No final de 2020, eu decidi que, em 2021, faria uma série mensal de posts sobre pilotos de Fórmula 1, chegando até a fazer uma lista com 12 pilotos que já foram campeões mundiais, sobre os quais eu escreveria os posts. Não me lembro bem o que aconteceu, mas eu acabei abandonando essa ideia e escrevendo só quatro posts - sobre Mario Andretti, Alain Prost, Niki Lauda e Graham Hill - os quais publiquei ao longo do ano. Essa semana, fui arrumar uns papéis e achei a tal lista - sim, eu ainda anoto muita coisa em papel, pra poder consultar rapidamente quando o note não estiver ligado - e fiquei com vontade de escrever sobre mais um deles. Não digo que escreverei sobre todos os oito que ficaram faltando, mas esse tem uma história interessante, sobre a qual eu gostaria de escrever. Hoje é dia de
Jochen Rindt no átomo!
Karl Jochen Rindt nasceu em 18 de abril de 1942 em Mainz, Alemanha, filho de uma tenista austríaca com um advogado alemão; ele tinha um meio-irmão, Uwe, fruto de um primeiro casamento de sua mãe, e a principal fonte de renda da família era um moinho que produzia temperos, o qual Rindt herdou e usou para financiar sua carreira no automobilismo. Os pais de Rindt morreriam em decorrência de um bombardeio aliado durante a Segunda Guerra Mundial quando ele tinha um ano e meio de idade, e ele e Uwe seriam levados para serem criados por seus avós maternos, na cidade de Graz, Áustria. Rindt jamais se naturalizaria austríaco, permanecendo um cidadão alemão até o fim de sua vida, mas, na hora de começar sua carreira no automobilismo, preferiria correr como austríaco. Uma vez, ao ser perguntado se se sentia mais alemão ou austríaco, ele diria que "se sentia europeu".
Rindt foi uma criança agitada, que não parava quieta e estava sempre envolvido em atividades arriscadas; seu comportamento faria com que ele fosse seguidamente expulso das escolas nas quais estava matriculado, e, quando ele tinha 14 anos, talvez por já não haver nenhuma escola em Graz que o aceitasse, seus avós o mandariam para Londres, para que ele concluísse seus estudos e, de quebra, aprendesse inglês. Em Londres, Rindt aprenderia a dirigir sozinho, mas seria jovem demais pra tirar carteira de motorista, de forma que só poderia dirigir escondido. Ao retornar à Áustria durante as férias escolares, ele quebraria o fêmur esquiando, próximo à cabeça do osso, e a cicatrização deixaria sua perna esquerda quatro centímetros mais curta que a direita, o que faria com que ele mancasse pelo resto da vida; mesmo com a perna engessada, ele dirigiria escondido, levando seus amigos a eventos noturnos da cidade. Aos 16 anos, ele ganharia uma motoneta, que usaria para desafiar os amigos para corridas em pistas de motocross. Aos 18, ele ganharia seu primeiro carro, um fusca com mais de dez anos de uso, e só conseguiria tirar a carteira de motorista graças à influência política de seu avô, já que ele havia sido parado pela polícia nada menos que oito vezes dirigindo abaixo da idade apropriada - a última delas na véspera de seu aniversário de 18 anos.
Rindt decidiria definitivamente ser piloto de automobilismo em 1961, quando ele e alguns amigos de escola, incluindo o também futuro piloto Helmut Marko, conseguiriam ingressos para assistir o Grande Prêmio da Alemanha, em Nürburgring. Naquele mesmo ano, ele decidiria se inscrever em uma corrida amadora que ocorreria no autódromo de Zeltweg, na Áustria, dirigindo o carro de sua avó, um Simca Monthléry. Rindt perderia o prazo, e só conseguiria correr porque um dos comissários da corrida era nascido em Graz e conhecia sua família. Ele acabaria desclassificado porque, ao ser advertido por direção perigosa, não se encaminharia aos boxes para pagar a punição; após a desclassificação, ele alegaria que não conhecia as regras. Rindt se inscreveria em várias corridas com o Simca da vovó, sempre sem conseguir bons resultados; o dono de uma concessionária da Alfa Romeo em Graz, entretanto, veria que ele tinha talento, e ofereceria vender para ele um Alfa Romeo GT 1300 preparado para corridas a preço de fábrica, abrindo mão de seu lucro em troca de publicidade. Com esse Alfa, Rindt conseguiria oito vitórias ao longo de 1961 e 1962.
Em 1963, o piloto Kurt Bardi-Barry, que também era dono de uma agência de viagens, ofereceria a Rindt uma vaga em sua equipe na Fórmula Júnior, categoria de carros baratos que tinha provas em vários países europeus. Dirigindo um Cooper T67, em sua primeira prova, em Vallelunga, Itália, Rindt faria a pole position, mas terminaria a corrida em segundo, atrás justamente de Barry. Na segunda prova, em Casenatico, também na Itália, Rindt conseguiria a vitória com uma manobra ousada: após um acidente, uma ambulância entraria na pista, e todos os pilotos diminuiriam para que ela passasse - menos Rindt, que ultrapassaria não somente os demais pilotos como também a própria ambulância, que ainda estava em movimento, o que, de alguma forma, não foi considerado ilegal. Nesse campeonato, Rindt ganharia a fama de piloto extremamente rápido porém irresponsável, inclusive quase atropelando um grupo de espectadores durante uma prova de rua em Budapeste, Hungria.
No ano seguinte, a Fórmula Júnior seria dividida em duas categorias, a Fórmula 3, com regulamento mais restrito, e a Fórmula 2, que permitiria o uso de carros de Fórmula 1 dos anos anteriores. Barry optaria por seguir na Fórmula 2, usando carros Brabham BT10 (os usados na Fórmula 1 em 1963) com motores Cosworth, considerados lentos e de performance inconsistente, mas os únicos que ele podia pagar. Rindt seria convidado para ser novamente seu colega de equipe, estreando em Aspern, Áustria, em abril de 1964, abandonando a corrida com problemas mecânicos. Na corrida seguinte, em Crystal Palace, Inglaterra, entretanto, ele faria uma exibição de gala, ganhando a prova com Graham Hill chegando em segundo; ao ser perguntado como havia conseguido um desempenho tão bom com um motor Cosworth, ele responderia que "deixava para frear dois metros mais à frente". Esse resultado renderia um convite para as 24 Horas de Le Mans, onde ele dividiria uma Ferrari 250LM da equipe North American Racing Team com o inglês David Piper; a dupla abandonaria após apenas uma hora, com um problema em um duto de óleo.
A boa performance de Rindt na Fórmula 2 e em Le Mans também renderia um convite para que ele estreasse na Fórmula 1, no Grande Prêmio da Áustria, em Zeltweg, pela equipe Rob Walker Racing Team, que usava carros Brabham BT11 (os do ano corrente) e motores BRM, muito mais potentes. Rindt faria uma boa corrida, mas abandonaria após 58 das 105 voltas, com um problema na barra de direção. Sua pilotagem seria tão boa, porém, que a equipe Cooper o contrataria para ser segundo piloto, ao lado do neozelandês Bruce McLaren, na temporada completa de 1965, na qual, em dez provas, ele só não se classificaria para Mônaco, abandonaria na África do Sul, França, Holanda e México, e conseguiria duas pontuações, um quarto lugar na Alemanha e um sexto nos Estados Unidos, terminando o campeonato na 13a colocação e com contrato renovado com a Cooper para 1966.
Como muitos outros pilotos de sua época, Rindt decidiria disputar os campeonatos de Fórmula 1 e Fórmula 2 simultaneamente. Na Fórmula 2, dirigindo pela Roy Winkelmann Racing com um Brabham-Cosworth, ele seria vice-campeão em 1965, atrás do lendário Jim Clark. Rindt não disputaria a temporada de 1966, mas, em 1967, faria sua melhor temporada na categoria, vencendo cinco das dez provas e ganhando o apelido de "Rei da Fórmula 2" - uma regra que entraria em vigor naquele ano, entretanto, diria que pilotos da Fórmula 1 não podiam ser campeões da Fórmula 2, o que faria com que o título de 1967 fosse para o belga Jacky Ickx. Ele ganharia mais três provas em 1968 e mais duas em 1969, sempre pela Winkelmann; em 1970, ele decidiria se inscrever com sua própria equipe, a Jochen Rindt Racing, usando um Lotus-Ford, e teria sua última vitória na Fórmula 2 na primeira prova do ano, em Thruxton, Inglaterra. Sua última prova na Fórmula 2 seria em agosto, em Salzburgo, na Áustria, numa pista que ele mesmo ajudou a projetar.
Além de vice-campeão da Fórmula 2, em 1965 Rindt seria campeão das 24 Horas de Le Mans, mais uma vez pilotando uma Ferrari 250LM da equipe North American Racing Team, mas agora dividindo-a com o norte-americano Masten Gregory. Ambos os pilotos diriam que, antes de a corrida começar, achavam que não tinham chances, que o carro não parecia competitivo, e esperavam que ele quebrasse logo para que eles pudessem pegar o dinheiro da participação e ir para casa; uma série de circunstâncias, entretanto, acabaria levando os dois a uma improvável vitória. Para começar, na época os carros começavam estacionados ao longo da pista, e os pilotos de pé na linha de largada; a um sinal da organização, os pilotos corriam, e quem entrasse no carro primeiro largava primeiro. Rindt não foi o primeiro a entrar no carro, mas conseguiu entrar de forma que seu pé já estava no acelerador e a Ferrari estava em movimento antes de ele entrar totalmente, se sentar e afivelar o cinto, o que fez com que ele pulasse na frente. Enquanto Gregory estava pilotando, um problema de motor fez com que somente 6 dos 12 cilindros funcionassem, e ele teve de ficar parado nos boxes meia hora enquanto os mecânicos consertavam. Rindt chegou a achar que eles iriam abandonar, tirou o macacão e vestiu uma roupa para ir para casa, mas o carro votou a funcionar. Como, na época, não havia período máximo para cada piloto dirigir, Gregory falou que continuaria guiando enquanto houvesse luz natural, e Rindt assumiria durante a noite, o que ele concordou. Rindt pegaria o carro na 18a posição, e, dirigindo como um maníaco, o entregaria a Gregory, no nascer do sol, em terceiro. Gregory dirigiria todas as horas que faltavam, temeroso de que o carro fosse quebrar a qualquer momento. Não somente não quebrou, como os dois primeiros é que tiveram problemas, um com um estouro de um pneu, outro com a caixa de câmbio, fazendo com que Gregory vencesse a prova cinco voltas à frente do segundo colocado.
Rindt ainda participaria mais duas vezes das 24 Horas de Le Mans, abandonando ambas: em 1966, ao lado do inglês Innes Ireland, pilotando um Ford GT40 pela equipe Comstock Racing, ele teria um estouro de motor com três horas de prova, e, em 1967, correndo pela Porsche, em um Porsche 907 LH, ao lado do alemão Gerhard Mitter, abandonaria após 9 horas com um problema na caixa de câmbio. Em 1965, pilotando a mesma Ferrari 250LM com a qual foi campeão em Le Mans, ele ganharia, sozinho, uma prova de 500 km em Zeltweg, graças a uma estratégia inusitada: as luzes de freio não se acendiam automaticamente, sendo necessário que ele pressionasse um botão quando freasse; Rindt acionaria o botão um pouco antes de realmente frear, o que faria com que seu maior adversário, o inglês Mike Parkes, que pilotava uma Ferrari mais potente, e vinha logo atrás, tivesse de frear antes do ponto ideal, o que permitiu que Rindt se mantivesse na frente até a vitória.
Rindt também participaria das 500 Milhas de Indianápolis duas vezes, em 1967, pela Eagle, do piloto norte-americano Dan Gurney, e em 1968, pela Brabham, abandonando por quebra em ambas as ocasiões; ele detestava a pista oval e, em uma entrevista após a prova de 1968, diria que só corria lá pelo dinheiro. Em 1969, pela Lotus, ele também disputaria a Tasman Series, categoria de carros de fórmula com corridas na Austrália e Nova Zelândia; em sete provas, teria duas vitórias, dois segundos lugares e três abandonos, se sagrando vice-campeão, atrás do neozelandês Chris Amon.
Mas a carreira principal de Rindt foi mesmo feita na Fórmula 1. Em 1966, após a saída de McLaren, ele seria promovido a primeiro piloto da Cooper, que correria naquele ano com motores Maserati, bem mais potentes que os Climax do ano anterior, ao lado do norte-americano Richie Ginther, que correria apenas em Mônaco e na Bélgica; na terceira corrida, na França, o inglês John Surtees viria da Ferrari para ser o novo primeiro piloto, e Rindt voltaria a ser o segundo pelo restante da temporada - na França, terceira etapa, e no México, a última, a Cooper ainda teria um terceiro carro, pilotado, respectivamente, por Amon e pelo mexicano Moisés Solana.
O primeiro pódio de Rindt na Fórmula 1 viria na segunda corrida do ano, na Bélgica, disputada sob forte chuva. Rindt largaria em segundo, e ultrapassaria o pole Surtees, então ainda na Ferrari, na quarta volta, mas rodaria na volta 21, quando Surtees o ultrapassaria e venceria a corrida, deixando-o em segundo. Rindt também seria segundo nos Estados Unidos, atrás de Jim Clark, e terceiro na Alemanha, atrás de Jack Brabham e Surtees, pontuando também na França, Inglaterra e Itália - ele só não pontuaria em Mônaco e no México, onde abandonou. No fim, Rindt terminaria o campeonato na terceira posição, com Brabham sendo campeão pela terceira vez e Surtees chegando em segundo - Surtees abandonaria cinco das nove provas, mas, além da vitória na Bélgica e do segundo lugar na Alemanha, venceria também no México e seria terceiro nos Estados Unidos.
Em 1967, Rindt se casaria com a modelo finlandesa Nina Lincoln, filha do piloto Curtis Lincoln, a quem ele conheceria no início de sua carreira, enquanto ainda fazia corridas amadoras. Os dois ficaram noivos no ano anterior, mas, de repente, Nina devolveu o anel de noivado, dizendo não ter certeza de se queria mesmo se casar; Rindt o enviou de volta para ela com um bilhete que dizia "mantenha-o até se decidir". Nina voltaria atrás e aceitaria se casar assim que leu o bilhete, dizendo que gostava de homens que sabem o que querem. Os dois comprariam uma casa em Genebra, Suíça, e tiveram uma única filha, chamada Natasha, nascida no ano seguinte. Na Fórmula 1, com um carro menos confiável que no ano anterior, que seria alterado duas vezes ao longo da temporada, das 11 provas Rindt abandonaria oito e sequer viajaria para disputar a última, no México, completando apenas duas, na Bélgica e na Itália, chegando em quarto em ambas e terminando o campeonato em 13o lugar. Com a saída de Surtees para a Honda, Rindt seria mais uma vez promovido a primeiro piloto, começando o ano tendo como companheiro de equipe o mexicano Pedro Rodríguez, que daria lugar ao inglês Richard Attwood na oitava prova, no Canadá, e a Ickx nas duas seguintes, na Itália e Estados Unidos, voltando para ser o único carro da Cooper no México; na sexta etapa, na Inglaterra, a Cooper ainda teria um terceiro carro, com o galês Alan Rees.
Apesar do mau ano, o visível talento de Rindt faria com que, para 1968, além da proposta de renovar com a Cooper, ele recebesse convites da Brabham, Ferrari, BRM, Matra e McLaren - das principais equipes, somente a Honda de Surtees e a Lotus de Jim Clark e Graham Hill não entrariam em contato com ele. Rindt acabaria optando pela Brabham, que havia sido campeã nos dois anos anteriores, em 1967 com o neozelandês Denny Hulme e em 1966 com Jack Brabham, mas, passando por dificuldades financeiras, a equipe não conseguiria construir um carro competitivo. Tendo como colega de equipe o próprio Jack Brabham - e Gurney dirigindo um terceiro carro na quinta etapa, na Holanda - Rindt conquistaria sua primeira pole, na França, mas só conseguiria completar duas provas: a primeira do ano, disputada em 1o de janeiro na África do Sul, e a oitava, na Alemanha, em ambas terminando em terceiro lugar, o suficiente para que ele terminasse o campeonato na 12a posição. Seria em 1968 que Jim Clark perderia a vida durante uma corrida de Fórmula 2, fato que deixaria Rindt muito abalado; ao ser entrevistado sobre o assunto, ele declararia "se nem Clark estava a salvo, o que será de nós?".
A morte de Clark abriria uma vaga na Lotus, pra onde Rindt iria em 1969, ser colega de equipe de Graham Hill, campeão em 1968. Ele aceitaria a proposta pela chance de ser campeão mundial, mas confidenciaria a amigos se sentir desconfortável com a mudança, porque os carros da Lotus se envolviam em muitos acidentes - entre 1967 e 1969, foram 31, com Hill envolvido em nove, o que o levaria a comentar, em tom jocoso, "quando estou correndo e vejo minha própria roda me ultrapassar, sei que estou em uma Lotus". Em sua primeira entrevista após assinar contrato, Rindt diria "na Lotus, ou serei campeão mundial, ou morrerei".
Além de Rindt e Hill, a Lotus teria um terceiro carro durante quase toda a temporada, com o norte-americano Mario Andretti ao volante na África do Sul, Alemanha e Estados Unidos, e o inglês John Miles guiando na França, Inglaterra, Itália, Canadá e México - somente na Espanha, Mônaco e Holanda, segunda, terceira e quarta provas do campeonato, eles correriam com apenas dois carros. Em sua estreia na Lotus, na África do Sul, Rindt abandonaria com problemas na bomba de combustível, mas, na segunda prova do ano, na Espanha, ele e Hill se envolveriam ambos em acidentes gravíssimos, que poderiam ter matado os dois: na sexta volta, a suspensão traseira do carro de Hill se quebrou, fazendo com que ele se chocasse com violência contra um
guard rail, e, na vigésima, quando vinha a 225 km/h, Rindt veria a asa traseira de seu carro se soltar, o que faria com que a Lotus decolasse, passasse por cima do mesmo
guard rail no qual Hill havia batido, e atingisse com violência o carro de Hill, que estava estacionado fora da pista, capotando em seguida. Dois fiscais de prova seriam atingidos pelos destroços, um perdendo o olho, o outro quebrando um pé, e Rindt quebraria o nariz, tendo de ficar fora da corrida seguinte, em Mônaco, onde seria substituído por Attwood.
Rindt colocaria a culpa dos acidentes no dono da equipe, Colin Chapman, o inventor do modelo de asa traseira usado nos carros da Lotus, dizendo que elas não eram seguras, causavam a quebra da suspensão traseira, e que Chapman deveria ter calculado que a asa poderia se soltar; à TV austríaca, ele diria que a asa era "uma insanidade", mas que "colocar razão na cabeça de Chapman" era impossível. Em uma entrevista subsequente, ele diria que jamais se sentia confortável dentro de uma Lotus, e que só estava na equipe por dinheiro. Essas declarações azedariam sua relação com Chapman, e, embora Rindt tenha seguido na equipe em 1969 e 1970, os dois pouco se falavam.
Ao retornar à temporada, na Holanda, Rindt faria várias apresentações memoráveis, mas seria traído pela pouca confiabilidade do carro, abandonando lá e na França. Na Inglaterra, ele estava disputando o primeiro lugar com o escocês Jackie Stewart, e poderia ter vencido, mas teve de parar nos boxes porque parte do assoalho do carro havia se soltado e estava roçando nos pneus, chegando em quarto. Rindt abandonaria mais uma vez na Alemanha, e, na Itália, estaria envolvido naquela que é considerada por muitos como a chegada mais incrível da Fórmula 1: na última volta, Rindt, Stewart, McLaren e o francês Jean-Pierre Beltoise entraram na última curva juntos, com Stewart vencendo a prova apenas oito centésimos à frente de Rindt, que chegaria nove centésimos à frente de Beltoise, que bateria McLaren por apenas dois centésimos, sendo essa a diferença mais apertada entre os quatro primeiros na história da categoria. Ele ainda seria terceiro no Canadá antes de finalmente conseguir sua primeira vitória na Fórmula 1, nos Estados Unidos, que infelizmente seria eclipsada por mais um grave acidente envolvendo Hill. Se tivesse um carro mais confiável, Rindt, que terminou o ano abandonando mais uma vez, no México, poderia ter disputado o título com Stewart, que se sagrou campeão naquele ano; ele acabaria terminando o campeonato apenas em quarto, atrás de Stewart, Ickx e McLaren.
Em 1970, ainda se recuperando de seu acidente nos Estados Unidos, Hill seria colocado por Chapman na equipe Rob Walker, que era uma espécie de segunda equipe da Lotus, correndo com carros do ano anterior, o que faria com que Rindt fosse promovido a primeiro piloto, ao lado de Miles; mais uma vez, em quase todo o campeonato a Lotus teria três carros na pista, com o espanhol Álex Soler-Roig dirigindo o terceiro carro na Espanha, Bélgica e França, e o brasileiro Emerson Fittipaldi o guiando na Inglaterra, Alemanha, Áustria e Itália - somente na África do Sul, Mônaco, Holanda, Canadá, Estados Unidos e México a equipe correria com dois carros, mas, nas duas últimas, os pilotos seriam Emerson e o sueco Reine Wisell.
Rindt começaria o ano abandonando a corrida sul-africana com problemas de motor faltando apenas oito voltas para o final, quando estava em quarto. Na segunda prova, na Espanha, a Lotus estrearia um carro revolucionário, o Lotus 72, com dois radiadores e várias outras novidades, mas que não se mostraria confiável, quebrando na nona volta. O Lotus 72 voltaria para a fábrica para modificações, e Rindt teria que usar o Lotus 49, do ano anterior, na terceira prova, em Mônaco, mas a equipe só tinha pneus próprios para o 72, o que faria com que o 49 ficasse quase impossível de dirigir; Rindt não se abalaria e faria o que seu engenheiro chamaria de "a corrida de sua vida", largando em oitavo e conseguindo ultrapassagens improváveis na estreita pista do principado, até Brabham sair da pista na última volta e permitir que Rindt conseguisse sua segunda vitória.
Nos treinos para a corrida seguinte, na Bélgica, Rindt usaria o 72, mas, ainda com sérios problemas de dirigibilidade, optaria por usar o 49 na corrida, abandonando com problemas de motor. O 72 finalmente seria consertado, e garantiria a Rindt quatro vitórias seguidas, na Holanda, França, Inglaterra e Alemanha; os problemas viriam de outros lados, entretanto: na Holanda, o inglês Piers Courage morreria em um incêndio após um acidente, o que deixaria Rindt extremamente abalado; na França, ele não conseguiria usar o capacete totalmente fechado, achando o calor insuportável, e optaria por usar um capacete antigo, aberto na frente, sendo atingido por uma pedra que cortaria sua bochecha; e na Inglaterra ele quase seria desclassificado por uma suposta irregularidade na asa traseira, só tendo sua vitória confirmada após os comissários deliberarem por três horas.
O Grande Prêmio da Alemanha, pela primeira vez, seria disputado em Hockenheim, após os pilotos pedirem modificações na pista de Nürburgring em nome da segurança. Rindt travaria uma grande batalha com Ickx, com várias trocas de liderança, e, após mais uma vitória, poderia ser campeão antecipado na corrida seguinte, caso vencesse novamente. Essa corrida não somente ocorreria na Áustria, mas também em uma nova pista, a Österreichring, que ele mesmo havia ajudado a projetar. Para delírio da torcida austríaca, Rindt conseguiria a pole position, mas o título seria adiado, já que ele teria de abandonar com problemas de motor após 21 das 60 voltas, com Ickx conseguindo a vitória e mantendo a chance de ser campeão. Rindt evidentemente não sabia, mas essa acabaria sendo sua última corrida na Fórmula 1.
A corrida seguinte seria na Itália, em Monza, pista conhecida pela alta velocidade. Como a Ferrari de Ickx era cerca de 16 km/h mais rápida que a Lotus, Chapman optaria por uma estratégia arriscada, mas permitida pelo regulamento: tirar as asas do carro para diminuir o arrasto. Miles reclamou da decisão, dizendo que era impossível fazer o carro andar em linha reta, mas Rindt não disse nada, e ainda comentou nos boxes que estava mais rápido que as Ferraris na reta. Durante o segundo treino livre, quando estava prestes a fazer a curva Parabólica, Rindt saiu da pista a 330 km/h, batendo no muro com violência e morrendo instantaneamente. A investigação concluiria que o acidente em si foi causado não pela falta da asa, mas por uma falha nos freios dianteiros, e que não foi o impacto que matou o piloto e sim um evento bizarro: após o acidente com Courage, Rindt passaria a usar um cinto de segurança de quatro pontos, menos seguro que o de cinco pontos já existente, mas mais fácil de o piloto soltar no evento de um incêndio; com o impacto da batida, o piloto escorregaria para a frente, e o cinto de segurança cortaria sua garganta.
Quando Rindt morreu, ele ainda não estava com o título garantido, mas o único que poderia tirá-lo dele era Ickx, que abandonaria na Itália com problemas de embreagem. Ickx venceria no Canadá, mas, nos Estados Unidos, precisaria de no mínimo um terceiro lugar para manter suas chances. Ele acabaria chegando em quarto, muito por mérito de Emerson, que de certa forma substituiria Rindt na Lotus e manteria o título com a equipe britânica ao ganhar a prova. Ickx ainda ganharia a corrida no México, mas não seria o suficiente, terminando o campeonato com 40 pontos contra 45 de Rindt. Assim, o austríaco Jochen Rindt se tornaria o primeiro, e todos esperamos único, campeão póstumo da Fórmula 1, com sua esposa Nina recebendo o troféu em seu nome, em uma cerimônia em Paris em novembro de 1970.
Apesar de conhecido como um piloto irresponsável - até mesmo fora das pistas, sendo famoso por fazer
drifting com seu Jaguar nas ruas da capital austríaca, Viena, e tendo sido extremamente criticado por capotar um Mini Cooper com sua esposa grávida dentro durante uma apresentação em Grosshöflein, também na Áustria - Rindt era árduo defensor de mudanças na Fórmula 1 para garantir mais segurança aos pilotos, ao ponto de ser alvo de críticas de seus colegas e da imprensa especializada, que diziam que suas preocupações eram exageradas. Ele se tornaria grande amigo de Stewart, a quem conheceria em 1964 na Fórmula 2, também grande defensor de maior segurança, e, junto com o sueco Jo Bonnier, formava um trio pejorativamente conhecido como "Conexão Genebra", já que os três tinham casa na cidade suíça, que viviam, por assim dizer, enchendo o saco dos organizadores das provas, apontando onde eles achavam que faltava segurança. Infelizmente, mesmo com a morte de Rindt, ainda levaria anos para que verdadeiras medidas de segurança fossem implementadas, e muitos outros pilotos perderiam a vida em acidentes evitáveis, incluindo o brasileiro Ayrton Senna.
Rindt seria um dos primeiros pilotos a conseguir lucrativos contratos individuais de patrocínio, numa época em que os principais patrocínios iam para as equipes, com os pilotos muitas vezes tendo de pagar para correr. Parte desse sucesso se daria através de uma amizade com Bernie Ecclestone, que ele conheceria enquanto pilotava para a Cooper. Rindt jamais contrataria Ecclestone oficialmente como empresário, mas permitia que ele buscasse contratos de publicidade, o que ele dizia fazer em nome da amizade; o modelo de contrato estabelecido por Ecclestone para obter patrocínios para Rindt seria considerado tão bem sucedido que acabaria sendo imitado por muitos outros pilotos e seus empresários nos anos seguintes. A amizade entre os dois era tão grande que, no dia do acidente, não seria alguém da Lotus, mas Ecclestone quem chegaria primeiro ao carro destroçado e carregaria o capacete de Rindt de volta para os boxes - seria Ecclestone quem negociaria a ida de Rindt para a Lotus, e o convenceria a mudar de equipe mesmo ele querendo continuar na Brabham, de forma que muitos acham que ele se sentiu culpado pelo destino do piloto. A filha de Rindt, Natasha, manteria a amizade com Ecclestone, e trabalharia a seu lado na FOM até ele se aposentar da função.
O sucesso de Rindt no automobilismo ajudaria a popularizar o esporte na Áustria, o que levaria ao surgimento de uma nova e bem sucedida geração de pilotos, da qual faria parte Niki Lauda; até hoje, ele é considerado o principal responsável pelo interesse dos austríacos no automobilismo, e os quatro títulos que ele e Lauda ganharam, pelo surgimento de novos pilotos austríacos todos os anos. Em 1965, Rindt criaria a primeira exposição de carros de corrida da Áustria, a Jochen Rindt Show, realizada anualmente em Viena com a presença de pilotos e chefes de equipe da Fórmula 1; após sua morte, em 1970, a exposição passaria para a cidade de Essen, na Alemanha, sendo realizada até hoje com o nome de Essen Motor Show. Ele também seria o apresentador de um programa mensal de TV na Áustria, chamado
Motorama, no qual eram apresentados os principais eventos do automobilismo naquele mês, dicas para viajar e para dirigir em estradas do país, e entrevistas feitas pelo próprio Rindt com outros pilotos. Mas, para muitos, o legado mais duradouro de Rindt seria que ele ajudaria a projetar os dois principais circuitos da Áustria, o Salzburgring, em Salzburgo, e o Österreichring, em Spielberg, hoje chamado Red Bull Ring, etapa do Campeonato Mundial de Fórmula 1 entre 1970 e 1987, entre 1997 e 2003 e ininterruptamente desde 2014.