segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Escrito por em 24.10.11 com 0 comentários

Firefly

Eu nunca fui muito fã de filmes de faroeste. O clima de faroeste, entretanto, como as músicas típicas, o cenário árido, o herói solitário etc, me agrada muito. Sei que isso parece contraditório, mas eu mesmo nunca entendi muito bem essa atração. De fato, às vezes me pego pensando em uma espécie de "Dilema Tostines": não sei se gosto tanto de Cowboy Bebop por causa do clima de faroeste, ou se comecei a gostar do clima de faroeste por causa de Cowboy Bebop.

Talvez tenha sido mais a segunda opção, até porque, pouco depois de conhecer Cowboy Bebop, descobri outra série que também tem clima de faroeste, e que rapidamente também se tornou uma das minhas preferidas. Infelizmente, essa série não teve vida muito longa, e, por alguma razão, jamais foi lançada em DVD no Brasil - assim como Cowboy Bebop, aliás; às vezes, acho que as pessoas que decidem os lançamentos por aqui não compartilham dos meus gostos. Enfim, essa série se chama Firefly, e o post de hoje é dedicado a ela.

Jayne, Kaylee, Book, Simon, Inara, Mal, Zoe, Wash, River


Firefly, que estreou na TV americana em 20 de setembro de 2002, é uma criação de Joss Whedon, também responsável por Buffy, a Caça-Vampiros, Angel e Dollhouse. Infelizmente, apesar de ser considerada excelente por muitos, não agradou quando estava no ar, e acabou tendo apenas uma única temporada. Seus fãs, entretanto, são leais, e até hoje mantêm viva sua memória.

A série é ambientada no ano 2517, em um sistema solar composto de diversos planetas e luas. Esse sistema começou a ser colonizado quando a Terra - referida na série como "Terra-que-foi" - se tornou pequena para a grande quantidade de pessoas que a habitavam. Essas pessoas então deixaram o planeta em busca de novos mundos para colonizar. Apesar de terem recebido ajuda para terraformar esses mundos - tornando-os capazes de sustentar a vida como na terra - esses colonos acabariam, posteriormente, abandonados à própria sorte. O resultado é que a maioria dos planetas se parece com um cenário do Velho Oeste, com vilarejos esparsos, clima hostil e vida difícil.

Esses planetas são conhecidos como "periféricos"; nos planetas "centrais", a vida é bem diferente. Contando com grandes cidades e todo o conforto que sua tecnologia avançada pode oferecer, os planetas centrais são governados com mão de ferro pela Aliança, uma entidade que atua como governo de todo o sistema solar. Em suas origens, a Aliança consistia de uma união entre os dois governos da Terra que promoveram a expansão espacial, os Estados Unidos e a China, o que resulta em uma curiosa mistura das duas culturas no universo da série - todas as gírias usadas pelos personagens, por exemplo, são em chinês. Quanto mais longe dos planetas centrais, entretanto, mais fraca é a influência da Aliança, o que significa que os planetas periféricos possuem um certo grau de autonomia. No passado, inclusive, os planetas periféricos tentaram se revoltar contra a Aliança, o que resultou em uma guerra. A batalha que determinou o resultado dessa guerra, com a vitória da Aliança, foi travada em um local conhecido como Vale da Serenidade.

Os eventos da série ocorrem alguns anos após essa batalha, e acompanham a tripulação de uma nave chamada Serenity, em homenagem a ela. A Serenity é uma nave da classe firefly, um modelo já antigo e meio fora de uso, cuja aparência lembra um vaga-lume (que, em inglês, evidentemente, é firefly), inclusive com um "bumbum" que acende quando está em aceleração. A Serenity é comandada pelo Capitão Malcolm Reynolds, ou simplesmente Mal (Nathan Fillion), que lutou ao lado dos rebeldes e perdeu, se tornando cínico, fechado e geralmente descontente com a humanidade após a derrota no Vale da Serenidade. Mal decidiu viver livre de quaisquer laços com a Aliança, e se tornou uma espécie de contrabandista, usando a Serenity para transportar cargas de valor mediante um preço e saqueando naves que encontra abandonadas no espaço para tentar vender sua carga. Para ajudar a pagar as contas, ele também aceita levar passageiros, fingindo que a Serenity é uma nave comum de transporte. Apesar de seu trabalho desonesto, Mal tem bom coração, o que não é muito bom para os negócios, pois muitas vezes o leva a tomar decisões que o fazem perder dinheiro ou ficar em maus lençóis com seus empregadores.

O segundo em comando na Serenity é Zoe Washburne (Gina Torres), que lutou ao lado de Mal contra a Aliança. Zoe é uma mulher forte, decidida, que respeita e confia cegamente em Mal, muitas vezes agindo como se ele ainda fosse seu superior hierárquico militar. Zoe é casada com o piloto da nave, Hoban Washburne, conhecido como Wash (Alan Tudyk), um homem que é seu completo oposto, brincalhão, descompromissado e sempre vestindo roupas mais apropriadas a quem está de férias no Havaí. Wash tem ciúmes da relação de Zoe com Mal, mas também confia no Capitão e respeita suas ordens - exceto quando ele pediu para que eles não se casassem.

A tripulação original da Serenity possuía ainda três outros membros. O primeiro é Jayne Cobb (Adam Baldwin), um mercenário de aluguel de personalidade contraditória. Jayne aparenta ser rude, mal-educado, machão, pouco inteligente e só pensar em dinheiro, mas em algumas situações morre de medo, trata seus colegas com delicadeza, encontra soluções criativas para os problemas enfrentados pela nave, e é até capaz de se mostrar altruísta e generoso. Já Kaylee Frye (Jewel Staite) é a mecânica da nave, com um conhecimento quase sobrenatural de suas peças e de como elas funcionam. Kaylee é ingênua, doce e sempre procura ver o lado positivo de cada situação. Finalmente, temos Inara Serra (Morena Baccarin), que trabalha como Companheira e aluga uma das duas pequenas naves que a Serenity carrega. Uma Companheira atua como acompanhante e parceira sexual mediante o pagamento de uma taxa, o que a torna uma espécie de prostituta - título pelo qual Mal a chama para irritá-la, e que ela detesta. No universo de Firefly, entretanto, Companheiras são extremamente respeitadas, e sua presença na Serenity confere à nave um grau de respeito e um status social que a nave não teria sem ela. Inara e Mal muito provavelmente tiveram um caso no passado, mas agora vivem às turras; ambos não admitem que gostam da presença um do outro, e alegam que só convivem juntos porque o contrato é bom para ambas as partes - possibilitando que Inara se desloque com facilidade de um planeta para outro, enquanto a Serenity posa como nave de respeito.

No episódio piloto, Mal concorda em transportar três outros passageiros, que se uniriam à tripulação da Serenity pelo resto da série. O único que não representa problemas é o Pastor Book (Ron Glass), que se diz apenas um homem de Deus indo pregar nos confins do Universo, mas demonstra conhecimento sobre o crime organizado, corrupção na polícia e uso de armas de fogo, além de possuir trânsito livre com a Aliança. Book acaba atuando como a consciência de Mal, e como guia espiritual para todo o grupo. Outro passageiro é o Dr. Simon Tam (Sean Maher), médico respeitado e cirurgião do primeiro time, tendo se formado entre os 3% mais competentes de sua turma em um dos mais famosos planetas centrais. Simon, na verdade, é um fugitivo da Aliança, pois resgatou sua irmã River (Summer Glau) de uma instituição de segurança máxima, onde estava servindo como cobaia para diversos testes. Originalmente uma criança-prodígio, River ficou meio lelé após as experiências, e agora anda pela nave dizendo coisas sem sentido e agindo como uma louca - embora, de repente, tenha momentos de extrema lucidez, encontre soluções brilhantes para os problemas da nave, e até mesmo demonstre habilidades telepáticas. A presença de Simon e River é um transtorno para a nave, pois todos serão presos se a Aliança descobrir que eles transportam fugitivos; ainda assim, Mal decidiu ajudá-los, com a desculpa de que a nave precisava de um médico.

Além de se envolverem com criminosos e de ter de fugir da Aliança, a tripulação da Serenity ainda tem um outro problema para lidar: os Reavers, uma raça de humanos deformados e canibais que vaga pelos confins do espaço, atacando naves e planetas periféricos para satisfazer seus desejos distorcidos. Para a Aliança, os Reavers são apenas uma lenda, mas quem vive no espaço sabe que eles são bem reais.

Whedon teve a ideia para a série após ler um livro que falava da Batalha de Gettysburg, ocorrida durante a Guerra de Secessão. Seu intuito era fazer uma série focada em personagens pertencentes ao lado perdedor de uma guerra, que atuassem como pioneiros e desbravadores mais ou menos como ocorreu durante a época da Reconstrução Americana. A ideia de aplicar esse conceito a um cenário de ficção científica veio depois, quando ele chegou á conclusão de que os seriados de ficção científica de época estavam muito pasteurizados, e que seria bom criar um com personagens mais profundos para dar uma chacoalhada. Esse intuito de fazer algo diferente acabaria resultando em uma das marcas registradas da série: em Firefly, diferentemente de em 99,9% dos filmes de ficção científica, não há som no espaço - como deveria ser, a propósito.

Após o sinal verde da Fox para a nova série, Whedon escolheu Tim Minear como produtor, e convidou Ben Edlund (criador do Tick) para chefe dos roteiristas. Whedon e Minear, entção, se puseram a escolher o elenco, dando preferência a atores que Whedon já conhecia; Fillion, por exemplo, sua primeira escolha para o papel de Mal, já havia interpretado Caleb na série Buffy, e se mostrou extremamente empolgado com seu primeiro protagonista. Torres, que já havia trabalhado com Whedon em Angel, a princípio não se mostrou muito interessada em um novo papel em uma série de ficção científica, mas, após ler o roteiro, se apaixonou pelo personagem. Baldwin, um grande fã de faroeste, também já havia trabalhado com Whedon em Angel, e topou na hora. Outra atriz já conhecida de Angel era Glau, mas ela só ganhou o papel de River após um teste em conjunto com Maher, indicado para o papel de Simon por Minear. Glass, um veterano da televisão, jamais havia pensado em fazer ficção científica ou faroeste, mas, após ser convidado por Minear, também se apaixonou pelo roteiro.

Assim como Glau e Maher, os outros três atores do elenco principal foram escolhidos após testes: Tudyk se candidatou ao papel através de uma agência, e Staite, nascida e criada em Vancouver, enviou de lá uma fita para Whedon em Los Angeles. A princípio, Whedon havia imaginado Kaylee como asiática, mas gostou tanto da atuação da menina que a convidou para um teste e lhe deu o papel. Finalmente, o papel de Inara ficaria com a atriz Rebecca Gayheart, mas, durante as filmagens do piloto, Whedon não gostou de sua atuação, e conduziu mais testes, após os quais escolheu Baccarin, que faria sua estreia na TV nesse seriado.

Infelizmente, o episódio piloto foi motivo de muita controvérsia entre Whedon e os executivos da Fox. Whedon preferia que a série fosse filmada em widescreen, mas a Fox exigiu que o fosse em fullscreen. Só para irritar, Whedon filmou várias cenas com elementos importantes de lados opostos da tela, o que tornaria impossível formatá-la em fullscreen. A resposta da Fox foi considerar o piloto inadequado, os personagens pobres, o enredo ruim e descartá-lo, dando a Whedon um curto prazo para filmar um novo piloto, sob pena da série não ir ao ar - em com a exigência de que, desta vez, ele filmasse em fullscreen.

Ao invés de um novo piloto, Whedon filmaria um novo episódio que também pudesse servir como primeiro. O resultado foi que a Fox exibiria os episódios fora da ordem pretendida por Whedon, começando por esse "segundo piloto" e então levando-os ao ar na ordem que achava melhor. Ainda por cima, a Fox promoveu Firefly como um seriado de ação e comédia, ao invés de um drama como Whedon queria. Essas ações acabariam confundindo o público da série, e fazendo com que ela não tivesse boa audiência. A crítica também se dividiu, com alguns criticando a mistura de ficção científica com faroeste, outros elogiando a profundidade das relações entre os personagens da série.

Ao todo, 14 episódios, incluindo o piloto, foram filmados. Devido à baixa audiência, entretanto, apenas 11 foram ao ar - curiosamente, o piloto foi o último, logo antes do cancelamento da série, em 20 de dezembro de 2002. Quando as notícias sobre o cancelamento começaram a surgir, um grupo de fãs fiéis se uniu para tentar convencer a Fox a produzir pelo menos mais uma temporada; quando não houve jeito, eles tentaram convencer a Paramount a assumir a série, também sem sucesso. Os três últimos episódios permaneceriam inéditos nos Estados Unidos e Canadá até o lançamento da série em DVD, mas foram exibidos na Europa pelo Sci Fi Channel.

Após seu cancelamento, Firefly ganharia status de cult, e sua mitologia seria mantida viva pelos fãs, que motivariam a criação de diversas outras mídias, como uma série em quadrinhos da Dark Horse Comics, um RPG publicado pela Margaret Weis Produtions (de Dragonlance) e webisódios que mostravam o sofrimento de River enquanto estava captiva nas instalações da Aliança. Esses webisódios também serviriam de prelúdio para um filme, dirigido por Whedon e produzido pela Universal, lançado em 30 de setembro de 2005, que atuaria como continuação e fechamento para a série.

Chamado Serenity (aqui no Brasil, onde foi lanaçdo direto em DVD, ganhou o subtítulo de A Luta Pelo Amanhã), o filme começa mostrando a fuga de Simon e River das instalações da Aliança, que então envia um agente (Chiwetel Ejiofor) para caçá-la e trazê-la de volta. Passados três anos desde os eventos da série, a tripulação da Serenity continua tentando levar sua vida contrabandeando, mas agora terá um novo problema pela frente, ao descobrir um segredo que pode minar o poder da Aliança e mudar os rumos da história do Universo, além de ter de fugir do implacável agente escolhido para trazer River de volta. Serenity teve uma boa recepção do público e da crítica, mas, talvez por ser ligado a uma série de TV, não teve boa bilheteria, só se pagando após seu lançamento em DVD.

Assim como os fãs, o elenco parece não ter se conformado com o fim da série, e, até hoje, surgem boatos de uma continuação para o filme, ou até mesmo de uma nova temporada para a série. Passados quase dez anos, porém, parece pouco provável que a tripulação da Serenity volte a singrar o espaço. De fato, parece que tudo o que é bom dura pouco.

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