segunda-feira, 11 de agosto de 2014

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Olimpíadas (XXVI)

Para quem não acompanha o átomo, ou chegou há pouco e ainda não leu tudo o que ficou para trás - eu sei, é muita coisa - convém dizer que, lá em 2006, eu decidi fazer uma série de posts sobre as Olimpíadas, motivado pelas Olimpíadas de Inverno de Turim, que aconteceram justamente naquele ano. E, evidentemente, tive de terminar essa série de posts falando justamente dos Jogos de Turim, que eram os últimos que haviam sido realizados na época. No mesmo post em que falei sobre eles, fiz também uma seção chamada "O Futuro", na qual comentei por alto os Jogos vindouros - Pequim 2008, Vancouver 2010 e Londres 2012, aqueles cujas sedes já haviam sido escolhidas até então.

Não me lembro agora, passados tantos anos, se minha ideia original era continuar com essa série de posts conforme mais edições fossem sendo realizadas ou deixá-la por isso mesmo, mas me lembro que, em 2008, após as Olimpíadas de Pequim, não me animei a fazer um novo post. Em 2010, após as Olimpíadas de Inverno de Vancouver, sim, e, na época, acabei optando por uma solução criativa: substituí a seção "O Futuro" do até então último post por um texto sobre as Olimpíadas de 2008, e, no novo post, além de falar das Olimpíadas de Inverno de 2010, fiz uma nova seção "O Futuro", mais uma vez falando sobre os Jogos vindouros cujas sedes já haviam sido escolhidas até então - Londres 2012, Sochi 2014 e Rio de Janeiro 2016. Lembro-me, inclusive, que "transplantei" o último parágrafo de um post para o outro, embora tenha refeito praticamente todo o restante.

Pois bem, a partir desse momento, aparentemente ficou estabelecido que, assim como a série dos Sentai, a das Olimpíadas ganharia novos posts conforme novas edições fossem sendo realizadas. O único problema é que não me agradou muito essa ideia de ter de ficar modificando o último post e reescrevendo a seção "O Futuro" toda vez que eu fosse fazê-lo. Por conta disso, após as Olimpíadas de 2012, mais uma vez não tive vontade de voltar à série, deixando-a do jeito que estava.

Só que as Olimpíadas de Inverno têm alguma coisa que me faz querer escrever sobre Olimpíadas depois de assisti-las. Desde que os Jogos de Sochi terminaram que eu estou com essa vontade, que acabou aumentando depois que eu fiz o post sobre os Esportes Paralímpicos de Inverno. Como, novamente, já temos duas edições de Olimpíadas para comentar, acabei, dessa vez, decidindo pelo óbvio: ao invés de reescrever o post anterior, incluindo Londres 2012 nele, e começar esse aqui por Sochi 2014, nesse aqui eu vou falar sobre essas duas edições, e o anterior vai ficar do jeito que está. Tudo bem que "O Futuro" não é mais tão futuro assim, mas na época em que eu escrevi era, então eu acho que isso é que vale.

Assim, hoje é dia de mais Olimpíadas no átomo! E, daqui a quatro anos, se ainda existir átomo, provavelmente teremos mais um post dessa série.

Londres 2012

Em 2012, Londres se tornaria a primeira cidade a sediar nada menos que três edições dos Jogos Olímpicos - tendo sido as outras duas realizadas em 1908 e 1948. Para isso, ela venceria, na votação do COI, oito outras representantes: Havana, Istambul, Leipzig, Madri, Moscou, Nova Iorque, Paris e Rio de Janeiro. No início do processo de escolha, Paris era a favorita, e parecia que seria ela a primeira a hospedar três Olimpíadas - já que já havia sediado o evento em 1900 e 1924 - mas, durante o processo, dois pontos pesaram a favor da capital britânica: primeiro, para azar dos franceses, bem no dia da visita da comissão do COI a Paris, uma grande greve paralisou a cidade, o que impossibilitou que tudo fosse inspecionado como devido; segundo, Londres havia nomeado como chefe do Comitê Organizador Local (LOCOG) um homem fortemente ligado ao esporte e às Olimpíadas: Sebastian Coe, vencedor de duas medalhas de ouro e duas de prata no atletismo, uma de cada em 1980 e em 1984.

Com carisma e um plano austero e bem estruturado, Coe conseguiria convencer os delegados do COI de que Londres era a melhor opção - a grande vantagem que Paris tinha no início diminuiu a cada visita, e, no final, Londres venceria a contenda por apenas quatro votos de diferença. Infelizmente, porém, a comemoração dos londrinos foi curta: apenas um dia após o anúncio da escolha da sede, uma série de atentados a bomba no metrô mataria 52 pessoas e deixaria mais de 700 feridas. Oficialmente, os atentados não estavam diretamente ligados à escolha da cidade como sede, mas é claro que planejavam se aproveitar da exposição dada pela mídia.

Problemas políticos à parte, a Grã-Bretanha fez todo o possível para que os Jogos de 2012 entrassem para a história como os melhores de todos os tempos. Era prioridade absoluta para o LOCOG que não somente o evento em si fosse um sucesso, mas que gastasse o mínimo possível e deixasse um verdadeiro legado para a cidade. Parte dessa estratégia previa revitalizar a região leste da cidade, onde seria construído o Parque Olímpico, que ocuparia partes anteriormente degradadas dos bairros de Stratford, Bow, Leyton e Hackney Wick. O Parque Olímpico contaria não somente com o Estádio Olímpico em si, mas também com o Centro de Imprensa; o velódromo; o Centro de Esportes Aquáticos, onde seriam disputadas as provas de natação, nado sincronizado, polo aquático e saltos ornamentais; um ginásio chamado Copper Box ("caixa de cobre"), dedicado ao handebol; o complexo de Eton Manor, usado para treinamentos de esportes aquáticos, mas que depois dos Jogos virou um conjunto de quadras para hóquei e tênis; uma torre de observação que servia como atração turística; e a Vila Olímpica, que, após os jogos, se transformaria em um novo bairro residencial, o East Village. O projeto original ainda previa um ginásio de vôlei e um de esgrima, que não chegaram a ser construídos devido a problemas de orçamento, sendo esses esportes realocados para as já existentes Earl Courts e ExCel London, respectivamente; em compensação, seria construída no Parque Olímpico um campo de hóquei e uma arena de basquete (apelidada "The Marshmallow" devido à sua aparência) temporários, que foram desmontados e tiveram suas partes vendidas ou doadas após o fim dos Jogos.

Os Jogos de Londres seriam realizados entre 27 de julho e 12 de agosto de 2012. No início, essa data gerou uma certa controvérsia por coincidir com o Ramadã, mês sagrado durante o qual os muçulmanos não podem comer nem beber nada do nascer até o pôr do sol; vários Comitês Olímpicos de países islâmicos chegaram a solicitar que a data fosse alterada, alegando que seus atletas estariam em desvantagem por terem de praticar esportes sem a alimentação ou hidratação adequada. Após deliberar sobre a questão, o LOCOG e o COI decidiram manter a data, apoiados por um grande número de atletas muçulmanos e até mesmo por alguns Comitês Olímpicos de países islâmicos que não viam nada de mais na coincidência de datas, já que o islamismo permite que muçulmanos em viagem abram mão do jejum. Se, por esse lado, o islamismo arrumou uma certa confusão, por outro ele proporcionou uma notícia muito bem-vinda: pela primeira vez, a Arábia Saudita concordaria em enviar uma atleta mulher para o evento, o que, somado às primeiras vezes em que atletas femininas do Qatar e do Brunei obtiveram índice para participar de uma prova olímpica, fez com que, pela primeira vez na história, todos os países participantes tivessem pelo menos uma atleta do sexo feminino competindo.

E não eram poucos: nada menos que 204 países enviariam atletas para Londres, totalizando 10.568 competidores. Apenas um dos Comitês Olímpicos nacionais filiados ao COI não participou oficialmente: o das Antilhas Holandesas, grupo de ilhas no Caribe que deixou de existir enquanto entidade política independente em 2010, se dividindo em cinco outras entidades: Curaçao e Sin Maarten, agora entidades autônomas ligadas ao Reino da Holanda; e Bonaire, Saba e Sint Eustatius, agora parte do Reino da Holanda - ou seja, quem nasce lá é holandês. Atletas de Bonaire, Saba e Sint Eustatius, portanto, poderiam participar (mas não participaram, já que nenhum se classificou) como parte da delegação da Holanda, mas três atletas de Curaçao (nenhum de Sint Maarten se classificou) obtiveram autorização do COI para competir como Participantes Independentes, sob a bandeira dos anéis olímpicos, junto com um atleta do Sudão do Sul, que se tornou independente do Sudão em 2011, já que, nem Curaçao, nem o Sudão do Sul, ainda possuíam um Comitê Olímpico próprio na época da realização dos jogos.

Após a maluquice de volta ao mundo perpetrada para as Olimpíadas de 2004 e 2008, o COI pediria ao LOCOG que mantivesse o trajeto da Tocha Olímpica restrito apenas à Grécia e ao Reino Unido. Assim, o Fogo Olímpico, aceso no dia 10 de maio, visitaria 40 cidades gregas até o dia 17, quando partiria para a Inglaterra. Chegando lá dia 19, ele seguiria um roteiro pelas principais cidades de Inglaterra, Escócia, Irlanda do Norte e País de Gales, passando, ainda pelas dependências de Jersey, Guernsey e Ilha de Man, e por Dublin, capital da República da Irlanda, onde fez uma escala em nome da amizade entre os povos britânico e irlandês. A tocha chegaria a Londres no dia 21, percorrendo vários pontos estratégicos da cidade até entrar no Estádio Olímpico pelas mãos de Steve Redgrave, atleta do remo ganhador de nada menos que cinco medalhas olímpicas de ouro e uma de bronze entre 1984 e 2000. Muitos imaginaram que seria o próprio Redgrave quem acenderia a Pira Olímpica, mas os organizadores da festa haviam preparado uma surpresa: Redgrave compartilharia o Fogo Olímpico com sete jovens atletas, que usariam suas Tochas para acender uma pira formada por 204 pétalas - cada uma representando um dos países presentes aos Jogos, e tendo entrado no Estádio Olímpico junto com a delegação do país em questão durante o desfile da cerimônia de abertura.

Ao todo, o programa olímpico contou com 302 provas de 32 esportes: atletismo, badminton, basquete, boxe, canoagem, ciclismo, equitação, esgrima, futebol, ginástica artística, ginástica de trampolim, ginástica rítmica, handebol, hóquei, judô, levantamento de peso, luta olímpica, nado sincronizado, natação, pentatlo moderno, polo aquático, remo, saltos ornamentais, taekwondo, tênis, tênis de mesa, tiro com arco, tiro esportivo, triatlo, vela, vôlei e vôlei de praia (clique aqui para ver todas as provas do programa). Em relação aos Jogos anteriores, deixaram o programa o beisebol e o softbol, considerados pelo COI de pouca procura pelo público; em compensação, retornaria ao programa, após uma ausência de 88 anos, o torneio de duplas mistas do tênis, usando um sistema especialmente criado pela ITF baseado em seu ranking para definir quem seriam as duplas representantes de cada nação - já que, nos torneios de duplas mistas do circuito de tênis, o normal é que cada competidor seja de um país diferente, sendo raríssimas as duplas nas quais ambos são do mesmo país, e nenhuma delas sendo uma dupla de ponta. Mas a principal novidade do programa de Londres foi a estreia do boxe feminino, o que fez com que, pela primeira vez, as mulheres pudessem competir em todos os esportes do programa - mas os homens, diga-se de passagem, seguiram sem conseguir fazê-lo, já que a ginástica rítmica e o nado sincronizado só possuem torneios femininos. Também vale registrar que, para que o torneio de tiro pudesse ser realizado, a Coroa Britânica teve de dar uma permissão especial ao COI, já que as leis do Reino Unido proíbem torneios e treinamentos de tiro em todo o território nacional.

Durante os Jogos, os olhos do mundo estiveram em dois atletas que já haviam brilhado em 2008: o jamaicano Usain Bolt, do atletismo, e o norte-americano Michael Phelps, da natação. Phelps, que em Pequim já havia se tornado o atleta com mais medalhas de ouro em toda a história das Olimpíadas - além de o atleta com o maior número de ouros em uma só edição dos Jogos - ampliou ainda mais seu plantel, conquistando mais quatro medalhas de ouro e duas de prata. O nadador, na época com 27 anos, anunciara que, após os Jogos, iria se aposentar, o que aumentou ainda mais o interesse do público por ingressos das provas das quais ele iria participar. Ao encerrar sua carreira, Phelps contava com nada menos que 18 medalhas de ouro, 2 de prata e 2 de bronze, mais do que qualquer outro atleta do planeta.

Curiosamente, a opinião geral era a de que, Phelps à parte, a natação de 2012 não teria tanto espetáculo quanto a de 2008 - principalmente devido à proibição pela FINA do uso do maiô LZR Racer, considerado o principal responsável pelas sucessivas quebras de recordes dos anos anteriores. Mesmo sem esse maiô, porém, Londres viu a quebra de nove recordes mundiais e 16 recordes olímpicos, o que mostra que, além da vestimenta, o treinamento dos atletas e outros fatores - como a modernidade das piscinas, que evita marolas, por exemplo - também está contribuindo para que o ser humano seja cada vez mais veloz na água. Outros destaques da natação de Londres foram a norte-americana Missy Franklin, considerada o "Michael Phelps do feminino", vencedora de quatro medalhas de ouro e uma de bronze; e a lituana Ruta Meilutyte, campeã dos 100 metros nado peito aos 15 anos de idade.

Assim como Phelps, Bolt também não decepcionou, mais uma vez ganhando os ouros dos 100 e dos 200 metros, além de ajudar a Jamaica a conseguir o ouro e a quebra do recorde mundial no revezamento 4 x 100 metros. Muitos apostavam que Bolt também quebraria o recorde mundial nos 100 metros, mas nessa prova ele quebraria "apenas" o recorde olímpico. Tanto nos 100 quanto nos 200 metros, o medalhista de prata - que chegou 12 centésimos atrás de Bolt em ambas as provas - foi outro jamaicano, Yohan Blake, o que mostra que a escola de velocistas da Jamaica continua produzindo grandes talentos. Também merece destaque o atleta Félix Sánchez, da República Dominicana, ouro nos 400 metros com barreiras de 2004, que, após uma participação desastrosa em Pequim, onde terminou em 22o lugar, retornou das cinzas para vencer novamente a prova em Londres, aos 34 anos de idade. Dentre os "locais", o mais festejado foi Mo Farah, nascido na Somália mas filho de pais britânicos, que competiu pela Grã-Bretanha e conseguiu o ouro dos 5.000 e dos 10.000 metros.

Dentre as mulheres, a musa russa Yelena Isinbayeva, infelizmente, não correspondeu às expectativas, terminando apenas com o bronze em sua prova de salto com vara, alcançando apenas 4,7 metros - bem menos do que ela costuma saltar em seus treinamentos. Outra favorita, a brasileira Fabiana Murer, também não foi bem, sequer se classificando para a final, e terminando a prova na 15a colocação - mesma posição de outra brasileira, Maurren Maggi, medalhista de ouro no salto em distância de 2008, mas que sequer se classificou para a final de 2012. Os ouros tanto do salto com vara quanto do salto em distância acabariam ficando com duas norte-americanas que sequer estavam dentre as favoritas, Jenn Suhr e Brittney Reese, respectivamente. Merecem destaque entre as mulheres a neozelandesa Valerie Adams, do arremesso de peso, que conquistou sua segunda medalha de ouro seguida na modalidade, e a britânica Jessica Ennis, campeã do heptatlo.

Os Estados Unidos, mais uma vez, garantiram os ouros masculino e feminino do basquete - no caso do feminino, o quinto seguido - bem como o do futebol feminino - o terceiro seguido - derrotando, na final, o então campeão mundial Japão, que havia eliminado o Brasil nas quartas de final. No vôlei de praia, as também norte-americanas Misty May-Treanor, 34 anos, e Kerri Walsh Jennings, 33, fizeram história ao conseguir seu terceiro ouro olímpico seguido. E o ciclista e superstar britânico Bradley Wiggins levou o público à loucura ao vencer a prova de estrada contra o relógio - o ciclismo, aliás, foi um dos esportes que mais deu medalhas para os anfitriões, com um total de 8 ouros, 2 pratas e 2 bronzes.

Dois esportes merecem destaque não somente pelos competidores, mas também pelos locais de competição: o tiro com arco foi disputado em stands temporários montados no campo do Lord's Cricket Ground, talvez o mais famoso e emblemático clube de críquete do planeta; e o torneio de tênis seria disputado no All England Club, em Wimbledon, sede do famoso Grand Slam desse esporte - tendo sido, aliás, a primeira vez em que o tênis olímpico foi disputado sobre piso de grama desde sua reintrodução ao programa em 1988. Os Estados Unidos levariam o ouro nas simples femininas, com Serena Williams, nas duplas femininas, com Serena e sua irmã Venus, e nas duplas masculinas, com os irmãos Mike e Bob Bryan, mas, no masculino, o ouro ficaria em casa com a vitória do britânico Andy Murray, que faria uma campanha impecável, derrotando o sérvio Novak Djokovic na semifinal e o suíço Roger Federer na final - o atual medalhista de ouro e favorito ao título, o espanhol Rafael Nadal, desistiu de participar devido a uma lesão no joelho. Nas recém-ressuscitadas duplas mistas, o ouro ficaria com a dupla da bielorrússia, Max Mirnyi e Victoria Azarenka, que derrotariam Murray e Laura Robson na final.

O Brasil enviou para Londres 258 atletas, sendo 136 homens e 122 mulheres. O objetivo, mais uma vez, era quebrar o recorde de medalhas de 1996, quando conquistamos 15, sendo 5 de ouro. No total, o objetivo foi alcançado, com o Brasil conseguindo 17 medalhas; apenas 3 delas, entretanto, foram de ouro, com outras 5 de prata e 9 de bronze.

Uma das medalhas de ouro seria uma grande surpresa: Artur Zanetti, nas argolas, conquistaria a primeira medalha da ginástica olímpica brasileira com uma atuação impecável - desdenhada pelo técnico do chinês Chen Yibing, que ficou com a prata por uma diferença de 100 pontos, e resolveu dizer que os juízes haviam roubado a favor do brasileiro, declaração considerada absurda por vários especialistas na modalidade, que exaltaram a apresentação de Artur. A segunda medalha de ouro não foi exatamente uma surpresa, mas foi histórica: Sarah Menezes, na categoria até 48 Kg do judô, se tornaria a primeira brasileira a subir no degrau mais alto do pódio no judô feminino. Já a terceira não teria absolutamente nada de surpresa: a seleção de vôlei feminino, que mesclava atletas já consagradas como Sheilla, Paula Pequeno, Fabiana, Fabi, Thaísa e Jaqueline - todas presentes na conquista de 2008 - a revelações como Tandara, Fernanda Garay e Natália, começaria a campanha do bi olímpico com um susto, terminando a fase de grupos em quarto lugar - última posição dentre os classificados - mas, na fase de mata-mata, não tomaria conhecimento das adversárias, deixando para trás Rússia e Japão e derrotando mais uma vez os Estados Unidos na final.

Duas medalhas de ouro consideradas certas pela maioria dos torcedores - e até dos jornalistas - foram, na verdade, de prata. O campeoníssimo vôlei masculino, do técnico Bernardinho e contando com nomes como Giba, Murilo, Serginho e Dante, fez uma boa primeira fase, ganhou os dois primeiros jogos da fase final por 3 sets a 0, e parecia que faria o mesmo na final, contra a Rússia; uma atuação inspirada de Dmitriy Muserskiy, porém, virou um jogo que estava 2 a 0 para o Brasil, dando a medalha de ouro aos russos e deixando os brasileiros em segundo lugar. Já o futebol masculino, com astros como Neymar, Thiago Silva, Paulo Henrique Ganso, Alexandre Pato, Hulk e Leandro Damião, atropelou os adversários até a final, na qual perdeu por 2 a 1 para o México.

As outras medalhas de prata do Brasil vieram com a dupla de vôlei de praia Alison e Emanuel, que perderam a final para os alemães Brink e Reckermann; com o nadador Thiago Pereira nos 400 metros medley; e com o boxeador peso-médio Esquiva Falcão, no melhor desempenho de um brasileiro na modalidade, perdendo na final para Ryota Murata, do Japão.

O boxe brasileiro, aliás, está de parabéns: além da prata de Esquiva, também seriam conquistadas duas medalhas de bronze, uma pelo meio-pesado Yamaguchi Falcão, irmão de Esquiva, e uma pela peso-leve Adriana Araújo. O judô traria mais três bronzes, com Felipe Kitadai na categoria até 60 kg, Mayra Aguiar na até 78 kg, e Rafael Silva na mais de 100 kg. Juliana e Larissa, no vôlei de praia, e Robert Scheidt e Bruno Prada, na classe Star da vela, também conquistariam medalhas de Bronze.

Cesar Cielo Filho, campeão olímpico e mundial dos 50 metros estilo livre na natação, e uma das maiores esperanças de ouro do Brasil, não corresponderia, e acabaria conquistando o bronze nos 50 metros livre, atrás do francês Florent Manadou e do norte-americano Cullen Jones. E a última medalha de bronze do Brasil seria também uma das mais emocionantes: Yane Marques, atleta do pentatlo moderno, esporte do qual a maioria dos brasileiros sequer ouviu falar, superaria várias das favoritas e chegaria à última prova em primeiro lugar, mas a terminaria em terceiro, atrás da lituana Laura Asadauskaite e da britânica Samantha Murray - ainda assim, um desempenho histórico e heroico da brasileira.

Para terminar, falta falar do mascote, o simpático Wenlock. Curiosamente, o mascote, cuja face inteira é apenas um grande olho, representa uma gota de aço de uma das siderúrgicas da cidade de Bolton, e foi batizado em homenagem a Much Wenlock, cidade que, em 1850, 46 anos antes da primeira edição criada pelo Barão de Coubertin, já organizava seus próprios Jogos Olímpicos, conhecidos como Wenlock Olympian Games. Esses Jogos, aliás, existem até hoje, são disputados exclusivamente por atletas amadores, em sua maioria britânicos, e são até reconhecidos pelo COI como um evento que leva em conta os ideais do olimpismo.

Sochi 2014

Localizada na costa do Mar Negro, próxima à fronteira com a Geórgia, a cidade de Sochi é conhecida por seu clima ameno e suas belas praias. Devido a isso, no início do Século XX, ainda na época do Império Russo, Sochi era um chique balneário, onde os nobres passavam seus verões e os abastados se hospedavam em luxuosos resorts. De tão movimentada, a cidade chegou a ganhar o apelido de "Riviera Russa", em alusão à região francesa de mesmo nome.

Durante a época da União Soviética, porém, a cidade foi perdendo seu prestígio. No início, o próprio Stalin estava dentre seus mais assíduos frequentadores, e a cidade chegou a experimentar um boom de desenvolvimento, mas, conforme os anos foram passando, os que procuravam suas praias foram reduzindo de número, a maioria preferindo regiões de clima mais quente como a Crimeia. Além disso, sendo a União Soviética uma república socialista, já não haviam nobres ou abastados para injetar vultosas somas de dinheiro na economia local. Aos poucos, Sochi foi sendo abandonada, reservada apenas aos seus próprios moradores.

Após o fim da União Soviética, entretanto, Sochi ganharia uma nova chance quase sem querer: a Crimeia, destino favorito dos turistas russos, já não pertencia mais à Rússia, havendo sido "doada" para a Ucrânia pelo premiê Nikita Krushchev em 1954. Com a Rússia e a Ucrânia agora sendo dois países diferentes, os russos que desejassem passar o verão na Crimeia tinham de viajar ao exterior - com todas as dificuldades que uma viagem ao exterior proporciona, como passaportes e taxas de alfândega internacionais. Os mais ricos não se importavam, mas os não tão abastados começaram a voltar às margens do Mar Negro - e, consequentemente, a Sochi.

Diante desse quadro, a candidatura de Sochi a sede das Olimpíadas de Inverno de 2014 foi um projeto pessoal do presidente russo Vladimir Putin. Ele desejava que os mais ricos - que agora passavam suas férias na Ucrânia, Turquia e Geórgia - gastassem seus rublos dentro de seu próprio país. Sochi, com suas praias e resorts, era um local mais que apropriado, se não estivesse parada no tempo devido ao abandono de tantos anos. A realização de um importante evento internacional como as Olimpíadas poderia dar o empurrão que a cidade precisava, garantindo investimentos não somente do Governo Federal, mas também de empresas interessadas em contribuir para que a região voltasse a ser um destino turístico, obtendo lucros no futuro com sua exploração.

Ao ser escolhida, Sochi derrotaria, curiosamente, as mesmas duas oponentes que Vancouver derrotou na disputa a sede para os Jogos de 2010 - Pyoengchang, na Coreia do Sul, e Salzburgo, na Áustria - se tornando a primeira cidade russa a receber uma edição das Olimpíadas de Inverno e a primeira a receber uma Olimpíada desde Moscou, em 1980, ainda na época da União Soviética. Não foi uma escolha fácil: houve quem criticasse o fato de que quase todo o necessário para os Jogos ainda precisaria ser feito, quem argumentasse que realizar uma Olimpíada em um país governado por Putin não era uma boa ideia, e até quem levantasse o fato de que seria a primeira Olimpíada de Inverno realizada em uma cidade de clima subtropical, o que poderia prejudicar as competições; o projeto entregue pelo Comitê Organizador Local (SOOC), porém, era extremamente bem detalhado, contava com garantias sólidas do Governo Federal, e até previa o uso de máquinas de neve artificial caso o clima não colaborasse.

Os delegados do COI podem ter ficado satisfeitos com o projeto, mas grande parte do público e da imprensa, não. Uma das principais reclamações foi direcionada ao custo absurdo dos Jogos, com o orçamento inicial sendo estourado múltiplas vezes - segundo muitos, devido a esquemas de corrupção por parte de membros do governo. Com custo inicial previsto de 12 bilhões de dólares, os Jogos de Sochi acabaram custando mais de 51 bilhões, se tornando as Olimpíadas mais caras da história, considerando tanto os jogos de Verão quanto os de Inverno - antes dela, a Olimpíada mais cara havia sido a de Pequim 2008, ao custo de 44 bilhões de dólares.

Além da controvérsia dos custos, o período de preparação de Sochi para os Jogos foi marcado por três polêmicas: um protesto dos povos da etnia circássia, que alegavam que a região de Sochi havia sido palco de um massacre dos russos contra seu povo, e portanto era inadequado realizar um evento como as Olimpíadas ali; ameaças de separatistas insurgentes do Cáucaso Norte, que queriam usar as Olimpíadas como forma de forçar o governo russo a atender suas reivindicações; e um protesto de vários órgãos de imprensa, ONGs e até atletas contra a chamada "lei anti-gay", assinada em junho de 2013 e que proibia manifestações ou representações de relacionamentos homo-afetivos em todo o território russo, com a justificativa de "proteger as crianças" e a "família tradicional". Chegou a existir até mesmo uma ameaça de boicote devido a essa lei, mas que não se concretizou.

Mais uma vez, os Jogos Olímpicos passariam por todas essas controvérsias, e as Olimpíadas de Inverno de Sochi seriam realizadas entre 7 e 23 de fevereiro de 2014, contando com 98 provas de 15 esportes: biatlo, bobsleding, combinado nórdico, curling, esqui alpino, esqui cross country, esqui estilo livre, hóquei no gelo, luge, patinação artística no gelo, patinação no gelo em velocidade, patinação no gelo em velocidade em pista curta, saltos com esqui, skeleton e snowboarding (clique aqui para ver todas as provas do programa). Participariam 2.873 atletas de 88 países, incluindo 13 brasileiros, sendo 6 homens e 7 mulheres, a maior delegação já enviada pelo Brasil para uma edição das Olimpíadas de Inverno e a maior delegação presente em Sochi dentre todos os países que não possuem instalações apropriadas para treinamento de esportes de inverno dentro de seu território. Os Jogos de Sochi também seriam a primeira Olimpíada de Inverno a contar com Participantes Independentes: três atletas da Índia, cujo comitê olímpico estava suspenso por suspeita de fraude na eleição para presidente do órgão, que obtiveram permissão do COI para competir sob a bandeira dos anéis olímpicos.


Os Jogos contaram com três mascotes, um urso polar, uma lebre branca e um leopardo da neve; curiosamente, nenhum dos três tinha um nome oficial, sendo conhecidos apenas como "urso", "lebre" e "leopardo". Os três foram escolhidos através de votação popular, e essa votação contou com um fato inusitado: desde o início, um dos personagens mais populares e mais votados era um sapo azul chamado Zoich, que chegou até a virar meme nas redes sociais. Apesar de sua popularidade, Zoich não se classificou para a última rodada de votação, o que levou seu criador a reclamar que os organizadores não estavam levando a opinião pública em consideração. Após o fim da votação, porém, os organizadores revelaram que Zoich jamais foi um "concorrente real", e sim uma jogada de marketing para chamar atenção sobre o concurso.

As competições em Sochi se dividiram em dois locais: na montanha de Krasnaya Polyana ("clareira vermelha", em russo), seriam construídos o Complexo Laura de Esqui Cross-Country e Biatlo; o Parque e Resort Rosa Khutor, para esqui alpino, esqui estilo livre e snowboarding; o Centro de Saltos RusSki Gorki (um trocadilho com as palavras "russki", "russo" em russo, e "ski", esqui em inglês), para os saltos com esqui; e a pista de Sanki, para o luge, skeleton e bobsled. Já o Parque Olímpico, construído próximo à costa do Mar Negro, contava com as Arenas Bolshoi e Shayba, dedicadas ao hóquei no gelo; a Arena Adler, da patinação em velocidade; o Palácio Iceberg, da patinação artística e patinação em velocidade em pista curta; o Cubo de Gelo, do curling; e o Estádio Olímpico Fisht, para as cerimônias de abertura e encerramento; além do centro de imprensa, da Vila Olímpica e da curiosa Praça das Medalhas - diferentemente do ocorrido em outras edições dos Jogos, a entrega das medalhas não acontecia logo após as provas, e sim em uma cerimônia especial nessa Praça, no dia seguinte. Após as Olimpíadas, a Vila Olímpica se transformou em mais um resort, a Arena Shayba será desmontada e movida para ser reconstruída em alguma outra cidade russa ainda não escolhida, a Arena Adler será convertida em um pavilhão de exposições, e o Estádio Fisht se transformará em um estádio de futebol, sede do time local e que será usado na Copa do Mundo de 2018; além disso, em volta do Parque Olímpico foi construído um circuito de automobilismo, que será usado como sede do GP da Rússia de Fórmula 1 ainda esse ano. Todas essas ações foram planejadas ainda antes da candidatura, e faziam parte do projeto de revitalização de Sochi.

Visando atrair mais público para as Olimpíadas de Inverno, o COI concordaria em incluir cinco novas modalidades, sugeridas por suas respectivas federações internacionais: a patinação artística no gelo por equipes, o salto com esqui feminino, o revezamento misto do biatlo, o halfpipe do esqui estilo livre e a prova do revezamento no luge. Poucas semanas depois de incluir essas cinco, o COI anunciou que estaria incluindo mais oito por vontade própria: as provas de slopestyle do esqui e do snowboarding e o slalom paralelo e o slalom gigante paralelo do snowboarding, todos no masculino e no feminino. Essa decisão pegou de surpresa a Federação Internacional de Esqui e a Federação Internacional de Snowboarding, avisadas dias antes do anúncio oficial. A justificativa do COI para a inclusão foi a de que estes esportes são bastante populares dentre o público jovem, e o Comitê estaria querendo ampliar a audiência do evento dentre os jovens. Duas outras modalidades tiveram seus pedidos considerados, mas negados: o esqui alpino por equipes e o bandy, esporte parecido com o hóquei no gelo que havia sido esporte de demonstração nas Olimpíadas de Inverno de 1952.

A Rússia se preparou com afinco, visando o primeiro lugar no quadro de medalhas, algo que não acontecia em uma Olimpíada de Inverno desde os Jogos de 1994. O maior destaque dos donos da casa foi a equipe de patinação artística, liderada pela revelação Yulia Lipnitskaya, de apenas 15 anos, que arrebatou os juízes em sua participação na prova por equipes. Yulia ajudaria a equipe russa a conseguir o ouro nessa prova, mas, no individual feminino, seria surpreendida por outra conterrânea talentosa, Adelina Sotnikova. Nas duplas, Tatiana Volosozhar e Maxim Trankov também subiriam no lugar mais alto do pódio, e o segundo lugar também seria dos russos, com Ksenia Stolbova e Fedor Klimov. A dança no gelo, com Elena Ilinykh e Nikita Katsalapov, conseguiria uma medalha de bronze.

A Rússia também conseguiria os dois ouros do Bobsled, nas duplas com Alexandr Zubkov e Alexey Voyevoda, e no Four-Man Bob com essa dupla acompanhada de Dmitry Trunenkov e Alexey Negodaylo; e o ouro do skeleton, com Alexander Tretiakov. No luge, o masculino, com Albert Demchenko, e o revezamento misto conseguiriam a medalha de prata. Houve quem creditasse o bom desempenho dos russos nas provas de trenó à possibilidade de treinar na mesma pista que seria usada nos Jogos, enquanto atletas de outros países tiveram que treinar em outras pistas; mesmo que tenha sido esse o caso, entretanto, essa prática não é proibida pelo COI.

Dois "estrangeiros" também ajudariam a Rússia a subir no quadro de medalhas. Um deles foi Vic Wild, filho de russos nascido nos Estados Unidos, que ganharia dois ouros no snowboard, no slalom paralelo e no slalom gigante paralelo. O destaque mais curioso, porém, foi o patinador Viktor Ahn, filho de sul-coreanos, e que já havia competido em 2006 representando a Coreia do Sul. Desta vez competindo pela pátria onde nasceu, ele conquistaria três medalhas de ouro e uma de bronze na patinação em velocidade em pista curta.

No biatlo, o norueguês Ole Einar Bjørndalen se tornaria o maior medalhista da história das Olimpíadas de Inverno ao ganhar o ouro do sprint e do revezamento misto, aumentando seu total para 13 medalhas, sendo 8 de ouro, 4 de prata e 1 de bronze. Aos 40 anos, Bjørndalen estava em sua sexta Olimpíada, tendo competido pela primeira vez em 1994, e conquistado suas primeiras medalhas, um ouro no sprint e uma prata no revezamento, em 1998. A bielorrussa Daria Domracheva também seria um grande destaque do biatlo, conquistando três ouros, no sprint, na largada em massa e na perseguição.

Seguindo os passos do compatriota Bjørndalen, a também norueguesa Marit Bjørgen se tornaria a maior medalhista feminina das Olimpíadas de Inverno. Competindo no esqui cross-country, ela levaria para casa o ouro dos 15 km, dos 30 km estilo livre e do sprint por equipes, aumentando sua coleção para 10 medalhas, sendo 6 de ouro, 3 de prata e 1 de bronze, a primeira conquistada em 2002. No "outro esqui", o alpino, o que mais chamou a atenção foi um acontecimento inusitado: a eslovena Tina Maze e a suíça Dominique Gisin terminaram a prova do downhill empatadas no mesmo minuto, segundo, décimo e centésimo. Sem ter como desempatar, o COI decidiu dar uma medalha de ouro para cada uma, e não dar a medalha de prata, ficando o bronze com outra suíça, Lara Gut.

O Canadá faria a festa nos esportes coletivos, conquistando o ouro no hóquei no gelo e no curling tanto no masculino quanto no feminino, e a Holanda varreria a pista da patinação em velocidade, conquistando nada menos que 8 ouros, 7 pratas e 8 bronzes - 23 medalhas no total, sendo quatro pódios completos, ou seja, quatro provas nas quais as três medalhas foram para atletas holandeses.

Já a maior decepção dos Jogos ficou por conta do norte-americano Shaun White. Considerado por muitos como o maior atleta de snowboard do mundo, ouro em 2006 e 2010 no halfpipe, White levou uma legião de fãs a Sochi, e se tornou o atleta mais comentado das redes sociais durante o evento. Após criticar a pista do slopestyle, prova na qual tem nada menos que 13 ouros nos X-Games, White decidiria não participar da nova prova, concentrando-se para tentar mais um ouro no halfpipe. No dia da prova, durante sua apresentação, ele caiu sentado, e terminou em quarto lugar.

Série Olimpíadas

Londres 2012
Sochi 2014

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