sábado, 3 de março de 2007

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Olimpíadas (XVIII)

E vamos retornar do Carnaval com mais um post sobre as Olimpíadas!

Sarajevo 1984


Curiosamente, logo em seguida à primeira Olimpíada de Verão realizada em um país comunista, tivemos a primeira Olimpíada de Inverno realizada em um país comunista. Sarajevo, atual capital da Bósnia-Herzegovina, mas que na época ainda estava localizada na Iugoslávia, ganhou o direito a sediar os Jogos de Inverno de 1984 na reunião do COI de 1978, quando derrotou a cidade japonesa de Sapporo, e Gotemburgo, na Suécia.

O governo iugoslavo, porém, não depreendeu um esforço tão grande para mostrar ao mundo a eficiência do comunismo como os soviéticos quatro anos antes. Afinal, as Olimpíadas de Inverno eram um evento bem menos famoso, e a Iugoslávia era bem mais pobre que a União Soviética. Ainda assim, o governo gastou uma grande soma para construir o complexo de Zetra, onde ocorreriam as provas de patinação e a cerimônia de encerramento - a última de uma Olimpíada de Inverno a acontecer em um local fechado - e para reformar o complexo de Skenderija, construído na década de 50 para ser um centro cultural, mas que se tornou uma arena de hóquei com shopping center para os Jogos. Uma funcional Vila Olímpica foi construída em Mojmilo, e, para facilitar a vida dos jornalistas, foi construído uma "vila da imprensa" em Dobrinja. O povo de Sarajevo, muito empolgado com o evento, ofereceu aos atletas e turistas uma recepção calorosa, bem diferente do que muitos esperavam encontrar atrás da Cortina de Ferro.

Os Jogos de Sarajevo ocorreram entre 7 e 19 de fevereiro, e contaram com um número recorde de 49 nações participantes, representadas por 1.272 atletas, dos quais 274 eram mulheres. O número de esportes, 10 (biatlo, bobsleding, combinado nórdico, esqui alpino, esqui cross country, hóquei no gelo, luge, patinação artística no gelo, patinação no gelo em velocidade e saltos com esqui - clique aqui para ver todas as provas do programa) não se alterou, mas o de provas aumentou para 39, com a inclusão da prova de 20 km do esqui cross country feminino. Quatro provas masculinas do esqui alpino paralímpico, usadas para promover as Paralimpíadas de Inverno, também fariam parte do programa, mas, como ocorria com os esportes de demonstração, não contariam como olímpicas. O mascote dos Jogos, o lobo Vucko, foi escolhido pela população através de uma votação organizada pela população local, dentre seis opções possíveis.

Apesar de ter sido escolhida para sediar os Jogos, a Iugoslávia jamais havia ganhado uma medalha em Olimpíadas de Inverno, e corria o risco de ser o primeiro país sede a terminar uma Olimpíada sem uma medalhinha sequer. Felizmente, eles foram salvos desta vergonha por Jure Franko, de 21 anos, que conseguiu uma prata no slalom gigante do esqui alpino. Na primeira descida, Franko havia terminado na quarta posição, mas conseguiu o melhor tempo da segunda descida, terminando em segundo na soma dos tempos, e se tornando praticamente um herói nacional. Outros atletas de destaque no esqui alpino foram Bill Johnson, o primeiro norte-americano a conseguir um ouro na prova de downhill, e os gêmeos norte-americanos Phil e Steve Mahre, ouro e prata no slalom, respectivamente.

No biatlo, aconteceu uma coisa curiosa: dois atletas conseguiram, cada um, uma medalha de cada cor. O norueguês Eirik Kvalfoss foi ouro nos 10 km, prata no revezamento 4 x 7,5 km, e bronze nos 20 km; já Peter Angerer, da Alemanha Ocidental, terminou com o ouro dos 20 km, prata nos 10 km, e bronze no revezamento. No esqui cross country, o sueco Gunde Svan subiu ao pódio em todas as provas, ouro nos 15 km e no revezamento 4 x 10 km, prata nos 50 km e bronze nos 30 km.

Na patinação em velocidade, Karin Enke, da Alemanha Oriental, conseguiu dois ouros, nos 1.000 e 1.500 metros, e duas pratas, nos 500 e 3.000 metros, sendo a única atleta a subir no pódio em todas as quatro provas. A Alemanha Oriental ainda conseguiria uma segunda proeza neste esporte, ganhando nove medalhas das doze possíveis, perdendo apenas três bronzes para as soviéticas Natalya Petruseva, nos 1.000 e 1,500 metros, e Natalia Glebova, nos 500 metros. No masculino, o favorito era o soviético Sergei Khlebnikov, mas quem roubou os holofotes foi o canadense Gaétan Boucher, ouro nos 1.000 e 1.500 metros e bonze nos 500 metros, deixando Khlebnikov com duas pratas, nas duas primeiras provas.

A Alemanha Oriental ainda conseguiria os dois ouros e as duas pratas do bobsleding, as três medalhas do luge feminino, e, com Jens Weissflog, duas medalhas nos saltos com esqui, ouro na colina baixa e prata na alta. Katarina Witt, que mais tarde se tornaria um dos maiores ídolos da patinação artística da Alemanha, também conseguiu seu ouro, nas simples femininas. Graças a estes resultados, a Alemanha Oriental alcançou pela primeira vez o topo do não-oficial mas cada vez mais popular quadro de medalhas.

Nas duplas, a patinação artística poderia ter sido dominada pelos soviéticos, mas duas outras duplas resolveram se meter na festa: os norte-americanos Kitty e Peter Carruthers, prata nas duplas mistas, e os britânicos Jayne Torvill e Christopher Dean, ouro na dança no gelo. Torvill e Dean dançaram ao som do Bolero de Ravel, e sua performance foi considerada tão bela que os jurados lhes deram 12 notas máximas em um total de 18 possíveis, a maior pontuação de uma dupla até hoje neste esporte.

Mas o maior destaque dos Jogos foi uma finlandesa de 29 anos e nome complicado, Marja-Liisa Hämäläinen, atualmente a única mulher que competiu em seis Olimpíadas de Inverno seguidas, no caso entre 1976 e 1994. Em Sarajevo, Hämäläinen venceu as três provas individuais do esqui cross country, e o fez com facilidade, vencendo os 5 km com mais de dez segundos de vantagem sobre a norueguesa Berit Aunli, os 10 km com dezoito sobre a soviética Raissa Smetanina, e os 20 km com mais de quarenta segundos de vantagem, também sobre Smetanina. Hämäläinen ainda conseguiria um bronze no revezamento 4 x 5 km. Apesar de ter sido campeã mundial em 1978 e em 1989, esta foi a competição de sua vida - jamais ela conseguiria repetir resultados tão expressivos, se limitando a um bronze no revezamento em 1988 e a dois bronzes em 1994, nos 5 km e nos 30 km.

No fim, o mundo se despediu satisfeito da Iugoslávia - afinal, mesmo acontecendo em uma nação comunista, estes Jogos não haviam sido maculados por nenhum boicote.

Los Angeles 1984


Hoje em dia, quando mais de dez cidades se candidatam para cada Olimpíada, pode ser difícil acreditar que houve um tempo em que ninguém se interessou por sediar uma edição dos Jogos, mas isso quase aconteceu. Tudo começou em 1970, quando apenas três cidades se candidataram a sede das Olimpíadas de 1976, Montreal, Moscou e Los Angeles. Montreal venceu o pleito, mas uma crise do petróleo em 1972 fez com que ela tivesse muitos problemas para organizar o evento. Tal crise fez com que, em 1974, apenas duas candidatas se lançassem para os Jogos de 1980, por acaso as mesmas que haviam perdido quatro anos antes, Moscou e Los Angeles, com a honra de sediar os Jogos sendo dada à primeira. A reunião do COI que escolheria a sede da Olimpíada seguinte, a de 1984, estava marcada para 1978, quando o petróleo não estava mais em crise. Mas aí veio a conta bilionária dos Jogos de 1976, o que deve ter terminado de assustar as eventuais candidatas. Por causa disso, aconteceu um fato inédito: Los Angeles foi a única cidade que decidiu se arriscar, e acabou apenas referendada, sem nem a votação tradicional para escolha da sede.

Engana-se quem acha que Los Angeles não saiu do páreo apenas por estar localizada em um país rico, no caso os Estados Unidos. O comitê organizador, liderado por Peter Ueberroth, tinha um plano de marketing, ao melhor estilo capitalista, com o qual esperava não só conseguir pagar as Olimpíadas, mas também obter algum lucro ao final do evento. O plano funcionou até melhor do que o esperado, e os Jogos de 1984, além de se tornarem a segunda edição de uma Olimpíada organizada sem qualquer ajuda financeira do governo - e a primeira foi justamente a primeira de todas, em 1896 - também entraram para a História como a segunda edição dos Jogos a terminar com dinheiro em caixa ao invés de devendo - sendo que, curiosamente, a primeira havia sido a de 1932, também em Los Angeles. E não foi qualquer dinheirinho em caixa: graças a Ueberroth e ao chefe de operações Harry Usher, Los Angeles se despediu dos Jogos com mais de 200 milhões de dólares de lucro.

O plano de Ueberroth, na verdade, era até bastante simples: já que Los Angeles já havia recebido uma Olimpíada em 1932, e que a maioria das instalações estava bem conservada, a cidade poderia reaproveitá-las, apenas reformando ou adaptando o que fosse preciso. E o dinheiro destas reformas viria não do governo, mas de patrocinadores, que, em troca, poderiam exibir propaganda nas instalações para as quais contribuíssem totalmente de graça durante toda a duração dos Jogos. Graças ao espírito capitalista, não só os organizadores arrumaram patrocinadores para todas as reformas, mas também conseguiram empresas que forneceram carros, equipamentos de filmagem, cronometragem, computadores e copiadoras, além de passagens aéreas de graça para os voluntários que trabalhariam nos Jogos. Mais ainda, conseguiram construir um velódromo e um parque aquático totalmente novos, patrocinados pelas lojas Seven Eleven e pelo McDonald's, respectivamente. Finalmente, ao invés de construir ou reformar uma Vila Olímpica, alojaram os atletas nos dormitórios da Southern Cal Univeristy e da UCLA, a Universidade da Califórnia em Los Angeles, cujos alunos estavam de férias na época. Ações e idéias simples, mas que sem as quais provavelmente os Jogos teriam amargado prejuízo.

No plano político, porém, os organizadores tiveram um problema: quatro anos antes, os Estados Unidos lideraram um boicote aos Jogos de Moscou, sob o argumento de que era inaceitável a invasão soviética ao Afeganistão. Embora muitos acreditassem que os comunistas quisessem dar sua resposta no esporte, ganhando dos norte-americanos dentro da casa do adversário, alguns pessimistas achavam que a União Soviética iria retaliar, conclamando os países comunistas a boicotar os Jogos de Los Angeles, justamente como os capitalistas haviam boicotado os Jogos de Moscou. Infelizmente, os pessimistas se mostraram certos. Curiosamente, um dos maiores prejudicados com o boicote foi o McDonald's, que havia criado uma promoção onde quem comprasse um lanche ganhava uma raspadinha com o nome de um esporte, e, caso os Estados Unidos ganhassem medalha de ouro neste esporte, o proprietário da raspadinha ganharia um novo lanche grátis. Graças ao boicote, os Estados Unidos ganharam 83 medalhas de ouro, algumas em esportes onde nem sonhavam subir ao pódio, o que acarretou um prejuízo de 44 milhões de dólares à lanchonete. O episódio foi tão inusitado que acabou sendo parodiado em vários programas de TV, incluindo Os Simpsons, onde o Krusty Burger lançou uma promoção parecida.

Mas voltando ao assunto sério, o Presidente do COI desde o final da Olimpíada de 1980, o espanhol Juan Antonio Samaranch, lutou o quanto pôde para impedir o boicote. Fazendo parte da turma dos pessimistas, ele achava que o boicote era iminente, mas que poderia ser impedido com o esforço certo: ao invés de tentar convencer os comunistas a participar dos Jogos pelo espírito esportivo, Samaranch tentou convencê-los de que viajar para Los Angeles seria um excelente negócio. Seu primeiro ato foi se aliar a Horst Dassler, o alemão dono da marca Adidas, a quem nomeou seu consultor esportivo e financeiro. O segundo passo foi negociar pessoalmente as cotas de televisão com a rede ABC, que, por um contrato de exclusividade de transmissão de imagens para o mundo todo, pagou nada menos que 225 milhões de dólares, a maior soma já paga para se televisionar um evento esportivo.

A maior parte dessa dinheirama seria utilizada para cobrir custos da própria Olimpíada, como a confecção das tochas e medalhas e a hospedagem de árbitros e fiscais. Samaranch, porém, separou 36 milhões: 18 milhões ele colocou nos cofres do COI, que antes dos Jogos tinham apenas 230 mil dólares; os outros 18 milhões ele reservou para um fundo que chamou de "Solidariedade Olímpica", destinado a cobrir as despesas de viagem dos países que não pudessem mandar seus atletas a Los Angeles por seus próprios meios. A jogada de mestre foi que o país que não participasse dos Jogos de 1984 perderia também o direito ao fundo para os Jogos de 1988, que aconteceriam na longínqua Coréia do Sul.

Assim, Samaranch colocou a União Soviética em uma situação delicada: ela, evidentemente, não precisava do dinheiro do fundo, mas se quisesse convencer algum de seus aliados mais pobres a boicotar os Jogos, provavelmente teria de se comprometer a pagar de seu bolso suas despesas em 1988. O plano de Samaranch deu certo, e não só muitos países comunistas concordaram em participar dos Jogos, como também muitos países pobres da África e da Ásia, que não teriam como enviar seus atletas devido à distância, acabaram beneficiados pelo Solidariedade Olímpica. Samaranch ainda tentou até o último momento convencer os soviéticos a desistir do boicote - até mesmo o Presidente dos Estados Unidos, Ronald Reagan, gravou uma entrevista onde prometia que os soviéticos seriam recebidos na América com o máximo de conforto e segurança - mas não teve jeito. Na manhã de 8 de maio de 1984, União Soviética, Alemanha Oriental, Tchecoslováquia, Cuba, Hungria, Polônia e mais oito países anunciaram sua desistência do evento. O motivo oficial, meio esfarrapado, foi que seus governos não acreditavam que os Estados Unidos pudessem oferecer a segurança necessária a seus atletas. Mas a ausência da União Soviética acabou por produzir um curioso efeito colateral: pela primeira vez a China participaria de uma Olimpíada de Verão, se para mais nada apenas para provocar seus vizinhos, com os quais estava tendo um problema militar na fronteira.

Os Jogos de 1984 foram realizados entre 28 de julho e 12 de agosto, e contaram com a participação de 7.078 atletas, sendo 1.620 mulheres, representando 141 nações em 221 provas de 25 esportes: atletismo, basquete, boxe, canoagem, ciclismo, equitação, esgrima, futebol, ginástica artística, ginástica rítmica, handebol, hóquei, judô, levantamento de peso, luta olímpica, nado sincronizado, natação, pentatlo moderno, polo aquático, remo, saltos ornamentais, tiro com arco, tiro esportivo, vela e vôlei; mais tênis e beisebol como esportes de demonstração (clique aqui para ver todas as provas do programa). Duas provas paralímpicas do atletismo, os 1.500 m masculino e os 800 m feminino em cadeira de rodas, fariam parte do programa de todas as Olimpíadas de Verão entre 1984 e 2004; muitas fontes citam essas provas como esportes de demonstração, mas, na verdade, elas eram usadas para promoção das Paralimpíadas.

A cerimônia de abertura rivalizou com a de 1980, um grande show no Coliseu de Los Angeles, com dançarinos, ex-atletas e até mesmo um astronauta trajando uma mochila a jato e fazendo pequenos vôos. A tocha olímpica entrou no estádio pelas mãos de Gina Memphill, neta do lendário Jesse Owens, e a honra de acender a pira coube a Rafer Johnson, ouro no decatlo de 1960. O mascote da Olimpíada, uma águia de cartola com o sugestivo nome de Sam, foi o primeiro de uma Olimpíada de Verão a ser combinado com os pictogramas, ou seja, ao ilustrar suas matérias sobre os esportes, os jornais e revistas podiam optar pelos tradicionais bonequinhos de cabeça redonda, tipo os de placa de sinalização, ou por desenhos especialmente produzidos de Sam praticando todos os 25 esportes do programa.

Apaixonados por um espetáculo, os norte-americanos conseguiram incluir no programa olímpico dois esportes até hoje criticados por alguns membros do COI por serem mais artísticos do que atléticos, a ginática rítmica e o nado sincronizado. A ginástica foi disputada em um sistema de exercícios combinados, onde cada ginasta se apresentava quatro vezes, cada uma com um dos chamados aparelhos - arco, bola, maças e fita - e suas notas eram somadas para se determinar as colocações. Muitas das ginastas foram atrapalhadas pelo ar condicionado forte demais do pavilhão da UCLA, e outras acabaram perdendo pontos por um item rigoroso do regulamento, que proibia que a alça do sutiã das atletas ficasse à mostra durante as apresentações. O ouro acabou ficando com uma zebra, a canadense Lori Fung, que bateu a campeã do mundo, a romena Doina Staiculescu, por apenas cinco centésimos. O nado sincronizado teve duas modalidades, individual e em duplas, mas em ambas o resultado foi o mesmo: Estados Unidos com o ouro, Canadá com a prata, Japão com o bronze. Também fez sua estréia nos Jogos de 1984 um esporte que era mania mundial na década de 80, o windsurf, representado pela categoria Winglider da vela.

Na primeira participação da China em uma Olimpíada, seus destaques foram todas mulheres, começando por Luan Jujie, da esgrima, categoria florete. Adolescente problemática que começou a praticar esporte para controlar seu temperamento, Jujie, 23 anos, canhota, dois bronzes em mundiais, em 1981 e 1983, perdeu na etapa de classificação para a veterana sueca Kerstin Palm, mas se recuperou na repescagem, e acabou ganhando o ouro diante da favorita alemã ocidental Cornelia Hanisch, bicampeã mundial em 1979 e 1981. Também se sobressaiu a pequenina Zhou Jihong, 19 anos, saltos ornamentais, categoria plataforma, que apresentou saltos acrobáticos até então inéditos na modalidade, e chegou ao ouro com quatro pontos a mais que a favorita norte-americana Michelle Mitchell. Mas a melhor história da China aconteceu no vôlei feminino: sem as equipes comunistas, os Estados Unidos eram favoritíssimos ao ouro, principalmente depois de chegar de forma invicta à final, ganhando das chinesas na primeira fase por 3 sets a 1. As chinesas, porém, também conseguiram chegar à final, e, ao chegar ao estádio para enfrentar as donas da casa, se depararam com uma "americanada" da ABC, que decidiu exibir no telão, antes do jogo, uma retrospectiva da "caminhada norte-americana rumo ao título", que terminava com uma montagem do time já com as medalhas de ouro no peito. O time chinês viu o vídeo, e ao final a capitã Lang Ping, apontando a tela, decretou: "vamos arrancar essas medalhas desses pescoços". Dito e feito, a China jogou com uma garra ainda não vista no torneio, e acabou com os Estados Unidos em 3 sets a zero.

Ainda falando nas mulheres, muitas delas, das mais diversas nacionalidades, conseguiram um lugar de destaque, como por exemplo a marroquina Nawal El Moutawakel, medalha de ouro nos 400 metros com barreiras do atletismo, primeira mulher muçulmana a subir no degrau mais alto do pódio, e primeira medalha de ouro do Marrocos. Ou a norte-americana Mary Lou Retton, primeira ginasta de um país que não fosse comunista a conseguir o ouro nos exercícios combinados. Ou ainda sua compatriota Mary Meagher, primeira mulher a nadar os 100 metros borboleta em menos de um minuto, impedida de participar dos Jogos de 1980 por causa do boicote, mas que em 1984 ganharia três ouros, sendo o dos 200 metros borboleta com mais de sete metros de vantagem sobre a segunda colocada.

Em 1984, as mulheres, aliás, ganharam uma maratona só delas, prova que já existia ao redor do mundo, mas que pela primeira vez seria disputada em uma Olimpíada. A vencedora foi a norte-americana Joan Benoit, mas a personagem inesquecível do evento só apareceu no estádio vinte minutos após sua vitória: a suíça Gabrielle Andersen-Scheiss. 39 anos de idade, moradora dos Estados Unidos, funcionária de uma escola de esqui em Idaho, Gaby, como era conhecida, estava dizimada pelo calor, desidratada, a um suspiro do desmaio, mas se recusava a desistir. Se arrastando, mal conseguindo se manter de pé, Gaby demorou 5 minutos e 44 segundos para percorrer os 100 metros finais da prova, acompanhada a uma certa distância por um batalhão de médicos, que correram para atendê-la assim que ela desfaleceu ao completar a prova. Por sua imensa força de vontade, Gaby foi decretada a heroína dos Jogos, e motivou até mesmo a criação de uma nova regra, segundo a qual, se os médicos constatarem que há risco para a saúde do atleta, podem se aproximar durante a prova para examiná-lo sem o risco de desclassificá-lo, como ocorreu com Dorando Pietri na maratona de 1908. Um detalhe: muita gente pensa que Gaby chegou em último lugar, mas na verdade ela foi a 37a entre 44 competidoras que completaram a prova, sendo a última a brasileira Eleonora de Mendonça.

E, como toda Olimpíada tem pelo menos uma confusão, essa também teve uma, desta vez envolvendo mulheres. Foi na prova dos 3.000 metros do atletismo, onde a norte-americana Mary Decker, que competia desde 1973, tentava sua última chance de conseguir uma medalha olímpica. Com terríveis dores musculares, Decker não pôde participar dos Jogos de Montreal, e devido ao boicote também ficara fora dos de Moscou. Em Los Angeles, ela seria a favorita, ao lado de uma de suas maiores fãs, a britânica Zola Budd, dezoito anos, que tinha o hábito de correr descalça. No dia da prova, Decker largou alucinada, correndo como se fosse quebrar o recorde mundial até os 1.600 metros, quando diminuiu um pouco o ritmo. Bastou uma curva para que Budd a alcançasse, e então as duas correram lado a lado, até que Budd, em uma manobra ousada, a cortou por fora e assumiu a ponta. Decker respirou fundo e voltou a investir contra a rival; sua estratégia, porém, era arriscada demais: Decker tentou passar Budd por dentro da raia, e não encontrou espaço, ficando esmagada entre a corredora e a faixa de grama da pista. Então, por um milésimo de segundo, a ponta de seu pé direito bateu no calcanhar esquerdo de Budd. Budd pulou como um saci, perdeu várias posições, mas continuou na corrida. Decker caiu no gramado, com um grito de dor que muitos imaginaram ser um palavrão dirigido a Budd. Os 85.000 espectadores presentes ao Coliseu, lógico, começaram a vaiar Budd, que se desestabilizou, começou a chorar e terminou a prova, vencida pela romena Maricica Puica, no sétimo lugar. Os fiscais chegaram a desclassificar Budd, mas uma hora depois, graças ao videotape da ABC e ao depoimento de Puica, que acompanhava as duas de perto na hora do acidente, voltaram atrás e validaram sua colocação.

Passando aos homens, o atletismo viu a estréia olímpica de um dos maiores ídolos do esporte norte-americano, Carl Lewis. Filho de dois treinadores de atletismo, Lewis teve contato com o esporte desde muito cedo. Aos 13 anos, começou a competir no salto em distância, onde ficou tão bom que conseguiu uma bolsa de estudos na Universidade de Houston. Na Universidade, ele passou também a praticar os 100 metros, os 200 metros, e o revezamento 4 x 100 metros. Em Los Angeles, ele competiria nestas quatro provas, chegando ao ouro em todas. No salto em distância, seu primeiro salto foi tão bom que ele abriu mão de todas as demais tentativas - sendo até vaiado pela platéia, que queria vê-lo saltar - e mesmo assim ninguém conseguiu alcançá-lo. Lewis foi o primeiro atleta a ganhar quatro ouros no atletismo em uma mesma edição dos Jogos desde seu ídolo Jesse Owens em 1936 - e exatamente nas mesmas provas.

O decatlo também exibiu um grande atleta, o britânico Daley Thompson, que travou um duelo emocionante com o alemão ocidental Jürgen Hingsen. Hingsen havia estabelecido um novo recorde mundial em 1981, e em Los Angeles Thompson, apesar de levar o ouro, ficou a um ponto da marca do alemão. Dois anos depois, porém, o COI retificaria o resultado do britânico nos 110 metros com barreiras, dando a ele o recorde. Na Olimpíada, após receber um abraço da Princesa Anne, Presidente do comitê olímpico da Grã-Bretanha, Thompson protestou contra a transmissão da ABC, que praticamente só mostrava os atletas dos Estados Unidos, com uma bem-humorada camiseta, onde na frente se lia "obrigado América por estes grandes Jogos e por estes grandes momentos", e atrás "mas as transmissões da ABC..."

Nas piscinas, o maior destaque não viria da natação, mas dos saltos ornamentais: o norte-americano Greg Louganis, primeiro atleta a conseguir o ouro tanto na plataforma quanto no trampolim desde 1928. Descendente de samoanos e suecos, Louganis nasceu quando seus pais tinham apenas 15 anos de idade. Como não tinham condições de criá-lo, o ofereceram à adoção. Louganis foi então adotado por uma família de origem grega, e criado na cidade de Mission Viejo, na Califórnia, onde descobriu as piscinas e os saltos. Aos 16 anos, passou nas seletivas para as Olimpíadas de Montreal, onde terminou com a medalha de prata, atrás apenas do lendário italiano Klaus Dibiasi. Em 1978, após a aposentadoria de Dibiasi, Louganis se tornou o maior saltador da época, ganhando o mundial da categoria e conseguindo uma bolsa de estudos para a Universidade de Miami. O boicote norte-americano impediu que ele fosse às Olimpíadas de Moscou, mas foi campeão mundial mais uma vez em 1982. Então, em Los Angeles, Louganis conseguiu uma performance histórica, se tornando o primeiro homem a ultrapassar 700 pontos em toda a história da categoria. Sua diferença para o segundo colocado no trampolim, o chinês Tan Liangde, é até hoje a maior deste esporte, 92 pontos e um décimo. Na plataforma, Louganis também conseguiu uma pontuação altíssima após um salto muito arriscado, onde sua cabeça quase bateu na ponta da plataforma após uma pirueta.

Na natação, com a ausência dos comunistas, esperava-se que os norte-americanos se destacassem como nunca. Realmente, dentre as mulheres, os Estados Unidos ganharam 11 dos 14 ouros possíveis, e dentre os homens 9 de 15; mas o maior destaque individual acabou sendo o alemão ocidental Michael Gross, apelidado Albatroz devido à sua envergadura. Primeiro campeão olímpico da Alemanha Ocidental na natação, Gross venceu os 200 metros livre e os 100 metros borboleta, quebrando os recordes olímpico e mundial em ambas, e ainda ficaria com a prata nos 200 metros borboleta e no revezamento 4 x 200 metros livre.

Dentre os esportes mais prejudicados pelo boicote estiveram as lutas. Na luta livre, por exemplo, mais de 60% dos lutadores pré-selecionados não viajaram a Los Angeles, fazendo com que suas vagas fossem supridas por atletas do segundo escalão. Apesar da excelente oportunidade para atletas de países que normalmente não teriam a chance de disputar uma Olimpíada, o nível das lutas foi bastante fraco, o que deu a chance dos Estados Unidos ganharem sete das dez medalhas em disputa. Na luta greco-romana o pódio foi mais diversificado, com campeões de oito nacionalidades diferentes em dez provas, mas mesmo assim muitos dos maiores lutadores do planeta não participaram do torneio. Neste torneio, aliás, houve um atleta de grande destaque, o norte-americano Jeffrey Blatnick, campeão dos superpesados, portador do Mal de Hodgkin, um câncer linfático de tratamento caro e desgastante, que já havia perdido o baço devido à doença. Contrariando a indicação dos médicos, Blatnick mergulhou nos treinamentos, pois queria a medalha de ouro para homenagear seu irmão David, morto em um acidente de moto em 1977. Mesmo perdendo na segunda luta, Blatnick conseguiu passar pela repescagem, e conseguiu o ouro ao vencer o experiente sueco Thomas Johansson, dezesseis quilos mais pesado, com uma queda a pouco mais de um minuto do fim da luta. Além de perder a luta, Johansson ainda acabaria desclassificado por doping após o torneio. Blatnick ainda lutaria até o ano seguinte, quando complicações com sua doença o fariam abandonar o esporte.

Outro esporte onde os norte-americanos fizeram a festa com a ausência dos comunistas foi o boxe, nove ouros em 12 possíveis. O mais esperado, porém, acabou não vindo graças a uma decisão polêmica: em uma das semifinais, lutavam o neozelandês Kevin Barry e o favoritíssimo norte-americano Evander Holyfield. Holyfield massacrou Barry desde o início, até derrubá-lo com um soco fortíssimo no queixo. Ao invés de decretar o nocaute, porém, o árbitro iugoslavo Bilgorije Novicic desclassificou o norte-americano, alegando que havia interrompido a luta antes deste golpe. De fato, o replay mostrava o apito do árbitro, mas quando o punho de Holyfield já estava no meio do caminho, incapaz de voltar ou interromper o golpe. Mesmo diante deste argumento, de um protesto dos delegados norte-americanos, e até de uma declaração de Barry, que considerou o golpe limpo, o árbitro se recusou a voltar atrás. Holyfield acabou com o bronze, e Barry perderia a final justamente para um iugoslavo, Anton Josipovic. Se serve de consolo, mesmo sem ganhar este ouro Holyfield se tornou o maior campeão da década de 90 quando passou a lutar dentre os profissionais.

Outro norte-americano futuro campeão com os profissionais ajudou os Estados Unidos a chegar ao ouro do basquete. Liderados por Michael Jordan, os norte-americanos não tomaram conhecimento dos adversários, vencendo todos os seus oito jogos, e arrasando a Espanha na final por 96 a 65. Os Estados Unidos também ficariam com o ouro no feminino, mais uma vez de forma invicta. Nos demais esportes coletivos, a Iugoslávia subiu ao lugar mais alto do pódio no handebol masculino e feminino e no pólo aquático, onde tirou o ouro dos favoritos norte-americanos após um empate de 5 a 5, mas que a deixou na frente pelo saldo de gols superior. No hóquei masculino, o Paquistão voltaria ao ouro ao derrotar a mesma Alemanha Ocidental que os havia vencido em 1972, enquanto no feminino a Holanda chegou ao seu primeiro ouro em um esporte coletivo. No vôlei, com a ausência dos comunistas, o favoritismo recaiu sobre o Brasil, vice-campeão mundial em 1982 e campeão pan-americano em 1983. De fato, na fase classificatória, o Brasil, apesar de uma estréia ruim, onde perdeu para a Coréia do Sul, venceu sem dificuldades Argentina, Tunísia, Estados Unidos e Itália. Os norte-americanos, porém, fizeram seu dever de casa: mesmo perdendo por 3 sets a zero, aproveitaram para marcar todas as jogadas do Brasil e estudar todos os levantamentos de William, o titular da seleção brasileira. O resultado foi que, na final, William não conseguiu fazer uma só jogada que sobrepujasse a defesa norte-americana, e o técnico Bebeto de Freitas não conseguiu armar a defesa brasileira de forma que resistisse a seus ataques, o que fez com que os Estados Unidos devolvessem os 3 sets a zero. De qualquer forma, aquele time, que além de William contava com jogadores como Bernard, Renan, Montanaro e o atual técnico da seleção masculina Bernardinho, acabou carinhosamente apelidado de "Geração de Prata", e abriu caminho para a popularização do vôlei no Brasil, hoje um dos esportes mais vitoriosos do país.

O Brasil ainda conseguiria uma segunda medalha de prata nos esportes coletivos, a do futebol, onde a FIFA, cansada do domínio dos falsos amadores comunistas, chegou a um acordo com o COI, segundo o qual poderiam participar das Olimpíadas jogadores de futebol profissionais, desde que jamais tivessem atuado em uma Copa do Mundo. Aproveitando a nova regra, o técnico Jair Picerni montou um time poderosíssimo, quase imbatível. Infelizmente, às vésperas dos Jogos os clubes se recusaram a liberar seus jogadores, e o Brasil acabou viajando para Los Angeles com o time do Internacional de Porto Alegre, reforçado por alguns poucos jogadores de outros clubes. Ainda assim, o Brasil fez bonito, vencendo Alemanha Ocidental, Arábia Saudita, Marrocos, Canadá e Itália, só perdendo na final para a França, pelo placar de 2 a 0. O torneio de futebol foi todo disputado no estádio Rose Bowl, surpreendentemente quase sempre lotado, com mais de 100 mil espectadores na final, o que contribuiu para a popularização do esporte nos Estados Unidos, e para o lançamento da candidatura do país a sede da Copa do Mundo que ocorreria dez anos depois.

Já que estamos falando no Brasil, o país, que enviou 166 atletas, sendo 21 mulheres, voltou de Los Angeles com o dobro de medalhas que trouxe de Moscou, oito, sendo uma de ouro, cinco de prata e duas de bronze. Justiça seja feita, apenas no futebol e no vôlei pode-se dizer que o Brasil tenha sido beneficiado pela ausência dos comunistas; nos demais esportes, mesmo que os boicotadores tivessem ido a Los Angeles, teriam poucas chances de êxito. A medalha de ouro, por exemplo, veio da prova dos 800 metros do atletismo, onde os favoritos eram os rivais britânicos Sebastian Coe e Steven Ovett, prata e ouro em Moscou, respectivamente. Ambos acabaram surpreendidos por um brasiliense de Taguatinga, 21 anos de idade, que treinava nos Estados Unidos desde 1981, chamado Joaquim Cruz. Cruz tinha uma boa tática: esperaria algum outro corredor disparar e ficaria em seu vácuo, sem se cansar, até a metade da última volta, quando daria uma arrancada. Deu certo: após permanecer quase toda a prova atrás do queniano Ed Koech, Cruz deu uma arrancada fantástica, que lhe rendeu a medalha de ouro e, nos jornais norte-americanos, o apelido de Gazela. Coe ainda tentou acompanhá-lo, mas não conseguiu, e ficou com a prata. Ovett, com uma crise de bronquite, terminaria na oitava posição. Cruz ainda havia se inscrito para a prova dos 1.500 metros, mas fortemente gripado e já com um ouro no peito, desistiu, o que abriu caminho para mais um ouro de Coe, primeiro atleta a conseguir dois seguidos nesta prova.

Além das pratas do futebol e do vôlei, o Brasil ainda conseguiu a segunda posição no judô, categoria meio-pesados, com Douglas Vieira, que perdeu na final para o sul-coreano Ha Hyoung-Zoo por decisão dos jurados; na vela, classe Soling, com o barco de Daniel Adler, Torben Grael e Ronaldo Senfft; e na natação, prova dos 400 metros medley, com Ricardo Prado. Prado já havia tentado as provas dos 200 metros costas, onde acabou em quarto lugar, e dos 200 metros medley, onde ficou de fora da final por um problema de interpretação: achava que vencendo sua semifinal estaria na final, mas na verdade precisaria fazer um dos oito melhores tempos no total. Caindo em uma semifinal fácil, Prado decidiu se poupar e nadar apenas o suficiente para vencer, terminando com o 11o tempo. A prova acabou vencida pelo canadense Alex Baumann, que bateu os recodes olímpico e mundial, e se transformou no favorito para os 400 metros. Dono do recorde mundial anterior, Prado sabia que, se quisesse vencer Baumann, especialista no nado de peito, o terceiro dos estilos do medley, deveria chegar ao final do borboleta, o segundo estilo, com uma folga de mais de três segundos. Deu quase certo: ao final do nado de costas, Prado tinha uma vantagem de um segundo, que subiu para três ao final do borboleta. Mas Baumann conseguiu recuperar a diferença e ultrapassá-lo no nado de peito, e se manteve à frente no crawl, terminando a prova com um segundo de folga sobre Prado, e mais um recorde olímpico e mundial.

Completaram a lista de medalhas do Brasil dois bronzes no judô, nas categorias leves com Luís Onmura e médios com Walter Carmona. Dentre os que quase chegaram lá podemos citar João Batista Eugênio, quarto lugar nos 200 metros do atletismo, a apenas quatro centésimos do bronze; e Delival Nobre, do tiro, categoria pistola de tiro rápido, que empatou com o finlandês Rauno Blies na terceira posição, mas na série desempate fez cinco pontos a menos.

No fim, uma grande festa, com dançarinos, show de luzes e apresentação de Lionel Ritchie encerrou a terceira Olimpíada seguida com boicote - felizmente, seria também a última. Curiosos, alguns jornalistas americanos decidiram pesquisar os resultados dos Jogos anteriores, para tentar imaginar quantas medalhas os comunistas teriam ganhado se tivessem viajado a Los Angeles. Quando descobriram que em Montreal, último palco de embate direto entre capitalismo e comunismo, os comunistas haviam ganhado 58% das medalhas em disputa, deixaram o cálculo pra lá. Era melhor esperar por 1988.


Série Olimpíadas

Sarajevo 1984
Los Angeles 1984

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