segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

Escrito por em 7.12.15 com 0 comentários

Mario Bava

Eu adoro filmes antigos, principalmente de ficção científica, terror e aqueles de Antigo Egito ou Império Romano. Não me pergunte por que, deve ser influência da minha mãe, que também é fã dessas coisas e não se importava de que eu os assistisse com ela quando era criança - algo que eu já devo ter falado aqui no átomo uma centena de vezes. Seja como for, uma das minhas maiores frustrações em relação a filmes antigos era que era muito difícil encontrá-los em DVD por aqui, então eu não tinha como rever meus favoritos. Mas, felizmente, hoje eu posso usar todos esses verbos no passado, já que, esse ano, houve tantos lançamentos de filmes clássicos que eu ainda nem consegui assistir à metade dos que comprei. Se pelo menos alguém resolvesse fazer o mesmo com séries clássicas de TV...

Enfim, uma das melhores coisas sobre esses lançamentos foi que eles me deram a chance de rever - e de conhecer, já que muitos eu nunca tinha visto - alguns filmes de um dos meus diretores preferidos: Mario Bava. Eu conheci Bava através de O Planeta dos Vampiros, que assisti em alguma convenção que aconteceu no SESC, não me lembro se de quadrinhos, filmes mesmo ou RPG. O fato é que adorei o filme, e, desde então, sempre que alguma dessas convenções tinha um filme de Bava, eu assistia. Assiti a uns três ou quatro (lembro particularmente de Seis Mulheres para o Assassino), depois as convenções ou saíram de moda ou foram para locais longínquos e inacessíveis (ou eu perdi a vontade de frequentá-las, alguma coisa assim) e, como filmes de Bava não costumam passar na TV, nunca mais vi nenhum.

Até agora, quando finalmente estou não só podendo vê-los como também adicioná-los à minha coleção de DVDs, algo que vocês não têm noção de como me deixa feliz. Tão feliz que eu decidi escrever um post a respeito - que, aliás, deveria ter escrito bem antes, mas acabei adiando por causa da série dos World Games, e depois para que ele coincidisse com o 650. De qualquer forma, chegou o dia. Cuidado, pois hoje tem Mario Bava no átomo.

Bava nasceu em 31 de julho de 1914, na cidade se Sanremo, Itália. Seu pai, Eugenio Bava, era originalmente escultor, mas também fazia bicos como câmera e como responsável por efeitos especiais em filmes mudos do cinema italiano. Na adolescência, Bava começaria a trabalhar como assistente do pai, e, mais tarde, se tornaria assistente do diretor de fotografia Massimo Terzano.

Mas Bava só entraria definitivamente para o mundo do cinema depois que seu pai começasse a trabalhar no Istituto Luce, estúdio de cinema criado por Benito Mussolini, levando-o como seu assistente. Lá, ele conheceria o diretor de cinema Roberto Rossellini (pai da Isabella), que o convidaria para seu primeiro trabalho como diretor de fotografia, no curta La Vispa Teresa, de sete minutos, filmado em 1939. Rossellini gostaria do trabalho de Bava e o empregaria como diretor de fotografia em sete de seus filmes da década de 1940. Na década de 1950, ele começaria a trabalhar também como diretor de efeitos especiais, acumulando ambas as funções em dois grandes clássicos, Ulisses, estrelado por Kirk Douglas, de 1955, e Hércules, estrelado por Steve Reeves, de 1957, ambos hoje creditados como precursores de um estilo conhecido como sword and sandal ("espada e sandálias"), responsável por um boom do cinema italiano entre as décadas de 1950 e 1960.

A primeira experiência de Bava como diretor ocorreria em 1956. Na ocasião, ele trabalhava como diretor de fotografia no filme I Vampiri (Nota do Guil: levanta a mão quem leu "ái vampiri" ao invés de "í vampiri"; influência da língua inglesa é mesmo um saco), do diretor Riccardo Freda, que simplesmente abandonou as filmagens no último dia. Na época, impulsionada pelo sucesso dos filmes de sword and sandal, a indústria cinematográfica italiana estava crescendo rapidamente, e muitos produtores começariam a arriscar produzir filmes que pudessem ser vendidos para o mercado internacional, com temas e estilos diferentes dos normalmente encontrados no cinema italiano. I Vampiri (simplesmente "os vampiros", em italiano), do estúdio Titanus, seria concebido para ser o primeiro filme de horror falado (ou seja, sem contar os da época do cinema mudo) produzido na Itália. Receosos de que o projeto não desse certo, porém, ao contratar Freda, os produtores exigiram que toda a filmagem levasse apenas duas semanas, para que se gastasse pouco com o aluguel dos estúdios e com as diárias dos profissionais, e o orçamento do filme pudesse ser baixo. Freda concordou, mas, faltando um dia para que o prazo se esgotasse, argumentaria que era impossível, e que "nem valia a pena tentar", pois o filme "jamais faria sucesso", já que "o público italiano não gostava de filmes de terror".

Sem condições de contratar um novo diretor, os produtores "promoveriam" Bava, que não somente aceitaria o desafio, mas mudaria vários elementos do roteiro e vários diálogos, inclusive adicionando novas cenas. O filme ficaria pronto no prazo e seria lançado em 5 de abril de 1957; infelizmente, seria um imenso fracasso de público, o que levaria Freda a reiterar sua teoria em diversas entrevistas. A crítica, porém, elogiaria exatamente a direção de fotografia, e, nos anos que se seguiram, o filme se tornaria cult e uma espécie de "exemplo" para os críticos, que frequentemente discutem seu lugar na história do cinema italiano. Curiosamente, Bava seria creditado apenas como diretor de fotografia, sendo a direção creditada apenas a Freda.

Bava teria uma experiência parecida em 1958, no filme La Morte Viene dallo Spazio, uma co-produção entre estúdios italianos e franceses, considerado o primeiro filme de ficção científica da história do cinema italiano. Bava seria contratado pelo estúdio Royal Film, mais uma vez, para ser o diretor de fotografia, mas, na prática, acabaria co-dirigindo o filme ao lado de Paolo Heusch, o "verdadeiro" diretor. Como Bava não tinha créditos prévios como diretor, entretanto, o estúdio se recusou a creditá-lo como tal, de forma que o único diretor creditado no filme é Heusch.

Em 1959, Bava trabalharia em mais dois clássicos do sword and sandal, Hércules e a Rainha da Lídia e O Gigante de Maratona, e seria convidado por Freda para ser diretor de fotografia no filme de horror e ficção científica Caltiki, o Monstro Imortal. Freda mais uma vez abandonaria a direção em meio às filmagens, fazendo com que Bava tivesse de terminá-las; mais tarde, ele revelaria que, dessa vez, isso fazia parte de um plano, pois ele não estava muito interessado em dirigir o filme, sabia que Bava faria um bom trabalho, e ainda contribuiria para que o amigo conseguisse seu primeiro crédito como diretor, o que lhe abriria portas para trabalhos futuros. O produtor Bruno Vailati, porém, se recusaria a creditar Bava como diretor, e, em protesto, tanto ele quanto Freda decidiriam usar pseudônimos, de forma que a direção de Caltiki é creditada a Robert Hamton, e a direção de fotografia a John Foam.

Entretanto, Nello Santi, presidente da Galatea Film, estúdio responsável não somente por Caltiki, mas também por O Gigante de Maratona, considerava que o estúdio tinha uma dívida de gratidão com Bava, não somente por ele ter terminado o filme de Freda, mas por ter concordado em atuar como diretor em filmagens de diversas cenas de O Gigante de Maratona que tiveram de ser refeitas poucos dias antes do lançamento do filme, trabalho com o qual o diretor do filme, Jacques Tourneur, não concordou. Santi procurou Bava e lhe ofereceu não somente um cargo de diretor, mas em um filme qualquer de sua total preferência e escolha.

Fã de contos de horror russos, Bava aproveitaria a oportunidade para adaptar para o cinema o conto Viy ("você", em russo), escrito em 1865 por Nikolai Gogol. O próprio Bava decidiria escrever o roteiro, em parceria com seus amigos Ennio de Concini e Mario Serandrei; roteiro esse que, em sua versão final, curiosamente, tem pouquíssimo a ver com Viy, sendo mais uma homenagem de Bava aos filmes clássicos de horror filmados em Hollywood na década de 1930, em especial aqueles produzidos pela Universal, como Drácula, Frankenstein e O Lobisomem - tanto que, assim como esses, seria filmado em preto e branco, embora em 1960 filmes coloridos já fossem mais do que comuns. As únicas coisas em comum com o conto seriam que o filme é ambientado na Rússia, no século XIX, e a história envolve uma bruxa que volta à vida após duzentos anos.

No filme, chamado A Maldição do Demônio, uma bruxa de nome Asa (a inglesa Barbara Steele) é condenada, no século XVII, a ser queimada, tendo antes uma máscara de ferro com espinhos na parte de dentro pregada a seu rosto. Antes de morrer, ela roga uma maldição aos descendentes de seu irmão, responsável por dedurá-la como bruxa. Dois séculos depois, o médico Dr. Thomas Kruvajan (Andrea Checchi) e seu assistente, Dr. Andre Gorobec (John Richardson), estão indo a uma conferência quando, inadvertidamente, encontram a tumba da bruxa e, com o sangue de Kruvajan, que se cortou acidentalmente, fazem com que ela retorne à vida, mas ainda muito fraca e com poucos poderes. Asa, então, ressucita seu amante, Javuto (Arturo Dominici), e ordena que ele vá até o castelo do Príncipe Vajda (Ivo Garrani), descendente de seu irmão, onde os médicos estão hospedados, e sequestre Katia (também interpretada por Steele), a filha do Príncipe, por quem Andre se apaixona, para que ela drene seu sangue e recupere totalmente seus poderes.

O filme teve muitos problemas na produção, grande parte causados por Steele, na época com 22 anos, que não entendia italiano (ela diria suas falas de qualquer jeito e seria dublada na pós-produção, algo por incrível que pareça muito comum na época quando atores estrangeiros participavam de filmes italianos), sempre achava que a estavam enganando, e se recusava a fazer muitas das cenas reservadas às suas personagens, alegando que não havia sido previamente consultada - especialmente uma das cenas finais, na qual o vestido de Asa é rasgado e ela fica com os seios à mostra. Curiosamente, Steele seria escolhida para o papel através de uma fotografia, sem fazer nenhum teste, pois tinha justamente a aparência que Bava queria para a bruxa. Outro problema seria que Asa e Javuto, originalmente, teriam dentes de vampiro, mas, durante a edição, o editor Mario Serandrei acharia que os dentes pareceriam muito falsos, especialmente nos closes, o que fez com que várias cenas tivessem de ser refilmadas.

Apesar disso, o filme, que estrearia em 11 de agosto de 1960, seria um imenso sucesso internacional, principalmente nos Estados Unidos, onde seria exibido em uma versão dublada em inglês chamada Black Sunday, produzida pela American International Pictures (AIP), mas sem qualquer alteração - um verdadeiro milagre, já que o normal na época era editar o original para que ele ficasse "mais ao gosto do público norte-americano". A Maldição do Demônio é considerado até hoje um dos maiores filmes de horror de todos os tempos, principal expoente do horror gótico europeu, responsável pelo surgimento de diversos outros do mesmo estilo produzidos nos anos seguintes, e, além de tudo, um filme à frente de seu tempo: no Reino Unido, seria considerado "violento demais", e proibido de ser exibido nos cinemas até 1968, quando uma reavaliação o considerou adequado. Muitos críticos consideram o filme "de influência incalculável", e muitas de suas cenas seriam reproduzidas em produções recentes, como em Dracula de Bram Stoker, de Francis Ford Coppola, e A Lenda do Cavaleiro sem Cabeça, de Tim Burton. Apesar de todos os problemas que causou, Steele teria sua carreira impulsionada pelo sucesso do filme, e se tornaria uma das principais atrizes de terror dos anos 1960.

Depois de A Maldição do Demônio, Bava dirigiria mais dois filmes de sword and sandal para a Galatea, Hércules no Centro da Terra e A Vingança dos Vikings, além de co-dirigir As Maravilhas de Aladdin, ao lado de Henry Levin, e Ester e o Rei, ao lado de Raoul Walsh, que também atuou como roteirista e produtor, sendo o mais provável que Bava tenha dirigido o filme o nome de Walsh tenha sido incluído só para lhe dar o crédito triplo.

Em seguida, Bava simplesmente revolucionaria o cinema italiano, criando um novo gênero com A Garota que Sabia Demais. Lançado em 10 de fevereiro de 1963 e filmado mais uma vez em preto e branco, o filme fazia uma homenagem ao giallo, estilo de livros de romances policiais com elementos de suspense muito popular na Itália na época. O grande sucesso do filme - no qual uma turista norte-americana (Letícia Román) presencia um crime em Roma, mas ninguém acredita nela exceto um jovem médico (John Saxon) - transformaria o giallo em um gênero cinematográfico, com vários filmes de "suspense policial italiano", como o estilo ficaria conhecido fora da Itália, sendo lançados nos anos seguintes, alguns revelando diretores posteriormente consagrados como Sergio Martino e Dario Argento - esse último considerado o maior mestre do giallo de todos os tempos. Curiosamente, Bava não gostou do resultado final de A Garota que Sabia Demais, considerando a história "absurda" e "boba", e dizendo que "talvez ficasse melhor se tivesse sido filmado nos Estados Unidos com James Stewart e Kim Novak". Falando nisso, mais uma vez, a AIP lançaria uma versão dublada do filme nos Estados Unidos, mas essa fortemente editada, sendo removidas referências a drogas e inseridas cenas de comédia com atores norte-americanos em pequenos papéis que não alteravam a história central.

Ainda em 1963, Bava dirigiria mais dois filmes. O primeiro, As Três Máscaras do Terror, era composto de três episódios sem ligação entre si, sendo que o segundo, O Wurdalak, considerado o melhor, contava com a participação de Boris Karloff (de Frankenstein e A Múmia). Uma curiosidade sobre esse filme é que ele seria lançado nos países de língua inglesa com o nome de Black Sabath - e a banda Black Sabbath, liderada por Ozzy Osbourne e originalmente chamada Earth, decidiria mudar de nome após assistir a uma sessão do filme em Londres.

Também em 1963, Bava deixaria a Galatea e voltaria a trabalhar para a Titanus, com o filme O Chicote e o Corpo. Estrelado por Christopher Lee (e, por causa disso, lançado aqui no Brasil na década de 1960 com o título picareta de Drácula, o Vampiro do Sexo, que buscava pegar carona no sucesso do Drácula estrelado por Lee e lançado em 1966, embora seu personagem em O Chicote e o Corpo não seja nem sequer vampiro), que pediu para trabalhar com Bava após ouvir de Karloff que havia adorado trabalhar com o diretor, o filme teria problemas devido a cenas de sadomasoquismo entre o personagem de Lee, o Conde Kurt Menliff, e sua amante, a esposa de seu irmão, Nevenka Menliff, interpretada por Dalilah Lavi. Inicialmente, o comitê de classificação italiano não exigiria cortes, mas classificaria o filme como impróprio para menores de 18 anos; dois meses após a estreia, porém, eles exigiriam que o filme fosse retirado de cartaz e que todas as cenas consideradas "imorais" fossem removidas. Bava não concordou, e o filme não voltou a estrear. Uma versão com absurdos 14 minutos a menos chegou a ser preparada para exibição internacional (sendo exibida nos Estados Unidos com o nome de Night is the Phantom), e, como Bava se recusou a ser creditado como seu diretor, ela acabaria creditada a John M. Old.

Em 1964, Bava dirigiria seu primeiro faroeste, A Estrada para o Forte Álamo (no qual usaria mais uma vez o pseudônimo John M. Old), e voltaria ao giallo, dirigindo um dos maiores clássicos do gênero, Seis Mulheres para o Assassino, uma co-produção entre a italiana Emmepi Cinematografica, a francesa Productions Georges de Beauregard e a alemã Produktionsgesellschaft mbH, na qual modelos são assassinadas durante um desfile por um mascarado que busca obter um diário escrito por uma delas, que revela detalhes comprometedores de uma operação financeira da qual ele foi parte. O filme seria considerado influente por Dario Argento, Martin Scorcese e Quentin Tarantino, mas seria um grande fracasso de bilheteria na Itália, e a AIP se recusaria a lançá-lo nos Estados Unidos devido às roupas das modelos, consideradas indecentes.

Em 1965, seria a vez de Bava voltar à ficção científica com O Planeta dos Vampiros, co-produzido pela AIP, pela Italian International Film e pela espanhola Castilla Cooperativa Cinematográfica. Após fazer um bom dinheiro com as versões norte-americanas dos filmes de Bava, a AIP decidiria ela mesma financiar um de seus filmes, para ter mais controle criativo sobre o roteiro, que seria escrito por Ib Melchior, roteirista do sucesso Robson Crusoé em Marte (Nota do Guil: não se deixe levar pelo título, é realmente um filme bom). Em O Planeta dos Vampiros, duas espaçonaves explorando o espaço profundo caem em um planeta desconhecido, onde os membros de suas equipes começam a morrer de forma misteriosa.

O filme teria um elenco multinacional, contando com o norte-americano Barry Sullivan, a italiana Evi Marandi, o espanhol Ángel Aranda e a brasileira Norma Bengell; cada um receberia um roteiro em seu próprio idioma, e diria suas falas nesse idioma - Sullivan falava em inglês, Bengell em português, Marandi em italiano e Aranda em espanhol - muitas vezes sem que um entendesse o que o outro estava dizendo; na pós-produção, todos seriam dublados para as três versões oficiais lançadas - uma em inglês, uma em italiano e uma em espanhol. Devido ao orçamento bastante reduzido, Bava - que também trabalhou como diretor de fotografia e como diretor de efeitos especiais, embora só tenha sido creditado como diretor - teve de fazer verdadeiros malabarismos para conseguir o que queria, usando espelhos, fumaça e truques de câmera em muitas das cenas.

O Planeta dos Vampiros seria um grande sucesso de público e crítica nos Estados Unidos, mesmo tendo feito apenas um sucesso mediano na Europa. O filme costuma ser citado como uma das principais influências de Alien: O Oitavo Passageiro, mesmo com o diretor Ridley Scott e o roteirista Dan O'Bannon alegando que jamais haviam assistido ao filme de Bava antes da estreia de Alien - embora elementos como a sequência na qual os astronautas descobrem uma espaçonave caída de uma civilização avançada, cujos membros são bem maiores que seres humanos, tornam difícil acreditar nessa versão.

Em 1966, Bava faria três filmes bastante diferentes. O primeiro seria mais um sword and sandal, Os Punhais do Vingador. O segundo seria Bonecas Explosivas, estrelando Vincent Price, uma nova parceria entre a AIP e a Italian International Film, uma sátira aos filmes de espionagem, com Price interpretando um cientista que trabalhava com o governo chinês para criar androides femininas que seduziriam generais da OTAN e então explodiriam, eliminando-os, e um agente secreto mulherengo, interpretado pelo cantor norte-americano Fabian, sendo o único que pode detê-lo. O filme seria um gigantesco fracasso, e costuma ser considerado o pior filme de Bava.

Já o terceiro, O Ciclo do Pavor, costuma ser considerado justamente o melhor. Produzido pelo estúdio F.U.L. o filme pode ser considerado tanto uma volta às origens, já que se trata de um filme de horror gótico ambientado no leste europeu do século XIX, quanto um giallo, pois envolve um jovem médico estrangeiro (Giacomo Rossi-Stuart) chegando a uma isolada cidade e se envolvendo com uma bela mulher (Erika Blanc), enquanto ocorrem assassinatos misteriosos, atribuídos a bruxaria. O Ciclo do Pavor foi citado como influência por Scorcese e Fellini, é frequentemente citado como uma das maiores influências sobre os filmes de horror asiáticos do final dos anos 1990 e início dos anos 2000 (tipo O Chamado e O Grito) e foi um dos maiores sucessos de bilheteria da carreira de Bava.

Em 1968, Bava co-dirigiria, ao lado de Franco Rossi, seu primeiro trabalho para a TV, a minissérie L'Odissea, estrelada por Bekim Fehmiu e Irene Papas e baseada na obra de Homero, exibida pela RAI em 8 episódios. No mesmo ano, ele dirigiria Perigo: Diabolik, adaptação para o cinema do famoso personagem francês Diabolik, um mestre dos disfarces que age como uma espécie de Robin Hood, roubando criminosos para devolver ao povo o que roubaram. Produzido pelo lendário Dino De Laurentiis, o filme não faria muito sucesso, sendo considerado "muito infantil" pelos fãs de Diabolik.

Bava só voltaria a filmar em 1970, quando lançou Roy Colt & Winchester Jack, seu primeiro western spaghetti (nome dado aos faroestes fanfarrões produzidos na Itália entre as décadas de 1960 e 1970, alguns de grande sucesso internacional, como os estrelados por Terence Hill e Bud Spencer), além de mais dois gialli. Em um deles, Cinco Bonecas pela Lua de Agosto, um grupo de pessoas é convidado para passar um fim de semana em uma ilha paradisíaca para relaxar, mas dentre eles está um químico cuja nova fórmula é cobiçada por diversos industriais - e, por causa dela, os convidados começam a morrer um a um. O filme seria considerado um tanto confuso, não faria muito sucesso, e não ganharia uma versão internacional até 2001.

O outro, O Alerta Vermelho da Loucura, foi inicialmente considerado fraco e um dos menos inspirados trabalhos de Bava, mas hoje é tido como um dos maiores clássicos do gênero e precursor dos "filmes de sociopata", nos quais um personagem sociável, simpático e aparentemente normal comete crimes horríveis que a polícia não consegue desvendar. Nele, um estilista (Stephen Forsyth), dono de um ateliê de vestidos de noiva, secretamente mata, durante a noite de núpcias, as noivas que veste, sem que o marido veja como elas foram mortas, e se livra dos corpos de forma que a polícia não consiga encontrar o culpado. A única ameaça a seus planos é sua esposa (Dagmar Lassander), a quem odeia, mas de quem não pode se divorciar sem perder tudo o que tem. O Alerta Vermelho da Loucura seria o primeiro filme de Bava filmado originalmente em inglês e depois dublado em italiano, de forma que a versão lançada nos Estados Unidos pela AIP, com o nome de Hatchet for the Honeymoon, não precisou de qualquer edição.

Em 1971, Bava revolucionaria novamente o cinema com Banho de Sangue, no qual um grupo de adolescentes invade uma mansão na praia, abandonada após seu proprietário matar a esposa, visando se divertir, mas sendo violentamente assassinados um a um. Com pouco mistério e muita violência, o filme partiria de uma ideia da atriz Laura Betti, que trabalhou com Bava em O Alerta Vermelho da Loucura, e desejava repetir a dose. Com orçamento mínimo, seria filmado em duas semanas na casa de praia do produtor Giuseppe Zaccariello, que conseguiria financiar o filme junto ao pequeno estúdio Nuova Linea Cinematografica. Mais uma vez, Bava recorreria a vários truques de câmera para conseguir realizar os efeitos especiais com pouco dinheiro, inclusive transformando umas poucas árvores que cercavam a casa em uma floresta inteira. O maquiador Carlo Rambaldi também usaria de bastante criatividade para retratar as mortes, tendo seu trabalho bastante elogiado e ganhando inclusive prêmios por ele.

Banho de Sangue seria o filme mais controverso de Bava, considerado por alguns críticos e fãs como o pior de toda a sua carreira - até mesmo Christopher Lee, que foi assisti-lo em uma pré-estreia, saiu no meio, se dizendo revoltado. Por outro lado, os sustos e as mortes - 13 ao todo, cada uma mais chocante que a anterior - agradariam a grande parte da crítica e do público, incluindo o diretor Joe Dante, de Gremlins, que escreveu uma resenha extremamente favorável para a revista The Film Bulletin. O filme seria lançado nos Estados Unidos em 1972 com o título Twitch of the Death Nerve, e faria um sucesso gigantesco, principalmente dentre o público jovem. Hoje, o filme é considerado precursor dos "filmes de estripador", no qual um vilão mata pessoas em sequência de formas grotescas ou assustadoras, tipo Sexta-Feira 13 e A Hora do Pesadelo. Seu estilo seria imitado em praticamente todos os filmes norte-americanos de terror que o seguiram; Sexta-Feira 13 Parte II, de 1981, inclusive, é quase um plágio, já que refilma algumas das mortes presentes em Banho de Sangue quadro a quadro.

Em 1972, Bava lançaria dois filmes que teriam péssimo desempenho junto ao público e à crítica. No primeiro, Barão Sanguinário, um jovem norte-americano (Antonio Cantafore) viaja à Áustria para estudar as origens de sua família, e acaba encontrando o castelo de um de seus antepassados, um Barão sádico que morreu de forma violenta (Joseph Cotten); inadvertidamente, ele recita um encanto que traz o Barão de volta à vida, fazendo que que ele passe a torturar e matar os pobres habitantes da pequena cidade à sombra do castelo. No segundo, Quatro Vezes Aquela Noite, um playboy milionário (Brett Halsey) conhece uma linda moça (Daniela Giordano) por acaso e a convida para sair à noite; na manhã seguinte, ela retorna para casa com seu vestido totalmente rasgado, e o rapaz cheio de escoriações. Quando a polícia é chamada, cada um dos dois, mais um porteiro de um prédio próximo (Dick Randall), dá uma versão totalmente diferente para o que aconteceu durante a noite. Ambos os filmes foram considerados de roteiro fraco e atuações pouco inspiradas, e estão hoje dentre os menos lembrados da carreira do diretor.

Talvez por causa disso, a partir daí, as coisas pararam de funcionar bem para Bava. Seu filme seguinte, Lisa e o Diabo, de 1973, no qual uma jovem turista norte-americana (Elka Sommer) se perde nas ruas de Roma e encontra abrigo em uma mansão da qual o mordomo (Telly Savalas) pode ser o diabo disfarçado e cujos moradores escondem terríveis segredos, seria considerado confuso e de sequências desnecessariamente longas, embora, depois do sucesso de Savallas na série Kojak, tenha se tornado uma espécie de cult. A má-fama do filme faria com que Bava não conseguisse um distribuidor internacional - após o insucesso de seus dois filmes de 1972, a AIP, com problemas financeiros, optaria por não renovar seu contrato de distribuição - e, durante anos, o filme ficaria restrito aos cinemas da Itália, à exceção de uma versão, sem cortes nem edição, exibida em pouquíssimos cinemas dos Estados Unidos em 1974 com distribuição da Allied Artists - assim como O Alerta Vermelho da Loucura, Lisa e o Diabo foi originalmente filmado em inglês e então dublado em italiano, então, de certa forma, essa versão era a original.

Essa situação, evidentemente, não agradaria ao produtor Alfredo Leone, que desejava um retorno financeiro maior para o filme no qual havia investido. Querendo pegar uma carona no sucesso do filme O Exorcista, lançado sete meses depois de Lisa e o Diabo, Leone tentaria convencer Bava a filmar novas cenas, editar as antigas e transformar o filme em um clone do norte-americano. Leone contrataria o ator Robert Alda para interpretar um padre para exorcizar Lisa, já de volta à sua casa nos Estados Unidos e possuída pelo demônio, com os eventos do filme aparecendo como flashbacks durante o exorcismo. Bava chegaria a concordar, mas, como Leone exigiria conteúdo erótico nas cenas do exorcismo, e que fossem cortadas ou alteradas cenas que Bava considerava essenciais, incluindo o final, ele acabaria abandonando a direção - não sem antes tentar convencer Sommer a se recusar a voltar a interpretar Lisa, sem sucesso.

O próprio Leone dirigiria as cenas extras, e o novo filme, que no total excluía mais de 20 minutos de cenas do original (mas ficando no total apenas três minutos mais curto, devido às novas cenas do exorcismo), seria lançado nos Estados Unidos e Europa em 1975 com o nome de A Mansão do Exorcismo, com direção creditada a Mickey Lion. O tiro acabaria saindo pela culatra, já que o filme seria um gigantesco fracasso de crítica e público justamente por ser considerado uma cópia mal-feita de O Exorcista. Bava ficaria extremamente entristecido com essa história, já que Lisa e o Diabo era um de seus filmes preferidos, e renegou essa nova versão até o dia de sua morte.

O pior, porém, ainda estava por vir: em 1974, Bava filmaria Cães Raivosos, um dos primeiros road movies - filmes ambientados quase que totalmente em um veículo em movimento, com poucas paradas ao longo da viagem. Com roteiro de Allesandro Parenzo, que incluía um final surpreendente, o filme acompanhava um trio de ladrões (Maurice Poli, Don Backy e George Eastman) que rouba todo o pagamento de uma indústria farmacêutica, e, para escapar pega como refém uma linda moça (Lea Lander) e um senhor (Riccardo Cucciolla) que está levando o filho, inconsciente, ao hospital em seu carro, fazendo com que ele dirija até que eles estejam em segurança. Mais uma vez produzido por Leone, o filme ficaria inacabado, já que o estúdio responsável, Spero Cinematografica, fecharia suas portas durante sua pós-produção, após seu dono falecer, ironicamente, em um acidente de carro. Leone e Bava tentariam finalizar o filme por si mesmos, mas um tribunal proibiria que qualquer um mexesse no filme até que todas as dívidas deixadas pelo estúdio fossem pagas. O resultado foi que Cães Raivosos, considerado hoje como um dos melhores filmes de Bava, permaneceria inédito até bem depois da morte do diretor. O processo jurídico se arrastaria até 1996, e somente em 1998 Leone, com a ajuda do filho de Bava, terminaria o filme e o lançaria diretamente em vídeo. O filme permaneceria inédito nos cinemas até 2004, quando seria exibido no Festival de Veneza.

A versão lançada por Leone, porém, era bem diferente da idealizada por Bava, contendo um prólogo com novas cenas filmadas em 1996 e um final completamente diferente - e bastante tradicional, sem a surpresa do roteiro original. Somente em 2007, quando a Kino International obteria os direitos para lançar o filme em DVD é que ele seria reeditado, sendo incluídas cenas restauradas e mantido o final original e surpreendente imaginado por Parenzo. Essa versão seria lançada nos Estados Unidos com o nome de Kidnapped, sendo a versão de Leone conhecida por lá como Rabid Dogs.

O último filme dirigido por Bava seria Shock, de 1977, no qual uma moça (Daria Nicolodi), anos após ser internada em um manicômio e tratada com eletrochoques devido a um colapso nervoso que sofreu quando seu primeiro marido faleceu em circunstâncias misteriosas, retorna para casa, mas se convence de que seu filho (David Colin Jr.) está possuído pelo fantasma do pai. O filme seria mais um fracasso de público na Europa, e acabaria lançado nos Estados Unidos com o título de Beyond the Door 2, para que o público pensasse ser uma sequência do filme Chi Sei?, de Ovidio Assonitis, lançado por lá como Beyond the Door - embora a única semelhança entre ambos os filmes, tirando o fato de que os dois são de terror, seja a presença de David Colin Jr. no elenco.

Depois de Shock, Bava deixaria de ser considerado um diretor de sucesso, o que faria com que ele tivesse extrema dificuldade em conseguir novos financiamentos. Ele faleceria sem conseguir produzir seu próximo projeto, com o qual retornaria à ficção científica, em 27 de abril de 1980, aos 65 anos, de infarto fulminante, poucos dias após passar por um exame médico geral e ouvir de seu médico que sua saúde estava perfeita. Seu último trabalho como diretor seria um episódio da série de TV I Giochi del Diavolo, de temática semelhante a Além da Imaginação, exibida pela RAI entre 1979 e 1981; Bava seria convidado para dirigir o segundo episódio da primeira temporada, La Venere d'Ille, no qual a descoberta de uma estátua de bronze da deusa Vênus no terreno de uma mansão faz com que acontecimentos bizarros passem a afligir seus moradores. O último trabalho de sua vida, porém, seria como diretor de fotografia, no filme A Mansão do Inferno, de seu amigo Dario Argento, lançado dois meses antes de sua morte.

Bava foi casado, e teve apenas um filho, Lamberto, que atuou como seu assistente em todos os seus filmes desde O Planeta dos Vampiros, e chegou a escrever e co-dirigir Shock a seu lado, embora não tenha sido creditado pela direção. Lamberto Bava também se tornaria um bem-sucedido diretor de filmes de terror - embora não tão genial quanto o pai - contando hoje com 32 obras em seu currículo. Após finalizar seu primeiro filme, Macabre, ele o mostraria a seu pai, que declararia: "estou orgulhoso de você, agora já posso morrer feliz". Brincadeira de péssimo gosto, já que, de fato, Bava faleceria menos de dois meses depois de fazê-la.

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