domingo, 4 de julho de 2021

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Niki Lauda

Escrevendo sobre Alain Prost eu reparei que, quando eu escrevo sobre pilotos de Fórmula 1, tem um nome que sempre aparece: o do austríaco Niki Lauda. Com uma carreira que abrangeu praticamente duas décadas, era até natural que isso acontecesse, já que Lauda esteve na pista junto com os três brasileiros campeões do mundo, Emerson, Piquet e Senna. Como Lauda também tem uma história fantástica, decidi que, mesmo tendo abandonado a ideia de fazer uma série mensal sobre pilotos, pelo menos um post sobre ele eu iria fazer. Hoje, portanto, é dia de Niki Lauda no átomo!


Andreas Nikolaus Lauda nasceu em Viena, capital da Áustria, em 22 de fevereiro de 1949; seu avô paterno, Hans Lauda, foi um dos mais famosos industriais da Áustria, fundador da Federação das Indústrias Austríacas, e dono de uma empresa de fabricação de papel que seu pai herdou. Apesar de sua família ser rica, ela também era totalmente contra Lauda se envolver com automobilismo, de forma que jamais deu um centavo para que ele corresse em qualquer categoria; mesmo assim, desde adolescente ele tinha certeza de que queria ser piloto e, contrariando o desejo de seus pais, em 1968, aos 19 anos, já considerado velho para um estreante, decidiu correr na Fórmula Mini, categoria que usava aqueles pequenos carros de passeio fabricados pela britânica BRC, hoje conhecidos como Cooper Minis.

Lauda seria segundo lugar logo em sua primeira prova com os Minis, e, apesar de não ter mais nenhum resultado de destaque ao longo do ano, seu estilo de pilotagem chamaria a atenção da Volkswagen, que o convidaria para correr no Campeonato Europeu de Fórmula V, categoria de monopostos que usava motores da fabricante alemã, e que estava apenas em sua terceira temporada, tendo feito sua estreia em 1967. Lauda correria a temporada de 1969 da Fórmula V pela equipe Kaimann, conseguindo duas vitórias, na Itália e Hungria, terminando o campeonato em terceiro, apenas 7 pontos atrás do campeão, seu colega de equipe e também austríaco Erich Breinsberg. O dono da equipe, o também austríaco Kurt Bergmann, tinha fé em seu talento e imaginava que ele poderia ser campeão já em 1970, mas, prestes a fazer 21 anos, Lauda queria novos desafios, e, para 1970, ele decidiria se transferir para o Campeonato Francês de Fórmula 3, que considerava mais desafiador, mas onde não conseguiu nenhum resultado expressivo.

Considerando que sua carreira estava estagnada, e que precisava de um empurrão para ir para a frente, Lauda compraria uma vaga na equipe March para o Campenato Europeu de Fórmula 2 de 1971 - compraria mesmo, com dinheiro que ele conseguiu através de um empréstimo bancário de 30 mil libras esterlinas; para convencer o banco a lhe emprestar a quantia, ele faria um seguro de vida, segundo o qual, se morresse pilotando, o banco receberia o dinheiro. Sua família mais uma vez se posicionou absolutamente contra suas atitudes e, desgostoso, Lauda decidiria cortar de vez todos os laços com seus pais.

Lauda correria nove das onze provas, somaria 8 pontos, e terminaria na décima colocação do campeonato. Gostando de seu estilo de pilotagem, a March decidiria dar-lhe uma chance na Fórmula 1, inscrevendo-o como terceiro carro no GP da Áustria, o qual teve de abandonar após 20 voltas com problemas na suspensão. Ele renovaria com a March para o Europeu de Fórmula 2, disputando o campeonato completo, conquistando sua primeira vitória, em Thruxton, Inglaterra, e somando 25 pontos, terminando em quinto lugar. As três provas inglesas do campeonato (Mallory Park, Thruxton e Crystal Palace) valeriam também para o Campeonato Britânico de Fórmula 2, que também contaria com duas provas em Outlon Park; como Lauda também havia conseguido um segundo lugar em Mallory Park, a March decidiria inscrevê-lo, e, com uma vitória na primeira prova em Outlon e um segundo lugar na segunda, ele conquistaria o título, o primeiro de sua carreira, com 31 pontos, apenas 4 à frente de seu colega de equipe, o sueco Ronnie Peterson.

Peterson e Lauda também seriam os dois pilotos da March para a temporada de 1972 da Fórmula 1, na qual o austríaco oficialmente estrearia, correndo todas as 12 provas. Claramente ainda cru para a categoria, Lauda não marcaria nenhum ponto, tendo como melhor resultado um sétimo lugar na África do Sul, abandonando três provas e sendo desclassificado do GP do Canadá por irregularidades com o carro, enquanto Peterson faria 12 pontos, incluindo um terceiro lugar na Alemanha, e terminaria o campeonato na nona posição. Lauda não se deixaria abalar, porém, e, para 1973, conseguiria um segundo empréstimo bancário, se transferindo para a equipe BRM.

A BRM já tinha dois pilotos, o francês Jean-Pierre Beltoise e o suíço Clay Regazzoni, mas estava com sérios problemas financeiros, e não pôde recusar o dinheiro oferecido por Lauda, que foi inscrito como terceiro piloto para todo o campeonato. O austríaco, porém, cometeria um erro de avaliação, e o carro da BRM, apesar de rapidíssimo e fácil de pilotar, se mostraria extremamente pouco confiável, o que faria com que Lauda abandonasse nove das quinze corridas do ano, e sequer conseguisse se classificar para o GP da Áustria; apesar disso, ele conseguiria seus primeiros pontos, com um quinto lugar no GP da Bélgica.

Antes de prosseguir com a carreira de Lauda na Fórmula 1, é preciso fazer um parágrafo para citar que, entre 1970 e 1974, ele participaria de várias provas de turismo e endurance. Sua estreia no endurance seria na prova dos 1.000 km da Áustria, válida pelo Campeonato Mundial de Carros Esporte da FIA, na qual pilotou um Porsche para a equipe Bosch Wien, ao lado do também austríaco Peter Peter, não completando a prova com problemas mecânicos; também em 1970, ele seria campeão de uma prova de turismo em Diepholz, Alemanha, pilotando um Porsche. Em 1971, ele ganharia mais uma prova, dessa vez na Áustria, pilotando um Chevron na Taurenpokal Salzburgring; no mesmo ano, ele participaria das 6 Horas de Nürburgring, na Alemanha, dividindo um BMW com o alemão Ferfried von Hohenzollern e chegando em segundo lugar. Em 1972, ele seria terceiro lugar em duas provas, as 9 Horas de Kyalami, na África do Sul, dividindo um March com o sul-africano Jody Scheckter, e as 4 Horas de Zandvoort, na Holanda, dividindo um BMW com o austríaco Gerold Pankl. Seus últimos resultados de destaque ocorreriam em 1973, quando venceria três provas pela equipe BMW Alpina: a etapa austríaca do Campeonato Europeu de Turismo; as 24 h de Nürburgring, ao lado do alemão Hans-Peter Joisten; e as 4 Horas de Monza, dividindo carro com o australiano Brian Muir; além disso, Lauda também disputaria pela equipe os 1.000 km de Spa Francorchamps, na Bélgica, prova válida pelo Campeonato Mundial de Carros Esporte da FIA, dividindo carro com o alemão Hans-Joachim Stuck, na qual chegaria em sétimo.

Pois bem, no final da temporada de 1973, Regazzoni seria contratado novamente pela Ferrari, onde havia pilotado entre 1970 e 1972, para o lugar do belga Jacky Ickx, que estava indo para a Lotus, e o dono da equipe, o Comendador Enzo Ferrari, querendo substituir também o italiano Arturo Merzario, que não correspondeu às expectativas e acabou desempregado, perguntou o que o suíço achava de Lauda. Regazzoni falou tão bem de Lauda que o Comendador decidiu que o austríaco seria seu segundo piloto e ponto final, inclusive pagando os empréstimos que ele havia feito para correr na March e na BRM. Lauda faria sua estreia pela Ferrari em 13 de janeiro, no GP da Argentina, conseguindo seu primeiro pódio, um segundo lugar, atrás de Denny Hulme, da McLaren. Ele abandonaria as duas corridas seguintes, o GP do Brasil, com um estouro de motor após apenas duas voltas, e o GP da África do Sul, para o qual conseguiu sua primeira pole position, com problemas mecânicos faltando apenas quatro voltas para o final, quando liderava a prova. Na quarta prova da temporada, porém, Lauda conseguiria um hat trick, fazendo a pole position, a volta mais rápida e vencendo a corrida, conquistando a primeira vitória para a Ferrari desde Ickx no GP da Alemanha de 1972. Lauda ainda venceria o GP da Holanda, seria segundo na Bélgica e na França, quinto na Inglaterra e faria seis poles seguidas (para um total de oito no ano) entre a Holanda e a Itália, mas abandonaria as outras sete provas, incluindo as cinco últimas do campeonato, somando 38 pontos e terminando em quarto, atrás do brasileiro Emerson Fittipaldi, da McLaren, de seu colega Regazzoni e de Scheckter, da Tyrrell.

Devido às posições no campeonato, a Ferrari continuaria com o mesmo esquema para 1975, com Regazzoni como primeiro piloto e Lauda como segundo. O austríaco teria um péssimo começo, com um sexto lugar, dois quintos e um abandono - no GP da Espanha, onde faria a pole - mas, no GP de Mônaco, faria uma nova pole e obteria sua primeira vitória no Principado, conseguindo nova pole e vitória na Bélgica, e uma terceira vitória seguida no ano na Suécia; depois disso, os papéis se inverteriam, com Lauda recebendo tratamento de primeiro piloto e a Ferrari apostando em seu título. Na segunda metade da temporada, ele faria a pole em todas as provas exceto no GP da Inglaterra, no qual a posição de honra surpreendentemente ficaria com o galês Tom Pryce, da equipe Shadow; no GP da Alemanha, em Nürburgring, Lauda se tornaria o primeiro piloto a completar uma volta em menos de sete minutos (sim, é isso mesmo, na época a pista era muito mais longa que a usada hoje), mas veria a vitória escapar com um estouro de pneu que praticamente destruiria a asa dianteira de seu carro - e, mesmo assim, ele conseguiria levar o carro para os boxes, trocar o pneu e a asa, voltar para a corrida e terminar a prova em terceiro. Após mais uma vitória na França, Lauda conquistaria seu primeiro título mundial com um terceiro lugar no GP da Itália, prova vencida por Regazzoni, resultado que levaria ao primeiro Mundial de Construtores da Ferrai desde 1964, para delírio total da torcida ferrarista; Lauda venceria, também, a última corrida do ano, o GP dos Estados Unidos, fechando o campeonato com 64,5 pontos (a pontuação do GP da Áustria, no qual Lauda chegou em sexto, foi pela metade, pois a prova foi interrompida por uma tempestade antes que 75% da distância tivessem sido completados), 19,5 pontos a mais que Emerson, seu maior rival naquele ano.

Falando em rival, também seria em 1975 que começaria aquela que seria considerada a maior rivalidade da Fórmula 1 da década de 1970, entre Lauda e o inglês James Hunt - alguns dizem que a rivalidade começou em 1973, ano em que Hunt estreou na Fórmula 1, mas, então, com Lauda na BRM e Hunt na modesta equipe Hesketh, não havia muito o que rivalizar, assim como em 1974, quando Lauda foi para a Ferrari, muito superior à Hesketh. Em 1975, porém, a Hesketh daria um salto de qualidade, que permitiria a Hunt ganhar sua primeira prova, o GP da Holanda, além de conquistar três segundos lugares, na Argentina, França e Áustria, terminando o campeonato em quarto lugar. Várias seriam as provas nas quais ele e Lauda duelaram, mas, ao contrário do que a imprensa pudesse dar a parecer, os dois, na verdade, eram grandes amigos, tendo se conhecido ainda na Fórmula 3, e mantendo o contato quando Lauda subiu antes para a Fórmula 1. Apesar de terem estilos de pilotagem e de vida totalmente diferentes, ambos declarariam que se consideravam iguais, e que não tinham qualquer sentimento negativo um pelo outro em seus duelos, apenas "a gana pela vitória de dois grandes pilotos". Lauda e Hunt seriam amigos até a morte do inglês, em 1993, quando o austríaco declararia que ele estava "dentre os poucos pilotos dos quais eu gostava, e dentre os mais poucos ainda que eu respeitava".

Em 1976, com Emerson indo para sua própria equipe, Hunt assumiria seu lugar na McLaren, e aí sim teríamos uma rivalidade de verdade. Lauda começaria o campeonato arrasador, e parecia que seu bicampeonato seguido, algo até então só conquistado por Jack Brabham em 1959 e 1960, era somente uma questão de tempo. Nas nove primeiras corridas do ano, exceto por um abandono na França, Lauda só faria pódios, obtendo vitórias no Brasil, África do Sul, Bélgica, Mônaco e Inglaterra, segundo lugar no GP dos Estados Unidos Oeste e na Espanha, e terceiro na Suécia, o que fez com que ele tivesse mais que o dobro dos pontos de Hunt, que havia abandonado quatro provas e obtido vitórias na Espanha e França, e Scheckter, considerado seu maior rival na luta pelo título, que havia tido apenas uma vitória, na Suécia.

A décima corrida da temporada, porém, seria o GP da Alemanha, em Nürburgring, onde, como já vimos, Lauda havia passado por maus momentos no ano anterior. Considerando que o circuito não era seguro, principalmente devido à sua extensão, por acreditar que equipes de emergência demorariam a chegar a pilotos acidentados no lado oposto ao dos boxes, Lauda protestou contra a realização da prova, e chegou a pedir que os demais pilotos fizessem um boicote; a maioria deles foi contra, entretanto, e a FIA declarou que, se Lauda não participasse da corrida, seria multado e suspenso das provas seguintes, o que poderia comprometer sua caminhada rumo ao título. Sem opção, ele concordou em correr.

Parecia, porém, que ele estava adivinhando: logo na segunda volta da corrida, Lauda sairia da pista, bateria em uma elevação no terreno, voltaria para o circuito, seria atingido por dois outros carros, a Hesketh do austríaco Harald Ertl e a Surtees do norte-americano Brett Lunger, e explodiria, deixando Lauda envolto em uma bola de fogo. O acidente seria causado, em parte, pelo mau tempo: antes da prova, havia chovido torrencialmente, mas na hora da largada o tempo estava bom, com a pista ainda molhada, o que fez com que vários pilotos, inclusive Lauda, que largou em segundo, com Hunt na pole, decidissem largar com pneus de chuva; após a primeira volta, que durou mais de oito minutos, todos decidiriam parar nos boxes e voltar com pneus para pista seca, que teriam falhado porque o trecho da pista no qual Lauda bateu ainda tinha um bolsão d'água. Segundo os engenheiros da Ferrari, porém, Lauda não teria perdido o controle por estar com pneus inadequados, e sim por uma falha da suspensão traseira.

Seja como for, Ertl e Lunger conseguiram sair de seus carros, mas Lauda ficou preso nas ferragens, e só conseguiu escapar com a ajuda de dois pilotos que pararam seus carros para salvá-lo, Merzario, da Wolf, e o inglês Guy Edwards, da Hesketh. A corrida foi interrompida, e Lauda, como temia, após esperar um longo tempo pelo resgate, foi levado para o hospital entre a vida e a morte. Após a relargada, com os lugares de Lauda, Ertl e Lunger vazios, Hunt venceria a prova com facilidade. O acidente de Lauda seria tão traumático que essa seria a última corrida no circuito original de Nürburgring; no ano seguinte, a Fórmula 1 passaria a correr em Hockenheim, e o circuito de Nürburgring passaria por reformas, que o deixariam menor e mais seguro, inclusive para a famosa prova das 24 Horas - na Fórmula 1, ele só retornaria em 1984, com um traçado 60% mais curto que o original.

Outra coisa que mudaria após o acidente de Lauda seria a política de segurança da FIA em relação a capacetes: o capacete fornecido ao austríaco para a corrida lhe causava desconforto e atrapalhava sua visão, de forma que a equipe fez adaptações, que levaram a, por causa do acidente, a espuma protetora se descolar e expor a lateral da cabeça do piloto ao calor e às chamas; a partir de 1977, todos os capacetes deveriam ser homologados pela FIA, sem poder passar por alterações. Além de sérias queimaduras na cabeça, Lauda inalaria gases tóxicos que queimariam seus pulmões. Seria Merzario quem, praticamente se colocando dentro das chamas, conseguiria soltar seu cinto de segurança e retirá-lo do carro; Lauda estava consciente, e chegaria a lhe perguntar como o italiano havia conseguido salvá-lo, mas depois colapsaria e chegaria ao hospital em coma. Sua situação era tão crítica que um padre foi chamado para dar-lhe a extrema unção.

Lauda ficaria com extensas cicatrizes das queimaduras no lado direito da cabeça, perderia parte do cabelo, parte da orelha direita, a sobrancelha e a pálpebra direitas; ele aceitaria fazer cirurgia reconstrutiva para a pálpebra, mas não para as cicatrizes, para que elas ficassem como uma lembrança da importância da segurança nas corridas - de certa forma, ele, com isso, inventaria os bonés de patrocínio, já que aparecia em entrevistas e outros eventos sempre de boné, para cobrir parte das queimaduras, e seus patrocinadores logo se aproveitariam para expor sua marca, com os dos demais pilotos imitando em seguida. Apesar da gravidade das queimaduras, Lauda teria uma recuperação considerada milagrosa, e ficaria de fora de apenas duas corridas - a primeira previsão dos médicos era de que ele só poderia voltar a correr no ano seguinte. A Ferrari não participaria da prova imediatamente posterior à da Alemanha, o GP da Áustria, em protesto contra o que ela considerava ser um favorecimento da FIA à McLaren, e, na Holanda, correria só com Regazzoni, mas, sem acreditar que Lauda voltaria ainda naquele ano, contrataria o argentino Carlos Reutemann, então na Brabham, para seu lugar; com a recuperação de Lauda, Reutemann só correria uma prova, o GP da Itália, na qual a Ferrari colocaria três carros, ficando, depois, desempregado, já que seria substituído na Brabham pelo australiano Larry Perkins.

Lauda seria quarto na Itália, com Hunt abandonando; nas duas provas seguintes, Canadá e Estados Unidos, Hunt conseguiria a vitória, e Lauda seria, respectivamente, oitavo e terceiro. Isso faria com que Lauda chegasse à última prova, o GP do Japão, apenas três pontos à frente de Hunt. No dia da prova, chovia torrencialmente, e, achando que não teria segurança suficiente para correr, Lauda decidiria abandonar após apenas duas voltas. Hunt lideraria a maior parte da prova, mas, com um furo de pneu, teria de fazer uma parada a mais nos boxes; ainda assim, ele conseguiria chegar em terceiro, e conquistaria seu primeiro e único título com apenas um ponto a mais do que Lauda.

Após Lauda abandonar no Japão, sua relação com a Ferrari, até então boa, começaria a azedar. 1977 já começaria com o caldo desandando, quando a equipe decidiria contratar novamente Reutemann, com quem Lauda não tinha uma boa relação, dessa vez para o lugar de Regazzoni, que decidiria assinar com a Ensign. O austríaco, porém, teria poucas dificuldades para chegar a seu segundo título: Hunt, que começaria o ano com três poles seguidas, e venceria nos Estados Unidos, Inglaterra e Japão, logo pareceria satisfeito com apenas um título, e passaria a se dedicar mais à sua vida de celebridade que à de piloto, não opondo qualquer rivalidade séria a Lauda; Scheckter, esse ano na Wolf, mais uma vez visto como a principal ameaça, venceria a prova de abertura, na Argentina, e a sexta, em Mônaco, abandonando o GP do Brasil e fazendo pódio nas outras três, mas, após sua vitória no principado, abandonaria quatro provas seguidas, o que minaria suas chances, tendo como canto do cisne uma vitória no Canadá; o norte-americano Mario Andretti, da Lotus, faria sete poles e venceria os GPs dos Estados Unidos Oeste, Espanha, França e Itália, mas, no geral seria menos consistente, tendo também sete abandonos. Com apenas três vitórias no ano, na África do Sul, Alemanha e Holanda, mas cinco segundos lugares, um terceiro no GP do Brasil, e não pontuando apenas no GP da Argentina, no qual abandonou, e no GP da Espanha, do qual não pôde participar após quebrar uma costela nos treinos, Lauda chegaria ao bicampeonato ao terminar em quarto no GP dos Estados Unidos, faltando ainda duas corridas para o final do campeonato. Ele somaria 72 pontos, 17 a mais que Scheckter, que foi seguido por Andretti, Reutemann e Hunt, que terminaria apenas em quinto.

Insatisfeito com a Ferrari, Lauda usaria como desculpa o fato de que a equipe italiana planejava colocar o canadense Gilles Villeneuve como terceiro piloto no Canadá e pediria demissão logo após conquistar o título, não participando das duas últimas provas, os GPs do Canadá e Japão, nos quais a Ferrari correria com Reutemann e Villeneuve. Ele então aceitaria uma proposta da Parmalat para ser piloto da Brabham por dois anos, com salário de um milhão de dólares. O carro, que tinha motores Alfa Romeo, entretanto, era pouco confiável, e, em 1978, tanto Lauda quanto seu companheiro de equipe, o irlandês John Watson, sofreriam para conseguir bons resultados. O austríaco só conseguiria duas vitórias, a primeira na Suécia, na qual a Brabham estreou seu revolucionário carro BT46B, que tinha uma espécie de turbina atrás, mas que foi acusado de estar fora do regulamento por outras equipes, e acabou sendo aposentado após apenas uma prova, e na Itália, onde originalmente chegou em terceiro, mas foi beneficiado pela desclassificação de Andretti e Villeneuve. Com 44 pontos, 20 atrás do campeão Andretti, Lauda terminaria o campeonato em quarto lugar.

Em 1979, Lauda seria colega de equipe do brasileiro Nelson Piquet, que estrearia como terceiro piloto na última prova do ano anterior, o GP do Canadá. Apesar de um novo motor V12, o carro seria ainda pior que o do ano anterior, e Lauda abandonaria nada menos que 11 das 13 primeiras provas do ano, só completando os GPs da África do Sul e da Itália, nos quais seria sexto e quarto, respectivamente. Durante os treinos para a 14a prova, o GP do Canadá, Lauda cortaria uma chicane e ouviria de Bernie Ecclestone, o dono da equipe, que teria seu tempo anulado, precisando largar dos boxes; irritado, ele diria pelo rádio que estava se aposentando, e não participaria das duas últimas provas, no Canadá e Estados Unidos, sendo substituído pelo argentino Ricardo Zurino.

Concomitantemente à sua temporada na Fórmula 1, em 1979 Lauda aceitaria um convite da equipe britânica Project Four Racing para correr na primeira temporada na categoria de turismo BMW M1 Procar Championship, que contaria também com a presença de incluindo Andretti, Regazzoni, Reutemann, Emerson e Piquet, além de pilotos de diversas outras categorias do automobilismo. Com três vitórias, em Mônaco, Inglaterra e Alemanha, e um segundo lugar na Itália, Lauda se sagraria campeão da categoria, que só teria mais uma temporada antes de ser desativada, em 1980, sem a presença do austríaco, mas com Piquet, que seria campeão após vencer as três últimas provas do calendário, na Áustria, Holanda e Itália.

Também em 1979, Lauda havia fundado uma companhia aérea, chamada Lauda Air, inicialmente apenas para pequenos voos fretados (os populares "jatinhos"), mas que, em 1985, receberia autorização para se tornar uma companhia de transporte de passageiros usando aviões Boeing para voos nacionais e, a partir de 1990, internacionais. Lauda passaria os anos de 1980 e 1981 se dedicando totalmente à companhia e, em entrevistas, declararia que gerenciar uma companhia aérea era mais difícil que ganhar um título mundial na Fórmula 1. A Lauda Air se tornaria uma subsidiária da Austrian Airlines em 2000, e, em 2012, as duas passariam por uma fusão; a companhia deixaria de existir oficialmente em 2013, sendo substituída pela marca Austrian myHolyday, que não opera voos, apenas vende pacotes de viagem. Lauda ainda seria dono de mais duas companhias, a Niki, fundada em 2003, que se fundiria com a Air Berlin em 2011, e a LaudaMotion, criada após Lauda comprar a falida Amira Air em 2016, e que compraria de volta a marca Niki após a falência da Air Berlin em 2017; em 2018, a LaudaMotion passaria a ser uma subsidiária da Ryanair, e, em 2020, já após a morte do piloto, voltaria a ser uma companhia independente, apenas com o nome de Lauda, que faz voos a partir de Malta para várias cidades europeias. Lauda tinha ele mesmo licença de piloto comercial e, durante muitos anos, atuou como capitão de alguns voos de suas companhias.

O início da década de 1980 foi uma época turbulenta para a Fórmula 1, devido à chamada Guerra FISA-FOCA: em resumo, Ecclestone, que se tornou presidente da Associação dos Construtores (FOCA) discordou de várias mudanças que o comitê da FIA responsável por gerenciar a Fórmula 1 (FISA) havia feito no regulamento, incluindo na distribuição do dinheiro proveniente das cotas de televisão e permissão ou não para as equipes utilizarem inovações tecnológicas em seus carros. A maior parte das equipes ficou ao lado da FOCA, mas Ferrari, Renault, Alfa Romeo e algumas pequenas ficaram ao lado da FISA, e ambos os lados passaram a acusar o outro de favorecimento. Em meio a essa confusão, Ron Dennis, que havia se tornado chefe da equipe McLaren em setembro de 1980, convidaria Lauda para retornar à Fórmula 1 para a temporada de 1982. Dennis havia sido o chefe de equipe da Project Four Racing, e tinha um projeto revolucionário para a McLaren, parte do qual consistia em a equipe não ter primeiro piloto, dando a ambos carros iguais e chances iguais de lutar pelo título. Lauda se interessou, e seu primeiro ato após contratado foi liderar uma greve de pilotos contra mudanças no regulamento da Superlicença, o documento que permite que um piloto corra na Fórmula 1; após quase 24 horas trancados num hotel em Joanesburgo, antes da primeira etapa do ano, o GP da África do Sul, os pilotos foram bem sucedidos, e as mudanças não foram efetuadas.

A temporada de 1982 é hoje tida como uma das mais emocionantes da Fórmula 1 - as 16 provas tiveram 11 vencedores diferentes, sendo que nenhum venceu mais de duas vezes, e o finlandês Keke Rosberg, da Williams, foi campeão graças à sua regularidade, pois teve apenas uma vitória, no GP da Suíça (disputado em Dijon, França) - mas também foi uma das mais trágicas: dois pilotos sofreriam acidentes fatais, Villeneuve durante os treinos para o GP da Bélgica, e o italiano Riccardo Paletti, da Osella, atingido por trás durante a largada do GP do Canadá, além de o francês Didier Pironi, da Ferrari, ter de encerrar sua carreira após um sério acidente nos treinos para o GP da Alemanha. No meio disso tudo, o retorno de Lauda, após dois anos longe das pistas, era visto com desconfiança pelo principal patrocinador da McLaren, a Marlboro, principalmente porque Dennis lhe ofereceria um salário de 3 milhões de dólares, o mais alto da história do esporte até então. Repetindo a dupla que havia feito com Watson na Brabham em 1977, Lauda se sairia relativamente bem, conquistando duas vitórias, nos GPs dos Estados Unidos Oeste e da Inglaterra, mas somaria apenas 30 pontos, 9 a menos que Watson (que também teve duas vitórias, na Bélgica e no GP dos Estados Unidos Leste) e 14 a menos que o campeão Rosberg, terminando o campeonato em quinto lugar.

Em seu retorno à Fórmula 1, Lauda seria um dos primeiros pilotos a trocar a pintura de seu capacete - na época, e até bem recentemente, o capacete na Fórmula 1 era considerado parte da identidade visual do piloto, tornando-se, por assim dizer, sua marca registrada, com o modelo adotado por cada um acompanhando-o por toda a sua carreira. No caso de Lauda, seu capacete de 1970 a 1979 era totalmente vermelho, exceto pelo nome "Niki Lauda" escrito em letras cursivas brancas nas laterais; para a temporada de 1982, Lauda usaria um capacete branco com o L que era o logotipo da Lauda Air nas laterais em vermelho - no ano seguinte, ele inverteria as cores, com o capacete sendo vermelho e o L branco.

Para 1983, a McLaren mudaria de motor, do Ford-Cosworth para o TAG-Peugeot, e teria uma queda sensível de rendimento. Com isso, a equipe só venceria uma prova, com Watson, o GP dos Estados Unidos Oeste, onde Lauda também conseguiria seu melhor resultado do ano, um segundo lugar - Lauda só conseguiria completar cinco provas no ano, sequer se classificaria para o GP de Mônaco, e seria desclassificado do GP da Alemanha por dar ré durante um pit stop, o que faria com que ele só somasse 12 pontos, terminando o campeonato em décimo. Após o GP da Alemanha, ele insistiria para que o projetista da McLaren, John Barnard, já começasse a trabalhar no carro do ano seguinte; Barnard ficaria furioso, mas acabaria concordando, e o carro usado pela equipe na última prova do ano, o GP da África do Sul, já traria algumas bem-vindas modificações - Lauda poderia, inclusive, ter vencido a corrida, mas, com uma pane elétrica, teve de abandonar, enquanto Watson nem correu, desclassificado por ultrapassagem ilegal na volta de apresentação.

O novo projeto de Barnard colheria frutos a partir de 1984, quando Watson seria substituído pelo francês Alain Prost. A princípio, Lauda foi contra a vinda de Prost, que saiu expulso da Renault após declarações controversas sobre a equipe, mas, ao longo do ano, declarou que ter um companheiro de equipe tão rápido fez com que ele se motivasse ainda mais a vencer. A McLaren de Lauda e Prost mostraria desde o início ser o carro a ser batido, vencendo 12 das 16 provas do ano; cinco dessas vitórias foram de Lauda (na África do Sul, França, Inglaterra, Itália e Áustria, na primeira e única vez em que um piloto austríaco venceu em casa), que, apesar de outros seis abandonos, só não foi primeiro ou segundo no GP da Europa, que marcou o retorno de Nürburgring ao calendário da Fórmula 1, prova na qual Lauda chegou em quarto. Mesmo com Prost tendo mais vitórias, os quatro segundos lugares de Lauda fizeram com que ele conquistasse seu tricampeonato com meio ponto de vantagem sobre o francês, graças ao ocorrido no GP de Mônaco, no qual Lauda havia abandonado e Prost liderava, mas, sob uma chuva torrencial, pediu para que a prova fosse cancelada com apenas 28 voltas completadas, o que fez com que os pilotos recebessem apenas a metade dos pontos aos quais tinham direito. O título de Lauda em 1984 seria o primeiro da McLaren desde o de Hunt em 1976, e inauguraria uma sequência de sete quase seguidos - entre 1984 e 1991, somente Piquet, em 1987, pela Williams, seria campeão sem pilotar um McLaren.

Lauda repetiria a dupla com Prost em 1985, mas não faria uma boa temporada, abandonando 11 das 14 provas das quais participou - após quebrar o pulso durante os treinos para o GP da Bélgica, ele não largaria nessa prova e teria de ser substituído por Watson na seguinte, o GP da Europa, realizado em Brands Hatch, Inglaterra. O único pódio de Lauda em 1985 seria também sua última vitória na Fórmula 1, no GP da Holanda; curiosamente, na prova imediatamente anterior, o GP da Áustria, ele avisaria à McLaren, e depois declararia em uma entrevista coletiva, que se aposentaria ao fim da temporada, aos 36 anos de idade. Diferentemente do que fez quando saiu da Ferrari e da Brabham, Lauda cumpriu seu contrato até o final, sendo sua última corrida o GP da Austrália, que estreou no calendário naquele ano.

Após sua segunda aposentadoria, Lauda ficaria quase oito anos se dedicando exclusivamente a sua companhia aérea, até ser convidado pela Ferrari, em 1993, para ser consultor. Em 2001, ele seria convidado para ser chefe da recém-formada equipe Jaguar, mas ficaria no cargo menos de um ano e meio, sendo demitido no final de 2002. Ele retornaria à Fórmula 1 dez anos depois, em 2012, no cargo de presidente não-executivo da equipe Mercedes, sendo um dos responsáveis pela contratação de Lewis Hamilton em 2013.

Ao longo da vida, Lauda escreveria cinco livros, todos editados pelo jornalista austríaco Herbert Volker: The Art and Science of Grand Prix Driving, de 1975, sobre ser um piloto de Fórmula 1; My Years With Ferrari, de 1978, sobre sua época como piloto da Ferrari; The New Formula One: A Turbo Age, de 1984, sobre a mudança ocorrida com a introdução dos motores turbo na Fórmula 1; To Hell and Back, de 1986, sobre seu acidente; e Das dritte Leben ("a terceira vida"), de 1996, sua autobiografia.

Lauda foi casado duas vezes; no início de 1976, ele se casaria com a jornalista austríaca descendente de chilenos Marlene Knaus, cujo apoio considerou fundamental para sua recuperação do acidente; o casal teria dois filhos, Mathias, que também é piloto, atualmente disputando o Mundial de Endurance pela Aston Martin, e Lukas, que atua como empresário do irmão. Lauda e Knaus se separariam em 1991; em 2008, ele se casaria com a aeromoça austríaca Birgit Wetzinger, com quem já namorava há mais de uma década, e que havia lhe doado um rim em 2005 - no ano seguinte, eles teriam um casal de gêmeos, Mila e Max.

Além do transplante de rim, em 2018 Lauda teria de se submeter a um transplante de pulmão. Apesar de bem sucedido, sua saúde nunca mais seria a mesma e, no início de 2019, ele teria de se internar no Hospital Universitário de Zurique, na Suíça. Ele faleceria dormindo, ainda internado, em 20 de maio, aos 70 anos.

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