segunda-feira, 30 de novembro de 2015

Escrito por em 30.11.15 com 0 comentários

World Games (VI)

E vamos ao (por enquanto) último post da série sobre os World Games, com as duas edições mais recentes!

Kaohsiung 2009

Sete cidades expressaram publicamente seu desejo de sediar os World Games de 2009. Kaohsiung, segunda maior cidade de Taiwan, atrás apenas da capital, Taipé, não estava entre elas. Isso porque, para garantir o direito de sediar o evento, Kaohsiung teve de empregar uma verdadeira tática de guerrilha.

Para quem não sabe, a China possui uma picuinha com Taiwan, se recusando a reconhecer a ilha como uma nação independente. Nas palavras do governo chinês, Taiwan é apenas "uma província rebelde", que se recusa a seguir as ordens vindas de Pequim. Devido a essa picuinha, a China sempre usa de suas relações diplomáticas e comerciais para prejudicar Taiwan no cenário internacional, principalmente em competições esportivas: em eventos como as Olimpíadas, a Copa do Mundo de Futebol e os World Games, por exemplo, Taiwan é proibida de competir sob seu nome oficial (República da China; a China é a República Popular da China), devendo usar "Taipé Chinês", de usar sua própria bandeira (que a China considera como sendo um símbolo separatista), e até mesmo de ouvir seu hino nacional caso seus atletas vençam provas, sendo usada uma bandeira criada e executada uma música composta especialmente para esse tipo de ocasião. Por mais que isso seja absurdo, a própria Taiwan acabou concordando com esses termos, acuada pelo medo de acabar ainda mais prejudicada pela China caso não aceitasse.

Toda vez que Taiwan tenta sediar um evento esportivo de grande porte, a China também intervém para impedir - embora o governo chinês negue, é sabido que até mesmo ameaças comerciais são feitas, tipo a China parar de importar um determinado produto de um determinado país se este votar a favor ou oferecer apoio a Taiwan. Uma das poucas vezes em que Taiwan chegou perto foi quando Kaohsiung se candidatou a sede da Universíade, a Olimpíadas dos esportes universitários, de 2005. Kaohsiung chegaria à última fase de votação, e, nas pesquisas não-oficiais, era quase certo que ela seria a vencedora. A China, porém, usaria sua influência para que muitos dos delegados mudassem seus votos, e a Universíade acabaria ficando com a cidade de Izmir, na Turquia.

O prefeito de Kaohsiung, Frank Hsieh, porém, decidiria não deixar barato. Desde a primeira edição, Taiwan era um dos países que davam mais importância aos World Games, e ele já sabia que, algum tempo depois da escolha da sede da Universíade de 2005, começaria o processo para a escolha da sede dos World Games de 2009. Determinado a conseguir o evento, Hsieh criaria um comitê que trabalharia no mais alto sigilo, para garantir que Kaohsiung fosse a vencedora antes mesmo de a China perceber o que estava acontecendo. O trabalho desse comitê começaria ainda em 2002, dois anos antes de se iniciar o processo da escolha de sede de 2009, quando o Comitê Nacional para Preparo Físico e Esportes de Taiwan convidaria o presidente da IWGA, Ron Frohlich, para uma visita ao país, sob a desculpa de mostrar as instalações de treinamento que faziam com que os atletas de Taiwan fossem tão bem sucedidos nos World Games. Em meio à visita, Frohlich assistiria a uma apresentação surpresa sobre a cidade de Kaohsiung, e sobre a possibilidade de que ela se candidatasse a sede para 2009. A Secretária de Esportes de Taiwan, Lin Lin, manifestaria esse desejo a Frohlich, mas pediria para que ele guardasse segredo.

Em novembro de 2003, aconteceria o contrário: uma delegação de seis pessoas, representando a prefeitura de Kaohsiung, o Comitê Olímpico Taiwanês e o Comitê Nacional para Preparo Físico e Esportes, visitaria a Europa, para se encontrar com os delegados da IWGA e fazer a apresentação oficial da candidatura de Kaohsiung. A cidade assinaria o contrato para sediar os World Games de 2009 em junho de 2004, mas a notícia seria mantida em segredo até a cerimônia de encerramento dos World Games de 2005, quando o então prefeito de Kaohsiung, Chen Chi-mai, receberia a bandeira dos World Games das mãos do prefeito de Duisburgo, e Frohlich faria o anúncio oficial de que Kaohsiung seria a próxima sede. A China, evidentemente, protestou, mas aí já era tarde para tomar qualquer providência.

Uma das principais preocupações da IWGA em relação a Kaohsiung sediar os World Games estava no idioma, já que, embora o idioma oficial de Taiwan seja o mandarim, principal dialeto chinês, a maior parte da população fala outro dialeto, o hokkien, mas os delegados que visitariam a cidade para ratificar a escolha acabariam descobrindo que a maior parte da população jovem do país fala bem o inglês - de fato, o comitê organizador conseguiria recrutar quase meio milhão de voluntários para agir como intérpretes não somente para os atletas, mas também para os visitantes. Entusiasmados, simpáticos e solícitos - e, para muitos dos visitantes, uma surpresa - esses voluntários acabariam se tornando uma das principais atrações dos World Games de 2009, e frequentemente seriam citados como uma das principais razões para o sucesso do evento.

O logotipo do evento representava o primeiro ideograma do nome da cidade escrito em chinês tradicional, gao, que significa "elevado" ou "superior" em mandarim; ao invés de desenhado com traços, esse ideograma foi construído com uma fita colorida, para simbolizar o esporte, o movimento e a alegria. Assim como Akita, Kaohsiung teve um casal de mascotes, os gêmeos Gao Mei e Syong Ge; embora sejam quase idênticos, eles representam, respectivamente, uma labareda e uma gota d'água, e simbolizam o apelido de Kaohsiung, "cidade do sol e do mar". O nome dos mascotes, aliás, une as duas sílabas do nome da cidade em mandarim (gao e syong) às palavras sol (mei) e mar (ge).

Um fato curioso sobre essa edição dos World Games seria que Kaohsiung conseguiria burlar a regra do IWGA que proíbe a construção de instalações apenas para o evento: as duas principais instalações esportivas utilizadas, o Estádio Nacional e a Arena Kaohsiung, foram planejados para a Universíade, mas, quando a cidade não conseguiu garantir o direito de sediá-la, suas obras foram suspensas; ambos acabariam concluídos e inaugurados apenas para os World Games, o que fez com que se tornassem as instalações mais modernas da história do evento. Algo semelhante ocorreu com um novo sistema de transporte, o MRT (da sigla em inglês para Transporte Rápido de Massa), evidentemente construído especialmente para os World Games, já que interligava todos os locais de competição, mas que, oficialmente, já estava planejado pela cidade, e, nas palavras do prefeito, seria construído mesmo que a cidade não sediasse o evento.

O Estádio Nacional, palco das cerimônias de abertura e encerramento, além das competições de rugby e ultimate, é um dos mais modernos do mundo, com capacidade para 55 mil pessoas, uma cobertura em formato de dragão, e totalmente adaptado para colher e utilizar energia solar, o que faz com que seu impacto ambiental e econômico seja mínimo. A Arena Kaohsiung, palco da ginástica e da dança de salão, também não fica atrás, com um belo formato arquitetônico - que lhe valeu o apelido de "Grande Ovo" - e arquibancadas para 15 mil pessoas totalmente acessíveis para deficientes físicos. Todos os demais locais de competição já existiam e foram, no máximo, reformados, incluindo o ginásio da Universidade Nacional, usado para o corfebol e o tchoukbol; o ginásio da Universidade Sun Yat-sen, usado para o jiu-jitsu, o caratê e o cabo de guerra; o estádio da Universidade I-Shou, usado para a patinação; e o Estádio de Chung Cheng, usado para o bilhar, raquetebol, squash e punhobol.

Os World Games de 2009 seriam realizados entre 16 e 26 de julho, e contariam com a presença de 3.100 atletas de 105 nações. Embora muitos temessem que a China boicotasse o evento, ela participou, enviando 148 atletas, que não participariam, porém, das cerimônias de abertura e de encerramento. Na abertura, cujo desfile das delegações contou apenas com uma voluntária levando a bandeira chinesa, o motivo oficial apresentado pelo governo chinês foi a presença de Ying-Jeou Ma, presidente de Taiwan, a quem Pequim não reconhece como Chefe de Estado; no encerramento, a desculpa foi que os atletas precisaram retornar à China para reiniciar seus treinamentos. A prefeita de Kaohsiung, Chen Chu, lamentou a ausência dos chineses na abertura, e declarou em seu discurso que "um grande país deveria mostrar mais tolerância".

O programa contaria com 164 provas de 32 esportes: bilhar, boliche, boules, cabo de guerra, caratê, corfebol, dança esportiva, escalada esportiva, esportes aéreos, esqui aquático, finswimming, fisiculturismo, frisbee, ginástica acrobática, ginástica aeróbica, ginástica de trampolim, ginástica rítmica, hóquei inline, jiu-jitsu, orientação, patinação artística, patinação em velocidade, polo a canoa, powerlifting, punhobol, raquetebol, rugby sevens, salvamento, squash, sumô e tiro com arco. Os esportes convidados foram cinco: corrida de barcos-dragão, handebol de praia, softbol, tchoukbol e wushu (clique aqui para ver todas as provas do programa).

O Brasil conseguiria uma excelente participação, terminando com três ouros, três pratas e três bronzes. As medalhas de ouro incluiriam o primeiro ouro em um esporte coletivo, no punhobol, e o primeiro ouro individual conquistado por uma mulher, com Marcela Lopez na aeróbica, além de um merecido ouro para o principal atleta do caratê brasileiro, Douglas Santos Brose, categoria leves. As pratas viriam uma do boules, nas duplas femininas da modalidade punto, raffa, volo, com Noeli Dalla Corte e Ingrid Fulcher, e duas do fisiculturismo, com Luiz Carlos Sarmento na categoria leves e Diana Almeida na categoria fitness. Os bronzes viriam com Marat Leiras na categoria pilotagem do paraquedismo, Marcel Sturmer na patinação artística, e Milton Schmitz e Rafael Vanz Borges nas duplas masculinas do punto, raffa, volo. Além dessas medalhas todas, o Brasil ainda seria ouro no handebol de praia masculino e bronze no feminino, mas, lembrando, medalhas de esportes convidados não contam para o quadro.

O topo do quadro de medalhas ficaria com a Rússia, com 18 de ouro, 14 de prata e 15 de bronze, seguida de perto pela Itália, com 16 ouros, 12 pratas e 13 bronzes, e por uma surpreendente China, 14 ouros, 10 pratas e 5 bronzes. Todos esses três países se destacariam no finswimming, travando uma luta pódio a pódio, mas a Rússia reinaria soberana na ginástica, com nada menos que nove ouros, incluindo quatro de Eugenia Kanaeva, campeã em todos os quatro aparelhos da ginástica rítmica - bola, maça, fita e corda.

Taiwan, a anfitriã, teria como maior destaque a patinadora Yu-Ting Huang, três ouros na patinação em velocidade, no sprint de 500 e 1.000 m e no contra o relógio 300 m. Ao todo, Taiwan conquistaria 8 ouros, 9 pratas e 7 bronzes, com os outros ouros vindo da patinação em velocidade, 300 m contra o relógio masculino (Wei-Lin Lo); do powerlifting, categoria leves masculino (Tsung-Ting Hsieh) e feminino (Wei-Ling Chen); do caratê, categoria pesados masculino (Hao-Yun Huang); e do cabo de guerra feminino. Taiwan também se sairia muito bem nos esportes convidados: no tchoukbol, extremamente popular naquele país, Taiwan conquistaria os dois ouros (masculino e feminino), ficando as duas pratas com a Suíça, o bronze do masculino com Cingapura e o do feminino com o Canadá. No softbol, disputado apenas no feminino, Taiwan ficaria com a prata, ficando o ouro com o Japão e o bronze com a Coreia do Sul. No wushu, os taiwaneses terminariam com um ouro (Peng-Wei Chua, nanquan e nandao masculino), três pratas (Chen-Shao Chi, jianshu e qiangshu feminino; Fan-Man Yun, taijiquan e taijijian masculino; e Chou-Ting Yuan, sanshou masculino, categoria médios) e um bronze (Kao-Yu Chuan, sanshou feminino, categoria pesados). E, nos barcos-dragão, Taiwan terminaria com uma prata nos 2.000 m e um bronze nos 200 m - a grande campeã seria a Rússia, que conquistaria o ouro nas quatro corridas.

O punhobol, além do ouro do Brasil, teria prata da Suíça e bronze da Áustria. No corfebol, mais um ouro para a Holanda, mais uma prata para a Bélgica, e bronze para Taiwan. No rugby sevens, mais um ouro para Fiji, uma surpreendente prata para Portugal, e bronze para a África do Sul. No pólo a canoa masculino, ouro para a França, prata para a Holanda e bronze para a Austrália; no feminino, ouro para o Reino Unido, prata para a Alemanha e bronze para a França. No ultimate, ouro para os Estados Unidos, prata para o Japão e bronze para a Austrália. No handebol de praia masculino, ouro para o Brasil, prata para a Hungria e bronze para a Croácia; no feminino, ouro para a Itália, prata para a Croácia e bronze para o Brasil. E, no hóquei inline, ouro para os Estados Unidos, prata para a França e bronze para a República Tcheca.

No fim, os World Games de Kaohsiung seriam um grande sucesso, sendo considerados, até hoje, como os melhores de todos os tempos. Só quem não ficou muito satisfeito, apesar de todas as medalhas que ganhou, foi a China, já que, além de agora estar provado que Taiwan tem condições de realizar um evento esportivo de grande porte, parece que muitos países perderam o medo de votar a seu favor: em 2011, Taipé, a capital taiwanesa, mesmo com todos os protestos chineses de praxe, foi escolhida para sede da Universíade de 2017 - curiosamente, derrotando Brasília na última rodada de votações.

Cali 2013

Nos quatro anos entre a escolha da sede de 2009 e o início do processo para escolha da sede de 2013, nada menos que 22 cidades de quatro continentes chegaram a expressar, de alguma forma, o desejo de sediar a competição - incluindo duas que já haviam sido sedes olímpicas, Barcelona e Moscou. Nem todas, entretanto, levaram o projeto adiante: na "hora do vamos ver", quando a IWGA abriu as inscrições, apenas três cidades efetivamente se candidatariam - ou melhor, quatro, já que, além de Pretória, na África do Sul, e de Cali, na Colômbia, havia uma candidatura conjunta das cidades de Duisburgo e Düsseldorf, na Alemanha.

Duisburgo, para quem não lembra ou não leu os posts anteriores dessa série, havia sido sede dos World Games de 2005. Na ocasião, o comitê organizador planejava usar também algumas instalações esportivas de Düsseldorf, mas a IWGA vetou. Como o retorno financeiro dos World Games para a cidade foi fantástico - e como o título de "melhores World Games de todos os tempos", anteriormente conferido a Duisburgo, havia sido "tomado" por Kaohsiung quatro anos depois - o prefeito de Duisburgo se apressou a candidatar a cidade novamente o quanto antes, dessa vez convencendo Düsseldorf a entrar junto, para que as tais instalações esportivas fossem usadas. Como a IWGA também havia ficado extremamente satisfeita com os World Games de 2005, e como o projeto de Duisburgo e Düsseldorf era realmente o melhor, em março de 2008 a IWGA anunciaria que as cidades alemãs foram escolhidas para sediar os World Games de 2013, dando a Duisburgo a chance de ser a primeira cidade a sediar duas edições do evento, com apenas oito anos entre uma e outra.

Isso, porém, jamais chegaria a se concretizar. Ainda em 2008, já com um novo prefeito, e colocando a culpa na crise financeira que se abateu sobre a Europa naquele ano, Duisburgo desistiria de sediar os World Games, comunicando sua decisão à IWGA. Düsseldorf poderia ter seguido em frente como sede única, mas, incapaz de assegurar os patrocínios necessários para a realização do evento, também decidiu desistir. Pretória e Cali, então, se reapresentaram, se dizendo ainda dispostas a sediar o evento caso a IWGA concordasse, e São Petersburgo, na Rússia, decidiu entrar na disputa. A IWGA, então, realizaria uma reunião extraordinária para a escolha da nova sede, na qual, após três rodadas de votação, seria vitoriosa a cidade colombiana, que seria oficialmente anunciada como sede de 2013 na abertura dos World Games de 2009.

Como já era de praxe, a população de Santiago de Cali - nome completo da cidade - ficaria empolgadíssima com a realização do evento, tanto que todas as competições teriam lotação máxima ou próxima da máxima, até mesmo aquelas as quais o povo colombiano não estava acostumado a acompanhar - e as que eram realmente populares, como a competição de salsa da dança esportiva, atrairiam tanto público que seus ingressos se esgotariam com meses de antecedência, e milhares de pessoas se amontoariam do lado de fora no dia, ainda tentando conseguir uma forma de entrar. Cali também já havia sido sede dos Jogos Panamericanos de 1971, e estava acostumada a receber competições esportivas de atletismo, ciclismo e futebol, de forma que a cidade já possuía a experiência necessária para a organização de um evento desse porte. Mesmo com esses dois fatores, porém, os World Games de 2013 teriam muitos problemas. Cali é uma cidade enorme - terceira maior da Colômbia, atrás de Bogotá e Medellín, e bem maior que Barranquilla, a quarta colocada - de forma que os locais de competição ficavam muito longe uns dos outros. Além disso, alguns locais de competição sequer ficavam em Cali, mas nos municípios vizinhos de Buga e Jamundí; como não havia um sistema de transporte eficiente como o de Kaohsiung, alguns espectadores - e até mesmo alguns atletas - levariam mais de uma hora para se locomover de um local de competições para o outro. Além disso, Cali fica a mil metros de altitude, o que influenciou algumas competições, e, durante todo o período do evento, fez um forte calor, com o qual a maioria dos atletas não estava acostumada - em alguns dias o sol era tão forte que o público nem conseguia se sentar nas arquibancadas dos locais de competição abertos, de tão quentes que elas ficavam. Por causa disso, muitos dos eventos programados para o dia tiveram de ser reprogramados para a noite, quando o clima era mais fresco e agradável, mas, para algumas competições, como a de paraquedismo, não houve jeito.

Outro problema bizarro em Cali ocorreu com as medalhas: sem que ninguém percebesse, ao invés de World Games, estava escrito nelas "Word Games" (os "jogos de palavras", em inglês). Curiosamente, o design das medalhas passaria por várias inspeções e aprovações sem que ninguém percebesse o erro, só notando-o quando todas já estavam prontas e era tarde demais. Alguns atletas, ainda no pódio, ao perceberem, começavam a rir. A empresa responsável pelas medalhas disse que não poderia se responsabilizar, já que o comitê organizador havia assinado um contrato segundo o qual "qualquer erro encontrado após a aprovação do cliente será de responsabilidade deste, e não da empresa". O canal de TV Noticias Uno deu grande destaque ao caso, mas o prefeito de Cali, Rodrigo Guerrero, considerou que estava sendo feita uma tempestade em copo d'água, e que o erro de maneira alguma diminuía o valor ou a importância das medalhas.

Para completar as pataquadas, os responsáveis simplesmente se esqueceram de criar um poster para o evento. Criaram um logotipo, é verdade, no mesmo estilo do de Kaohsiung, com uma fita colorida formando a letra C (de Cali e Colômbia) e a silhueta de um sapo saltando, pois o tema escolhido para esses World Games era a preservação da natureza, e seu slogan era "jogue limpo com o planeta". Até a abertura do evento, entretanto, ainda não havia um poster oficial, de forma que esse logotipo acabaria combinado ao slogan e ao nome da cidade para criar um. O mascote de 2013 foi um bem-te-vi, conhecido por lá como bichofué; talvez em mais uma escorregada, ele não tinha nome, e acabou conhecido apenas como Bichofué mesmo.

Apesar de todas essas lambanças, os World Games de 2013 estiveram longe de ser um fracasso. Apesar do calor, os atletas adoraram o "clima latino" que permeou todas as competições, e a já citada grande presença do público contribuiu para chamar a atenção sobre o evento, até então pouco conhecido na América do Sul. A cerimônia de abertura, realizada no Estadio Olímpico Pascual Guerrero, onde o América de Cali joga suas partidas, contou com 40 mil espectadores, e foi uma das mais animadas dos World Games. Também estariam presentes o vice-presidente da Colômbia, Angelino Grazón, e o presidente do COI, Jacques Rogge, que fez um discurso enaltecendo o evento e a animação da cidade em recebê-lo. O canal de TV público colombiano Señal Colombia seria o responsável por televisionar as competições, negociando-as com a ESPN e com a Fox Sports, que, por sua vez, fariam com que as transmissões, ao vivo, em VT ou na forma de programas "o melhor do dia", chegassem a mais de cem países, um recorde para o evento.

Os World Games de 2013 seriam realizados entre 25 de julho e 4 de agosto, e contariam com a presença de 2.870 atletas de 103 nações, disputando 164 provas de 31 esportes: bilhar, boliche, boules, cabo de guerra, caratê, corfebol, dança esportiva, escalada esportiva, esportes aéreos, esqui aquático, finswimming, frisbee, ginástica acrobática, ginástica aeróbica, ginástica de trampolim, ginástica rítmica, handebol de praia, hóquei inline, jiu-jitsu, orientação, patinação artística, patinação em velocidade, polo a canoa, powerlifting, punhobol, raquetebol, rugby sevens, salvamento, squash, sumô e tiro com arco. Os esportes convidados seriam canoagem, duatlo, futebol de salão, patinação em velocidade, softbol e wushu (clique aqui para ver todas as provas do programa).

O fisiculturismo, cuja federação internacional fora suspensa pela IWGA em 2010, já que não concordava com as novas políticas da entidade para os exames anti-doping, ficaria pela primeira vez de fora do programa; em compensação, o handebol de praia, após três aparições como esporte convidado, finalmente entraria para o programa principal. E o rugby sevens faria sua última participação nos World Games, já que, tendo sido incluído no programa das Olimpíadas para a partir de 2016, se tornou automaticamente inelegível para o evento da IWGA.

Os esportes convidados teriam dois "repetidos", o softbol e o wushu, e muitas novidades: no caso da patinação em velocidade, até 2013 apenas as provas de pista eram disputadas nos World Games; nessa edição, as provas de estrada estreariam, mas como parte dos esportes convidados, permanecendo as de pista no programa principal. Já no caso da canoagem, ao invés da corrida de barcos-dragão, seria disputada como esporte convidado a modalidade maratona, que conta com provas de 20 km, com um total de seis provas (canoa individual masculina, canoa duplas masculinas, caiaque individual masculino, caiaque duplas masculinas, caiaque individual feminino e caiaque duplas femininas). O futebol de salão seria o "original", usando as regras da AMF (Associação Mundial de Futebol de Salão) e não as da FIFA (que usa o nome futsal em seus torneios). Completaria a lista dos esportes convidados o duatlo, regulado pela Federação Internacional de Triatlo (ITU) e composto por três partes, uma de corrida, uma de ciclismo e outra de corrida, sendo, portanto, basicamente, um triatlo sem natação. A organização ainda tentaria incluir o frontón internacional, o kudô e o hapkidô como esportes convidados, mas não chegaria a um consenso com as federações desses esportes; competições de todos os três, porém, seriam realizadas em Buga e Jamundí simultaneamente aos World Games, mas com todos os atletas participantes sendo colombianos.

Nos esportes coletivos, o punhobol teria ouro para a Alemanha, prata para a Suíça e bronze para a Áustria, com o Brasil decepcionando e terminando em quarto lugar, ficando fora do pódio pela primeira vez desde 1993. No corfebol, nenhuma surpresa: ouro para a Holanda, prata para a Bélgica e bronze para Taiwan. No rugby sevens, ouro para a África do Sul, prata para a Argentina e bronze para o Canadá. No pólo a canoa masculino, ouro para a Alemanha, prata para a França e bronze para a Itália; e, no feminino, ouro para a Alemanha, prata para o Reino Unido e bronze para a França. No handebol de praia masculino, o ouro foi do Brasil, a prata da Rússia e o bronze da Croácia; no feminino, mais um ouro para o Brasil, prata para a Hungria e bronze para a Noruega. No hóquei inline, ouro para os Estados Unidos, prata para a Itália e bronze para a República Tcheca. No ultimate, ouro para os Estados Unidos, prata para a Austrália e bronze para o Canadá. No softbol, no qual todas as equipes participantes eram das Américas, o ouro ficou com Cuba, a prata com a Venezuela e o bronze com a Colômbia. E, no futebol de salão, o ouro ficou com a Colômbia, a prata com a Venezuela e o bronze com o Brasil.

O topo do quadro de medalhas ficaria com a Itália, que superaria a Rússia por apenas um ouro: 18 ouros, 13 pratas e 18 bronzes dos italianos contra 17 ouros, 23 pratas e 13 bronzes dos russos. Mais uma vez, a Itália se destacaria no salvamento, onde conquistaria 5 ouros, 7 pratas e 5 bronzes, mas dessa vez teria uma excelente performance também na patinação, arrebatando 5 ouros, 2 pratas e 2 bronzes, incluindo ouro no individual feminino da patinação artística com Debora Sbei, bronze no individual masculino com Andrea Aracu, ouro (com Alessandro Spigai e Anna Remondini) e prata (com Filippo Forni e Elena Leoni) na categoria dança, e ouro (com Danilo Decembrini e Sara Venerucci) e bronze (com Daniele Ragazzi e Giulia Merli) nas duplas mistas. A Rússia mais uma vez se destacaria no finswimming e na ginástica, mas dessa vez não conseguiria os quatro ouros da ginástica rítmica, ficando os do arco e fita para Ganna Rizatdnova, da Ucrânia, e os do bola e maça para Melitina Staniouta, da Bulgária; a única medalha russa na ginástica rítmica seria um bronze de Elizaveta Nazarenkova no arco.

A Colômbia se aproveitaria do fator casa para realizar sua melhor participação na história dos World Games, com 8 ouros, 13 pratas e 10 bronzes; a mais comemorada seria a medalha de ouro na categoria salsa da dança esportiva, incluída especialmente para essa edição, com Jefferson Benjumea Merolanda e Adriana Avila Molina. Na categoria latina, porém, na qual a Colômbia também era favorita, a dupla colombiana terminaria em quarto lugar, ficando o ouro com a Moldova, a prata com a Rússia e o bronze com a França. O raquetebol, esporte bastante popular na Colômbia, também decepcionaria, rendendo apenas uma medalha de prata, com Christina Amaya, nas simples femininas. As outras medalhas de ouro da Colômbia viriam quatro do caratê e três da patinação em velocidade.

O Brasil também faria sua melhor participação na história dos World Games, com 5 ouros, 3 pratas e 1 bronze. Subiriam ao lugar mais alto do pódio Marcel Stürmer, na patinação artística; Bruno Martini, na ginástica de trampolim, prova do mini duplo; Ana Castellain, na categoria pesados do powerlifting; e as seleções de handebol de praia masculina e feminina. As pratas seriam trazidas por Douglas Santos Brose, categoria leves do caratê; Luciana Montgomery Watanabe, categoria leves do sumô; e Janaína Silva, categoria aberta do sumô. O bronze viria com Noeli Dalla Corte e Ingrid Fulcher, nas duplas femininas da modalidade punto, raffa, volo, do boules. Além dessas medalhas todas, o Brasil ainda ganhou duas das que "não contam", o bronze no futebol de salão e uma prata no wushu, modalidade nanquan e nangun, com Marcelo Yamada.

No fim, a Colômbia mostrou que, mesmo sem tradição nos esportes do programa, e com as deslizadas da organização aqui e ali, é possível organizar uma edição empolgante dos World Games, inclusive fazendo bonito nas competições. Fica a esperança de que alguma cidade brasileira, um dia, se aventure a se candidatar a sede, nem que seja para mostrar ao público que existem brasileiros se destacando em esportes menos conhecidos - e mais exóticos - que os olímpicos.

Série World Games

Kaohsiung 2009
Cali 2013

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