteiro de Anno, e Higuchi ficando responsável pelos efetios especiais. Anno diria em entrevistas ter sido procurado pela Toho já em janeiro de 2013, mas, como ele estava em depressão após ter terminado de dirigir Evangelion: 3.0 You Can (Not) Redo, recusaria sem nem pensar; Higuchi, seu amigo de longa data, que já havia trabalhado para a Toho, o convenceria, com a dupla assinando contrato em março de 2013, mas sendo mantida em segredo pela Toho durante dois anos. Anno diria que, mesmo após assinar, ainda estava com falta de confiança, já que se tratava de um reboot, imaginando que jamais conseguiria fazer um filme de Godzilla à altura do primeiro, mas, após assistir ao filme norte-americano, se convenceria de que a única forma de igualar o primeiro seria fazendo um remake, algo que nem ele, nem a Toho queriam, e que o melhor seria contar sua própria história da melhor forma possível.

A Toho passaria boa parte da pré-produção planejando qual a melhor forma de trazer Godzilla de volta às telas, testando bonecos, animatronics e efeitos digitais, optando pela última que, apesar de mais cara, permitiria melhor controle sobre como Godzilla se portava em cena, economizando tempo e dinheiro na edição e permitindo que os diretores tivessem um maior controle criativo. Um estúdio foi forrado de chroma-key e maquetes para ser usado como referência nas cenas onde Godzilla aparecesse, com o ator Mansai Nomura servindo para a captura de movimentos.

Assim como o primeiro Godzilla foi uma alegoria para as bombas atômicas que destruíram Hiroshima e Nagasaki, Anno e Higuchi decidiriam fazer de Shin Godzilla uma alegoria para o desastre nuclear de Fukushima, causado pelo terremoto e tsunami que atingiram Tohoku em 11 de março de 2011. Muitos críticos apontariam que cenas do filme, como as montanhas de escombros deixadas pela passagem do monstro e as equipes vestidas com macacões azuis tentando lidar com o desastre, pareciam saídas diretamente do noticiário da época, ao invés de gravadas para o filme. Alguns críticos também apontaram que o filme servia com uma crítica ao governo japonês, tão engessado pela burocracia que parece ser incapaz de lidar em tempo hábil com um desastre de grandes proporções.

A história é a tradicional: Godzilla, uma criatura gerada pela energia nuclear, sai das águas da Baía de Tóquio e começa a destruir a cidade, levando um grupo de cientistas a pesquisar como detê-lo. O filme tem, porém, duas grandes diferenças em relação às histórias habituais de Godzilla: primeiro, os três protagonistas humanos são ligados ao governo - o Secretário de Governo Rando Yaguchi (Hiroki Hasegawa), o Primeiro-Ministro Hideki Akasaka (Yutaka Takenouchi) e a enviada especial do governo dos Estados Unidos Anne Patterson (Satomi Ishihara). Segundo, Godzilla é adaptável, passando por várias formas antes de atingir seu estágio final, e sendo capaz até mesmo de se modificar para se tornar imune a ataques usados contra ele. A Toho prometeria que esse seria "o maior Godzilla já visto em uma de suas produções", com mais de 100 metros de altura.

Shin Godzilla estrearia nos cinemas japoneses em 29 de julho de 2016. Em uma decisão considerada arriscada, a Toho financiaria sozinha o filme, sem buscar parceiros internacionais; inicialmente com orçamento de 900 milhões de ienes, o filme acabaria custando 1,3 bilhão, o que teria quebrado o estúdio se não fosse o desempenho internacional do filme. Aliás, ao invés de preparar uma versão internacional, a Toho venderia o filme sem nenhuma modificação, cabendo às distribuidoras interessadas em exibi-lo fora do Japão dublá-lo ou legendá-lo. Nesse sentido, Shin Godzilla seria um inesperado sucesso, sendo negociado para mais de 100 países e territórios da Ásia, África, Europa e Américas apenas 19 dias após sua estreia no Japão. Nos Estados Unidos, onde foi distribuído pela Funimation, o filme seria lançado com o nome de Godzilla: Resurgence, mas a Toho bateu o pé e ele acabou sendo lançado com seu título original. Shin Godzilla seria o primeiro filme de Godzilla exibido nos cinemas dos Estados Unidos desde Godzilla 2000, estreando em 6 de outubro de 2016.

Em 2023, por ocasião do lançamento do filme seguinte (que vamos ver em breve), a Toho lançaria nos cinemas uma versão especial de Shin Godzilla chamada Shin Godzilla: Orthochromatic. Partindo de uma ideia de Anno, que não teve envolvimento, com Higuchi e Katsuro Onoue supervisionando sua produção, a Orthochromatic não tem nenhuma diferença em termos de edição, mas é totalmente em preto e branco, assim como foi o Godzilla original. Ela seria exibida em apenas sete cinemas, durante apenas três dias, 27, 28 e 29 de outubro, mas, em março de 2024, seria lançada em DVD e Blu-ray.

Shin Godzilla seria um sucesso de público e crítica do tamanho de Godzilla, e logo Anno e Higuchi começariam a ser perguntados se uma sequência já estava em desenvolvimento. Acontece que, quando o contrato com a Legendary foi ser renovado, o estúdio norte-americano fez questão de uma cláusula segundo a qual a Toho não poderia produzir outro filme de Godzilla até 2020, quando já teriam sido lançados nos Estados Unidos os dois previstos na renovação, Godzilla: Rei dos Monstros e Godzilla vs.Kong. Inicialmente previsto para 2018, Godzilla: Rei dos Monstros acabaria atrasando e só sendo lançado em 2019, e, por conta desse atraso e da Pandemia, Godzilla vs.Kong, originalmente previsto para 2019, acabaria só sendo lançado em 2021, quando a Toho finalmente pôde começar a trabalhar em um novo filme japonês.

Inicialmente, a Toho alegaria não ter interesse em fazer uma sequência de Shin Godzilla - tanto que, apesar de ele ser um novo reboot, originalmente não inaugurou uma nova série, sendo colocado na Série Millenium - e os executivos do estúdio declarariam em 2018 estar pensando em criar algo como o Universo Cinematográfico Marvel, lançando filmes estrelados por vários monstros da Toho ambientados em um mesmo universo, com um filme final no qual todos se encontrassem. Em março de 2022, Anno diria em entrevistas ter escrito o roteiro de uma continuação para Shin Godzilla, chamada Sequel Shin Godzilla, que a Toho prometeria filmar, com Higuchi como diretor, e declararia ter ficado muito surpreso com a declaração dos executivos de que uma sequência não estava nos planos. Seja como for, nem a sequência nem o "Universo Cinematográfico Toho" saíram do papel, e parecem ter sido engavetados de vez; Anno, por outro lado, seria chamado para fazer reboots de duas outras grandes franquias japonesas: Shin Ultraman (2022, pela Tsuburaya) e Shin Kamen Rider (2023, pela Toei).

Embora a Toho não pudesse fazer um novo filme de Godzilla tão cedo, o contrato com a Legendary não falava nada sobre animações, de forma que o estúdio japonês decidiu seguir por esse caminho, lançando Godzilla: Kaiju Wakusei ("planeta dos monstros", 2017), Godzilla: Essen Kido Zoshoku Toshi ("a batalha decisiva da cidade ambulante que se prolifera", lançado internacionalmente como "cidade no limiar da batalha", 2018) e Godzilla: Hoshi o Kuu Mono ("o devorador de planetas", 2019). Todos esses três filmes de animação foram lançados nos cinemas e entram na contagem oficial da Toho, sendo oficialmente os filmes de Godzilla de número 30, 31 e 32. Em 2021, a Toei também lançaria o primeiro anime de Godzilla, Godzilla: Singular Point, com 13 episódios lançados entre 1 de abril e 24 de junho. Esse anime e os três filmes de animação atualmente fazem parte do catálogo da Netflix.

Assim como Shin Godzilla, os três filmes de animação (mas não o anime) oficialmente faziam parte da Série Millenium, mas, em 2020, quando começou a produção do filme seguinte de Godzilla, aproveitando que o Japão tinha um novo Imperador, Naruhito, e vivia uma nova era, a Era Reiwa (que havia começado em 2019, ano do lançamento da última animação), a Toho decidiria, retroativamente, colocá-los em uma nova série, a Série Reiwa, que já conta com cinco filmes - Shin Godzilla, os três de animação, e o que vamos ver agora.

Godzilla Minus One
2023

Em 2019, quando se aproximava a data na qual, contratualmente, a Toho poderia fazer um novo filme de Godzilla, os executivos do estúdio decidiriam criar uma "Sala do Godzilla", para roteiristas, produtores e diretores discutirem ideias para o novo filme. Um dos que participariam dessas discussões seria o produtor Minami Ichikawa, que, naquele mesmo ano, havia lançado o filme The Great War of Archimedes, e indicaria seu diretor, Takashi Yamazaki, para o novo filme de Godzilla. Yamazaki seria convidado para expor suas ideias, e decidiria fazer um filme ambientado não na época atual, mas imediatamente após o término da Segunda Guerra Mundial, o que deixaria a Toho encantada. Yamazaki seria contratado como diretor, roteirista e responsável pelos efeitos especiais ainda em 2019, e chegaria a escrever uma versão preliminar do roteiro antes do fim do ano; a Pandemia, entretanto, atrasaria a produção, e faria com que o roteiro fosse reescrito pelo menos três vezes.

A produção do novo fime, ainda sem título oficial, só seria retomada em fevereiro 2022, quando seria anunciada pela parceira da Toho na produção, a Robot Communications. Seria a Robot quem também anunciaria que o novo filme seria um remake do original de 1954, mas ambientado entre 1945 e 1947. Yamazaki declararia que o filme seria inspirado em Godzilla (1954), Godzilla, Mothra and King Ghidorah: Giant Monsters All-Out Attack (2001) e Shin Godzilla (2016), "com um toque dos filmes de Steven Spielberg e Hayao Miyazaki". Em 3 de novembro, dia conhecido como Godzilla Day, por ter sido o da estreia do primeiro filme, a Toho faria uma grande festa, na qual revelaria que as filmagens já estavam terminadas, e o filme se encontrava em pós-produção, com data de estreia prevista para dali a exatamente um ano, em 3 de novembro de 2023.

Seria durante essa festa que o título do filme seria finalmente revelado: Godzilla Minus One (em inglês mesmo, significando "Godzilla -1", no sentido de que viria antes do zero), título escolhido para passar a ideia de que o Japão regrediria da "situação zero", termo usado para determinar o estado em que um país se encontra logo após sair de uma guerra, para uma espécie de "situação menos um", causada pelo ataque de Godzilla. O título seria criado pelo produtor Shuji Abe, inspirado no romance de ficção científica Minus Zero, de Tadashi Hirose, e, segundo ele, seria escolhido porque ele imaginou que o filme seria ambientado antes do original, e não um remake, com o significado oficial sendo criado depois.

Godzilla Minus One começa em 1945, próximo ao final da Segunda Guerra Mundial, e tem como protagnista humano o piloto kamikaze Koichi Shikishima (Ryunosuke Kamiki), que pousa seu avião em uma base na Ilha Odo pouco antes do ataque de Godzilla. Os pilotos são chamados para atacar o monstro, mas Shikishima congela e não consegue, e acaba sendo culpado por não conseguir evitar que o monstro siga em direção à ilha principal do Japão. Ao voltar a Tóquio, o piloto encontra a cidade destruída pelos bombardeiros norte-americanos, e desenvolve Culpa do Sobrevivente. O filme, então, passa a intercalar o drama pessoal de Shikishima com os ataques de Godzilla e as tentativas do governo de impedi-lo. De forma interessante, o filme acompanha ambos, Shikishima e Godzilla, durante três anos, e envolve não somente o Japão no ataque do monstro, mas também os Estados Unidos e a União Soviética, que têm navios e bases destruídas, mas mesmo assim optam por não se envolver para que as tensões entre os dois países não aumentem.

Yamazaki declararia que, diferentemente dos demais filmes de Godzilla, onde o foco está em cientistas, militares ou oficiais do governo que tentam deter o monstro, ele gostaria que Godzilla Minus One focasse nas pessoas comuns cujas vidas foram alteradas pelo ataque. Ele escolheria Kamiki para o papel principal e a atriz Minami Hamabe para interpretar a namorada do piloto, Noriko Oishi, devido às suas participações na novela de época Ranman, do canal NHK; curiosamente, a crítica japonesa reclamaria muito da escolha do casal, argumentando que seus papéis eram muito semelhantes aos da novela, mas o diretor responderia dizendo que queria atores que ele tivesse certeza de que conseguiriam interpretar um casal japonês do pós-guerra de forma realista.

Mais uma vez, Godzilla seria inteiramente feito por computação gráfica, apenas na segunda vez em que isso ocorria em um filme da Toho. Também responsável pelos efeitos especiais, Yamazaki pediria que a equipe se inspirasse no visual de Godzilla em Godzilla, Mothra and King Ghidorah: Giant Monsters All-Out Attack, seu filme preferido da série, mas, segundo ele, o nível de realismo conseguido pela equipe surpreenderia até ele mesmo, que ficaria impressionado principalmente com o nível de detalhes das escamas do monstro. Para contribuir com o clima do filme, Yamazaki pediria para que essa fosse "a versão mais horrível já feita de Godzilla", e que ele fosse não apenas amedrontador, mas mais violento e feroz que nos filmes anteriores. Assim como em Shin Godzilla, o Godzilla desse filme tem o poder de alterar sua forma, mas apenas quando absorve energia nuclear.

Todos os efeitos especiais seriam feitos por uma única empresa, a Shirogumi, que empregou apenas 35 programadores - um imenso contraste com os filmes de Hollywood, que usam uma dezena de empresas e mais de uma centena de programadores. Segundo um levantamento feito pelo jornal Los Angeles Times, entre um quarto e um terço do orçamento total do filme, de cerca de 12 milhões de dólares - também baixíssimo se comparado a um filme de Hollywood da mesma magnitude - seria usado exclusivamente para os efeitos especiais. Uma curiosidade seria que o filme teria poucas cenas sob a água, até o compositor Tatsuji Nojima, responsável pela trilha sonora do filme, que tem como hobby criar água em computação gráfica, mostrar a Yamazaki alguns de seus trabalhos; o diretor pediria então que ele trabalhasse junto com a equipe de efeitos especiais e inseriria mais cenas subaquáticas, incluindo o clímax do filme.

Um dos maiores desafios para recriar o Japão Pós-Guerra seria da equipe de figurinos, já que não somente as roupas, mas os cabelos e maquiagens mudaram radicalmente de lá para cá, talvez mais ainda que no ocidente - todos os homens, atores e figurantes, tiveram de deixar o cabelo crescer e fazer permanentes, e as mulheres que tingiam os cabelos tiveram de tingi-los novamente, mas de preto. O orçamento não permitia o uso de aviões originais da época, hoje raríssimos e que exigem um polpudo seguro para serem usados, então a equipe de produção teve de construir réplicas em tamanho real, que obviamente não voavam, com a impressão de voo sendo criada por computação gráfica durante a pós-produção. A réplica do Kysuhu J7W Shinden usado por Shikishima ficaria tão perfeita que seria doada para exposição no Tachiarai Peace Memorial Museum da cidade de Fukuoka.

Em 24 de agosto, a Toho anunciaria que, em uma espécie de contagem regressiva para a estreia de Godzilla Minus One, quatro filmes de Godzilla estreariam em cinemas selecionados do Japão nos meses de setembro e outubro, cada um ficando em cartaz por apenas um fim de semana; antes de cada um desses filmes, seria exibido uma espécie de talk show onde o convidado falaria de sua relação com o filme e de sua importância para o cinema japonês. Os quatro filmes seriam Godzilla (1954), que teve como convidado do talk show o co-diretor de Shin Godzilla, Shinji Higuchi; Godzilla vs. Ghidrah (1964), com Keizo Murase, o responsável por confeccionar a roupa de Godzilla em muitos dos filmes da Série Showa, como convidado; Godzilla, Mothra and King Ghidorah: Giant Monsters All-Out Attack (2001), que teve como convidado seu diretor, Shusuke Kaneko; e Shin Godzilla: Orthochromatic, na única vez em que essa versão foi exibida nos cinemas, tendo como convidado o co-diretor de Shin Godzilla (2016), Hideaki Anno, que também foi quem teve a ideia de preparar a versão Orthochromatic especialmente para esse evento.

Godzilla Minus One teria uma pré-estreia em 18 de outubro de 2023 em um cinema localizado dentro do prédio da Toho, em Tóquio, participaria do Festival Internacional de Cinema de Tóquio em 1 de novembro, e estrearia oficialmente em todo o Japão em 3 de novembro, o Godzilla Day, sendo aclamado pela crítica, que o considerou "uma obra-prima" e o melhor de todos os filmes de Godzilla, contando com os norte-americanos. A própria Toho prepararia uma versão legendada em inglês, que seria lançada nos Estados Unidos em 1 de dezembro; originalmente, o filme estrearia em 2308 salas de todo o país e ficaria em cartaz por apenas uma semana, mas faria tanto sucesso que na semana seguinte a contagem de salas aumentaria para 2600, e o filme acabaria ficando em cartaz até 1 de fevereiro de 2024 - segundo boatos, os donos dos cinemas queriam que ele ficasse ainda mais tempo em cartaz, mas a Legendary estabeleceria 1 de fevereiro como a data-limite para a exibição de Godzilla Minus One nos cinemas dos Estados Unidos, pois oito semanas depois estrearia seu quarto filme de Godzilla, Godzilla e Kong: O Novo Império, e ela não queria que os dois competissem por bilheteria. Além de no Japão e Estados Unidos, Godzilla Minus One estrearia em outros 21 países, dentre eles o Brasil, onde foi distribuído pela Sato Company.

Em 12 de janeiro de 2024, a Toho lançaria nos cinemas do Japão uma versão em preto e branco de Godzilla Minus One, chamada Godzilla Minus One / Minus Color; ao invés de simplesmente converter o filme para preto e branco, Yamazaki faria uma edição sutil, que deixaria o filme ao mesmo tempo com cara de documentário e com um ritmo bastante parecido com o do Godzilla original de 1954. A produção dessa versão seria supervisionada pelo famoso produtor Shuji Abe, que faleceria em 11 de dezembro de 2023, o que a tornaria seu último trabalho. Godzilla Minus One / Minus Color também estrearia em cinemas selecionados dos Estados Unidos em 26 de janeiro, ficando em cartaz por apenas uma semana.

Godzilla Minus One ganharia o Oscar de Melhores Efeitos Especiais, derrotando Guardiões da Galáxia Vol. 3, Napoleão, o filme de ficção científica Resistência e Missão: Impossível - Acerto de Contas Parte 1. Seria o primeiro filme de Godzilla, japonês ou norte-americano, a ser indicado a qualquer Oscar, o primeiro filme japonês e primeiro filme asiático a concorrer ao Oscar de Melhores Efeitos Especiais, e o primeiro filme não-falado em língua inglesa a vencer nessa categoria, além de fazer com que Yamazaki se tornasse o primeiro diretor a vencer um Oscar nessa categoria desde Stanley Kubrick, em 1969 (por 2001: Uma Odisseia no Espaço), e com que Kiyoko Shibuya, supervisora dos efeitos do filme, se tornasse a primeira mulher não-branca a ganhar um Oscar de Melhores Efeitos Especiais. A Toho consideraria o filme um "fenômeno global", responsável por tornar Godzilla mais popular que nunca, e críticos dos Estados Unidos creditariam a Godzilla Minus One a responsabilidade por uma nova onda de interesse no ocidente pela cultura japonesa, que transformaria também em sucessos o filme O Menino e a Garça e as séries de One Piece e Shogun.

Em janeiro de 2024, Yamazaki expressaria seu interesse em dirigir uma continuação direta, usando os mesmos personagens, mas a Toho declararia que "ainda vai demorar algum tempo" para que um novo filme de Godzilla seja produzido, seja ele uma continuação de Godzilla Minus One ou não; segundo o produtor Minami Ichikawa, a Toho não quer fazer nada com pressa, buscando boas ideias e um roteiro de qualidade antes de anunciar que um novo Godzilla está em produção - mas o que mais se comenta é que, mais uma vez, a Legendary estaria impedindo uma sequência tão cedo por razões contratuais, restando saber qual seria o prazo dessa vez para que Godzilla pudesse retomar sua série japonesa.

Série Godzilla

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sábado, 13 de abril de 2024

Escrito por em 13.4.24 com 1 comentário

Kho-Kho / Ordo

Hoje eu vou falar sobre dois esportes exóticos, porque parece que eu já falei sobre todos os normais. Vamos começar por um que eu conheci assistindo filmes indianos no streaming, chamado kho-kho.

O kho-kho (cujo nome não se pronuncia "cocô", e sim algo como "rorrô", com um R aspirado semelhante ao H da língua inglesa) é um dos esportes mais antigos da Índia, com evidências apontando que ele já era praticado no século IV a.C., e referências à sua prática constando do Mahabharata, texto épico mitológico que conta a origem da Índia e do hinduísmo. Alguns estudiosos acreditam que o kho-kho seria uma evolução de um esporte ainda mais antigo, chamado rathera e praticado usando carruagens (sendo ratha a palavra em sânscrito para "carruagem"); verdade ou não, inicialmente ele se chamava kho-dhwani krida, "um jogo no qual se faz o som kho", e esse kho não significa absolutamente nada, sendo apenas o som que os jogadores fazem ao trocar de lugar.

A forma moderna do kho-kho, jogada até hoje, foi criada em 1914 pelo Deccan Gymkhana Club, da cidade de Pune, próxima a Mumbai. Dois anos depois, em 1916, seria criada a Federação Indiana de Kho-Kho (KKIF), que visava garantir que as regras criadas em Pune fossem usadas em todo o país, permitindo a realização de torneios. Um dos principais fatores que levaram à popularidade do kho-kho ao longo do século XX foi sua inclusão no programa das escolas; sendo um esporte que não precisa de equipamentos sofisticados, ele é ideal para a prática nas comunidades mais pobres, o que transformou rapidamente o kho-kho em um sucesso nas aulas de educação física das escolas do interior. Com sua inclusão nas escolas, o kho-kho também evoluiria: originalmente jogado na lama, ele passaria a ser praticado na terra batida ou em superfícies acarpetadas, dependendo das condições de cada escola, em ambos os casos proporcionando um jogo mais veloz e dinâmico - mas superfícies de concreto, como as das quadras esportivas escolares, não são recomendadas devido ao alto índice de lesões.

Embora hoje a KKIF já atue em todo o território indiano, o kho-kho ainda é mais popular no sul da Índia que no norte, o que faz com que a entidade tenha um programa especial voltado para a popularização do esporte nos estados onde ele é menos praticado. Nos últimos anos, tem crescido também a prática do kho-kho fora da Índia, levado principalmente por imigrantes indianos; apesar de ainda não existir uma federação internacional de kho-kho, vários países já contam com federações nacionais, quase todos da Ásia, como Bangladesh, Sri Lanka, Butão, Nepal, Irã, Malásia, Indonésia e Coreia do Sul - uma das poucas exceções é a Inglaterra, cuja federação nacional foi fundada em 2014. O kho-kho já faz parte do programa dos Jogos do Sul da Ásia, e almeja ser incluído nos Jogos Asiáticos, versão daquele continente de nossos Jogos Panamericanos.

O kho-kho é disputado em um campo de 27 metros de comprimento por 16 de largura. No sentido do comprimento, próximas à metade do campo, são traçadas duas linhas de 24 m de comprimento cada, distantes 30 cm uma da outra; essas linhas formam a chamada central lane. Em cada uma das pontas da central lane há um poste cilíndrico, com entre 9 e 10 cm de diâmetro e entre 120 e 125 cm de altura; no sentido da largura, uma linha atravessa o centro de cada poste, sendo a área de 1,5 m de comprimento além de cada poste conhecida como zona neutra. Tirando a zona neutra, o campo de jogo é dividido em nove partes pelas chamadas cross lanes, que cortam o campo no sentido da largura; cada cross lane é formada por duas linhas paralelas, uma a 35 cm da outra, havendo um total de 8 cross lanes. A distância entre cada cross lane e a seguinte é de 2,3 m, e a da primeira e da última para cada poste é de 2,55 m. As interseções das cross lanes com a central lane criam oito creases, retângulos de 35 cm de comprimento por 30 cm de largura.

Uma equipe de kho-kho é formada por nove jogadores. No início da partida, será sorteado um time que será o perseguidor e um que será o perseguido. Oito dos jogadores do time perseguidor se sentarão nas creases, quatro virados para cada metade do campo, de forma alternada - se o primeiro estiver olhando para a metade da direita, o segundo deverá olhar para a metade da esquerda, o terceiro para a metade da direita, e assim por diante. O nono jogador será o primeiro perseguidor, e se posicionará ao lado de um dos postes, escolhendo uma das metades do campo. Do time perseguido, três jogadores começam em campo, nas posições que bem entenderem, enquanto os outros seis ficam de fora, esperando sua vez. A um sinal do árbitro, o jogo começa.

O objetivo do primeiro perseguidor é encostar em um dos três jogadores do time perseguido; se ele conseguir, o jogador no qual ele encostou estará eliminado. Quando os três que estão em campo forem eliminados, entram os três seguintes na ordem determinada pelo técnico ou capitão. Assim como no beisebol, um jogador "eliminado" não é excluído do jogo; se todos os nove forem eliminados, e ainda houver tempo, aqueles três que começaram a partida voltam para o campo, não havendo limite para o número de vezes que um jogador pode voltar para o campo. Um jogador também é eliminado caso pise fora da área de jogo por qualquer motivo, ou caso demore muito para entrar em campo quando um novo trio tiver de assumir seu lugar. Para cada jogador eliminado, o time perseguidor soma um ponto.

Para que as coisas não fiquem muito fáceis, existem algumas regras que os jogadores devem seguir. Para começar, embora os jogadores do time perseguido possam correr em qualquer direção, mudar de direção à vontade, e até mudar o lado do campo onde estão correndo, o perseguidor só pode correr na metade do campo que ele escolheu antes de o jogo começar, e nunca pode mudar de direção no sentido do comprimento - se ele estava correndo da esquerda para a direita, não pode mudar e passar a correr da direita para a esquerda. Para que o jogo não fique impossível, há duas formas de mudar de lado e direção. A mais simples é o perseguidor ir até a zona neutra e dar a volta no poste; se ele fizer isso, ele passa a poder correr no lado oposto do campo e na direção contrária que ele estava correndo.

O kho-kho é, porém, um esporte coletivo, e ficar dando voltas nos postes demanda muito tempo, o que nos leva ao aspecto principal do jogo: o kho. A qualquer momento, o jogador perseguidor pode encostar em um de seus colegas de time que estão sentados e falar "kho", no que se chama "fazer um kho". No momento em que o kho é feito, o jogador que estava sentado se levanta e passa a ser o novo perseguidor, e o que estava perseguindo se senta no lugar dele, olhando para o mesmo lado do campo que ele estava olhando antes do kho. Após se levantar, o jogador só pode correr no lado do campo para o qual estava olhando, e, uma vez que comece a correr, não pode mudar de direção - a menos que, como já vimos, dê a volta em um dos postes. Para que o kho seja válido, o perseguidor não pode ter passado da cross lane correspondente à crease onde está sentado o colega, e o colega só pode se levantar e começar a correr depois que ele for tocado e a palavra kho for pronunciada; o antigo perseguidor deve se sentar em seu lugar assim que possível.

Caso o perseguidor pise fora do campo, faça kho em algum colega pelo qual já passou, mude de direção ou de lado de campo quando está correndo sem dar a volta no poste, ou demore muito para se sentar após fazer o kho, ele incorrerá em falta. Um jogador que incorra em falta não poderá eliminar nenhum oponente até alcançar a zona neutra mais distante do ponto onde está e dar a volta no poste, quando poderá voltar a tentar eliminar os oponentes normalmente.

Uma partida de kho-kho dura quatro tempos de nove minutos cada, com os times se alternando entre perseguidor e perseguido - se, no primeiro tempo, o time A foi o perseguidor, no segundo tempo ele será o perseguido, no terceiro será o perseguidor, e no quarto será o perseguido. O vencedor será o time que, ao final do quarto tempo, tiver marcado mais pontos, com o jogo podendo ser mais curto caso o time que seria o perseguidor no quarto tempo já esteja ganhando ao final do terceiro, ou consiga ultrapassar o outro time ao longo do quarto. É possível um jogo terminar empatado, mas, caso seja um jogo eliminatório, é disputado o chamado minimum chase: são jogados mais dois tempos com "morte súbita", que se encerram assim que o primeiro jogador é eliminado, e o time vencedor será aquele que conseguir eliminar um oponente mais rápido.

Sendo um esporte regional popular dentre crianças, o kho-kho tem diversas variações; nas escolas, a mais popular é o time kho-kho, no qual a partida dura só dois tempos, com cada tempo se encerrando quando os nove jogadores do time perseguido forem eliminados, e sendo vencedor o time que conseguiu eliminar seus nove oponentes mais rápido. Na zona rural, a variação mais popular é a circle kho-kho, na qual o campo de jogo é composto por dois círculos concêntricos e não há postes; um perseguidor não pode passar do círculo externo para o interno e vice-versa, e seus colegas não ficam sentados, mas de pé espalhados pelo campo, metade olhando para o círculo interno, metade de costas para ele - quando é feito o kho, jogadores que estavam olhando para o círculo interno só podem correr dentro dele, enquanto os que estavam de costas só podem correr fora dele, mas os perseguidos podem mudar de círculo à vontade.

Em 2022, a KKIF criaria uma variante chamada Ultimate Kho Kho (UKK), visando jogos profissionais mais emocionantes. No UKK, o jogo é mais curto, durando 4 tempos de 7 minutos cada, e o time perseguidor tem apenas 7 jogadores em campo (mas o perseguido ainda tem 9); por isso, há apenas 7 cross lanes e 7 creases, com o campo tendo apenas 22 m de comprimento. O jogo é indoor, sendo disputado em uma superfície semelhante à de uma quadra de vôlei, e cada eliminação vale 2 pontos. É feita uma pausa de 30 segundos entre a eliminação do terceiro jogador de um grupo e a entrada do grupo seguinte; e, caso um grupo perseguido consiga permanecer sem ter nenhum jogador eliminado durante 3 minutos (a chamada Dream Run), o time perseguido ganha 1 ponto, e mais 1 ponto para cada 30 segundos sem ter seu primeiro jogador eliminado depois disso. Antes de cada partida, um dos jogadores de cada time é escolhido para ser o wazir; quando o time está perseguindo, o wazir, se for o perseguidor ativo, pode mudar de direção livremente. Cada time perseguidor também pode, uma vez por tempo, decidir chamar um powerplay, durante o qual terá dois wazirs, o que começou a partida e outro escolhido por ele; o powerplay começa quando um grupo de 3 perseguidos entra em campo e dura até todos os três serem eliminados. O powerplay também está sempre ativo durante o Minumium Chase, caso ele seja necessário.

O principal torneio do UKK também se chama UKK, e já teve duas edições, uma disputada em 2022 e uma que começou em dezembro de 2023 e terminou em janeiro de 2024, ambas exclusivamente masculinas - embora o kho-kho amador tenha versões masculina, feminina e mista, essa última a mais popular nas escolas. Segundo dados das emissoras de TV da Índia, se não forem considerados os torneios de críquete, o UKK é o terceiro torneio esportivo de maior público do país, atrás da Pro Kabaddi League e da Indian Super League (de futebol); isso fez com que a KKIF já começasse a planejar uma expansão para o futuro, com mais times (atualmente são apenas seis) e talvez um torneio feminino.

Internacionalmente, o principal torneio do kho-kho é o Campeonato Asiático, realizado em 1996, 2000, 2016 e 2023. O torneio é organizado pela KKIF, que tem a intenção de torná-lo anual com a mesma fórmula do de 2023: oito etapas ao longo do ano nas quais os times somam pontos, sendo campeão quem tiver mais ao final da última. A Índia ganhou as quatro edições no masculino, mas apenas três no feminino, com a de 2000 tendo sido conquistada por Bangladesh. Em 2024, a KKIF também organizou um Campeonato Mundial de Kho-Kho (com a presença das seleções da Inglaterra, Austrália e Quênia, além das asiáticas), sediado na Índia, que conquistou os títulos do masculino e do feminino.

No estado de Maharashtra, onde fica Mumbai, é muito popular um esporte aparentado do kho-kho, chamado atya patya, que conta com sua própria federação, a Federação Indiana de Atya Patya, fundada em 1982, e é conhecido em outras regiões da Índia pelos nomes killithattu, klithatu, wanjh wati, gallery, sur-pati, lon-pati, darya-banth, saragari, saramani, tilli, uppinat, uppupatti, choupal pati, panchwati e chikka. O campo é mais estreito, com apenas 7 m de largura, e as cross lanes são nove, separadas 3,4 m uma da outra; não há postes nem zona neutra. No início do jogo, o time que está defendendo coloca um jogador em cada uma das creases, e o time que está atacando começa com dois jogadores de cada lado do campo, um em cada metade; dois vão correr da esquerda para a direita, enquanto os outros dois vão correr da direita para a esquerda. Os defensores só podem se movimentar nas cross lanes, e seu objetivo é tocar os atacantes, que podem mudar de direção no sentido da largura, mas não no sentido do comprimento - ou seja, só podem correr para a frente. O time atacante ganha 1 ponto para cada cross lane que cada jogador seu ultrapassou completamente antes de ser eliminado. Um jogador que consiga passar por todas as nove grita "tond", e então pode voltar e correr no sentido contrário; se ele conseguir cruzar todas as nove de novo, ele marca uma Lona, e os atacantes que estão em quadra mas não foram eliminados podem retornar às suas posições iniciais para recomeçar a correr. Se os quatro atacantes forem eliminados, outros quatro entram em seu lugar, sendo permitido um jogador ser atacante mais de uma vez durante o mesmo tempo de jogo. A partida é dividida em quatro tempos de 7 minutos cada, com os times se alternando entre atacantes e defensores. Até hoje só foi disputado um Campeonato Asiático de Atya Patya, no Butão, em 2013, exclusivamente no masculino e conquistado pela Índia.

Outro parente do kho-kho é o langdi, popular no sudeste da Índia, embora seja hoje considerado mais um jogo de crianças que um esporte. O campo de jogo é um quadrado de 10 m de lado, e cada time tem 12 jogadores; uma partida dura quatro tempos de 9 minutos cada, com os times se alternando entre atacante e defensor. O time defensor começa com três jogadores em campo, enquanto o atacante começa com apenas um. Todos os jogadores podem correr em qualquer direção, mas o atacante deve fazê-lo pulando em um pé só - o pé direito no primeiro tempo em que o time atua como atacante, o pé esquerdo no segundo. Cada vez que o atacante toca em um defensor, ou se um defensor pisar fora do campo, o defensor é eliminado e o time atacante ganha 1 ponto; quando os três defensores são eliminados, entram os três seguintes. Se o atacante pisar no chão com o pé errado, ou se pisar fora do campo, é o atacante que é eliminado; o time defensor não ganha pontos, mas outro atacante deve substituí-lo.

O segundo esporte que veremos hoje se chama ordo, e eu o conheci quando descobri os Jogos Mundiais Nômades, sobre os quais já falei aqui no átomo. Descrito como "um jogo de tabuleiro gigante disputado na areia" ou "bocha usando ossos", o ordo é um esporte milenar, considerado o mais antigo dos esportes tradicionais do Quirguistão. Ele é tão antigo que não há nenhum registro de quando ele teria surgido, com suas regras, pela maior parte de sua história, tendo sido transmitidas por tradição oral; há inclusive uma alegação do governo da Mongólia - onde o ordo também é popular - de que o esporte teria surgido na Mongólia e sido levado para o Quirguistão, algo que o governo do Quirguistão contesta com veemência.

Uma partida de ordo simboliza uma invasão ao palácio do Khan - ordo, em quirguiz, era justamente o nome do palácio do Khan. Tradicionalmente, ele é disputado sobre uma superfície de areia, na qual é traçado um círculo de 80 cm de diâmetro que representa o palácio do Khan. Cada time tem oito jogadores, sendo sete titulares e um reserva, que pode substituir um dos outros a qualquer momento durante a partida, mas o que foi substituído não pode mais voltar. Cada time também tem um técnico, que pode orientar os jogadores de forma limitada durante a partida, gritando certas instruções e sugestões, mas sem poder entrar na área de jogo. Assim como no críquete, primeiro um time joga, depois o outro, visando igualar ou superar a pontuação do que jogou primeiro.

Três tipos de peças são usadas no jogo de ordo; 35 delas se chamam alchicks, representam os guardas do Khan, e são feitas com ossos do tornozelo de ovelhas. Uma das peças é um disco de bronze de 2 cm de diâmetro, que representa o Khan; os alchicks e o Khan começam o jogo dentro do círculo, com o Khan exatamente no centro do círculo e os alchicks cercando-o. A terceira peça será usada pelos jogadores para tentar remover os alchicks e o Khan do círculo, se chama tompoy, e é feita do osso do tornozelo de uma vaca. Tradicionalmente, os alchicks são de cor vermelha e o Khan é de cor marrom, um dos times joga com um tompoy vermelho e o outro com um tompoy amarelo, mas, recentemente, já passou a ser permitido que cada tompoy seja da cor do uniforme de cada time, embora um dos times ainda seja o "vermelho" e o outro o "amarelo", mesmo que seus uniformes não sejam dessas cores.

No início de cada partida, o capitão de cada time pega um alchick e joga para cima, de forma que ele passe da altura de sua cabeça. Se os dois alchicks caírem com o mesmo lado para cima, é feito um novo arremesso, mas, se cada um cair com um lado para cima, o time cujo alchick caiu com o lado mais arredondado, chamado aykur, pra cima começa. Cada jogador deverá se posicionar em uma postura própria, apoiado em um pé só, com os dedos tocando a linha do círculo e o dedão apontando para dentro do círculo, e arremessar o tompoy para que ele bata nos alchicks e os remova do círculo. Existem várias técnicas diferentes para lançar o tompoy, cada uma delas apropriada para uma configuração de alchicks - já que, no início do jogo, todos os alchicks estarão arrumadinhos no centro do círculo, mas, a cada arremesso, eles vão se espalhando. Cada jogador tem direito a três arremessos, mas tem que acertar pelo menos um alchick em cada um deles; se o jogador arremessar o tompoy e não acertar nenhum alchick do círculo, ele passa sua vez. Um jogador que pise incorretamente na hora de fazer seu arremesso, que toque nos alchicks, que jogue o tompoy para fora do círculo, ou que cometa outras infrações previstas nas regras também perde sua vez. Cada jogador pode remover até cinco alchicks do círculo, também passando a vez quando remove o quinto.

Quando um jogador passa a vez, o seguinte em uma lista previamente determinada pelo técnico assume seu lugar. Não há limite para quantas vezes cada jogador pode jogar, mas cada um dos sete deve jogar pelo menos uma vez antes que eles comecem a se repetir, e jogadores que tirem cinco alchicks do círculo saem da rotação. Os jogadores vão se alternando e arremessando até que consigam remover todos os alchicks de dentro do círculo; quando isso acontece, os jogadores que estavam fora da votação retornam, e o objetivo passa a ser remover o Khan do círculo, sendo que, para remover o Khan, o jogador pode pisar dentro do círculo, embora ainda tenha que se apoiar em um pé só, e seu dedão tenha que apontar na direção do Khan - além disso, em todos os arremessos para remover o Khan, o tompoy tem que deixar a mão do jogador por baixo da linha de seus joelhos. Um time tem 60 minutos (também conhecido como uma hora) para concluir seu turno; caso consiga remover o Khan do círculo antes desse tempo, o time faz um malak.

Quando o primeiro time faz o malak, ou quando os 60 minutos se esgotam, passa a ser a vez do outro time, que seguirá as mesmas regras. Ao final do turno do segundo time, se um dos dois times tiver feito malak mas o outro não, o time que fez malak vence. Se ambos tiverem feito, o jogo termina empatado. Se for um jogo eliminatório, uma partida-desempate começa imediatamente.

E se, vocês devem estar se perguntando, nenhum dos dois times fizer malak? Caso pelo menos um dos times não tenha conseguido remover todos os alchicks, ganha quem removeu mais. Caso ambos tenham deixado só o Khan, o jogo conta com dois árbitros, que observam se a postura dos jogadores e os arremessos estão corretos, se um jogador cometeu alguma falta, e se os alchicks e o Khan realmente saíram do círculo. Um desses árbitros carrega um equipamento muito importante: uma régua de 40 cm, que tem um lado vermelho e o outro amarelo. Se o time que arremessou primeiro deixou só o Khan, mas não fez malak, o árbitro mede, a partir do centro do círculo, a distância que o Khan ficou da borda do círculo, e a anota. Se o segundo time ficar na mesma situação, o árbitro também mede essa distância, e vence o time cujo Khan ficou mais perto da borda do círculo. Ainda é possível empatar, caso os dois times removam a mesma quantidade de alchicks, ou caso os dois Khans fiquem na mesma distância.

Torneios de ordo tradicionalmente são disputados em pontos corridos, sem jogos eliminatórios; nesse sistema, um time que ganhou a partida porque fez malak e o outro não ganha 3 pontos, um time que ganhou a partida sem fazer malak ganha 2 pontos, e, em caso de empate, cada time ganha 1 ponto. Em torneios com jogos eliminatórios, essa pontuação é usada na fase de grupos, mas, na fase eliminatória, os vencedores vão avançando e os perdedores vão sendo eliminados.

O ordo é regulado pela Federação Quirguiz de Ordo, fundada apenas em 2012; além de no Quirguistão e na Mongólia, que tem sua própria federação nacional, e regras um pouquinho diferentes, o ordo é jogado no Cazaquistão, Uzbequistão, Tajiquistão, Turcomenistão, Paquistão, Afeganistão, China e Nepal. Sua única competição internacional é os Jogos Mundiais Nômades, dos quais faz parte do programa desde a primeira edição, em 2014, tendo ficado de fora em 2022 mas já estando previsto para voltar em 2024. Por questões de tradição, o ordo é disputado somente no masculino - embora não haja absolutamente nada que impeça as mulheres de jogá-lo além do machismo.

Antes de terminarmos por hoje, cabe dizer que há um jogo de tabuleiro chamado Ordo, criado pelo alemão Dieter Stein e lançado em 2009, que não tem absolutamente nada a ver com o esporte, com as regras sendo completamente diferentes; o Ordo de Stein se tornou relativamente famoso, porém, e já há até versões dele para computador e celular.
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sábado, 6 de abril de 2024

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Universo Cinematográfico Marvel (XI)

Hoje seguiremos com a série de posts sobre o MCU, finalmente encerrando o ano de 2021!

Eternos
Eternals
2021

Os Eternos são um grupo de super-heróis criado por Jack Kirby quando ele retornou à Marvel, na década de 1970, após passar alguns anos escrevendo e desenhando para a DC. Membros de uma raça de seres superpoderosos criada pelos Celestiais para defender a Terra dos Deviantes, raça aparentemente alienígena que vê todas as demais como ameaças, planejando destruir todos os que não forem Deviantes, os Eternos caminham dentre a humanidade há um milhão de anos, tendo dado origem a várias lendas de diversas mitologias. Em termos de popularidade nos quadrinhos, os Eternos não pareciam uma boa escolha para protagonistas de um filme, mas Feige, querendo aproveitar a Fase 4 para abordar o passado e as origens do MCU, achou que o tema de "alienígenas que influenciaram na história da humanidade" era apropriado, e decidiu investir no projeto.

Um mês após anunciar o filme, a Marvel partiria para escolher um diretor, sendo abordados Nicole Kassell, Travis Knight, Chloé Zhao, e a dupla Cristina Gallego e Ciro Guerra. Zhao, que em várias entrevistas se diria fã do MCU, e já não havia sido escolhida para dirigir Viúva Negra, trabalharia em conjunto com o produtor Nate Moore para criar uma apresentação de primeiro nível, que deixaria os executivos dos Marvel Studios temerosos de que, se não a contratassem de imediato, poderiam perdê-la para algum grande projeto de outro estúdio, e acabaria sendo contratada quinze dias depois, sem que muitos dos outros sequer tivessem a chance de se apresentar. Outro ponto que convenceria a Marvel a contratar Zhao seria que, por sugestão de Moore, vários dos personagens teriam seu gênero, etnia e sexualidade diferentes de suas versões dos quadrinhos - nos quais a equipe era em sua maioria branca e masculina - o que estava alinhado com o projeto de maior diversidade de elencos planejado pelos Marvel Studios.

Inicialmente, a Marvel contrataria os roteiristas Ryan e Kaz Firpo, que chegariam a escrever um rascunho; após ser contratada, Zhao pediria para que ela mesma escrevesse o roteiro, para que o filme fosse um reflexo de sua visão, e a Marvel permitiria, desde que ela usasse o rascunho que já havia sido feito pelos Firpo como ponto de partida. Faltando quatro meses para a data prevista para o início das filmagens, Zhao estaria com dificuldades para finalizar o roteiro, então a Marvel indicaria Patrick Burleigh, de sua escola de jovens roteiristas, que decidiria apenas ajudá-la a finalizar, sem interferir em seu processo de criação. No fim, Zhao, Burleigh e os dois Firpo seriam creditados como roteiristas.

O filme começa cerca de oito meses após os eventos de Ultimato, e, através de flashbacks, acompanha uma equipe de dez Eternos - Gemma Chan (que já havia interpretado a Minn-Erva de Capitã Marvel) como Sersi, Richard Madden (de Game of Thrones) como Ikaris, Kumail Nanjiani como Kingo, Lia McHugh como Sprite, Brian Tyree Henry como Phastos, Lauren Ridloff como Makkari, Barry Keoghan como Druig, Don Lee como Gilgamesh, Angelina Jolie como Thena, e Salma Hayek como Ajax - ao longo da história da humanidade, sempre guiando seus avanços e protegendo-a dos Deviantes. Na época atual, um ataque dos Deviantes não ocorre há cerca de 500 anos, o que fez com que os Eternos se espalhassem pelo mundo e passassem a viver vidas normais em meio aos humanos; o ressurgimento dos Deviantes fará com que eles tenham de voltar à ativa, e, de quebra, descubram um terrível segredo.

Chan seria a última atriz testada para o papel de Sersi, que, mesmo sendo um "filme de equipe", é a protagonista da produção, e o papel com mais falas e mais cenas dentre todos os Eternos; após finalizar sua participação em Capitã Marvel, a atriz ouviria diretamente de Feige que "gostaria de aproveitá-la melhor em um futuro projeto", mas se surpreendeu com a rapidez com que retornou ao MCU. Phastos seria o primeiro super-herói gay do MCU, com Haaz Sleiman interpretando seu marido, Ben, e Esai Daniel Cross interpretando o filho do casal, Jack; e Makkari seria o primeiro super-herói surdo do cinema, se comunicando através da língua de sinais - Ridloff, sua intérprete, é surda na vida real. O elenco ainda conta com Bill Skarsgård como a voz do Deviante Kro; David Kaye como a voz do Celestial Arishem; Harish Patel como Karun, o mordomo de Kingo; e Kit Harington (também de Game of Thrones) como o namorado de Sersi, Dane Whitman, que, nos quadrinhos, é o herói Cavaleiro Negro. Na cena pós-créditos, Harry Styles aparece como o herói Starfox, Payton Oswalt faz a voz do troll Pip, e Mahershala Ali, não creditado, tem uma fala atribuída ao herói Blade, que ele interpretará em uma produção futura.

Zhao diria que a Marvel lhe daria liberdade total durante as filmagens, permitindo que a maioria das cenas fossem externas, algo raro no MCU, que ela usasse câmeras de qualquer tipo e e qualquer ângulo, e até mesmo que filmasse Eternos back to back como seu filme Nomadland, realizado de forma independente e que já estava em pré-produção quando ela foi contratada. As filmagens ocorreriam em Los Angeles, na Inglaterra e nas Ilhas Canárias, onde uma cena teve de ser interrompida e o elenco e equipe evacuados - incluindo Jolie e Madden - após ser descoberta bem no local de filmagens uma bomba da Segunda Guerra Mundial que não explodiu. As filmagens se concluíram em fevereiro de 2020, poucas semanas antes de começar a quarentena por causa da pandemia, e toda a pós-produção teve de ser feita de forma remota, incluindo os efeitos especiais, criados pelas empresas Scanline VFX, Industrial Light & Magic, Luma Pictures, RISE e Weta Digital. Algumas cenas tiveram de ser refilmadas em novembro de 2020, devido a Zhao não gostar da forma como elas se encaixaram no filme após a edição.

Após duas pré-estreias em outubro, Eternos estrearia em 3 de novembro de 2021, quase um ano depois da data para o qual estava originalmente marcado antes da pandemia; ele deveria ter sido o segundo filme da Fase 4, mas, quando a Marvel teve de alterar as datas por causa da pandemia, Zhao pediria para que ele fosse o terceiro, para que ela tivesse mais tempo para trabalhar na edição, com a qual ainda não estava totalmente satisfeita. Assim como Shang-Chi, Eternos ficaria 45 dias exclusivamente nos cinemas antes de ser oferecido no Premier Access do Disney+; ele seria o último filme do MCU a ser oferecido através desse serviço.

Com orçamento de 232,6 milhões de dólares, Eternos renderia quase 165 milhões nos Estados Unidos e pouco mais de 402 milhões no mundo inteiro; assim como Shang-Chi, ele teria sua exibição proibida na China, dessa vez por causa de uma delcaração que Zhao fez em 2013, quando disse que a China era um país onde havia "mentiras por toda parte". O filme também seria proibido na Arábia Saudita, Kuwait, Catar, Bahrein e Omã, devido à presença de um casal gay, e exibido editado, sem as cenas da família de Phastos, nos Emirados Árabes Unidos, Jordânia, Líbano, Indonésia e Egito. A crítica ficaria dividida, considerando a história confusa e as atuações abaixo da média, mas elogiando o visual do filme e o fato de que ele tem "super-heróis que conversam ao invés de resolver tudo com os punhos". O filme receberia o Selo de Representação Autêntica da Ruderman Family Foundation pela forma como um personagem surdo foi representado, e o ReFrame Stamp, conferido a produções nas quais há igualdade de gênero em relação a tempo de tela e duração de falas.

De todos os filmes do MCU até agora, Eternos é o que parece mais deslocado: seus eventos parecem não ter sofrido influência de nada do que aconteceu nas produções anteriores, nem terem influenciado nenhuma das seguintes - uma das maiores reclamações do público, inclusive, é que um acontecimento de grande magnitude do filme sequer foi novamente citado até agora. O futuro dos Eternos no MCU também é nebuloso: havia boatos de que seria feita uma série para o Disney+, com cada episódio mostrando um dos Eternos em um ponto específico da história da humanidade, mas isso jamais foi confirmado, e um segundo filme, que seria o caminho natural, ainda não foi incluído nos planos futuros da Marvel. Também não se sabe se Sersi, Whitman ou Starfox estarão em um dos futuros filmes dos Vingadores - o que é especulado pelos fãs devido ao fato de que, nos quadrinhos, os três já fizeram parte da equipe.

Gavião Arqueiro
Hawkeye
2021

Junto com Wanda, o Falcão e Loki, o Gavião Arqueiro seria um dos personagens escolhidos, lá em 2018, para estrelar uma série no Disney+. No caso dele, havia uma dificuldade, porém: ao contrário dos outros três personagens, que provavelmente não ganhariam jamais seus próprios filmes, havia um projeto para um filme solo do Gavião Arqueiro, o que faria com que seu intérprete, Jeremy Renner, assinasse um contrato para estrelá-lo. Após a definição de que o Gavião Arqueiro seria estrela de uma série, e não de um filme, Renner teria de ser convencido a mudar seu contrato, e o argumento usado para isso seria que, em uma série com de 6 a 8 episódios, o desenvolvimento da história e o tempo de tela do personagem seriam maiores que em um filme de duas horas - embora o argumento para que ele não mudasse, o de que os ganhos financeiros com o filme seriam maiores, também me parece muito bom. Seja como for, Renner acabaria convencido, e Gavião Arqueiro entraria em produção em abril de 2019.

Ainda em abril, Kevin Feige e a produtora Trinh Tran definiriam a históra da série, que mostraria Clint Barton, o Gavião Arqueiro dos Vingadores, passando seu manto para Kate Bishop, a nova Gaviã Arqueira dos quadrinhos - em inglês não havia o problema de gênero, já que ambos os personagens se chamavam Hawkeye - para poder passar mais tempo com sua família. Em setembro, Jonathan Igla seria contratado como showrunner, ficando responsável também por escrever o primeiro episódio e supervisionar a equipe de roteiristas, que contaria com Elisa Clement (que co-escreveria o último episódio com Igla), Katie Mathewson & Tanner Bean, Erin Cancino & Heather Quinn e Jenna Noel Frazier. Em março de 2020, ficaria definido que a série teria seis episódios, e que seria uma série limitada, sem segunda temporada. Em julho, Rhys Thomas seria contratado como diretor, mas, devido a outros compromissos pessoais, somente poderia dirigir três dos episódios, optando pelos dois primeiros e o último; para dirigir os três "do meio", a Marvel convidaria a dupla Bert & Bertie - nomes artísticos das inglesas Amber Templemore-Finlayson e Katie Ellwood.

Igla decidiria ambientar a série na época do Natal, e baseá-la nas histórias do Gavião Arqueiro escritas por Matt Fraction em 2012, usando elementos como o cachorro Lucky, os vilões vestidos com agasalhos de ginástica e o fato de que Barton está perdendo a audição após tantos anos de aventuras barulhentas. A série mostraria Barton ensinando Bishop a ser um "super-herói sem superpoderes", enquanto explora detalhes de seu passado, especialmente da época em que ele agiu com o codinome de Ronin, entre os eventos de Vingadores: Guerra Infinita e Vingadores: Ultimato. Fraction serviria como consultor para a série, e planejaria fazer uma participação especial como um dos bandidos vestidos de agasalho de ginástica, mas teria de cancelar devido à pandemia.

Logo após Renner assinar contrato, Hailee Steinfeld seria convidada para interpretar Bishop, mas não poderia assinar devido a uma cláusula de seu contrato com a Apple TV+, para a qual ela fez a série Dickinson. A Marvel não sondaria outras atrizes nem faria testes, decidindo tentar resolver essa questão legal para poder contar com Steinfeld, que seria anunciada somente em dezembro de 2020. Também em dezembro, seria confirmada a presença na série de Yelena Belova, com Florence Pugh repetindo o papel que já havia interpretado em Viúva Negra; Belova a princípio não estaria na série, retornando apenas no filme dos Thunderbolts, mas Igla convenceria Feige de que Gavião Arqueiro era o lugar certo para que a personagem retornasse e encerrasse suas histórias pendentes antes de sua aparição em uma equipe; para que as cenas de Belova na série não destoassem das do filme, Thomas, Bert & Bertie e os roteiristas assistiriam a uma sessão privada de Viúva Negra, antes da estreia do filme. Durante uma reunião para decidir sobre a presença de Belova, Feige sugeriria incluir também o Rei do Crime, interpretado por Vincent D'Onofrio como na série do Demolidor da Netflix, que assim faria sua estreia oficial no MCU.

A série começa durante os eventos de Os Vingadores, quando uma Kate Bishop ainda criança vê de sua janela a batalha contra os Chitauri, é salva de um ataque dos alienígenas pelo Gavião Arqueiro, e decide ela mesma se tornar uma heroína que usa um arco e flechas como arma. Mais de uma década se passa, e, um ano após os eventos de Vingadores: Ultimato, se aproxima o primeiro Natal após o blip, o qual Barton, aposentado, decide passar com sua família em sua casa do interior. Enquanto ele está em Nova Iorque com os filhos, porém, alguns objetos pessoais seus, como a roupa e a espada que ele usava na época de Ronin e um relógio, são roubados, e ele decide tentar recuperá-los. Bishop acaba se envolvendo acidentalmente ao tentar impedir os ladrões, e, juntos, os dois Gaviões Arqueiros acabam tendo de enfrentar perigosos criminosos.

O elenco conta com Jeremy Renner como Clint Barton / Gavião Arqueiro; Hailee Steinfeld como Kate Bishop; Tony Dalton como Jack Duquesne, que nos quadrinhos é o vilão transformado em herói Espadachim, mas na série é o noivo da mãe de Bishop, e aparentemente está envolvido no roubo dos objetos de Barton; Fra Free como Kazimierz Kazimierczak, apelido Kazi, chefe dos criminosos que usam agasalhos de ginástica; Vera Farmiga como Eleanor Bishop, mãe de Katie; Alaqua Cox como Maya Lopez, moça nativo-americana, surda e amputada de uma perna, ás das artes marciais, que quer se vingar do Ronin por ele ter matado seu pai, sem saber que Barton é o Ronin; Florence Pugh como Yelena Belova / Viúva Negra; e Vincent D'Onofrio como Wilson Fisk / Rei do Crime. Outros personagens de destaque são Laura Barton (Linda Cardellini), esposa de Clint, e seus filhos, Cooper (Ben Sakamoto), Lila (Ava Russo) e Nathaniel (Cade Woodward); os criminosos de agasalho de ginástica Ivan (Aleks Paunovic), Tomas (Piotr Adamczyk) e Enrique (Carlos Navarro); os policiais Grills (Clayton English), Wendy (Adetinpo Thomas), Orville (Robert Walker-Branchaud) e Missy (Adelle Drahos); os Detetives Caudie (Ivan Mbakop) e Rivera (Franco Castan); Armand Duquesne III (Simon Callow), tio de Jack e amigo da família Bishop, e seu neto, Armand Duquesne VII (Jonathan Bergman). Em flashbacks, também aparecem os pais de Katie, Derek Bishop (Brian d'Arcy James), e de Maya, William Lopez (Zahn McClamon). O jornalista Pat Kiernan faz uma participação especial como ele mesmo.

As filmagens começariam em dezembro de 2020, para aproveitar a decoração de Natal, e ocorreriam principalmente na cidade de Nova Iorque, no Brooklyn e em Manhattan. Em fevereiro de 2021, as filmagens das cenas de estúdio começariam em Atlanta, com algumas cenas externas adicionais sendo filmadas no centro da cidade de Canton, Georgia. As filmagens se encerrariam em abril de 2021, mas algumas cenas teriam de ser regravadas, por questões de ritmo, com as refilmagens sendo feitas em estúdios em Toronto, no Canadá, em setembro de 2021. Os efeitos especiais ficariam a cargo das empresas Industrial Light & Magic, Luma Pictures, Mr. X, Rise, Rising Sun Pictures e Weta Digital. Segundo estimativas da Disney, cada episódio custaria cerca de 25 milhões de dólares.

Gavião Arqueiro estrearia no Disney+ em 24 de novembro de 2021 com dois episódios, os demais estreando um por semana até 22 de dezembro, para um total de seis, com entre 42 e 62 minutos cada. O primeiro episódio teria uma pré-estreia em cinemas selecionados de Londres em 11 de novembro, e no El Captain Theatre, em Los Angeles, em 17 de novembro. A série seria extremamente elogiada, especialmente a química entre Renner e Steinfeld, e a ação mais "pé no chão", sem os ingredientes grandiosios, cósmicos ou espalhafatosos que marcam as produções do MCU. Alguns críticos a considerariam a melhor das séries do MCU no Disney+, e chamariam a atenção para o fato de que o Gavião Arqueiro não é um anti-herói torturado em busca de redenção, mas um herói aposentado que quer apenas resolver sua vida para poder ficar com sua família, o que também diferenciava a série das demais produções envolvendo super-heróis. A Disney não divulgou os números da audiência, mas declarou que a série foi um grande sucesso de público.

Ao inscrever a série para a premiação do Emmy, a Disney optaria pelas categorias de séries de comédia, devido ao tom leve dos episódios; o fato de ela não ter sido inscrita nas categorias reservadas a minisséries e séries limitadas levaria a especulações de que uma segunda temporada estava sendo planejada, o que seria desmentido por Igla. Gavião Arqueiro acabaria indicada apenas aos Emmys de Melhor Coordenação de Dublês pra uma Série de Comédia ou Programa de Variedades e Melhor Performance de Dublês, mas não ganharia nenhum dos dois prêmios.

Homem-Aranha: Sem Volta para Casa
Spider-Man: No Way Home
2021

Lá em 2017, quando Sony e Marvel Studios definiram os termos do acordo que permitiu a realização de Homem-Aranha: De Volta ao Lar e a inclusão do Homem-Aranha nos filmes do MCU, ficaria acertado que seriam feitos três filmes, produzidos pelos Marvel Studios e distribuídos pela Sony. Em relação à parte financeira, 100% do financiamento (ou seja, todo o dinheiro pago para fazer cada filme) seria de responsabilidade da Sony, que, em troca, receberia 95% do valor da bilheteria, com os Marvel Studios ficando com apenas 5%. E seria justamente essa parte que daria problema após a realização do segundo filme, Homem-Aranha: Longe de Casa, de 2019.

Uma cláusula do contrato assinado em 2017 previa que ele poderia ser terminado a qualquer momento, inclusive antes da realização de qualquer filme, por decisão unilateral - ou seja, bastava uma das partes, Marvel ou Sony, não querer mais, para que o contrato deixasse de valer. Ao mesmo tempo, também havia uma cláusula que previa que o contrato, se não fosse terminado dessa forma, valeria indefinidamente, sendo automaticamente renovado para um quarto filme após a estreia do terceiro, para um quinto após a estreia do quarto, e assim por diante. Assim, em agosto de 2019, Sony e Marvel se reuniriam para tratar não somente do terceiro filme, mas também do quarto, já que a série estava sendo um grande sucesso para ambos, e era preciso tratar de questões legais como a renovação dos contratos do diretor Jon Watts e do elenco principal, que, seguindo o padrão da Sony, eram assinados filme a filme, e não para múltiplos filmes como costumava fazer a Marvel.

Nessa reunião, a Disney se mostraria extremamente insatisfeita com a cláusula que previa apenas 5% da bilheteria para os Marvel Studios, alegando que os filmes só eram um sucesso por serem ambientados no MCU e que, após a estreia do Disney+, Feige estava sobrecarregado com tantas produções para a Fase 4, e exigiu que esse percentual fosse aumentado para de 25% a 50% da bilheteria. A Sony obviamente não concordou e, como não conseguiu convencer os executivos da Disney a aceitar menos de 25%, exerceu sua opção de encerrar o contrato unilateralmente, declarando que ainda faria um terceiro filme do Homem-Aranha dirigido por Watts, escrito por Chris McKenna e Erik Sommers e estrelado por Tom Holland, mas que esse seria ambientado não no MCU, e sim em seu Sony's Spider-Man Universe (SSU), do qual até então o único filme era Venom, mas para o qual já estavam previstos Venom: Tempo de Carnificina (que estrearia em 2021), Morbius (que estrearia em 2022) e Kraven, o Caçador (previsto para estrear esse ano).

Embora alguns fãs tenham comemorado, preferindo um filme do Homem-Aranha sem ligação com o MCU, a imensa maioria fez um grande estardalhaço, com a repercussão nas redes sociais sendo amplamente negativa. Mais que isso, o próprio Holland se declarou insatisfeito com a decisão, e decidiu conversar pessoalmente (em ocasiões separadas) com Tom Rothman, presidente da Sony, e Bob Iger, CEO da Disney, para tentar encontrar uma solução. O caldo entornaria de vez após uma declaração do CEO da Sony Pictures Entertainment, Tony Vinciquerra, de que Feige não era o único capaz de fazer um filme de sucesso e que a Sony era plenamente capaz de fazer um filme do Homem-Aranha no mesmo estilo dos do MCU, algo no qual (talvez por causa de Venom) os fãs não acreditaram. Após vários protestos na D23, a convenção anual da Disney (cujo nome remete a 1923, o ano de fundação da empresa), em setembro de 2019, Sony e Disney sentariam novamente para conversar, e chegariam a um novo acordo, segundo o qual tanto o financiamento quanto a bilheteria passariam a ser divididos: 75% para a Sony, 25% para os Marvel Studios. Iger declararia que Disney e Sony, ao negociar da primeira vez, haviam se esquecido das pessoas que realmente importam, os fãs, e agradeceria a todos que pressionaram para que o acordo fosse renovado.

Esse novo contrato também previa que personagens do MCU pudessem aparecer em filmes do SSU e vice-versa - o que permitiu que, por exemplo, o Abutre, interpretado por Michael Keaton, personagem de Homem-Aranha: De Volta ao Lar, aparecesse na cena pós-créditos de Morbius. O próprio Homem-Aranha de Holland está incluído nesse pacote, embora ainda não esteja confirmada sua participação em nenhum dos filmes futuros do SSU. Mas o que importa para esse post é que essa previsão contratual deu uma ideia a McKenna e Sommers: em sua primeira versão do roteiro, o vilão seria Kraven, seguindo uma sugestão de Watts, mas, aproveitando o novo contrato e o fato de que as produções da Fase 4 lidam com a ideia de Multiverso, os dois decidiriam fazer com que os filmes anteriores do Homem-Aranha, aqueles estrelados por Tobey Maguire e Andrew Garfield, fossem mostrados como parte do Multiverso Marvel.

Inicialmente, a ideia de McKenna e Sommers era que os personagens dos filmes anteriores fizessem apenas participações especiais. Seu primeiro rascunho seguia uma história semelhante à de A Felicidade Não se Compra, de 1946, com Peter Parker desejando jamais ter se tornado o Homem-Aranha e tendo um vislumbre de um universo no qual ele nunca foi picado pela aranha radioativa; conforme trabalhavam na história, eles decidiriam fazer com que os personagens dos filmes de Maguire e Garfield se tornassem parte integrante dela, vindo parar no universo no qual é ambientado o MCU e tendo de ser devolvidos para seus universos de origem. Os roteiristas também aproveitariam essa ideia para manter uma característica dos dois filmes anteriores do Homem-Aranha no MCU: em cada um deles, o Homem-Aranha contracena brevemente com um personagem mais velho do MCU, que atua como uma espécie de mentor; no primeiro, com Tony Stark, no segundo, com Nick Fury. Como já estava definido que o filme seguinte dos Marvel Studios seria Doutor Estranho no Multiverso da Loucura, a escolha óbvia foi Stephen Strange, que seria também o responsável pelo feitiço que traria os personagens dos outros universos para a história.

McKenna e Sommers escreveriam o roteiro sem nem saber se os atores que interpretaram os personagens originalmente aceitariam retornar, preferindo se preocupar com isso depois. Eles também escreveriam cenas para praticamente todos os personagens dos cinco filmes, incluindo Mary Jane, Gwen Stacy e as duas versões de Harry Osborn, mas, em dado momento, achando que estavam pegando mais peso do que aguentavam carregar, e querendo evitar que o filme se tornasse um grande amarrado de fan service, decidiriam usar apenas os vilões - em uma das versões do roteiro, nem mesmo Maguire e Garfield estariam no filme. Também houve um momento no qual os roteiristas decidiriam colocar um vilão inédito no filme, que seria o principal, com os demais apenas atacando o Homem-Aranha aleatoriamente, mas, quando Willem Dafoe assinou contrato para voltar a interpretar o Duende Verde, eles ficaram tão empolgados que decidiram que nenhum outro vilão conseguiria ser o principal com ele no filme.

Uma das dificuldades encontradas pelos roteristas seria que, originalmente, Homem-Aranha: Sem Volta para Casa estrearia depois de Doutor Estranho no Multiverso da Loucura - versões preliminares do roteiro, inclusive, traziam America Chavez, que faria amizade com Peter Parker, usando seus poderes para acessar as dimensões dos vilões. Por causa da pandemia, as filmagens de ambos os filmes acabariam atrasando, e, quando retornaram, o do Homem-Aranha estava muito mais adiantado. Querendo aproveitar que, mesmo com a pandemia, poderia lançar um filme do Homem-Aranha a cada dois anos, a Sony marcaria a data de estreia para novembro de 2021; como a Marvel já estava com seu cronograma de cinema todo atrasado, e em novembro ainda seria a estreia de Eternos, McKenna e Sommers teriam de mudar várias cenas para que a continuidade do MCU não fosse alterada - já haviam sido filmadas cenas, por exemplo, nas quais o Doutor Estranho dizia já ter conhecimento do Multiverso, que tiveram de ser refilmadas.

O filme é uma continuação direta de Homem-Aranha: Longe de Casa, no fim do qual (SPOILER) Mystério revela publicamente que Peter Parker é o Homem-Aranha. Peter vê sua vida virar de cabeça para baixo após a revelação, principalmente porque ele e seus amigos estão no último ano do colégio, e nenhuma universidade decide aceitá-los por ele ser o super-herói. Desesperado, ele procura o Doutor Estranho para que ele faça um feitiço e todos esqueçam que ele é o Homem-Aranha, mas atrapalha o feiticeiro em um momento crítico, e o feitiço acaba fazendo algo bem diferente, trazendo para o universo onde o MCU é ambientado pessoas de outros universos, que Peter, então, deve encontrar e enviar de volta, antes que todo o tecido do espaço-tempo se rompa e destrua o Multiverso.

O elenco conta com Tom Holland como Peter Parker / Homem-Aranha; Zendaya como MJ; Benedict Cumberbatch como Stephen Strange / Doutor Estranho; Jacob Batalon como Ned Leeds; Jon Favreau como Happy Hogan; Jamie Foxx como Max Dillon / Electro; Willem Dafoe como Norman Osborn / Duende Verde; Alfred Molina como Otto Octavius / Doutor Octopus; Rhys Ifans como Curtis Connors / Lagarto; Thomas Haden Church como Flint Marko / Homem-Areia; Benedict Wong como Wong; Tony Revolori como Flash Thompson; J.K. Simmons como J. Jonah Jameson; Marisa Tomei como May Parker; Andrew Garfield como Peter Parker / Homem-Aranha; e Tobey Maguire como Peter Parker / Homem-Aranha. Também aparecem no filme Angourie Rice como Betty Brant; Hannibal Buress como o Treinador Wilson; Martin Starr como Roger Harrington; J.B. Smoove como Julius Dell; Paula Newsome como a responsável pelo setor de admissão do MIT; Mary Rivera como a avó de Ned; e Gary Weeks e Arian Moayed como os agentes do Departamento de Controle de Danos Foster e Cleary. Charlie Cox gravaria uma participação especial de uma única cena como o advogado Matt Murdock, e Tom Hardy estaria na cena intercréditos como Eddie Brock / Venom. Harry Holland, irmão de Tom, gravou uma participação especial como um ladrão, mas sua cena acabou sendo removida da versão final do filme, assim como uma cena que trazia Lexi Rabe como Morgan Stark.

As filmagens começariam em outubro de 2020 em Nova Iorque, mas apenas para cenários, sem a presença do elenco; as filmagens com elenco começariam duas semanas depois, mas em Atlanta, dois dias após Holland encerrar as filmagens de Uncharted. Cumberbatch começaria a filmar em novembro, e combinaria as filmagens com as de Doutor Estranho no Multiverso da Loucura. Por causa das restrições impostas pela pandemia, a Sony montaria uma verdadeira operação de guerra, com atores e equipe tendo o mínimo contato físico possível, e luzes por todo o set indicando quando os atores deveriam pôr suas máscaras; muitos dos efeitos que poderiam ser obtidos com maquiagem acabariam sendo feitos com efeitos especiais na pós-produção, também para diminuir o contato entre atores e equipe de produção. Rhys Ifans preferiu não viajar para filmar nos Estados Unidos, fornecendo apenas sua voz para dublar o Lagarto; a única cena em que o Dr. Connors não está transformado foi reaproveitada de O Espetacular Homem-Aranha. A pandemia trouxe, porém, uma vantagem: as equipes de reportagem não tiveram amplo acesso às filmagens, o que fez com que a Sony conseguisse esconder a presença de Maguire e Garfield no filme - em um dia no qual jornalistas estavam presentes, eles chegaram ao set cobertos por lençóis.

Em uma das entrevistas, Holland diria que a posição da produção era "todos ou nenhum", ou seja, se algum dos atores originais não aceitasse repetir seu personagem, o filme não seria produzido - na verdade a gente sabe que não é bem assim, e que provavelmente só cortariam aquele personagem. Felizmente, não somente todos acabaram aceitando como também se mostraram empolgados em poder repetir seus papéis, especialmente Dafoe e Molina - que, em uma entrevista, declarou ter ficado extremamente surpreso ao ser procurado, já que estava quase vinte anos mais velho do que quando interpretou o Dr. Octopus pela primeira vez. Houve rumores de que Jamie Foxx só havia aceitado voltar a interpretar Electro se o vilão tivesse um visual diferente dos filmes anteriores, mas a mudança de visual foi opção da Marvel. Maguire e Garfield só começariam a filmar suas cenas em 2021, já que só apareceriam na parte final do filme; mesmo com todos os esforços da Sony, a presença dos dois no filme seria vazada e começaria a ser noticiada por várias publicações - o que levaria Holland a dar uma entrevista negando que os dois estavam no filme.

O filme seria a produção para o cinema do MCU com o maior número de efeitos especiais, e nada menos que 13 empresas trabalhariam neles: Cinesite, Clear Angle Studios, Crafty Apes, Digital Domain, Folks VFX, Framestore, Luma Pictures, Monsters Aliens Robots Zombies, Mr. X, Perception, Secret Lab, Sony Pictures Imageworks e SSVFX. Por opção de Watts, o filme não teria cena pós-créditos, e os Marvel Studios aproveitariam para, em seu lugar, exibir o trailer de Doutor Estranho no Multiverso da Loucura, até então inédito. A cena intercréditos seria encomendada pela Sony para tentar integrar o MCU ao SSU, e mostrava Eddie Brock no MCU, conversando com um barman; ela seria o complemento de outra cena, que mostrava Brock chegando ao MCU, também dirigida por Watts e filmada junto com Homem-Aranha: Sem Volta para Casa, mas que seria a cena pós-créditos de Venom: Tempo de Carnificina, que estreou dois meses antes. Segundo a produtora Amy Pascal, da Sony, houve negociações para que Venom participasse da batalha final de Homem-Aranha: Sem Volta para Casa, mas Watts seria contra.

Homem-Aranha: Sem Volta para Casa teria uma pré-estreia em Los Angeles em 13 de dezembro de 2021, estrearia no Reino Unido e Irlanda dia 15, e teria estreia nacional nos Estados Unidos dia 17, em 4.325 salas, um recorde para o período da pandemia. O filme receberia autorização do governo chinês para estrear lá, o que faria com que ele fosse o primeiro desde Viúva Negra a fazê-lo, mas até hoje não estreou - com a Sony alegando que um dos motivos seria que a China exige que todas as cenas mostrando a Estátua da Liberdade sejam removidas, o que é impossível. Em 31 de agosto de 2022, estrearia em cinemas selecionados uma versão estendida chamada The More Fun Stuff Version, para comemorar os 60 anos do Homem-Aranha nos quadrinhos e 20 anos do personagem no cinema; essa versão teria 13 minutos a mais, que incluíam a cena com Harry Holland, uma segunda cena com Matt Murdock e uma cena pós-créditos mostrando um mundo sem Peter Parker.

A Sony optaria por não divulgar o orçamento do filme, que seria calculado na casa de 200 milhões de dólares; sem contar com a versão estendida, Homem-Aranha: Sem Volta para Casa renderia 814,1 milhões somente nos Estados Unidos e 1,922 bilhão ao somar o mundo inteiro - mesmo sem a China - o suficiente para fazer dele o filme mais rentável de 2021, o sétimo mais rentável da história, o terceiro mais rentável nos Estados Unidos e Canadá, o mais rentável do Homem-Aranha e o mais rentável da história da Sony. Ele também seria o terceiro filme a alcançar a casa de 1 bilhão mais rápido, o segundo de maior bilheteria no dia da estreia (atrás apenas de Vingadores: Ultimato) e o de maior bilheteria no fim de semana de estreia para um filme lançado em dezembro, e a More Fun Stuff Version seria o recordista de bilheteria no fim de semana de estreia para um relançamento. Após divulgar os números finais, a Sony usaria o filme como argumento contra os que achavam que o cinema deixaria de existir depois da pandemia, sendo definitivamente substituído pelo streaming.

A crítica também seria extremamente positiva, elogiando principalmente o roteiro, com pitadas de humor e cenas emotivas, e a capacidade de unir personagens de filmes diferentes sem ficar parecendo uma colcha de retalhos em nome do fanservice. A performance de Dafoe seria exaltada, e as de Molina e Foxx bastante elogiadas - o que teve um sabor especial para Foxx, extremamente criticado quando fez O Espetacular Homem-Aranha 2: A Ameaça de Electro. A química entre Holland, Zendaya e Batallon também seria destaque. Homem-Aranha: Sem Volta para Casa seria indicado ao Oscar de Melhores Efeitos Especiais junto com Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis, mas ambos perderiam para Duna.

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sábado, 30 de março de 2024

Escrito por em 30.3.24 com 0 comentários

Cleopatra and the Society of Architects

Hoje eu vou falar sobre mais um jogo de tabuleiro que tem como tema o Antigo Egito. Hoje é dia de Cleopatra and the Society of Architects no átomo!

O principal diferencial de Cleopatra and the Society of Architects são seus componentes, que incluem peças em plástico para montar um palácio de aproximadamente 15 cm de altura, 30 cm de comprimento e 30 cm de largura. Os jogadores assumem o papel de arquitetos que trabalham para a Rainha Cleópatra, que os incumbiu de construir o palácio, e será vencedor aquele que contribuir com as mais valiosas estruturas. Como essa não é uma tarefa fácil, os jogadores podem recorrer aos Adoradores de Sobek, o deus-crocodilo, para obter vantagens que, embora acelerem a construção e rendam mais pontos, também rendem corrupção, que deduz pontos da pontuação final e pode fazer com que um jogador perca a partida mesmo sendo o que mais contribuiu com o palácio.

O jogo é uma criação de Bruno Cathala, também criador de outro jogo sobre o qual eu já falei no átomo, Kingdomino. Segundo Cathala, ele desejava fazer um jogo no estilo "teste os limites de sua sorte", já que dificilmente um jogador conseguirá ganhar sem pedir ajuda aos Adoradores de Sobek, mas com certeza irá perder se abusar dessa ajuda, então os jogadores passam toda a partida lidando com o dilema de se devem seguir se corrompendo ou parar, com a tensão aumentando a cada nova parte construída do palácio. O principal objetivo, mais do que ganhar pontos, é pesar os riscos e recompensas para saber o momento apropriado de pedir ajuda.

Cathala não desenvolveria o jogo sozinho, contando com a ajuda de Ludovic Maublanc, autor de Dice Town; essa seria a primeira parceria entre os dois, que, depois, também fariam juntos Cíclades. A arte do jogo ficaria a cargo de Cyrille Daujean, e as peças tridimensionais seriam criadas por Julien Delval. Cleopatra and the Society of Architects seria originalmente lançado em 2006 pela editora Days of Wonder, mesma de Ticket to Ride, e seria indicado ao prêmio Golden Geek de Melhor Jogo para Toda a Família.

Apesar de seus belos componentes, Cleopatra and the Society of Architects não seria um sucesso de vendas, por dois motivos: primeiro, justamente por causa desses belos componentes, o jogo era muito caro, segundo, suas regras eram consideradas complicadas. Por causa disso, depois que sua tiragem original se esgotou, a Days of Wonder não se interessou em relançá-lo, e o jogo ficou por muitos anos fora do mercado. Somente em 2019 a editora Mojito Studios procurou Cathala e Maublanc, para conversar sobre a possibilidade de lançar uma segunda edição do jogo, já que os direitos não pertenciam à Days of Wonder. Cathala e Maublanc aproveitariam para dar uma limpada nas regras, removendo componentes como as fichas de mercadores do Nilo e os dados do grande sacerdote, e mudando a forma como os jogadores pediam ajuda aos Adoradores de Sobek. A primeira edição também trazia componentes para até 5 jogadores, mas os autores decidiriam fazer com que a segunda fosse para de 2 a 4, para tornar o jogo mais rápido. Outra mudança importante seria que a primeira edição teria textos nas cartas, mas a segunda traria todas as suas informações através de símbolos.

Lançada em 2020 com o nome de Cleopatra and the Society of Architects: Deluxe Edition, a segunda edição também ganharia uma nova arte, de Miguel Coimbra (com um estilo mais de desenho animado, enquanto a primeira tinha um estilo mais realístico), e novas peças tridimensionais criadas por Delval, mais bonitas que as da edição original - e mais branquinhas, já que as da Days of Wonder tinham um tom amarelado. A Deluxe Edition é a única disponível no Brasil, e, assim mesmo, não foi exatamente lançada - como não há no jogo nenhuma informação em texto, a editora Conclave apenas importou o jogo original, acrescentando um manual em português que vem em um envelope de plástico preso junto à caixa. Como vocês devem ter imaginado, as regras que eu vou descrever nesse post são as da Deluxe Edition, mais recente e disponível em nosso país.

O jogo tem componentes em papelão, em plástico e cartas. Os componentes em papelão são 1 tabuleiro de jardim do palácio, 1 tabuleiro de praça da esfinge, 1 tabuleiro de piso do palácio, 1 tabuleiro de Adoradores de Sobek, 5 fichas de Adoradores de Sobek, 12 peças de mosaico dos deuses (cada uma formada por cinco quadrados dispostos em diferentes formatos, tipo Tetris), 100 fichas de tesouro dos escaravelhos (divididas em 1, 2, 5 e 10 pontos) e 90 amuletos de corrupção. Os componentes em plástico serão usados para montar o palácio, e são 1 base do palácio, 3 colunas da esquerda, 3 colunas centrais, 3 colunas da direita, 1 parte esquerda da porta da frente, 1 parte direita da porta da frente, 4 pilares, 6 esfinges, 1 pedestal, 1 trono, 2 obeliscos, 8 estátuas de Anúbis e 1 miniatura de Cleópatra. As cartas são 44 de recurso padrão (11 de cada para madeira, pedra, mármore e lápis-lazúli), 12 de recursos corrompidos (3 de cada recurso), 30 de artesão e 8 de caverna. Cada jogador, que pode escolher entre as cores azul, verde, laranja e roxa, recebe 1 carta de guia de referência, 1 pirâmide (de papelão) e 2 bases coloridas (de plástico).

Durante a preparação, a base do palácio é colocada no centro da mesa, com o piso do palácio em seu centro. Os quatro pilares são encaixados nos locais pré-determinados do piso, e o jardim do palácio é colocado sobre os pilares, também em uma posição pré-determinada. A praça da esfinge é colocada adjacente à base do palácio, com o espaço de número 5 ao lado das escadas. A miniatura de Cleópatra é colocada na primeira casa da praça da esfinge, a que conta com sua figura. O tabuleiro de Adoradores de Sobek é colocado próximo ao palácio, e as 5 fichas de Adoradores são embaralhadas e colocadas, aleatoriamente, com a face para cima, cada uma em uma das casas do tabuleiro. Os escaravelhos devem ser separados por valor, e são colocados próximo ao palácio, assim como os amuletos de corrupção, em uma reserva de fácil acesso por todos os jogadores. As peças do mosaico dos deuses são empilhadas em ordem aleatória e também colocadas nessa reserva próxima ao tabuleiro.

As 94 cartas são todas embaralhadas juntas, e cada jogador recebe 3 cartas, com a face virada para baixo. O baralho, então, é dividido em 3 montes de tamanho aproximado. Dois desses montes serão virados com a face para cima, e então eles serão combinados, com o que ficou com a face para baixo no meio, e embaralhados novamente, para que o monte de compras tenha intercaladas cartas com a face para cima e com a face para baixo. As 3 cartas do topo do monte de compras devem ser colocadas nos três espaços correspondentes do tabuleiro de Adoradores de Sobek, respeitando sua orientação - cartas que estavam com a face para cima no monte de compras seguem com a face para cima no tabuleiro, cartas que estavam com a face para baixo seguem com a face para baixo. O monte de compras é colocado próximo ao tabuleiro, e, durante o jogo, toda vez que uma carta sair do monte de compras para o tabuleiro, a orientação também deverá ser respeitada.

Cada jogador recebe sua pirâmide, que deve ser montada e colocada à sua frente, um guia de referência, as duas bases coloridas de sua cor e duas estátuas de Anúbis, colocando uma base colorida em cada estátua e as deixando ao lado de sua pirâmide. Cada jogador então pega, da reserva, uma quantidade de escaravelhos cujo total some 5 (um de 5, cinco de 1, dois de 2 e um de 1, não importa) e os coloca à sua frente, com o lado que tem a pontuação virado para baixo, para que, ao longo do jogo, nenhum oponente saiba quantos pontos cada jogador tem. Finalmente, as peças de plástico restantes são colocadas sobre a mesa, em um local de fácil acesso, mas que não atrapalhe nenhum jogador, para formar a Pedreira.

Após definir quem será o jogador inicial, os jogadores jogarão em sentido horário. Em sua vez de jogar, cada jogador pode escolher se vai visitar o Mercado ou visitar a Pedreira - mas apenas um, nunca ambos. Se escolher visitar o Mercado, o jogador escolherá uma das três casas com cartas do tabuleiro de Adoradores de Sobek - chamadas, em termos de jogo, de Tendas - e pegará todas as cartas que estiverem nessa Tenda, acrescentando-as à sua mão. Então, ele pegará mais três cartas do topo do monte de compras e colocará uma em cada Tenda, na ordem que desejar - isso significa que, na primeira vez em que alguém for visitar o Mercado, cada Tenda terá apenas uma carta, mas depois disso, cada Tenda poderá ter uma quantidade diferente de cartas. Quando uma nova carta é colocada em uma Tenda, ela não cobre a que estava lá, sendo colocada ligeiramente deslocada, de forma que uma parte da carta que ficaria imediatamente abaixo dela permaneça visível, e todos os jogadores saibam quais cartas estão em cada Tenda - lembrando também que cartas que estiverem no monte de compras com a face para baixo serão colocadas na Tenda com a face também virada para baixo.

O máximo de cartas que um jogador pode ter na mão é 10. Ao final de seu turno, quando for passar a vez ao jogador seguinte, se um jogador tiver mais de 10 cartas em sua mão, ele deverá escolher uma quantidade igual ao excedente e colocá-la, com a face para baixo, em um monte de descartes próximo ao tabuleiro de Adoradores de Sobek - mas em uma posição que não se confunda com a do monte de compras. Cartas que os jogadores joguem durante a partida também são colocadas nesse monte de descartes. Quando um jogador tiver de comprar cartas para as Tendas, se o monte de compras acabar, ele deverá pegar o monte de descartes, embaralhar, separar em três montes, virar dois com a face para cima, combiná-los e embaralhar de novo para formar um novo monte de compras.

Se escolher visitar a Pedreira, o jogador irá descartar cartas de sua mão para adquirir as peças que usará para construir o palácio. Cada peça possui um custo expresso no guia de referência, que é uma combinação de cartas de artesão e de recursos; o jogador deverá ter todas as cartas necessárias na mão, e colocá-las no monte de descartes após pegar a peça pela qual está pagando. Cada peça possui um local pré-determinado no palácio, onde o jogador deverá colocá-la após pegá-la na pedreira; caso mais de um espaço estiver disponível, o jogador escolhe onde vai colocar a peça. Um jogador pode usar uma única ação de visitar a Pedreira para colocar no palácio quantas peças quiser, desde que tenha cartas suficientes para pagar por todas elas. Não há "troco" para os recursos, ou seja, se o jogador precisava de 1 mármore, mas só tem uma carta de 2 mármores, ele pode usá-la mesmo assim, mas não recebe uma carta de 1 mármore de volta.

Cada peça também possui um valor em pontos, também expresso no guia de referência; após colocar a peça no palácio, o jogador pega na reserva geral uma quantidade de escaravelhos cuja soma seja o valor da peça e os coloca à sua frente, com a face para baixo - é permitido "troco", como, por exemplo, se o jogador for ganhar 8 pontos, ele pega da reserva um escaravelho que vale 10 e devolve para a reserva um de seus escaravelhos que vale 2.

As peças do palácio são divididas em seis categorias. Cinco das categorias usam peças de plástico: Esfinges (6 peças; devem ser colocadas na praça da esfinge, em duas fileiras de três peças cada; custo de 1 artesão + 2 recursos iguais; recompensa de 3 pontos + 1 ponto por cada outra esfinge já construída na mesma linha, para um máximo de 5 pontos), Portas (2 peças, uma para cada metade; colocadas na frente do palácio, onde ele se liga com a praça da esfinge; custo de 2 artesãos + 3 recursos iguais; recompensa de 5 pontos + 1 ponto para cada parede contínua ligada à porta no momento da construção, máximo de 14 pontos), Obeliscos (2 peças, colocados na praça da esfinge; custo de 3 artesãos + 4 recursos iguais; recompensa de 10 pontos + 2 pontos para cada esfinge já construída na mesma linha, máximo de 16 pontos), Paredes (9 peças, sendo 3 de colunas da esquerda, 3 de colunas da direita e 3 de colunas centrais; colocadas em volta do palácio, uma peça de cada tipo do lado esquerdo, uma de cada tipo do lado direito e uma de cada tipo na parte de trás; podem ser construídas em qualquer ordem; custo de 1 artesão + 2 recursos diferentes; recompensa de 3 pontos + 1 ponto para cada quadrado de mosaico adjacente à parede que acabou de ser construída, máximo de 6 pontos) e Trono (2 peças, uma para o trono e uma para o pedestal; colocados no jardim do palácio; o pedestal deve obrigatoriamente ser construído primeiro; custo de 3 artesãos + 4 recursos diferentes; recompensa de 10 pontos + 1 ponto para cada quadrado de mosaico adjacente ao pedestal ou trono no momento de sua construção, máximo de 19 pontos). Para uma peça ser considerada adjacente, ela deve tocar a outra na horizontal ou vertical, não contando peças que se toquem em suas diagonais.

A sexta categoria é a do Mosaico dos Deuses, e possui uma regra especial. Para construir o Mosaico dos Deuses, o jogador deve pagar 2 artesãos + 3 recursos diferentes; então, ele pega a peça do topo da pilha de peças do mosaico dos deuses e a coloca no jardim do palácio, de forma que todos os quadrados da peça fiquem dentro dos limites do jardim (não pode ficar um quadrado para fora) e nenhum deles cubra nem outro quadrado que já havia sido colocado lá antes, nem o espaço reservado ao pedestal do trono. Cada vez que uma peça de mosaico é colocada no jardim, o jogador deve verificar se a peça seguinte da pilha é possível de ser construída (ou seja, se há algum espaço no jardim no formato em que ela possa ser encaixada de acordo com as regras); se não houver, a peça é removida do jogo e o jogador confere a mesma coisa para a seguinte. É importante dizer que o jogador apenas confere se ainda há um lugar para a peça, não a coloca no jardim. Se a última peça da pilha for removida do jogo, a categoria Mosaico dos Deuses é considerada concluída (o mesmo ocorrendo, evidentemente, se a última peça da pilha for colocada no jardim seguindo as regras normais).

A recompensa por colocar uma peça de mosaico no jardim dos deuses é de 5 pontos + 1 ponto por cada palmeira coberta pela peça, para um máximo de 10 pontos. Porém, se, na hora em que o jogador colocar uma peça no jardim, ele criar uma área fechada, na qual seja impossível colocar uma das peças restantes, e ele ainda tiver estátuas de Anúbis em sua reserva, o jogador poderá abrir mão de receber a pontuação em troca de colocar a estátua nessa área, criando um Santuário - na hipótese rara de a colocação da peça ter resultado em duas áreas isoladas, o jogador pode colocar ambas as estátuas de uma vez, criando dois Santuários. Caso o jogador que colocou a peça opte por receber a pontuação, nenhum outro jogador poderá colocar sua estátua lá, e a área ficará vazia até o final do jogo. Criar um Santuário não resulta em pontos, mas traz uma vantagem para o jogador, que veremos em breve, no final do jogo.

No início de seu turno, um jogador também pode pedir ajuda aos Adoradores do Sobek, o que conta como uma ação livre - ou seja, o jogador pode pedir ajuda e depois visitar o Mercado, ou pedir ajuda e depois visitar a Pedreira. Pedir ajuda é totalmente opcional, nenhum jogador pode ser obrigado a pedir ajuda, mas deve ser feito sempre no início de seu turno - se um jogador visitar o Mercado ou a Pedreira antes de pedir ajuda, ele perde o direito de pedir ajuda naquele turno.

Ao pedir ajuda, primeiro o jogador escolhe uma das cinco fichas de Adoradores de Sobek; o personagem na ficha que ele escolheu estará sendo ativado. Dependendo da casa que a ficha ocupe, cada personagem possui um custo de ativação, que pode ser em escaravelhos ou em amuletos de corrupção: se for em escaravelhos, o jogador pega de seu total de escaravelhos uma quantidade cuja pontuação seja igual ao custo e os devolve para a reserva geral; se for em amuletos de corrupção, o jogador pega da reserva geral uma quantidade de amuletos igual ao custo e os coloca dentro de sua pirâmide - assim como o total de pontos dos escaravelhos, o total em corrupção que cada jogador tem deve ser mantido em segredo de seus oponentes, e é para isso que serve a pirâmide; um jogador pode, entretanto, a qualquer momento, consultar quantos amuletos de corrupção ele mesmo tem. Após pagar o custo, o jogador ganhará a vantagem conferida pelo personagem representado na ficha.

Os cinco personagens que o jogador pode escolher são: Arquiteto (nesse turno, ganhe 4 pontos de escaravelho para cada peça do palácio que você construir), Vizir (neste turno, você pode visitar tanto o Mercado quanto a Pedreira, não precisando escolher apenas um), Mercador (neste turno, você paga dois recursos a menos, à sua escolha, quando for construir uma peça do palácio), Pedinte (pegue quatro cartas do topo do monte de compras e as coloque em sua mão) e Contramestre (neste turno, você paga dois artesãos a menos quando for construir uma peça do palácio). Cada jogador só pode pedir ajuda a um único Adorador de Sobek por turno, ou seja, só pode escolher uma ficha de cada vez.

Ao escolher seu personagem e pagar seu custo, o jogador move a ficha para fora do tabuleiro de Adoradores de Sobek, mas a deixa no espaço acima da casa que ela estava ocupando, para mostrar que ela está ativa. No final de seu turno, após executar sua ação e usar a vantagem da ficha, mas antes de descartar o excesso de sua mão e passar a vez, o jogador deverá mover a ficha que estava à esquerda da que foi ativada para a casa que ela ocupava, e, se for o caso, todas as seguintes para as casas vazias à sua esquerda, até que a casa vazia seja a última, colocando a ficha que havia sido ativada lá. Isso faz com que o custo de cada ficha mude cada vez que um jogador pede ajuda, e com que a ficha ativada pelo último jogador seja sempre a mais cara para o seguinte. Esse procedimento, evidentemente, não é realizado se a ficha ativada estava na última casa.

Ao descartar o excesso de sua mão, o jogador também pode rezar para Sobek, o que também é uma ação livre, e não requer ativação de fichas - basta que o jogador pegue um amuleto de corrupção para cada carta além da décima que tiver em sua mão e os coloque em sua pirâmide. Ao fazer isso, o jogador não precisará descartar nenhuma carta, mas ele sempre precisará manter todas as que tem - por exemplo, se um jogador tiver 14 cartas na mão, ele pega 4 amuletos e mantém todas as 14, não sendo possível pegar 2 amuletos e descartar 2 cartas.

Sobek também se manifesta nas cartas corrompidas: toda vez que um jogador usa uma carta corrompida durante uma visita à Pedreira, ele deve pegar 1 amuleto de corrupção da reserva geral para cada cada carta que usou e colocar em sua pirâmide. Existem 20 cartas corrompidas no baralho, 3 para cada recurso e 8 de caverna, que podem ser identificadas por suas bordas vermelhas (as demais cartas têm bordas verdes). Cada carta de recurso corrompida vale 2 recursos do tipo mostrado - uma carta corrompida de pedra, por exemplo, vale 2 pedras - e é permitido compartilhar cartas corrompidas entre duas peças em uma visita à Pedreira - por exemplo, a mesma carta corrompida de pedra poderia ser usada para pagar tanto o custo de uma parede quanto de uma porta. Já as cartas de caverna são curingas, e podem ser usadas para representar qualquer recurso (mas não artesãos). Um jogador não pega amuletos de corrupção se descartar cartas corrompidas para manter o total de cartas de sua mão em 10.

Se, após um jogador colocar uma peça no palácio, aquela peça for a última de sua categoria (por exemplo, se o jogador coloca no palácio a segunda das duas metades da porta, ou a última das seis esfinges), aquela categoria é considerada concluída. Toda vez que uma categoria é concluída, Cleópatra anda para a frente na praça da esfinge. Quando ela chegar à quarta casa, deverá ser feita a Oferenda ao Grande Sacerdote: cada jogador deve pegar uma quantidade de pontos de escaravelhos que deseja ofertar e mantê-la em segredo em sua mão; quando todos tiverem escolhido, todos revelam ao mesmo tempo. O jogador que tiver ofertado a maior quantidade de pontos ganha o direito de pegar 3 amuletos de corrupção de sua pirâmide e devolvê-los à reserva geral; se ele tiver menos de 3, devolve todos. O jogador que ofertou a segunda maior quantidade de pontos pega 1 amuleto de corrupção da reserva geral e coloca em sua pirâmide; o que ofertou a terceira maior quantidade pega 2 amuletos de corrupção, e o que ofertou a menor quantidade de pontos pega 3 amuletos de corrupção da reserva geral e os coloca em sua pirâmide. Em caso de empate, os jogadores compartilham o efeito e o seguinte é pulado - por exemplo, caso dois jogadores empatem como o maior número de pontos ofertados, cada um deles tem o direito de devolver 3 amuletos de corrupção para a reserva geral, e o que ofertar a segunda maior quantidade de pontos deverá pegar 2 amuletos (pois o efeito "pegar 1 amuleto" é pulado). Independentemente da quantidade de pontos que o jogador ofertou, todos os escaravelhos ofertados são devolvidos para a reserva geral, ou seja, todos os pontos que os jogadores "apostaram" são perdidos.

Quando Cleópatra chega à quinta casa, o fim de jogo é acionado. Cada um dos jogadores, exceto aquele que moveu Cleópatra para a quinta casa, tem direito a mais um turno, seguindo as regras normais, e então são realizados cinco passos em uma ordem pré-determinada: primeiro, cada jogador descarta todas as cartas que ainda tinha na mão, recebendo 1 amuleto de corrupção para cada carta corrompida que descartar dessa forma. Segundo, cada jogador abre sua pirâmide e revela quantos amuletos de corrupção ainda tem lá dentro. Terceiro, cada jogador coloca um de seus amuletos de corrupção em cada espaço de seus Santuários, incluindo os espaços onde estão as estátuas. Quarto, cada jogador conta quantos amuletos de corrupção ainda tem; o que tiver menos descarta todos eles, então cada um dos outros descarta a mesma quantidade que aquele descartou - se alguém não tiver nenhum, ninguém descarta nada.

Finalmente, cada jogador paga uma penalidade, de acordo com o número de amuletos de corrupção que ainda tem: um jogador que ainda tenha 1 amuleto perde 1 ponto; 2 amuletos, 3 pontos; 3 amuletos, 6 pontos; 4 amuletos, 10 pontos; 5 amuletos, 15 pontos; 6 amuletos, 20 pontos; 7 amuletos, 25 pontos; e jogadores que ainda tenham 8 ou mais amuletos são servidos como alimento ao crocodilo de estimação de Cleópatra e desclassificados. Não é possível ficar com pontuação negativa, mas é possível um jogador terminar com pontuação 0 caso receba uma penalidade igual ou maior que o total de pontos de seus escaravelhos. Depois disso tudo, dentre os jogadores que não tiverem virado comida de crocodilo, o que tiver a maior pontuação é o vencedor. O jogo não traz nenhuma forma de quebrar empates, então supõe-se que é possível terminar empatado - assim como teoricamente é possível todo mundo terminar com pontuação zero.


Para conseguir produzir a Deluxe Edition, os Mojito Studios recorreram a um expediente já bem conhecido de quem lê meus posts sobre jogos de tabuleiro: um financiamento coletivo através do Kickstarter. Com meta de 50 mil dólares, o projeto seria totalmente financiado em apenas cinco horas, e se encerraria com 3.679 apoiadores que contribuiriam com 351.835 dólares, o que garantiria várias metas estendidas exclusivas para os apoiadores: escaravelhos de plástico, cartas em papel especial, peças do mosaico dos deuses em resina, amuletos de corrupção em metal, bolsa de veludo para que os oponentes não vejam quantos amuletos de corrupção cada jogador está pegando, bolsa de veludo para os escaravelhos, caixa especial com detalhes dourados, tabuleiro dos Adoradores de Sobek em papelão especial com duas camadas, tabuleiro do jardim dos deuses de plástico, pirâmides de plástico, e bandejas de plástico para acomodar as peças na Pedreira. Também estavam disponíveis, como add ons, um livro com toda a arte produzida para o jogo e a possibilidade de todas as peças de plástico (exceto os escaravelhos) virem pintadas.

Quatro das metas estendidas seriam mini-expansões exclusivas. A primeira seria The Cult of Sobek, e traria como componentes 3 estátuas de Sobek, 1 marcador de Sobek, 4 cartas de Sobek e 4 novos guias de referência. Quando um jogador visita a Pedreira, se ele já tiver um Santuário, pode pagar 1 artesão + 1 de cada recurso para colocar uma estátua de Sobek ao lado de sua estátua de Anúbis (sendo que o número de estátuas de Sobek disponíveis é sempre 1 a menos que o número de jogadores na partida). Se o fizer, ele poderá escolher uma das cartas de Sobek e colocá-la próxima à sua pirâmide, ganhando uma vantagem até o final do jogo. As quatro vantagens possíveis são: cada oponente coloca 1 amuleto de corrupção nas pirâmides deles quando você construir uma esfinge; cada oponente coloca 1 amuleto de corrupção nas pirâmides deles quando você construir uma parede; toda vez que um oponente construir uma porta, parte do trono ou obelisco, ele deverá te dar 2 pontos em escaravelhos; escolha uma de suas estátuas de Sobek (se tiver construído mais de uma) e coloque sob ela o marcador, no fim do jogo, cada casa do santuário onde está essa estátua poderá receber 2 amuletos de corrupção ao invés de 1.

A segunda seria The Whims of Cleopatra, que teria como componentes um dado especial e 7 fichas de bônus. No início do jogo, as fichas são colocadas com a face para baixo próximas à Pedreira, e o dado é rolado e colocado lá com a face que sair para cima. Cada uma das faces do dado representa uma das categorias de peças, e, toda vez que um jogador visitar a Pedreira e construir uma das peças da categoria mostrada, poderá sortear aleatoriamente uma das fichas e executar seu efeito. Os sete efeitos possíveis são: devolva 2 amuletos de corrupção para a reserva; cada oponente recebe 1 amuleto de corrupção; ganhe 3 pontos; cada oponente dá a você um escaravelho valendo 1 ponto; mantenha essa ficha e descarte-a da próxima vez em que visitar a Pedreira para que ela substitua 2 artesãos; mantenha essa ficha e descarte-a da próxima vez em que visitar a Pedreira para que ela substitua 2 recursos quaisquer; e pegue todas as cartas da Tenda que tiver menos (à sua escolha se houver empate) e coloque-as em sua mão sem pegar novas cartas do monte de compras para as Tendas. Se a categoria de peças mostrada pelo dado for concluída e ainda houver fichas de bônus disponíveis, o dado é novamente rolado até que saia uma categoria que ainda tenha peças a construir.

A terceira seria The Wisdom of Bastet, que teria como componentes uma estátua de Bastet e 10 cartas de Bastet, que são embaralhadas às cartas de recursos e artesãos para formar o monte de compras. Toda vez que um jogador pega as cartas de uma Tenda que tenha pelo menos uma carta de Bastet, ele recebe 3 pontos, pega a estátua de Bastet e a coloca ao lado de sua pirâmide, mesmo que a estátua já estivesse com outro jogador - se a estátua já estava com ele, ele ganha 3 pontos adicionais, para um total de 6. No início do turno de cada jogador, se ele estiver com a estátua de Bastet, ele ganha imediatamente 3 pontos.

A quarta e última seria Architects from Far Away, que tinha 4 cartas de Arquitetos, que, curiosamente, eram cada uma uma meta estendida de um valor diferente. As quatro cartas são colocadas com a face para baixo ao lado da pedreira, sempre uma a menos que o total de jogadores na partida, escolhidas aleatoriamente. Quando Cleópatra andar para a frente pela primeira vez (ou seja, quando a primeira categoria de peças for concluída), ocorre uma aposta com as mesmas regras da Oferenda ao Grande Sacerdote; o jogador que ofertar a maior quantidade de pontos poderá olhar as cartas dos Arquitetos e escolher uma, então o segundo e então o terceiro (se isso for possível) - o jogador que ofertar a menor quantidade de pontos, assim como jogadores que não ofertarem pontos, não terá direito a escolher um Arquiteto. Cada carta de Arquiteto é mantida próxima à pirâmide do jogador que a escolheu, e cada uma delas tem um efeito de uso único, devendo ser removida do jogo após usada: a Arquiteta Grega deve ser usada quando o jogador visitar a Pedreira, e permite que ele use cartas corrompidas para pagar pelas peças sem receber amuletos de corrupção; a Arquiteta Gaulesa deve ser usada quando o jogador visitar o Mercado, e permite que ele, no fim desse turno, mantenha todas as cartas que tem em sua mão sem receber amuletos de corrupção; o Arquiteto Babilônico deve ser usado quando o jogador for visitar o Mercado, e permite que ele pegue cartas de duas Tendas, com uma delas obrigatoriamente tendo que ser a que tem menos cartas (à escolha do jogador se for mais de uma); e o Arquiteto Romano deve ser usado quando o jogador for pedir ajuda aos Adoradores de Sobek, permitindo que ele use uma das fichas sem pagar seu custo.
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