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domingo, 21 de janeiro de 2024

Escrito por em 21.1.24 com 0 comentários

Clássicos Disney (XXI)

Recentemente eu atualizei as séries sobre James Bond, Kamen Rider e Doctor Who, então achei que, como o post 1050 se aproximava, seria uma boa atualizar a série sobre os Clássicos Disney também. Vamos lá!

Raya e o Último Dragão
Raya and the Last Dragon
2021

Há 500 anos, Kumandra foi atacada por criaturas sem mente chamadas Druun, que transformam pessoas em pedra com um mero toque. Para detê-los, os dragões se uniram aos humanos, mas também acabaram transformados em pedra, exceto Sisu, que usou todo o seu poder para criar uma joia mágica que baniu os Druun para outra dimensão e reverteu a transformação em pedra dos humanos, mas não a dos dragões, o que fez com que Sisu se tornasse a última de sua espécie e decidisse viver em isolamento. Disputando a posse da joia mágica, os humanos se dividiram em cinco reinos, que, após anos de guerra, alcançaram uma paz tênue. Na época presente, entretanto, uma nova disputa faz com que a joia mágica se quebre em cinco pedaços, cada um ficando em posse de um representante de um dos reinos, mas, com a joia despedaçada, os Druun conseguem retornar, e ameaçam novamente transformar todos em pedra. A Princesa Raya, detentora de um dos fragmentos da joia, decide procurar Sisu para pedir que ela crie uma nova, mas, ao encontrar o dragão, descobre que será necessário que elas encontrem os quatro outros fragmentos da joia original; as duas, então, partem por uma jornada pelos reinos de Kumandra, tentando fazer com que os reinos finalmente entrem em acordo para expulsar mais uma vez os Druun.

Com roteiro de Qui Nguyen e Adele Lim, Raya e o Último Dragão é baseado em várias lendas do Sudeste Asiático, no qual Kumandra foi modelada. A produção do filme consultaria vários experts em cultura da região, para assegurar que houvesse uma representação cultural precisa e evitar estereótipos, e viajaria para Laos, Vietnã, Camboja, Tailândia, Malásia, Cingapura e Indonésia; impressionados com a diversidade de climas e culturas da região, a produção decidiria fazer cada um dos cinco reinos de Kumandra com um clima diferente, que se refletia nas características de sua população. O rio que separa os cinco reinos de Kumandra tem formato de dragão e foi inspirado no Mekong, mas a produção evitaria corresponder cada um dos reinos a um país específico, fazendo uma mistura das culturas da região - da mesma forma, a história do filme não corresponde a uma lenda específica, sendo uma espécie de grande apanhado de lendas e histórias folclóricas locais. A ideia original do filme seria de Bradley Raymond e Helen Kalafatic, que achavam que já estava na hora de a cultura do Sudeste Asiático ser representada em uma grande produção da Disney, e estavam cansados do fato de que, sempre que uma terra de fantasia de um desenho animado tinha inspiração asiática, era baseada na cultura chinesa ou japonesa.

A produção do filme começaria complicada: em outubro de 2018, a Disney anunciaria que Paul Briggs e Dean Wellins, que já haviam trabalhado em Frozen, Zootopia e Moana, fariam sua estreia como diretores, e, em agosto de 2019, Lim e John Ripa seriam anunciados como roteiristas, e Cassie Steele como a dubladora de Raya. Então, em agosto de 2020, a Disney mudaria tudo: Lim seria mantida como roteirista, mas acompanhada por Nguyan, enquanto Don Hall e Carlos López Estrada substituiriam Briggs e Wellins na direção - Wellins e Ripa acabariam creditados como "co-diretores", embora não se saiba com certeza qual tenha sido seu papel na produção. Briggs, Wellins, Ripa, Nguyen, Lim, Hall, Estrada e Kiel Murray seriam todos creditados pela história, "baseada em ideias de" Raymond e Kalafatic, mas apenas Nguyen e Lim receberiam crédito de roteiristas.

Mas a mudança mais surpreendente foi a de Steele por Kelly Marie Tran como a dubladora de Raya; Tran havia feito o teste e ouvido que não era ela que a equipe estava procurando, mas em janeiro de 2020 receberia um "telefonema suspeito" que já a deixaria acreditando que iria substituir Steele. Boatos diriam que a Disney preferiria Tran por ela ser mais famosa, devido à sua participação como Rose Tico em dois filmes de Star Wars, Os Últimos Jedi e A Ascensão Skywalker, mas o motivo oficial divulgado pelo estúdio foi que a voz e entonação de Tran combinavam mais com o que eles queriam para a personagem - aliás, o motivo oficial para toda a mudança de diretores e roteiristas foi que a Disney queria que Raya fosse solitária, sofrendo calada e tendo Sisu como única amiga, mas Briggs, Wellins e Ripa estavam fazendo dela praticamente uma versão feminina do Peter Quill de Guardiões da Galáxia, superconfiante apesar de pouco habilidosa e cheia de tiradas engraçadinhas.

Além de Tran como Raya, a equipe de dubladores conta com Awkwafina - anunciada junto com Steele, mas mantida - como Sisu; Gemma Chan como Namaari, princesa de um dos outros reinos e rival de Raya; Daniel Dae Kim como Benja, pai de Raya; Izaac Wang como o menino Boun, que perdeu sua família para os Druun e decide acompanhar Raya após conhecê-la; Benedict Wong como Tong, guerreiro que também perdeu sua família para os Druun e também decide acompanhar Raya; Sandra Oh como Virana, mãe de Namaari; Thalia Tran como Noi, menina órfã criada por seres mitológicos chamados ongis; e Alan Tudyk como Tuk Tuk, o mascote de Raya. Por causa da pandemia, todos tiveram que dublar suas falas de casa, recebendo apenas as cenas das quais seus personagens participavam; a Disney aproveitaria para fazer uma espécie de jogo e não revelar a cada um deles quem eram os outros dubladores do elenco, mas eles acabariam descobrindo sozinhos, segundo Kim, porque os personagens tinham características físicas semelhantes às dos atores.

As roupas de Raya seriam inspiradas em vestes tradicionais do Sudeste Asiático, enquanto Sisu e os demais dragões do filme seriam inspirados nos naga, criaturas mitológicas ligadas ao elemento água, que podem assumir a forma de uma grande serpente ou de um ser humano - Sisu tem a habilidade de assumir forma humana no filme, com os animadores mantendo algumas características de dragão, como os olhos, para que ela se tornasse facilmente reconhecível. Inicialmente, Sisu se recusaria a ajudar Raya de todas as formas, mas os roteiristas acharam que a história fluiria melhor se ela quisesse ajudar, mas sentisse que não pudesse. Os animadores primeiro desenvolveriam Raya e Sisu separadamente, mas, insatisfeitos com o resultado, decidiriam criar os dois personagens juntos, para que ambos se complementassem visual e tematicamente. Já Namaari seria criada para ser o oposto de Raya, uma personagem quase militar, que demonstrasse força e confiança em cada pose, com vestes retas e angulosas em tons sóbrios.

Mais de 800 animadores trabalhariam no filme, usando os programas Autodesk Maya, Houdini e Nuke. A equipe combinaria animação tradicional com computação gráfica, para criar uma sensação proposital de imperfeição, como se algo em Kumandra estivesse fora do lugar devido à quebra da joia. Um dos feitos mais impressionantes da equipe de animação seria criar uma nova técnica para renderizar roupas, através da qual as roupas são criadas dobrando pedaços enormes de tecido, ao invés de combinando peças em padrões pré-determinados. As diferenças climáticas e culturais entre os reinos de Kumandra, que vão do deserto à floresta tropical, também fariam novos usos de iluminação e combinação de cenários; para garantir mais diversidade à população, sem sacrificar as características culturais do povo de cada reino, seria usada uma nova técnica que recombinava partes de personagens seguindo um modelo criado anteriormente. Para não se perder quando estava criando a população de Kumandra, a equipe teve de inventar um programa que fazia uma espécie de censo, mostrando quantos personagens já estavam prontos em cada reino e quais eram suas características; esse programa também ajudaria a confirmar que todos os personagens de um determinado reino estavam consistentes com as características daquele reino, com todos os seus elementos tendo a aparência correta.

Os movimentos de animais, como os besouros que escalam uns aos outros, cardumes de peixes, e, principalmente, dos dragões, seriam feitos individualmente, ao invés de o grupo como um todo, como é comum em animações desse tipo. Devido à sua ligação com a água, os dragões teriam várias características desse elemento, como o fato de serem fluidos e translúcidos, e de deixarem pegadas quando andam no ar como se seus pés estivessem molhados. Outros truques também seriam usados para acentuar as características dos personagens, sendo usados planos largos, focos profundos e uma paleta de poucas cores para Raya, enquanto para Sisu eram usados planos distantes, foco próximo e uma paleta mais ampla.

A trilha sonora ficaria a cargo de James Newton Howard, um dos maiores compositores de Hollywood, e a principal canção do filme, Lead the Way, seria escrita e interpretada por Jhené Aiko. Essa canção teria uma versão gravada pelo cantor filipino KZ Tandingan, chamada Gabay, incluída na versão filipina do filme - aliás, Raya e o Último Dragão seria o primeiro Clássico Disney a ser dublado em filipino, o que foi muito comemorado pela equipe da Disney Filipinas.

Raya e o Último Dragão estava originalmente previsto para novembro de 2020, mas, por causa da pandemia, estreou em 5 de março de 2021, simultaneamente nos cinemas e no Premier Access, serviço do Disney+ pelo qual os assinantes poderiam pagar 29,99 dólares adicionais para assistir ao filme antes dos demais, que só passaram a ter acesso em 4 de junho, quando o filme seria adicionado ao catálogo do Disney+. Com orçamento de 100 milhões de dólares, rendeu 54,7 milhões nos Estados Unidos e 130,4 milhões quando somado o mundo inteiro, com a Disney atribuindo o aparente fracasso à pandemia, e não à qualidade do filme - de fato, no streaming, o filme seria o segundo mais assistido no planeta na primeira semana de junho, quando ficou disponível a todos os assinantes, perdendo apenas para Lucifer, da Netflix - mesmo quando estava disponível apenas com assinatura adicional, ele seria o quarto mais assistido do período. Surpreendentemente, os dois países nos quais o filme teve a maior bilheteria nos cinemas, depois dos Estados Unidos, foram China e Rússia.

A crítica seria extremamente positiva, elogiando a mistura de emoção, humor e política social do roteiro, e a atuação inspirada de Awkwafina. A animação seria considerada lindíssima, a história, rica, e a ambientação no Sudeste Asiático como uma bem-vinda novidade - alguns críticos do Sudeste Asiático, entretanto, reclamariam que o elenco é majoritariamente composto por descendentes de chineses e coreanos, e diriam que a Disney poderia ter feito um esforço para escalar dubladores verdadeiramente relacionados com a região. A personagem Raya também acabaria criticada por não ter nenhum traço verdadeiramente relacionado à cultura do Sudeste Asiático além de sua aparência física e por parecer deslocada em seu próprio mundo, especialmente se comparada a Moana, que foi considerada uma verdadeira representação de uma garota polinésia. O filme seria indicado ao Oscar e ao Globo de Ouro de Melhor Filme de Animação, mas perderia os dois para o que vamos ver a partir de agora.

Encanto
2021

Em 2016, após concluírem Zootopia, os diretores Jared Bush e Byron Howard procurariam John Lasseter, na época chefe do departamento criativo da Disney Animation, e se diriam interessados em fazer um musical. Lasseter os colocaria em contato com Lin-Manuel Miranda, o principal compositor dos musicais da Disney, e os três começariam a conversar sobre qual seria o tema. Bush e Howard diriam que estavam cansados de fazer filmes nos quais dois personagens diferentes têm de aprender a trabalhar juntos - como Zootopia, o projeto seguinte de Bush, Moana, e o projeto da Disney então em desenvolvimento, Raya e o Último Dragão - e planejavam fazer algo novo; conversando com Miranda, eles descobririam que todos os três têm as chamadas "famílias estendidas" - nome usado nos Estados Unidos para se referir a famílias nas quais muitos parentes, como avós, tios e primos, moram juntos na mesma casa, algo que não é comum por lá, exceto em famílias de origem latina - e pensariam em fazer um musical sobre uma família estendida com poderes mágicos. Sendo as famílias estendidas um conceito relacionado às famílias latinas, Miranda sugeriria um musical latino, alegando que as músicas latinas seriam as mais apropriadas para capturar a complexidade das relações familiares. Bush e Howard também definiriam que o tema central do filme seria "como você vê e é visto pelas demais pessoas de sua família".

Como não eram de origem latina, Bush e Howard - Miranda, apesar de nascido em Nova Iorque, descende de porto-riquenhos e mexicanos - decidiriam conversar com Juan Rendon e Natalie Osma, com quem trabalharam durante o documentário Imaginando Zootopia. Por um acaso, tanto Rendon quanto Osma eram descendentes de colombianos, e frequentemente inseriam nas conversas suas experiências pessoais com a cultura colombiana presente em suas famílias e sua relação com a cultura norte-americana na qual haviam sido criados. Bush, Howard e Miranda gostaram tanto dessas conversas que decidiriam ambientar o filme na Colômbia, contratando Rendon e Osma como consultores, junto com outros estudiosos da cultura colombiana. O trio também conversaria com psicólogos e psicoterapeutas especialistas em terapia familiar, e com vários empregados da Disney Animation, que forneceram pontos de vista valiosos sobre interações familiares.

Encanto - palavra que pode ser usada como sinônimo de "magia" em espanhol, e por isso foi escolhida para o título do filme - é ambientado no passado, em um pequeno vilarejo do interior da Colômbia, fundado e praticamente governado pela Família Madrigal, cujos membros têm poderes mágicos graças a um desejo feito por sua matriarca, Alma Madrigal (a atriz e apresentadora colombiana María Cecilia Botero), forçada a abandonar sua casa e se estabelecer em um vale remoto após uma guerra. For força desse desejo, a vela que alma carregava se tornou a fonte dos poderes da família, jamais se consumindo ou se apagando, e criando uma casa mágica, chamada Casita, onde vive toda a família. Originalmente, a família era composta apenas por Alma, que ficou viúva na guerra, e seus três filhos, Julieta (Angie Cepeda), que tem o poder de curar qualquer enfermidade ou cansaço com sua comida, Pepa (Carolina Gaitán), que tem o poder de controlar o clima, e Bruno (John Leguizamo), que tem o poder de prever o futuro, que o deixa atormentado e faz com que ele decida deixar o vilarejo e ir morar em local ignorado.

Pepa se casaria com Félix (Mauro Castillo), que acha graça em tudo e veio ao mundo para se divertir, e teria três filhos: Dolores (a cantora Adassa), de 21 anos, que tem super audição, sendo capaz de escutar os mínimos sons a grandes distâncias; Camilo (Rhenzy Feliz), de 15, que tem o poder de mudar de forma; e Antonio (Ravi Cabot-Conyers), de apenas 5 anos, que tem o poder de falar com os animais. Já Julieta se casaria com o atrapalhado Agustín (Wilmey Valderrama), e teria três filhas: a lindíssima Isabela (Diane Guerrero), de 21 anos, que tem o poder de fazer plantas e flores nascerem em qualquer lugar; a alta e atlética Luisa (Jessica Darrow), de 19 anos, que tem superforça e nunca fica cansada; e a protagonista do filme, Maribel Madrigal (Stephanie Beatriz), de 15 anos, cujo melhor adjetivo para definir é normal: por alguma razão que ninguém compreende, Maribel não tem nenhum poder, e alguns da família acham que nunca terá. Também merecem ser citados Mariano Guzmán (o cantor colombiano Maluma), vizinho dos Madrigal e noivo de Isabela; a mãe de Mariano, chamada apenas de Señora Guzman (Rose Portillo); e Osvaldo (Juan Castano), vendedor de porta em porta que leva suas mercadorias em uma carroça. O onipresente Alan Tudyk também está no filme, no papel do tucano Pico.

Apesar de não ter poderes, Maribel não é revoltada, aceitando seu papel na família e aguardando ansiosamente o dia em que finalmente os terá. Quando o filme começa, porém, há algo de errado com a magia da família, que parece estar falhando ou saindo do controle, colocando até mesmo a integridade da Casita em risco - e os moradores do vilarejo, mais do que acostumados a depender da magia dos Madrigal para tudo, se desesperam ao pensar como será a vida sem ela. Para tentar descobrir como salvar a magia da família antes que seja tarde demais, Maribel decide tentar encontrar seu tio Bruno, e parte rumo a uma grande aventura.

Em 2018, Bush, Howard, Miranda, Rendon e Osma viajariam para a Colômbia, onde conversariam com arquitetos, chefs de cozinha e artesãos, para criar uma ambientação realística para o filme. Apesar de terem visitado cidades grandes como Bogotá e Cartagena, eles se sentiriam mais inspirados pelas pequenas cidades de Salento e Barichara, e decidiriam ambientar o filme em uma pequena cidade do interior. Bush também notaria que o terreno montanhoso da Colômbia fazia com que algumas cidades pequenas se desenvolvessem isoladas, ganhando "uma personalidade própria", e decidiria usar isso no filme. A guia Alejandra Espinosa Uribe, que acompanharia o quinteto, também acabaria contratada como consultora após dizer que o interior da Colômbia está repleto de locais permeados por magia, nos quais a população coexiste com ela sem questionar sua existência, o que Bush e Howard acharam que era perfeito para a história do filme; Uribe também acabaria servindo de modelo para Maribel Madrigal, que compartilhava com ela os cabelos encaracolados, os óculos de armações grandes e vários gestos que ela usava ao contar suas histórias.

Também é interessante dizer que a época na qual o filme é ambientado foi deixada intencionalmente vaga; inicialmente, Bush e Howard queriam fazê-lo na época atual, depois mudaram de ideia para a década de 1950, e, após visitar a Colômbia, decidiriam ambientá-lo no início do século XX, mas com elementos folclóricos e costumes que poderiam ser bem mais antigos. A mudança também serviria a um propósito no roteiro: entre outubro de 1899 e novembro de 1902, a Colômbia sofreria com a Guerra dos Mil Dias, durante a qual populações de cidades inteiras tiveram de fugir e se estabelecer em outros lugares, o que dava o motivo perfeito para a família Madrigal fundar uma nova cidade.

A Disney a princípio torceria o nariz para uma família tão grande, e Miranda chegaria a ouvir que era impossível fazer um filme com uma dúzia de protagonistas; ele escreveria o número inicial, que apresenta toda a família, especificamente para convencer os executivos da Disney de que era possível, e ele e os diretores se comprometeram a dar um arco de história para cada personagem, para que o filme não fosse uma aventura de Maribel com seus parentes como coadjuvantes. Bush planejava escrever o roteiro ele mesmo, mas, conforme a história ficava mais complexa, ele sentiu que precisava de alguém especializado em realismo fantástico, e chamou Charise Castro Smith, que, além disso, foi essencial para uma construção verossímil de Mirabel, que baseou em suas próprias experiências como uma adolescente latina numa família estendida. Como é comum nas mais recentes produções Disney, várias pessoas contribuiriam com ideias, e, apesar de apenas Bush e Smith serem creditados como roteiristas, a história seria creditada a Bush, Howard, Miranda, Smith, Jason Hand e Nancy Kruse.

A equipe de animação seria liderada por Renato dos Anjos e Kira Lehtomaki, que considerariam Encanto o filme mais difícil de suas carreiras, por terem que desenvolver completamente uma dúzia de personagens - em um filme normal, um máximo de três são completamente desenvolvidos, com os demais sendo feitos sob medida apenas para as cenas nos quais vão aparecer. Maribel foi considerada especialmente complexa, pois tinha de parecer ao mesmo tempo capaz e imperfeita, mas sem passar a impressão de ser desastrada. Coreógrafos colombianos e caribenhos seriam contratados para dar mais realismo aos números musicais, liderados por Jamal Sims, que decidiria usar um estilo musical diferente como característica de cada personagem, para refletir suas personalidades únicas. Um botânico colombiano, Felipe Zapata, também seria contratado, para aconselhar sobre quais plantas Isabela teria o poder de criar - pois só haveria sentido se ela criasse plantas que crescem naturalmente na região - e especialistas em moda colombiana seriam consultados para a criação das roupas leves, esvoaçantes e coloridas usadas pela família.

A ideia da Disney era enviar uma equipe de cerca de 50 animadores para trabalhar na Colômbia em março de 2020, mas esse plano teve de ser suspenso por causa da pandemia; a equipe de animação, composta por cerca de 800 pessoas, 108 delas animadores, acabaria tendo de trabalhar de casa, sendo orientados online pela equipe de consultores, em especial Uribe, que faria um tour em tempo real pela Colômbia por videoconferência através de seu celular, e a atriz Diane Guerrero, que pediria para que seus parentes na Colômbia enviassem fotos de suas refeições diárias.

Encanto teria duas pré-estreias, uma em Hollywood, em 3 de novembro de 2021, e uma em Bogotá vinte dias depois, antes de ser lançado oficialmente em 24 de novembro de 2021 - data para o qual estava previsto desde o início, sem necessidade de adiamento causado pela pandemia. O filme ficaria durante 30 dias exclusivamente em cartaz nos cinemas, estreando diretamente no catálogo do Disney+, sem Premier Access, em 24 de dezembro. Em 16 de fevereiro de 2022, devido ao grande sucesso no Disney+ e na cerimônia do Oscar, a Disney decidiria relançá-lo nos cinemas, onde ficaria em cartaz por mais 30 dias.

Encanto derrapou nas bilheterias - com orçamento não divulgado, mas estimado entre 120 e 150 milhões de dólares, renderia quase 100 milhões nos Estados Unidos e cerca de 256 milhões no mundo inteiro, sendo que a Disney calculava que o rendimento mundial deveria ser de 300 milhões para ele se pagar - mas acabaria sendo considerado um sucesso de público pela Disney, já que seria o segundo filme de animação mais assistido de 2021, atrás apenas de Sing 2, e o filme de animação mais assistido do mês de dezembro no streaming, mesmo faltando apenas uma semana para acabar o mês quando ele estreou. O álbum de sua trilha sonora alcançaria o topo da parada de mais vendidos, e a canção We Don't Talk About Bruno chegaria ao topo do Hot 100 da Billboard, o que faria de Encanto a primeira produção Disney a ter um álbum e uma música no topo das paradas simultaneamente.

A crítica aclamaria o filme, elogiando principalmente o humor do roteiro, a qualidade das canções e a beleza da animação; alguns críticos considerariam que o filme era um marco para a retratação da comunidade latina nos cinemas comparável a Amor, Sublime Amor. Encanto também seria elogiado por mostrar especificamente a cultura colombiana, e não um apanhado de culturas latinas como era comum em produções norte-americanas. O filme ganharia três Grammys (Melhor Trilha Sonora Compilada para Uma Mídia Visual, Melhor Trilha Sonora Instrumental para uma Mídia Visual, e Melhor Canção Escrita para uma Mídia Visual, por We Don't Talk About Bruno) e seria indicado a três Oscars e três Globos de Ouro, nas exatas mesmas categorias: Melhor Trilha Sonora Original, Melhor Canção Original (por Dos Oruguitas) e Melhor Filme de Animação - ganhando esse último nos dois prêmios.

Em janeiro de 2022, Bush e Smith se diriam interessados em transformar Encanto em uma série produzida para o Disney+, seja centrada em Maribel, seja com cada episódio centrado em um dos personagens - e Miranda se diria especialmente interessado em produzir uma série protagonizada por Dolores. No mês seguinte, o CEO da Disney à época, Bob Chapek, declararia durante uma videoconferência de prestação de contas aos acionistas que Encanto era "a mais nova franquia da Disney", dando a entender que outras produções usando os mesmos personagens estariam sendo avaliadas. Após quase dois anos, porém, nem a série, nem um segundo filme parecem estar próximos de entrar em pré-produção.

Mundo Estranho
Strange World
2022

A terra de Avalônia é cercada por montanhas intransponíveis, que fazem com que seus moradores desconheçam o que há além da cidade, mas bravos exploradores, como a família Clade, se aventuram para tentar encontrar uma passagem pelas montanhas e desbravar as terras além. Um dia, o explorador mais famoso de Avalônia, Jaeger Clade (Dennis Quaid), está liderando uma expedição que conta também com seu filho adolescente, Searcher (Jake Gyllenhaal), e aparentemente encontra um caminho através das montanhas. No caminho, entretanto, Searcher descobre uma nova fonte de energia, uma planta que ele decide chamar de Pando, e ele e o resto da expedição decidem retornar a Avalônia levando a descoberta; Jaeger, irritado, decide seguir em frente, e nunca mais é visto.

Anos se passam, e o Pando se mostra uma descoberta revolucionária, que muda a vida dos cidadãos de Avalônia para sempre, com Searcher se tornando um rico fazendeiro da planta que descobriu, casado com Meridian (Gabrielle Union) e pai do menino Ethan (Jaboukie Young-White). Um dia, entretanto, ele recebe a visita de Callisto Mal (Lucy Liu), presidente de Avalônia e antiga companheira de expedições de seu pai, que o recruta para uma missão: pouca gente sabe, mas as Pando estão perdendo seu poder, o que ameaça toda a estrutura de Avalônia, já completamente dependente da planta; a equipe de Callisto descobre que todas as raízes de todas as Pando são conectadas, e seguem um trajeto comum até o centro do planeta, com a presidente assumindo a missão de segui-las e descobrir a causa do enfraquecimento da planta, e recrutando Searcher por ele ser o maior especialista em Pando. Os demais membros da expedição serão a Capitã Pulk (Adelina Anthony), o piloto Duffle (Alan Tudyk, uma referência a seu personagem na série Firefly), e o nerd Caspian (Karan Soni).

Searcher concorda em acompanhar a expedição, e acidentalmente, acaba levando junto Meridian, Ethan e o cachorro da família, Legend. A família Clade, então, se vê em um mundo desconhecido, povoado por criaturas bizarras, onde fará amizade com uma delas, apelidada de Splat, descobrirá o destino de Jaeger, e se verá diante de uma verdade jamais imaginada sobre as Pando e Avalônia.

Don Hall teria a ideia para Mundo Estranho enquanto trabalhava em Moana, discutindo-a com seu colega Chris Williams - que acabaria não participando do projeto por decidir deixar a Disney para escrever e dirigir a animação da Netflix A Fera do Mar. Hall e Williams teriam como inspiração as revistas pulp do início do século XX, o livro Viagem ao Centro da Terra, de Júlio Verne, e filmes como Caçadores da Arca Perdida, Viagem Fantástica e King Kong; Hall também queria que a história fosse centrada em uma família e tivesse contornos ecológicos. Apesar de terem desenvolvido uma sinopse, Hall e Williams não escreveriam um roteiro nem apresentariam a ideia à Disney, até Hall ser escolhido para co-dirigir Raya e o Último Dragão, quando compartilharia suas ideias com o roteirista Qui Nguyen, que as adoraria e escreveria uma versão preliminar do roteiro, que os dois apresentariam à Disney. Os executivos do estúdio achariam que o filme tinha tudo para ser um sucesso, e dariam a luz verde logo após a conclusão da produção de Raya e o Último Dragão, confirmando Hall como diretor e Nguyen como roteirista.

Para criar o "mundo estranho", a equipe de produção conversaria com paleontólogos, climatologistas, biólogos e até mesmo fazendeiros; a ideia era criar um ambiente considerado totalmente diferente do que identificamos como um planeta, mas ainda assim reconhecível como um. Até mesmo as cores foram pensadas para causar estranheza: enquanto Avalônia é retratada em tons de marrom, cinza e verde, com um clima "agradável e nostálgico", o "mundo estranho" abusa de cores como vermelho, roxo e magenta, como se nada ali fosse natural. O personagem Splat, que se afeiçoa a Ethan, não fala, o que fez com que os animadores tivessem de criar para ele um manual de comunicação não-verbal, semelhante ao do tapete mágico de Aladdin, para que seus gestos e maneirismos fossem sempre adequados a cada situação - e sempre os mesmos, sem parecerem aleatórios. O filme combina animação 3D por computação gráfica, supervisionada por Randy Haycock, com animação tradicional, supervisionada por Eric Goldberg e Mark Henn, todos veteranos da Disney.

Inicialmente, a família Clade não teria um cachorro; o animal de estimação foi ideia do animador Burny Mattinson, outro veterano, que começou a trabalhar na Disney em 1953 - Mundo Estranho seria o último trabalho de Mattinson lançado durante sua vida, já que ele faleceria em 2023, aos 87 anos, mas após ter concluído seu trabalho em Wish: O Poder dos Desejos, o Clássico Disney seguinte. Enquanto fazia seu trabalho, Mattinson comentaria, como quem não quer nada, que uma família de fazendeiros com certeza teria um cachorro, e Hall gostaria da ideia, criando Legend. Legend não tem uma raça específica, lembrando um pouco um Old English Sheepdog, e tem apenas três pernas, toque que Hall achou que contribuiria para sua personalidade - e para mostrar que um cachorro deficiente é tão bom quanto um com todas as patas.

Mundo Estranho traria um casal interracial - Searcher é branco, Meridian é negra - e o primeiro personagem abertamente LGBTQIA+ em um Clássico Disney - Ethan, que é apaixonado por um colega de escola, Diazo (Jonathan Melo). Como de costume, isso foi elogiado pela crítica e considerado um marco pela comunidade, mas causou problemas para a Disney em 20 países, espalhados pelo Oriente Médio, África e Sul Asiático. O filme também não seria lançado na Rússia (segundo a Disney, em protesto contra a invasão da Ucrânia, mas é meio que sabido que não seria de qualquer forma, devido à "lei anti-gay" existente naquele país) na China (sem maiores explicações, embora o mais provável é que também tenha sido pelo personagem LGBTQIA+) e na França (por uma disputa entre a Disney e o sindicato do cinema francês, que não quis aceitar as datas de exibição propostas pelo estúdio; na França, o filme estrearia direto no Disney+).

Mundo Estranho também seria o primeiro filme a trazer a vinheta comemorativa do centésimo aniversário da Disney, com uma nova versão do castelo que é o símbolo do estúdio e um novo arranjo para When You Wish Upon a Star, mesmo o centenário ocorrendo apenas em 2023 e o filme tendo estreado em 23 de novembro de 2022. Curiosamente, Mundo Estranho seria considerado um dos maiores fracassos do cinema de todos os tempos - com orçamento não divulgado, mas estimado entre 135 e 180 milhões de dólares, renderia apenas 73,6 milhões somando o mundo inteiro, 38 milhões nos Estados Unidos - mas se sairia muito bem no streaming, sendo o programa mais assistido do Disney+, onde estreou em 23 de dezembro de 2022, durante 19 dias seguidos, e o oitavo programa mais assistido do mês de dezembro nos Estados Unidos considerando todos os serviços.

A crítica ficaria dividida, elogiando a mensagem ecológica, o visual arrojado do filme a as interpretações do elenco principal, mas criticando a história, considerada "muito básica", e os personagens, considerados mal-desenvolvidos. Mundo Estranho seria o primeiro Clássico Disney desde A Familia do Futuro, de 2007, a não ser indicado a nenhum Oscar, também não sendo indicado a nenhum Globo de Ouro.

Muitos analistas atribuiriam o fracasso do filme nos cinemas a ele ter estreado no mesmo dia que Glass Onion: Um Mistério Knives Out e apenas uma semana depois de Pantera Negra: Wakanda para Sempre, numa época em que a audiência dos cinemas ainda não havia voltado totalmente ao normal após a pandemia; a Disney, oficialmente, culparia a campanha de marketing, considerada muito pobre em relação aos demais Clássicos, e que não deixava claro sobre o que se tratava o filme, o que causou desinteresse do público - sobraria até mesmo para Bob Chapek, que havia decidido lançar três filmes seguidos da Pixar, Soul, Luca e Red: Crescer é uma Fera, diretamente no Disney+, o que, na avaliação dos executivos do estúdio, fez com que a maior parte do público preferisse esperar a estreia de Mundo Estranho no streaming ao invés de ir aos cinemas.

Série Clássicos Disney

•Raya e o Último Dragão
•Encanto
•Mundo Estranho

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domingo, 8 de novembro de 2020

Escrito por em 8.11.20 com 0 comentários

Clássicos Disney (XX)

Enquanto preparava as tabelas para colocar nos meus posts em série, percebi que já foram lançados mais três Clássicos Disney desde que eu escrevi meu último post sobre eles. É hora, portanto, de escrever mais um!

Moana
2016

Moana é a filha do chefe de sua tribo, que vive na ilha de Motonui, na Polinésia. Desde criança, ela sempre teve um grande desejo de singrar o oceano, mesmo sabendo que esse não é o costume de seu povo, que parece satisfeito em ter apenas sua ilha como seus domínios. Um dia, ela não resiste e rouba um barco, partindo para grandes aventuras.

Acontece que Moana não é só uma adolescente atrevida qualquer: no passado, os oceanos foram criados pela deusa Te Fiti, e os habitantes de Motonui eram seus protegidos. Um dia, o semideus Maui roubou o coração de Te Fiti, o que permitiu que a humanidade ganhasse o poder da criação, mas tornou os oceanos inseguros, e permitiu que o demônio Te Ka ameaçasse os domínios de Te Fiti. Milhares de anos se passaram, e Te Ka está mais perto do que nunca de destruir a humanidade; Moana foi a escolhida de Te Fiti para, retornando ao oceano, encontrar Maui e seu coração, devolvendo-o ao seu devido lugar e permitindo que a paz reine mais uma vez. O único problema é que o semideus é um chato convencido e exibido, e Moana terá muito trabalho para cumprir sua missão.

A história de Moana começaria a tomar forma em 2011, quando o diretor John Musker, de A Pequena Sereia e Aladdin, dentre outros, leu um livro sobre a mitologia polinésia, e ficou encantado com a riqueza de detalhes sobre os feitos heroicos de Maui. Intrigado por ter conhecido uma cultura tão rica e tão pouco divulgada no ocidente, ele achou que seria uma boa ideia produzir um longa de animação baseado na mitologia polinésia, e chamou Ron Clemens, seu habitual parceiro na direção de Clássicos Disney, para começar a trabalhar em um roteiro. Os dois apresentariam, ainda em 2011, a ideia a John Lasseter, então chefe do departamento de criação dos Estúdios Disney, que recomendaria que eles fizessem uma viagem para pesquisar mais elementos antes de começar a escrever o roteiro. Assim, em 2012, Musker e Clemens partiriam em uma viagem por Fiji, Samoa e Taiti, durante a qual conversaram com o povo local e aprenderam mais sobre sua cultura. Inicialmente, Musker havia pensado em fazer o filme centrado apenas em Maui, mas, durante essa viagem, concluiria que o melhor seria se a protagonista fosse uma adolescente, e Maui uma espécie de seu mentor.

Uma coisa que fascinou Musker e Clemens durante a viagem foi aprender que, apesar de as viagens exploratórias do povo polinésio serem anteriores até mesmo às dos europeus, tendo começado por volta do ano 300 a.C., um belo dia, sem nenhuma explicação, eles as abandonaram, e decidiram que iriam ficar restritos apenas a seu próprio território; essa "reclusão" durou cerca de mil anos, após os quais os polinésios voltariam a explorar os oceanos, sem maiores explicações. Os diretores adoraram o mistério por trás dessa história - até hoje não resolvido, sendo a teoria mais provável a de que mudanças climáticas interferiram com as correntes marítimas e ventos que os polinésios usavam para navegar, fazendo com que eles passassem a considerar a navegação perigosa - e decidiram que seu filme seria ambientado no fim desse período, inventando uma explicação tanto para a interrupção quanto para seu retorno. Motonui seria, evidentemente, uma ilha inventada, que reuniria características da antiguidade dos três países visitados por eles.

A pré-produção duraria cinco anos, durante os quais Musker e Clemens contariam com a ajuda de experts na cultura do Pacífico Sul, para que tudo no filme fosse o mais realístico possível - eles rejeitariam, por exemplo, que nos primeiros esboços Maui era careca, argumentando que não era comum homens rasparem a cabeça na antiguidade, sendo normal que eles tivessem vastas cabeleiras. A primeira versão do roteiro acabaria sendo escrita não por Musker e Clemans, mas pelo diretor e roteirista Taika Waititi, nascido na Nova Zelândia e descendente do povo maori; a história seria tão alterada desde então que Waititi brincaria que a única coisa que restou de sua versão foi a primeira linha - durante as sucessivas revisões, Moana teria um monte de irmãos, sofreria discriminação da tribo por ser mulher, se lançaria ao mar para salvar seu pai, desaparecido durante um naufrágio, ou seria seu pai quem tinha o desejo de explorar o mar, e ela apenas o acompanharia, ficando sozinha após ele desaparecer em um naufrágio.

Musker e Clemens seriam responsáveis pelas maiores mudanças, mas a maior parte dos elementos-chave do filme, como a tônica do relacionamento entre Moana e Maui, seria criação dos irmãos Aaron e Jordan Kandell; e a avó de Moana seria uma criação de Pamela Ribon, para que ela tivesse uma ligação com seus antepassados e um estímulo para ir ao mar. Quando a produção começou de vez, a equipe de animação identificou vários pequenos trechos que precisariam de ajustes antes que as cenas fossem animadas; como Musker e Clemens já estavam sobrecarregados, trabalhando de segunda a sábado doze horas por dia para que o filme pudesse ser concluído no prazo, a Disney chamaria os diretores Don Hall e Chris Williams, de Operação Big Hero, para fazer esses ajustes. Mesmo depois dessa gente toda mexer no roteiro, a Disney optaria por creditar como único roteirista Jared Bush, responsável por escrever a versão final enviada para o setor de animação.

Moana seria o primeiro filme de Musker e Clemens feito por computação gráfica; no início da pré-produção, eles cogitariam fazê-lo em animação tradicional, mas desistiram após considerar que o oceano ficaria muito mais bonito e realístico se fosse feito em CG. Apenas uma parte do filme seria feita com animação tradicional, as histórias contadas pelas tatuagens de Maui, que ficariam a cargo de Eric Goldberg, pois as versões em computação gráfica não teriam a aparência que os diretores queriam. Moana seria produzido simultaneamente a Zootopia, no mesmo local e usando os mesmos softwares, mas com duas equipes diferentes; esse esforço simultâneo permitiu que dois Clássicos Disney fossem lançados no mesmo ano, algo que não acontecia desde 2000, com Dinossauro e A Nova Onda do Imperador. Como os Estúdios Disney em Burbank estavam sendo reformados, Moana e Zootopia tiveram de ser produzidos em um galpão em North Hollywood; seria a segunda experiência do tipo para Musker e Clemens, já que A Pequena Sereia também havia sido produzido em um galpão, em Glendale.

Musker e Clemens queriam que a maior parte do elenco fosse de ascendência polinésia, e realizaram testes com centenas de candidatas até escolher Auli'i Cravalho (é Cravalho mesmo, não foi erro de digitação meu) para o papel de Moana; então com 14 anos, Cravalho se saiu tão bem no teste que os diretores pediriam para que ela trabalhasse junto com a equipe de animação para que Moana tivesse seus maneirismos ao falar. Nascida no Havaí, Cravalho é descendente de nativos havaianos por parte de mãe, mas seu pai, nascido em Porto Rico, tem antepassados portugueses, irlandeses e chineses; antes de se tornar atriz, ela sonhava em ser cantora, sendo a estrela do Clube do Coral de sua escola, e, graças a isso, também interpretou todas as músicas que Moana canta no filme. Cravalho também dublaria Moana na versão em havaiano, na primeira vez em que um Clássico Disney seria dublado nesse idioma.

Para o papel de Maui, Musker e Clemens escolheriam Dwayne Johnson, também conhecido como The Rock, o nome mais famoso do elenco, e que é de ascendência samoana. A mãe de Moana ficaria com a atriz e cantora Nicole Scherzinger, que, assim como Cravalho, nasceu no Havaí e descende de nativos havaianos por parte de mãe. O pai de Moana seria interpretado por Temuera Morrison, a avó por Rachel House, e o caranguejo Tamatoa por Jermaine Clement, todos os três neozelandeses de ascendência maori - assim como Cravalho na versão em havaiano, os três reprisariam seu papéis na versão dublada em maori.

Falando nisso, Moana, originalmente, seria dublado em 45 idiomas, mas, após seu lançamento, a Disney optaria por acrescentar mais seis, para um total de 51. O primeiro desses seis novos idiomas seria o taitiano, na segunda vez em que um Clássico Disney ganharia uma versão dublada especialmente em homenagem à cultura que inspirou o filme - a primeira foi quando O Rei Leão, em 1995, ganhou uma versão dublada em zulu (a versão em chinês de Mulan não conta porque os Clássicos Disney já são normalmente dublados em chinês desde A Pequena Sereia). A versão em taitiano seria distribuída gratuitamente em escolas do Taiti, mas até hoje ainda não se encontra disponível para o comércio, o mesmo ocorrendo com a já citada versão em havaiano, lançada em 2018 e distribuída gratuitamente nas escolas do Havaí, mas não com a versão maori, lançada em 2017 e disponível para venda na Nova Zelândia e Austrália. Os outros três "idiomas extras", caso alguém esteja curioso, não têm nada a ver com a Polinésia, e foram albanês, bengali e tâmil - mas vale o registro de que também foi a primeira vez em que um Clássico Disney foi dublado para eles.

Enquanto as "versões polinésias" seriam bastante elogiadas por linguistas, professores e pelos falantes de seus idiomas em geral, as versões europeias seriam bastante criticadas, especialmente a francesa. A questão, no caso, é que a França possui uma forte presença na Polinésia, já que, até hoje, lugares como Taiti, Bora Bora, Nova Caledônia e as ilhas Walis e Futuna são considerados parte da França; diferentemente do que Musker e Clemens fizeram, entretanto, os Estúdios Disney da França não se preocuparam em procurar atores polinésios, chamando apenas franceses europeus para a dublagem, o que resultaria em muitos protestos, inclusive do ator Yves Malakai, que, junto com o músico Ken Carlter, assim com ele, nascido no Taiti, fez uma campanha por uma nova dublagem em francês com "sotaque polinésio", que incluía uma versão do trailer oficial do filme dublado apenas por atores da Polinésia Francesa, que foi considerada por muitos críticos como melhor que a dublagem oficial. A campanha não sensibilizou a Disney, porém, e, até hoje, a única versão em francês que existe é a dos dubladores europeus.

Outro ponto controverso foi que, em quase toda a Europa, o filme e a personagem seriam rebatizados para Vaiana, pois "Moana" já era uma marca registrada da perfumaria espanhola Casa Margot; embora não houvesse problemas jurídicos, exceto na Espanha, a Disney optaria por usar o nome Vaiana também em outros países onde o perfume Moana Bouquet fosse comercializado - vale citar como curiosidade que, como em espanhol o V tem som de B, o nome da personagem na Espanha é falado "Baiana". Na Itália, a personagem continuou se chamando Moana, mas o filme mudou de nome para Oceania - segundo boatos, por causa da famosa atriz pornô Moana Pozzi, já que a Disney não quis que o filme ficasse associado a ela. Apenas em dois países europeus tanto a personagem quanto o filme se chamariam Moana, na Rússia e na Turquia.

Moana estrearia nos cinemas em 23 de novembro de 2016; com orçamento não revelado, mas estimado entre 150 e 175 milhões de dólares, renderia 248,7 milhões nos Estados Unidos, e quase 691 milhões no mundo inteiro, se tornando o quarto Clássico Disney a superar os 600 milhões, após Frozen, Operação Big Hero e Zootopia. A crítica seria amplamente favorável, elogiando principalmente a beleza do filme e as atuações de Cravalho e Johnson. A canção How Far I'll Go, escrita por Lin-Manuel Miranda e interpretada por Cravalho, ganharia um Grammy de Melhor Canção Escrita para uma Mídia Visual e seria indicada ao Oscar de Melhor Canção Original, perdendo para City of Stars, de La La Land; Moana também seria indicado ao Oscar de Melhor Filme de Animação, perdendo, ora vejam só, para Zootopia.

WiFi Ralph: Quebrando a Internet
Ralph Breaks the Internet
2018

Em 2012, pouco após a estreia de Detona Ralph, o diretor Rich Moore manifestou seu desejo de realizar uma sequência, que levaria Ralph e Vanellope para o mundo dos games online, e que gostaria de incluir Mario e Tron nela. As negociações com a Disney começariam ainda naquele ano, mas se arrastariam durante quase dois: somente em 2014 o compositor da trilha sonora de Detona Ralph, Henry Jackman, confirmaria em uma entrevista que o roteiro já estava sendo escrito, e somente em 2015 John C. Reilly, que faz a voz de Ralph, assinaria contrato para atuar também na sequência. A Disney só anunciaria a sequência oficialmente em 2016, quando também anunciaria o retorno de Moore, Reilly e do roteirista Phil Johnston, e revelaria que, no novo filme, Ralph deixaria os arcades para "quebrar a internet".

Duas versões do roteiro seriam descartadas antes de se chegar à versão final, incluindo uma na qual o vilão do filme é um antivírus que quer deletar Ralph. Desde o início, a equipe de produção se preocuparia com como iria relacionar a internet com algo do mundo real - como fizeram no primeiro filme, no qual o local onde os personagens dos games se encontram tem a aparência de uma estação de trem - e chegaria à conclusão de que a melhor forma seria mostrá-la como uma cidade, com diferentes prédios simbolizando diferentes sites, e bonequinhos que representavam as pessoas acessando a internet se movendo entre eles de acordo com quais sites essas pessoas visitavam. Em determinado momento, a internet era inclusive muito mais detalhada, mas veio uma ordem da Disney de que o filme não deveria ser sobre a internet, e sim sobre a amizade de Ralph e Vanellope, então eles tiveram que cortar alguns detalhes e simplificar outros.

No novo filme, o Sr. Litwak (Ed O'Neill) instala um roteador wi-fi no arcade, que abre o mundo da internet para seus frequentadores. Quando uma atitude impensada de Vanellope (Sarah Silverman) acaba danificando seu jogo Sugar Rush, ela e Ralph decidem usar o roteador para se aventurar pela internet e encontrar as peças que permitirão ao Sr. Litwak consertá-lo. Durante a viagem, eles passarão por uma jornada de crescimento e auto-conhecimento, durante a qual farão novos amigos: Shank (Gal Gadot), principal personagem do game de corrida online Slaughter Race, e Yesss (Taraji P. Henson), algoritmo que determina quais vídeos do site BuzzTube aparecerão para os usuários.

Várias marcas famosas da internet aparecem no filme, como eBay, Amazon, Twitter, IMDb e Google, mas a Disney não procuraria nenhuma delas nem receberia ofertas em dinheiro para que elas fossem incluídas, preferindo fazer "propaganda de graça" e contar com a boa vontade de cada uma para que elas não pedissem para ser retiradas, o que, de fato, não aconteceu; tirando a cena no eBay, entretanto, todas as cenas-chave envolvendo marcas usam marcas da própria Disney, e, sempre que possível, marcas inventadas - o site de buscas usado por Ralph e Vanellope, por exemplo, não é o Google, e sim o knowsmore.com (algo como "sabemais.com"). A equipe de produção também incluiria memes famosos da internet em algumas cenas, e faria questão de abordar temas considerados "pesados" como comentários maldosos, phishing (propagandas falsas nas quais a pessoa clica e tem seus dados roubados) e spam (mensagens não-solicitadas).

Uma das cenas mais famosas do filme, na qual Ralph e Vanellope encontram as Princesas Disney, seria ideia da roteirista Pamela Ribon, que, durante uma sessão de troca de ideias em 2014, diria que Vanellope é "a perfeita definição de uma Princesa Disney", pois tem todos os elementos que caracterizam esse tipo de personagem. Quando Johnston começou a escrever o roteiro da sequência, Ribon o procurou e sugeriu a cena, que seria tanto uma propaganda do site ohmydisney.com, onde o encontro acontece no filme, quanto uma espécie de auto-sátira, já que o filme faria graça com as características das Princesas. A cena daria muito trabalho para a equipe de animação, que teria que encontrar um estilo unificado para todas as Princesas - já que, em seus filmes originais, elas foram desenhadas usando várias técnicas de animação diferentes - e ainda deduzir qual seria a altura de cada uma em relação às outras - Aurora é mais alta, Mulan é mais baixinha. Ao todo, 14 Princesas aparecem na cena, as 12 oficiais mais as duas irmãs de Frozen: Branca de Neve (Branca de Neve e os Sete Anões, voz de Pamela Ribon), Cinderela (Cinderela, voz de Jennifer Hale), Aurora (A Bela Adormecida, voz de Kate Higgins), Ariel (A Pequena Sereia, voz de Jodi Benson), Bela (A Bela e a Fera, voz de Paige O'Hara), Jasmine (Aladdin, voz de Linda Larkin), Pocahontas (Pocahontas, voz de Irene Bedard), Mulan (Mulan, voz de Ming-Na Wen), Tiana (A Princesa e o Sapo, voz de Anika Noni Rose), Rapunzel (Enrolados, voz de Mandy Moore), Mérida (Valente, da Pixar, voz de Kelly Macdonald), Anna (Frozen, voz de Kristen Bell), Elsa (Frozen, voz de Idina Menzel) e Moana (Moana, voz de Auli'i Cravalho), além de Rajah, o tigre de estimação de Jasmine; Meeko, o guaxinim amigo de Pocahontas; os ratinhos e passarinhos que ajudam Cinderela; e do Príncipe Nareen, transformado em sapo (e confindido com Frogger, do jogo de mesmo nome, por Ralph). Todas as princesas têm as mesmas dubladoras de seus filmes originais, exceto por Cinderela e Aurora, dubladas por suas atuais dubladoras oficiais, e por Branca de Neve, dublada por Ribon (pois Adriana Caselotti, dubladora original de Branca de Neve, e Ilene Woods, dubladora original de Cinderela, já são falecidas, e Mary Costa, dubladora original de Aurora, está com 90 anos e aposentada); essa seria, inclusive, a primeira vez em que Macdonald dublaria Mérida depois de Valente.

Outros personagens que participam do filme com seus dubladores originais são C3-PO (Anthony Daniels), Eeyore (Brad Garett) e Sonic (Roger Craig Smith, que dublava o personagem na série animada). Tim Robbins e Vin Diesel fazem as vozes de Buzz Lightyer e Groot, respectivamente, mas foram usadas falas retiradas de Toy Story e Guardiões da Galáxia Vol. 2 ao invés de os atores gravarem novas. Os youtubbers Colleen Ballinger, Dani Fernandez e Tiffany Herrera, e a banda Imagine Dragons fazem participações especiais, assim como Stan Lee, que aparece em uma cena falando com o Homem de Ferro. Jane Lynch e Jack McBrayer repetem seus papéis de Calhoun e Felix, Jr. do primeiro filme, e Alan Tudyk, que no primeiro filme dublou o Rei, faz a voz do mecanismo de busca Knowsmore. Também merecem ser citados Bill Hader como J.P. Spamley e Alfred Molina como Double Dan, personagens que habitam a deep web e lidam com atividades escusas.

Com tanta gente em cena, WiFi Ralph se tornaria o Clássico Disney com o maior número de personagens, com 474 modelos individuais de personagem e 6.752 personagens no total (a diferença ocorre porque alguns, como os Stormtroopers, contam como um personagem individual, mas cada um de seu grupo conta como um personagem para o total). Ao melhor estilo Marvel, o filme também contaria com duas surpresas após o final, uma cena pós-créditos criada após a finalização do filme - e que fez com que Reilly, que já estava de férias com a família, tivesse que ir até um estúdio em Nova Iorque gravar suas falas - e uma cena "intercréditos" que faz uma sátira ao fato de alguns filmes conterem cenas nos trailers que não estão presentes na versão final - motivada pelo fato de que a equipe de animação realmente preparou uma cena que fez muito sucesso no trailer, mas depois, devido a algumas alterações de última hora no roteiro, ficou sem lugar durante o filme.

Com direção de Moore e Johnston, e roteiro de Johnston e Ribon, WiFi Ralph estrearia em 5 de novembro de 2018, se tornando apenas a segunda sequência de um Clássico Disney a ser ela mesma um Clássico Disney - a primeira foi Bernardo e Bianca na Terra dos Cangurus; Winnie the Pooh não conta porque não foi uma sequência, e sim um reboot. Com orçamento de 175 milhões de dólares, rendeu 201 milhões apenas nos Estados Unidos (sendo 3,8 milhões apenas no primeiro dia, um recorde para um filme que estreou no feriado de Ação de Graças, o que fez com que seu rendimento no primeiro fim de semana fosse de 18,5 milhões) e 529 milhões no mundo inteiro; a crítica também o receberia muito bem, considerando-o uma evolução em relação ao primeiro, e salientando o desenvolvimento da relação entre Ralph e Vanellope. WiFi Ralph seria indicado ao Oscar e ao Globo de Ouro de Melhor Filme de Animação, mas perderia ambos para Homem-Aranha no Aranhaverso.

Frozen 2
2019

Até 2019, Frozen era não só o mais bem sucedido dos Clássicos Disney, mas também o mais rentável filme de animação de todos os tempos (sendo ultrapassado, naquele ano, pela versão nova de O Rei Leão). Uma questão, porém, incomodava a muitos fãs (mas não a mim, gostaria de deixar claro): por que a Elza tinha poderes? Ela nasceu assim? Foi amaldiçoada? Foi mordida por um floco de neve radioativo? Diante dessa questão (e também devido ao grande sucesso do filme), desde 2014 a Disney seria questionada sobre uma sequência. De início, a posição oficial era que uma sequência não estava nos planos, e que o foco seria na adaptação de Frozen para um musical da Broadway, que estrearia em 2017. Bob Iger, presidente da Disney na época, diria em entrevistas que não forçaria ninguém a escrever uma sequência, pois o resultado jamais sairia bom, e que deixaria que as coisas acontecessem naturalmente.

Em junho de 2014, porém, John Lasseter, chefe da equipe criativa, procuraria Chris Buck e Jennifer Lee, diretores de Frozen, e lhes diria que a Disney estava pronta para dar todo o apoio que eles necessitassem para fazer uma sequência, "se fosse isso que seus corações quisessem". Buck e Lee já haviam começado a trabalhar em outra história, mas, ao dirigir o curta Frozen: Febre Congelante, lançado em 2015, perceberiam que ainda tinham vontade de trabalhar com os personagens de Frozen, e se reuniriam com o produtor Peter Del Vecho, que, durante uma palestra, havia sido bombardeado por perguntas dos fãs sobre elementos do primeiro filme, para discutir a possibilidade de um segundo. Buck e Lee já tinham uma ideia bem clara de como queriam que esse segundo filme terminasse, e se empenhariam para que tudo se encaixasse da melhor forma possível para obter esse final; Buck, Lee, Marc E. Smith e os compositores Kristen Anderson-Lopez e Robert Lopez trabalhariam no roteiro, com a versão final ficando a cargo de Lee, que seria a única creditada como roteirista.

Nessa segunda aventura, Elsa (Idina Menzel) começa a ouvir uma voz misteriosa (dublada pela cantora norueguesa Aurora), e, seguindo a orientação do chefe dos trolls, Pabbie (Ciarán Hinds), parte em uma jornada pela Floresta Encantada, em companhia de sua irmã Anna (Kristen Bell), do boneco de neve Olaf (Josh Gad), do namorado de Anna, Kristoff (Jonathan Groff), e da rena Sven. Na floresta, Elsa e Anna descobrirão detalhes nunca revelados sobre o acidente que vitimou seus pais, o Rei Agnarr (Alfred Molina) e a Rainha Iduna (Evan Rachel Wood); encontrarão uma tropa de soldados que estão perdidos na floresta há 30 anos, liderados por Mattias (Sterling K. Brown); travarão contato com criaturas místicas, como os gigantes de pedra; e entrarão em conflito com a tribo Nortaldra, liderada por Yelena (Martha Plimpton), e da qual fazem parte os irmãos Honeymaren (Rachel Matthews) e Ryder (Jason Ritter), que compartilha com Kristoff o amor pelas renas. Mas o mais importante é que, durante sua jornada, Elsa descobrirá mais sobre seus poderes, inclusive sobre sua origem. Também fazem parte do elenco Jeremy Sisto como Runeard, o avô de Anna e Elsa, e Alan Tudyk como vários personagens secundários.

Para dar maior veracidade aos cenários e criaturas místicas do filme, a equipe de produção teria contato com uma equipe de estudiosos da cultura do povo sámi - também conhecidos em português como lapões - um povo indígena que vive no norte da Noruega, Suécia, Finlândia e na península de Kola, na Rússia. A Disney firmaria um acordo com o Conselho Sámi Transnacional, órgão que protege os interesses do povo sámi, para que todos os elementos do filme respeitassem a cultura sámi, e nenhum fosse mostrado como estereotipado. As principais criaturas místicas a aparecer no filme são os nøkk, cuja aparência líquida e fluida deu muito trabalho à equipe de animação, que se baseou no oceano de Moana para começar seu trabalho; oito meses de produção foram necessários apenas para criar e modelar os nøkk. Vale citar também que o chefe da equipe de animação, Wayne Unten, queria que Elsa usasse seus poderes como no primeiro filme, como se eles fossem parte de sua personalidade, com movimentos leves como os de uma dança; no início do processo de criação da personagem, ele chamaria todos os animadores responsáveis pelas cenas de Elsa, mostraria a eles várias cenas do super-herói Gelado, de Os Incríveis, e diria que aquilo era exatamente o contrário do que ele estava querendo.

Para criar os nøkk os animadores conseguiriam usar os softwares já existentes, mas, para o espírito do vento Gale, teve de ser inventado um novo, chamado Swoop, que exigiu a cooperação entre quatro equipes de animação diferentes para que fosse obtido o efeito desejado. Os gigantes de pedra também exigiriam um intenso trabalho para que realmente se parecessem com pedras que se moviam, e não com seres que tinham pele com aparência de pedra; pequenas pedras caem de suas articulações quando eles se movem, e a equipe teve de ter cuidado para que elas não distraíssem o público. Apesar disso, as equipes de animação do filme se superariam no uso dos softwares disponíveis, ao ponto de que alguns elementos ficariam tão realísticos que não combinariam com os personagens que tinham de interagir com eles, tendo de ser "piorados" de propósito. Uma das principais dificuldades dos animadores seria quanto a aparência de Olaf, que ou ficava falsa demais ou realística demais; para chegar a um meio-termo, eles pediriam para que os diretores concordassem que ele estava sob efeito dos poderes de Elsa, parecendo sempre estar ligeiramente congelado.

Após a primeira exibição para as plateias de teste, o filme teve de ser significativamente alterado, pois os avaliadores concluiriam que, apesar de os adultos terem gostado do filme, as crianças tiveram muita dificuldade para entender a história. Uma equipe de animadores teria de trabalhar durante mais dois meses para modificar diversas cenas, incluindo mais humor e esclarecendo alguns pontos da trama; ao todo 61 novas cenas seriam criadas e 35 modificadas, mas a Disney não divulgaria quantas seriam cortadas da versão final do filme - sabe-se que a versão final tem muio mais cenas do personagem Bruni, a salamandra de fogo, do que a primeira versão; que a recapitulação que Olaf faz do primeiro filme foi criada apenas para a versão final, para substituir um diálogo considerado "interminável" e "muito adulto" pelas plateias de teste; e que uma cena extremamente elaborada e trabalhosa envolvendo Olaf ficaria de fora da versão final.

Assim como Moana e O Rei Leão, Frozen 2 ganharia uma dublagem oficial em homenagem à cultura do filme - no caso, evidentemente, em sámi. A dublagem em sámi seria supervisionada pelo Instituto Internacional de Cinema Sámi, que, curiosamente, em 2014 fez um pedido à Disney para que Frozen ganhasse uma versão dublada em sámi, que foi negado. Ao todo, Frozen 2 teria dublagens oficiais em 46 idiomas, quatro a mais que Frozen, incluindo, pela primeira vez para um Clássico Disney, uma versão em telugu.

Frozen 2 seria lançado em 7 de novembro de 2019; com orçamento não revelado, mas estimado em 150 milhões de dólares, renderia 477,4 milhões apenas nos Estados Unidos, sendo 42,2 milhões apenas no primeiro dia, e ficando em primeiro lugar na bilheteria durante suas quatro primeiras semanas, até ser destronado por Jumanji: Próxima Fase. Somando as bilheterias do mundo inteiro, Frozen 2 faria 358,5 milhões no primeiro fim de semana, recorde para um filme de animação, e 1,450 bilhão no total, ultrapassando Frozen e ficando atrás apenas do já citado O Rei Leão de 2019, que renderia 1,658 bilhão, na lista dos filmes de animação de melhor bilheteria de todos os tempos. A crítica também receberia o filme extremamente bem, considerando-o pior que o primeiro, mas excelente por seus próprios méritos; ele seria indicado a apenas um Oscar, de Melhor Canção Original por Into the Unknown, o qual perderia para (I'm Gonna) Love Me Again, de Rocketman.

Bônus!!!!!

Esse é o primeiro post da série no qual eu falei sobre as versões dos desenhos dubladas em outros idiomas (culpa da Moana), e, ao pesquisar sobre o assunto, descobri coisas interessantes (bom, na verdade algumas eu já sabia, mas ainda não tinha falado aqui) que decidi compartilhar com vocês.

Desde 1988, todas as produções Disney - para cinema e TV, e não somente os desenhos, mas os filmes também - são dubladas, em todo o planeta, pela própria Disney. Em outras palavras, tudo da Disney que é lançado no Brasil dublado em português, por exemplo, desde 1988 é dublado pela Disney Brasil, nunca acontecendo de um outro estúdio (como, por exemplo, a Herbert Richers, que dublou algumas produções anteriores a 1988) ser contratado pela Disney para fazer as dublagens. Além disso, desde 1988, quem coordena todas as dublagens Disney em todo o mundo é uma empresa chamada Disney Character Voices International (DCVI), que estabelece rígidos padrões de qualidade, para que todas as dublagens sejam pelo menos do mesmo nível que as originais norte-americanas. É a DCVI que determina em quais idiomas cada produção será dublada, com alguns idiomas fazendo parte de uma "lista fixa", e outros sendo adicionados caso a caso.

Em relação aos Clássicos Disney, que é o que interessa para essa série, o primeiro a ganhar dublagens em idiomas estrangeiros, supervisionadas pelo próprio Walt Disney, foi justamente o primeiro de todos, Branca de Neve e os Sete Anões, que, além da versão original em inglês, teve dublagens em dez idiomas: português brasileiro, alemão, dinamarquês, espanhol latino-americano, francês europeu, holandês, italiano, polonês, sueco e tcheco. Esses onze (contando com o inglês) se uniriam a outros nove para formar uma lista fixa de vinte, para os quais todos os Clássicos Disney seriam dublados de Pinóquio a Bernardo e Bianca: árabe, eslovaco, finlandês, grego, húngaro, japonês, norueguês, persa e turco. Com a revolução islâmica de 1979, a Disney parou de lançar filmes no Irã e o persa saiu da lista, mas os Clássicos entre O Cão e a Raposa e Oliver e Sua Turma ainda foram dublados nos demais 19 da lista.

Com a criação da DCVI, outros 14 idiomas foram adicionados à lista, para dublar os filmes entre A Pequena Sereia e A Nova Onda do Imperador, para um total de 33: cantonês, catalão, coreano, espanhol europeu, flamengo, francês canadense, guoyu, hebraico, islandês, mandarim, português europeu, romeno, russo e tailandês. Em 2000, mais dez seriam adicionados à lista fixa, que ficaria, de Atlantis a Frozen 2, com 43: búlgaro, cazaque, croata, esloveno, estoniano, letão, lituano, sérvio, ucraniano e vietnamita.

Além dos 43 da lista fixa, desde 2000 a DCVI tem autorizado dublagens em dez outros idiomas, avaliados caso a caso, dependendo da procura que a Disney acredita que cada Clássico terá nos cinemas de cada país: albanês, bengali, galego, hindi, indonésio, malaio, marata, tâmil, telugu e urdu. Finalmente, como vimos hoje, alguns Clássicos ganharam dublagens em idiomas específicos, em homenagem às culturas neles retratadas, e que provavelmente não voltarão a dublar outros Clássicos (exceto, sei lá, em caso de sequências): zulu (O Rei Leão), havaiano, maori, taitiano (Moana) e sámi (Frozen 2).

Série Clássicos Disney

•Moana
•WiFi Ralph
•Frozen 2

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domingo, 28 de abril de 2019

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Kim Possible

Quando estou em casa, eu tenho a mania de fazer minhas refeições com a televisão ligada. Normalmente eu coloco em algum noticiário ou algum esporte, mas, houve uma época, quando eu ainda estava na faculdade, na qual nós estávamos sem TV por assinatura e, na hora do almoço, a única coisa que estava passando era o desenho da Kim Possible. O resultado foi que eu acho que assisti a quase todos os episódios, e passei a gostar muito do desenho. Essa semana, eu descobri que fizeram um filme da Kim Possible, com atores de verdade. Embora isso não tenha me deixado com vontade de assisti-lo, me deixou com vontade de escrever um post. Por isso, hoje é dia de Kim Possible no átomo!

A protagonista de Kim Possible (cujo nome, evidentemente, é um trocadilho com impossible, "impossível" em inglês) é Kimberly Ann Possible (voz da atriz e cantora Christy Carlson Romano), apelido Kim, adolescente que mora na pequena cidade de Middleton, no Meio-Oeste dos Estados Unidos, filha de James Possible (Gary Cole), um cientista de foguetes, e Ann Possible (Jean Smart), uma neurocirurgiã, e irmã mais velha de dois pestinhas gêmeos, Jim e Tim Possible (vozes de Shaun Fleming e Spencer Fox). Kim é o que, no jargão das séries para adolescentes, se costumava chamar de "menina perfeita": líder das animadoras de torcida, boas notas em todas as matérias, competente em todos os esportes e desejada pelos meninos; apesar disso tudo, ela é humilde, e sempre costuma dizer que é "apenas uma adolescente comum" - de fato, apesar das aparências, ela tem alguns "defeitos", como ficar travada quando fala com o menino de quem gosta, se preocupar em não conseguir agradar aos pais, falta de tempo para estudar para as provas, enfim, coisas realmente de adolescentes comuns.

Para tentar ganhar uma graninha extra, Kim criou um site onde se oferece para serviços como babysitting (tomar conta de crianças enquanto seus pais saem à noite) e cortar a grama, com o slogan "eu consigo fazer qualquer coisa". Um dia, um empresário que ficou preso em casa por seu próprio sistema de segurança de última geração tentou acessar o site da equipe de super-heróis Team Impossible e chamá-los para salvá-lo, mas acabou acessando o de Kim e a chamando por engano. Usando de suas habilidades adquiridas nos treinos de cheerleading e de ginástica olímpica, Kim conseguiria passar por todo o sistema de segurança e salvar o empresário. A partir de então, com a influência do tal empresário, ela se tornaria referência também para missões de espionagem, infiltração, salvamento e outras nas quais ou o governo não pode se meter, ou, por algum motivo bizarro, uma adolescente amadora é mais indicada do que profissionais treinados.

O melhor amigo de Kim é Ron Stoppable (cujo nome é um trocadilho com unstoppable, palavra em inglês para "irrefreável", ou seja, algo que, uma vez em movimento, não pode ser parado por forças externas), que não tem tantas habilidades quanto ela, mas, mesmo assim, insiste em acompanhá-la durante as missões. Ron (voz de Will Friedle) é vizinho de Kim, a conhece desde a pré-escola, tem como mascote um rato-toupeira-pelado (sim, é um animal real) chamado Rufus (voz de Nancy Cartwright, de Os Simpsons), que também acompanha a dupla nas missões (salvando os dois e o mundo algumas vezes), e, de certa forma, é a antítese de Kim: atrapalhado, desastrado, sempre na média em relação às notas, péssimo nos esportes, nada popular e frequentemente ignorado pelos colegas - exceto por Kim, que tem por ele uma afeição genuína. A principal função de Ron na série, como vocês devem ter percebido, é a de apoio cômico.

Além de Ron e de Rufus, Kim conta, em algumas missões, com a ajuda de Wade (voz de Tahj Mowry), um menino-prodígio da informática. Apesar de bem mais novo que Kim e Ron (Wade tem cerca de 10 anos, enquanto a dupla principal tem cerca de 16), Wade já é formado na faculdade, graças a seu intelecto brilhante. É ele quem fornece a Kim as traquitanas que ela usa nas missões de espionagem, procura por informações sobre as missões e os vilões que ela vai enfrentar, invade computadores para ela quando necessário, e até mesmo providencia o transporte quando as missões são em locais distantes. Para se manter sempre em contato com Wade, Kim usa uma de suas invenções, que ele batizou de "Kimunicador". Nas três primeiras temporadas, Wade jamais é visto fora de seu "centro de operações" - seu quarto, na casa de seus pais, onde está sempre de frente com o computador e com as luzes apagadas. Uma piada recorrente na série é que Wade teria colocado um localizador em Ron, mas sempre desconversa quando o assunto surge.

Outros personagens recorrentes na série incluem os pais de Ron, conhecidos apenas como Sr. e Sra. Stoppable (vozes de Elliott Gould e Andrea Martin), que são, respectivamente, um atuário (profissional que calcula riscos e incertezas usando fórmulas matemáticas; curiosamente, o pai de um dos meus melhores amigos é atuário, então eu meio que sempre soube o que era isso, e às vezes eu esqueço que tem gente que não faz ideia) e uma dona de casa; Betty Director (voz de Felicity Huffman), líder da organização secreta Justiça Global, que lida com casos para os quais nem mesmo as forças de segurança oficiais estão preparadas, frequentemente contratando Kim como freelancer (vale dizer que a Justiça Global é uma paródia da SHIELD, e Betty é uma paródia de Nick Fury, com tapa-olho e tudo); Will Du (voz de B.D. Wong), principal agente da Justiça Global e parceiro de Kim nas missões que ela realiza para a organização (e cujo nome é um trocadilho com will do, "vou fazer", no sentido de "sim, senhor" em inglês); Felix Renton (voz de Jason Marsden), adolescente cadeirante e jogador de baquete amigo de Ron; Brick Flagg (voz de Rider Strong), o quarterback do time do colégio, excelente nos esportes e péssimo nas aulas, mas que, ao contrário do que normalmente ocorre com esse tipo de personagem, não faz bullying com os demais, tendo um bom coração; Bonnie Rockwaller (voz de Kirsten Storms), rival de Kim nas líderes de torcida e na escola em geral; o Professor Barkin (voz de Patrick Warburton), que sempre é professor substituto, das mais variadas matérias, no colégio de Kim; e a melhor amiga de Kim no colégio, Monique (voz de Raven, de As Visões da Raven), menina esperta, antenada e fissurada em moda, que, inclusive, ajuda a criar o uniforme que Kim usa nas missões.

O principal vilão da série é o Dr. Drakken (voz de John DiMaggio), cientista que tem a ambição de dominar o mundo. Quando jovem, Drakken foi colega de faculdade de James Possible, mas, ridicularizado por morar com sua mãe (que é coadjuvante na série, com voz de Estelle Harris, e não sabe que o filho é um vilão) e por sua falta de habilidades sociais, se revoltou e decidiu se tornar um vilão. Drakken é um cientista brilhante, capaz de inventar todo tipo de robôs (alguns até com inteligência artificial), veículos e armas, mas é absolutamente incompetente, de forma que seus planos sempre acabam frustrados em parte por sua própria culpa. Drakken jamais se lembra do nome de Ron, o que irrita bastante o adolescente, e sempre fica extremamente surpreso quando Kim aparece para enfrentá-lo, mesmo isso acontecendo episódio sim, outro também. A pele de Drakken é azul, mas a única coisa revelada sobre isso na série é que "aconteceu numa quinta-feira".

O Dr. Drakken está sempre acompanhado de sua ajudante, Shego (voz de Nicole Sullivan), a nêmese de Kim. Altamente treinada em vários tipos de artes marciais e mais furtiva que um ninja, Shego já foi uma super-heroína, mas decidiu trilhar o caminho do mal, se tornando uma criminosa procurada em onze países antes de decidir se unir ao vilão. Além de suas habilidades, Shego aparenta possuir um superpoder, sendo capaz de aumentar a força de suas mãos com uma energia verde, que também consegue disparar na forma de rajadas de energia; usar esse poder, entretanto, a deixa extremamente cansada, e, sempre que luta contra Kim, Shego prefere usar apenas as artes marciais - e provocar Kim ao extremo, principalmente com apelidos infantis como "Kimmie", para lembrá-la de que ela é mais jovem e menos experiente que a vilã. O relacionamento entre Shego e Drakken de certa forma espelha o de Kim e Ron, já que ela é mais competente e perigosa que ele, mas nutre por ele uma certa afeição, ao ponto de sempre tentar protegê-lo.

Outros vilões da série incluem o Punho de Macaco (voz de Tom Kane), lorde inglês obcecado por macacos que passou por diversos procedimentos cirúrgicos para ter as habilidades de um, além de se especializar na vertente do kung fu conhecida como "punho do macaco", e em roubar artefatos que tenham a ver com macacos; Duff Killigan (voz de Brian George), o "golfista mais letal do mundo", que, após ser expulso de todos os torneios do planeta devido a seu temperamento, decidiu se tornar um supervilão que usa como armas tacos e bolas de golfe modificados e trabalha como mercenário, cometendo crimes sob encomenda; o milionário Señor Senior Sênior (voz de Ricardo Montalban) e seu filho Señor Senior Júnior (voz de Nestor Carbonell), que são supervilões por hobby, cometendo atos de vilania como tentar dominar a Europa ou roubar as joias da coroa apenas para espantar o tédio; e DNAmy (voz de Melissa McCarthy), geneticista louca que cria híbridos de animais ao estilo Woozles. Alguns vilões, como a viciada em adrenalina Adrena Lynn (voz de Rachel Dratch), o ladrão chique e frequentador da alta sociedade Falsetto Jones (voz de Phil Morris), e o Professor Dementor (voz de Patton Oswalt), rival de Drakken, aparecem em apenas um episódio cada, talvez para quebrar a monotonia.

Kim Possible foi uma criação de dois roteiristas veteranos do Disney Channel, Bob Schooley e Mark McCorkle, que já haviam trabalhado em séries como Aladdin, Hércules e Buzz Lightyear do Comando Estelar. Todas essas séries, porém, eram baseadas em longa-metragens da Disney, e tanto Schooley quanto McCorkle pensavam em trabalhar em uma série original, para a qual pudessem criar histórias sem as amarras de um universo pré-estabelecido. Um dia, logo após chegar ao estúdio, eles ficaram sabendo que os executivos do Disney Channel procuravam por ideias para uma série que trouxesse crianças comuns em situações extraordinárias, voltada para crianças e adolescentes entre 9 e 14 anos. Naquele mesmo dia, no elevador, quando ambos retornavam de seu horário de almoço, enquanto pensava em uma premissa que pudesse se enquadrar nesse tema, McCorkley comentaria, meio de brincadeira, "Kim Possible. Ela pode fazer qualquer coisa", ao que Schooley responderia, de pronto, "Ron Stoppable. Ele não pode". Provavelmente após rirem um bocado, ambos começaram a trabalhar na sinopse da série, e ainda naquele dia a apresentariam aos executivos, recebendo a luz verde.

Kim Possible seria a segunda série de animação totalmente original produzida pelo Disney Channel, depois de A Família Radical, que estreou pouco menos de um ano antes. Tendo cada um uma filha pré-adolescente em casa, tanto Schooley quanto McCorkle desejavam criar uma série com uma protagonista feminina forte, em quem as meninas que estivessem assistindo a série pudessem se inspirar - algo que, se ainda é raro hoje, imaginem quinze anos atrás. Ambos os roteiristas, quando jovens, tiveram como ídolos James Bond e o Capitão Kirk de Jornada nas Estrelas, e quiseram que Kim tivesse algumas das características de ambos os personagens, para que as meninas da época pudessem ter com ela a mesma relação que eles tiveram com esses ídolos; eles também fariam questão de que Kim não tivesse nenhum superpoder, não tivesse identidade secreta, e que não fosse infalível, passando por grandes dificuldades em questões como gerenciar sua vida pessoal, manter suas boas notas na escola e lidar com os meninos pelos quais se apaixonasse, tudo para tornar a personagem mais humana e mais fácil para que as espectadoras se identificassem com ela. Ron, o parceiro de Kim, estaria na série não só como apoio cômico, mas, sendo muito menos competente que Kim, para mostrar que quem aparentemente não tem grandes habilidades também pode fazer a diferença se der o seu melhor.

Além de roteiristas, Schooley e McCorkle seriam produtores executivos da série, e, sob sua batuta, acabariam fazendo algo bastante diferente do que os executivos da Disney estavam acostumados. Para começar, eles sabiam que uma série com uma protagonista feminina teria grandes chances de ser rejeitada pelos meninos, então decidiram que a série deveria ter altas doses de ação, para chamar sua atenção; ao mesmo tempo, os roteiros tentariam focar em relações interpessoais e família, temas que agradavam mais às meninas. Além disso, eles decidiriam fazer a série não somente apropriada para crianças e pré-adolescentes, mas para todo tipo de público, dando a ela um tom de sitcom, com ritmo e humor mais próximo aos das séries feitas com atores reais do que dos desenhos da época. Isso faria com que os roteiros de Kim Possible fossem em média cinco páginas mais longos que o normal para uma série da Disney, e foi visto como uma aposta de alto risco pelos executivos, mas acabaria dando super certo. Schooley e McCorkle não seriam os únicos roteiristas da série, contando com uma equipe sob seu comando; a maioria das histórias, entretanto, seria inspirada em fatos que ocorreram durante a adolescência da dupla, ou com suas filhas pré-adolescentes, como um episódio no qual Ron decide entrar para o time de futebol, inspirado no que aconteceu com a filha de Schooley quando ela decidiu entrar para a banda da escola - uma das mais famosas exceções é um episódio no qual Kim é atacada pelo Dr. Drakken com um spray que faz com que ela desapareça quando fica encabulada bem às vésperas de um encontro romântico, inspirado no fato de que Romano, intérprete de Kim, cora facilmente quando é elogiada. Sendo grandes fãs dos quadrinhos da Marvel, Schooley e McCorkle também encheriam os episódios de referências a eles, algumas bem sutis, outras bem mais óbvias - como o fato de que o Dr. Possible e o Dr. Drakken foram colegas de faculdade, assim como Reed Richards e Victor von Doom.


Kim Possible estrearia no Disney Channel no dia 7 de junho de 2002, com o primeiro episódio de uma temporada que teria um total de 21, cada um com 22 minutos de duração - que, somados aos comerciais, resultaria em meia hora. A música de abertura da série ficaria a cargo de Christina Milian, que já havia trabalhado em outras produções do Disney Channel, e se tornaria um grande sucesso, sendo lançada em single e ganhando um clipe no qual Milian e Romano cantavam juntas. Pouco antes de a série estrear, alguns críticos de TV expressariam sua preocupação quanto ao fato de que ela poderia falhar em atrair o público masculino, o que poderia resultar em fracasso e cancelamento, mas, já nas primeiras semanas, foi mostrado que esses temores eram infundados, com Kim Possible tendo uma audiência altíssima, e pesquisas mostrando que a maior parte do público era composta por meninos. Além de um sucesso de público, a primeira temporada, que terminaria em 16 de maio de 2003, também seria um grande sucesso de crítica, sendo extremamente elogiada por toda a crítica especializada. A primeiro episódio da primeira temporada seria indicado ao Primetime Emmy Awards na categoria Melhor Programa de Animação, mas perderia para um episódio da décima-quarta temporada de Os Simpsons.

Todo o sucesso da primeira temporada levaria, evidentemente, ao lançamento da segunda, exibida entre 18 de julho de 2003 e 5 de agosto de 2004. Ao todo, a segunda temporada teve 28 episódios, sendo que um deles, Kim Possible: A Corrida do Tempo, foi exibido originalmente como um filme para a TV de uma hora de duração, sem intervalos - o primeiro filme de animação produzido pelo Disney Channel. Nele, o Dr. Drakken, o Punho de Macaco e Duff Killigan se unem para roubar um artefato que lhes permitirá reescrever a história, e Kim e Ron têm de viajar para o passado e para o futuro para detê-los; o filme conta com a participação de atores famosos como as vozes das versões futuras de alguns personagens: Dakota Fanning como Kim, Michael Clarke Duncan como Wade, Vivica A. Fox como Monique e Freddie Prinze Jr. como Jim e Tim Possible. Nas reprises e nas exibições por streaming dos episódios, o filme seria dividido em três, para um total de 30 episódios na segunda temporada. Vale citar também que três dos episódios eram "duplos", ou seja, traziam duas histórias de 11 minutos cada ao invés de uma única história de 22 minutos. A segunda temporada faria tanto sucesso quanto a primeira, e seria indicada a dois Daytime Emmy Awards, Melhor Série de Animação Infantil (perdendo para Little Bill) e Melhor Atuação em um Programa de Animação (para Cartwright, perdendo para Joe Alaskey no papel principal de Duck Dodgers).

A terceira temporada seria exibida entre 25 de setembro de 2004 e 10 de junho de 2006 - sendo que o penúltimo foi ao ar em 18 de novembro de 2005, e isso será explicado em breve. Ao todo, a terceira temporada teve apenas 12 episódios, mas, mais uma vez, um deles era um filme de uma hora de duração sem intervalos, que, dividido em três episódios para as reprises e o streaming, aumentou o total da temporada para 14. Nesse filme, Kim Possible: O Drama do Amor, Kim se apaixona por um garoto novo na escola, chamado Eric, e Ron descobre estar também apaixonado por ela; enquanto isso, o Dr. Drakken faz um ataque diabólico, e Kim tem de escolher entre uma noite romântica e salvar o mundo mais uma vez. No final do filme, que seria exibido após o sexto episódio da temporada, Kim e Ron começam a namorar, mas isso não seria explorado nos episódios seguintes, porque, cronologicamente, o filme se passa após o penúltimo episódio da terceira temporada - na verdade, todos os episódios da terceira temporada foram exibidos fora da ordem de produção por ordem dos responsáveis pela programação do Disney Channel, o que irritou os produtores. Enquanto a terceira temporada estava no ar, em 26 de agosto de 2005, foi exibido um episódio da série Lilo & Stitch que era um crossover com Kim Possible; nele, Stitch é sequestrado pelo Dr. Drakken, e Pleakley chama Kim, que tem de trabalhar em conjunto com Lilo para salvá-lo, enquanto Jumba tenta capturar Rufus, que confundiu com o perigoso Experimento 607. A terceira temporada seria indicada em 2005 a um número recorde de cinco Daytime Emmy Awards, o mais alto para qualquer série de animação indicada ao Emmy: Melhor Série de Animação Infantil (perdido para O Mundo Divertido de Peep), Melhor Atuação em um Programa de Animação (para Romano, perdido para Henry Winkler como Norville em Clifford, o Cachorrinho), Melhor Som (perdido para Duelo Shaolin), Melhor Edição de Som (perdido para O Batman) e Melhor Mixagem de Som (o único que ganhou).

Na época, existia uma regra não-oficial no Disney Channel, que vigorava desde a década de 1990, e dizia que nenhuma série de animação poderia ultrapassar as três temporadas ou os 65 episódios, o que ocorresse primeiro, e existia para que a programação estivesse sempre se renovando, e nenhuma série fosse cancelada por sua audiência cair após ela alcançar seu auge. Dessa forma, como o número de 65 episódios foi alcançado com os 14 da terceira temporada, Schooley e McCorkle interromperam a produção logo após o filme (que foi o último episódio produzido), e começaram a pensar em outros projetos. O setor de programação, entretanto, optaria por exibir apenas 13 dos 14 episódios produzidos, e os executivos do canal chamariam os produtores para uma conversa que os surpreendeu: devido à alta audiência, às várias indicações ao Emmy, e a centenas de cartas dos fãs pedindo uma quarta temporada, eles decidiriam abrir uma exceção e produzir mais episódios. Isso foi uma surpresa tão grande para Schooley e McCorkle que eles sequer souberam o que fazer com o namoro de Kim e Ron, propositalmente acabando o filme (que, vale lembrar, foi o último episódio produzido) com ele justamente para não ter que desenvolvê-lo. E a razão pela qual houve um espaço de seis meses entre o penúltimo e o último episódios foi que o setor de programação decidiu "guardá-lo" para exibi-lo próximo à estreia da quarta temporada - mas, oficialmente, ainda fazendo parte da terceira.

Assim, em 10 de fevereiro de 2007, estrearia a quarta temporada, que teria um total de 21 episódios - um deles duplo e o último de todos com 45 minutos de duração, dividido em dois para as reprises, para um total de 22. A maior mudança da quarta temporada foi que Kim e Ron agora eram um casal, mas os produtores também decidiriam estrear vários vilões novos, fazer com que Wade e Monique saíssem em missões ao lado de Kim e Ron, e até mesmo criar um novo uniforme para Kim. Infelizmente - e surpreendentemente - a quarta temporada não faria tanto sucesso quanto as outras três, tendo audiência bem menor e não sendo indicada a nenhum Emmy; diante disso, Schooley e McCorkle decidiriam que o último episódio (o tal de 45 minutos) seria um fechamento para a série, com Kim e Ron se formando na escola e enfrentando a maior ameaça de suas vidas - muitos acham que eles abandonaram o combate ao crime depois disso, mas na verdade isso fica em aberto. O último episódio seria exibido em 7 de setembro de 2007, encerrando a série após 87 episódios, o que fez com que ela se tornasse a série de animação mais longeva da história do Disney Channel, posto que só perdeu em 2010 para Phineas e Ferb - que teve um total de 222 episódios.

Mesmo com a queda na quarta temporada, Kim Possible é até hoje a série de maior audiência da história do Disney Channel, e, mesmo quinze anos após sua estreia, é considerada um dos maiores sucessos do canal, com suas reprises e exibições em syndication também sempre tendo boa audiência. Para celebrar tantos anos de sucesso, em 2018 o Disney Channel encomendaria um filme com atores, que estrearia no canal em 15 de fevereiro de 2019. Chamado simplesmente Kim Possible, o filme traz uma aluna nova, chamada Athena, que, após ajudar Kim e Ron a derrotar o Professor Dementor, é "adotada" pela dupla, que decide treiná-la para que se tornem um trio. Não gostando de onde isso vai dar, o Dr. Drakken decide sequestrar Athena, e Kim e Ron têm de partir para salvá-la. O elenco conta com Sadie Stanley como Kim, Sean Giambrone como Ron, Ciara Riley Wilson como Athena, Todd Stashwick como Drakken, Taylor Ortega como Shego, Issac Ryan Brown como Wade, Erika Tham como Bonnie, Matthew Clarke como o Dr. Possible, e Alyson Hannigan (a Willow de Buffy, a Caça-Vampiros) como a Dra. Possible, dentre outros. Oswalt repete seu papel como Dementor, Cartwright mais uma vez faz a voz de Rufus, e Romano faz uma participação especial como a cantora pop Poppy Blu, ídolo de Kim. Infelizmente, o filme não repetiu o sucesso da série, tendo a audiência mais baixa para um filme original do Disney Channel desde 2009, o que fez com que planos para uma sequência - ou até mesmo para uma série de Kim Possible com atores - fossem adiados indefinidamente.
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domingo, 27 de maio de 2018

Escrito por em 27.5.18 com 0 comentários

Chip 'n Dale Rescue Rangers

Vou confessar uma coisa: há duas semanas, quando pensei em escrever um post sobre um game, o primeiro no qual eu pensei não foi Duck Tales, e sim Chip 'n Dale Rescue Rangers. Rescue Rangers (para abreviar) era um dos meus jogos preferidos do NES, e um dos poucos que comprei; a esmagadora maioria eu alugava, comprar mesmo, só uns sete ou oito (até mesmo de Megaman, minha série preferida, eu só comprei o 1 e o 6), então isso faz dele membro de um grupo seleto. Na hora de escrever o post, entretanto, achei que Duck Tales seria um assunto melhor porque eu poderia falar também sobre o desenho, que eu adorava, ao passo de que o desenho no qual Rescue Rangers foi inspirado não me chamava muita atenção - quando aluguei e depois comprei o jogo, aliás, eu nem sabia que o desenho existia, só fui descobrir bem depois, já que ele ainda não era exibido no Brasil e na época não havia como consultar a internet. Mas, como vocês sabem, uma vez que eu fico com vontade de fazer um post, não sossego até que realmente o faça, então vamos lá. Hoje é dia de Chip 'n Dale Rescue Rangers no átomo!

Ah, sim, antes que eu me esqueça: caso alguém ainda não tenha ligado o nome às pessoas, Chip 'n Dale Rescue Rangers é um desenho lançado pela Disney em 1989 estrelado pelos esquilos Tico e Teco, que, aqui no Brasil, se chamava Tico e Teco e os Defensores da Lei. A razão pela qual estou falando isso nesse parágrafo em separado é para poder dizer que os nomes de Tico e Teco, em inglês, são, respectivamente, Chip e Dale. Esses nomes não foram escolhidos aleatoriamente: como a conjunção aditiva "e", em inglês, é and, a frase "Tico e Teco", ou seja, Chip and Dale, tem o mesmo som de Chippendale (que, aqui no Brasil, costuma ser chamada de "chipendéle"), nome da mais famosa fábrica de móveis em madeira do mundo, fundada em 1754, na Inglaterra, pelo marceneiro Thomas Chippendale. E por quê os dois esquilos (na verdade, aliás, eles são tâmias, uma outra espécie de roedor, mas deixa pra lá) mais famosos da Disney ganharam um nome que é um trocadilho com o de uma fábrica de móveis em madeira? Diz a lenda urbana que é por que a madeira preferida de Thomas Chippendale era a nogueira, e esquilos (e tâmias) comem nozes, mas a verdade é que o nome foi sugerido ao criador da dupla, o desenhista Bill Justice, pelo roteirista Tex Henson, segundo Henson, sem motivo em particular nenhum, somente porque ele gostava da sonoridade do nome Chippendale.

Pois bem, Tico e Teco foram criados por Justice para um desenho do Pluto, no qual o cão fazia parte do exército e deveria guardar uma guarita contra intrusos; Tico e Teco, porém, invadem o local desejando usar o canhão lá presente para quebrar suas nozes, enlouquecendo Pluto no processo. Esse desenho estrearia nos cinemas em 2 de abril de 1943, e o sucesso dos dois pequenos roedores garantiria que eles retornassem para outros 22, exibidos entre 1946 e 1956. Embora em alguns desses desenhos eles continuassem atormentando Pluto, sua vítima preferida logo passaria a ser Donald, que sofria por ter a dupla morando em uma das árvores de seu jardim. Depois de 1956, entretanto, Tico e Teco ficaram meio esquecidos, não sendo mais usados em nenhum desenho. Com o sucesso de Duck Tales, porém, a Disney logo quis investir em outros desenhos nos quais seus personagens vivessem aventuras, e, na reunião para selecionar quais seriam os astros do seguinte, os pequenos roedores foram sugeridos.

Em Tico e Teco e os Defensores da Lei, Tico e Teco resolvem abrir uma agência de detetives (chamada Rescue Rangers em inglês, Conexão Salva-Ação no Brasil) para lidar com casos "pequenos demais para a polícia". Em seu primeiro caso (ou seja, no episódio piloto), eles acabam ganhando a amizade de três outros bichinhos que se unem a eles na agência: Monterey Jack, ou Monty, um rato australiano de grande força e coração maior ainda, viciado em queijo e amante de aventuras; Zipper, mosca que é o melhor amigo de Monty; e Geninha (Gadget Hackwrench em inglês), ratinha com imenso talento para construir qualquer tipo de equipamento, de raciocínio rapidíssimo e intelecto invejável, por quem, obviamente, tanto Tico quanto Teco se apaixonam. Todos os três tiveram o curso de suas vidas alterado por Gatão (Fat Cat), gato mafioso que controla o crime na cidade, e acaba se tornando uma espécie de arqui-inimigo de Tico e Teco, que frequentemente se envolvem em encrenca com seus quatro capangas: o gato Mepps, o rato Snout, a toupeira Mole e o lagarto Wart. Além de Gatão, outro vilão recorrente da série é o Professor Norton Nimnul, cientista humano que leva a expressão "cientista louco" a um novo patamar - em um episódio, por exemplo, ele cria uma máquina que funciona com eletricidade estática, e sequestra todos os gatos da cidade para fazê-la funcionar. Nimnul é o único humano da série que sabe que Tico, Teco e seus amigos possuem inteligência e agem como humanos, e, como era de se esperar, outras pessoas não acreditam nele.

Falando nisso, o novo desenho possui duas diferenças em relação aos desenhos de Tico e Teco para os cinemas: primeiro, há o convívio entre animais antropomórficos e seres humanos, sendo que o comportamento dos animais sempre passa despercebido pelas pessoas - na presença de humanos, por exemplo, Gatão se comporta como se fosse um gato comum. Segundo, Tico e Teco foram completamente reformulados para o novo desenho, ganhando roupas - Tico usa uma jaqueta e um chapéu que lembram os do Indiana Jones, Teco usa uma camisa florida que lembra a do detetive Magnum - e novas personalidades: Tico é extremamente responsável, focado e certinho, ao ponto de ser acusado pelos demais de não saber se divertir, enquanto Teco é despreocupado, impulsivo, um pouco irresponsável e irritantemente brincalhão.

Essa nova aparência de Tico e Teco não foi criada por acaso. Na tal reunião para decidir qual seria o próximo desenho a investir após Duck Tales, a ideia preferida dos animadores era um desenho estrelado por Bernardo e Bianca, ratinhos astros de um longa metragem lançado nos cinemas em 1977. Na época, porém, a Disney já trabalhava com a hipótese de uma continuação de Bernardo e Bianca para os cinemas (que acabaria se tornando Bernardo e Bianca na Terra dos Cangurus, lançado em 1990), e ideia foi vetada pelo presidente da Disney na época, Michael Eisner. O roteirista Tad Stones, então, criou uma série de detetives, estrelada por uma equipe liderada por um rato chamado Kit Colby, que se vestia e agia como Indiana Jones, e composta por um camaleão de camisa florida, uma ratinha super inteligente e um rato gigante e muito forte. O produtor Jeffrey Katzenberg, porém, não gostou dos personagens, e aprovou apenas o enredo da série, pedindo para que eles fossem alterados; foi aí que Eisner sugeriu que Tico e Teco fossem os protagonistas, pois isso daria a chance de trabalhar com personagens já conhecidos do grande público. Stones, então, adaptou Tico e Teco aos conceitos que já havia criado para seus personagens, para manter a essência da série o mais próximo possível de sua criação original.

Tico e Teco e os Defensores da Lei estrearia no canal a cabo Disney Channel em 4 de março de 1989, passando para syndication (exibida em vários canais regionais dos Estados Unidos, ao invés de em apenas um dos canais nacionais) em 15 de setembro do mesmo ano. Curiosamente, o episódio-piloto, que, assim como o de Duck Tales, tinha duas horas de duração (sendo depois dividido em cinco episódios de meia hora cada, contando os anúncios, para as reprises), e contava a história de como os Rescue Rangers se conheceram e passaram a trabalhar na agência de Tico e Teco, não foi exibido antes da primeira temporada, e sim antes da segunda, com os episódios da primeira temporada sendo reprisados em syndication ao fim da segunda. A primeira temporada tinha episódios semanais, exibidos aos sábados, enquanto a segunda tinha episódios diários, exibidos de segunda a sexta-feira.

Sim, é confuso, então vamos tentar explicar melhor: em 4 de março de 1989 estrearia a primeira temporada, no Disney Channel, composta de 13 episódios semanais, o último exibido em 21 de maio. Então, em 15 de setembro, estrearia, em syndication, a segunda temporada, que começou com um episódio especial de duas horas de duração, seguido por outros 42 que foram exibidos de segunda a sexta, o último deles em 2 de maio de 1990. No dia seguinte, 3 de maio de 1990, começariam a ser exibidos em syndication os 13 episódios da primeira temporada, e, quando começaram as reprises, o episódio especial foi dividido em cinco - o que fez com que, para todos os efeitos, a segunda temporada tenha 47 episódios, e o "combo" da segunda com a primeira temporada tivesse 60, o que permitiu que as reprises do desenho fossem exibidas de segunda a sexta durante 12 semanas, apenas uma semana a menos que o considerado ideal.

Para chegar ao "número mágico" de 65 episódios para as reprises, o desenho ganharia uma terceira temporada de apenas cinco episódios, exibidos pela primeira vez entre 10 de setembro e 19 de novembro de 1990, semanalmente, no Disney Channel. Depois disso, como a audiência de Tico e Teco e os Defensores da Lei ficou abaixo do esperado, não chegando nem perto da de Duck Tales, a Disney optaria por não continuar produzindo episódios inéditos, embora as reprises tenham continuado até 1993.

Enquanto o desenho estava no auge de sua popularidade, a Capcom produziu um game baseado nele para o NES - o segundo game Disney produzido pela Capcom, depois do primeiro Duck Tales. Lançado em 8 de junho de 1990, Chip 'n Dale Rescue Rangers (Chippu to Deeru no Daisakusen, "a missão de Tico e Teco" no Japão) também contava em sua equipe com vários profissionais que trabalharam na série Megaman, o que fez com que ele tivesse visual e jogabilidade bastante parecidos com os dos jogos do robozinho azul - alguns inimigos das fases, inclusive, são nitidamente inimigos de Megaman adaptados para o estilo do desenho, e os chefes são até parecidos com alguns dos chefes do laboratório do Dr. Wily.

No enredo do jogo, Tico e Teco são contratados para encontrar a gatinha desaparecida de uma menininha chamada Mandy, mas, após a primeira fase, descobrem que isso não passou de um plano de Gatão para afastá-los de seus colegas e permitir que ele capturasse Geninha, para forçá-la a trabalhar para ele. Graças à sua genialidade, porém, Geninha constrói um telefone sem fio a partir de peças que encontra em seu cativeiro, e o utiliza para entrar em contato com Tico e Teco, revelar a eles os planos de Gatão e guiá-los através da cidade para que eles possam resgatá-la. Os dois roedores, então, deverão passar por diversas fases, enfrentando robôs criados pelo Professor Norton Nimnul e capangas contratados por Gatão, até conseguir derrotar o mafioso e salvar Geninha.

O jogo conta com 11 fases, sendo que, após a primeira, o jogador passa a ter várias chances de escolher qual caminho seguir, não sendo necessário passar por todas as outras nove antes de chegar à última (embora possa fazê-lo se quiser), ao fim da qual enfrentará Gatão. O jogo é para dois jogadores, com o jogador 1 sempre controlando Tico e o jogador 2 sempre controlando Teco (em termos de jogo, não há diferença nenhuma entre eles) e de modo cooperativo, ou seja, com ambos os personagens na tela simultaneamente se ambos estiverem jogando, com um podendo ajudar o outro. Para derrotar seus oponentes, Tico e Teco podem pegar certos objetos do cenário e arremessar neles, sendo que, no modo para dois jogadores, um pode pegar o outro e arremessá-lo também, o que, obviamente, causa dano ao arremessado, mas às vezes é útil para alcançar plataformas distantes ou se livrar de um inimigo chato em uma emergência.

O principal objeto que Tico e Teco podem arremessar nos oponentes são as caixas de madeira; cada fase é lotada de caixas, e, ao levantar algumas delas, Tico e Teco descobrem itens escondidos. Além de arremessar a caixa nos oponentes (o que pode ser feito para a direita, para a esquerda ou diretamente para cima), pressionando o direcional para baixo Tico ou Teco se escondem debaixo da caixa, afastando a atenção de alguns inimigos - caso um inimigo bata na caixa enquanto Tico e Teco estão escondidos, ele será derrotado e a caixa se perderá, mas Tico e Teco não receberão dano. Algumas caixas são de metal, e possuem alcance muito menor que as de madeira, mas com a vantagem de que, se não saírem da tela, podem ser empilhadas para que Tico e Teco alcancem locais altos. Outro item que pode ser arremessado é a maçã; a maçã causa muito mais dano que a caixa, mas, como é maior que Tico e Teco, quando eles a estão carregando ficam mais lentos e com pulos mais baixos e mais curtos - e suando profusamente, o que é um efeito bem legal. Em uma das fases do jogo Tico e Teco podem arremessar troncos, que, para todos os efeitos, são maçãs com uma aparência diferente. Outro tipo de item é a bomba, que, alguns segundos após ser erguida, explode, causando dano a Tico e Teco caso eles estejam no raio da explosão - e a todos os inimigos pegos no raio da explosão também, evidentemente. Finalmente, temos a bola, que é o único objeto que não sai da tela quando arremessado, quicando em paredes e no teto e indo parar em outro lugar, o que permite que seja arremessada mais de uma vez; a bola está presente na tela dos chefes, e é ela que Tico e Teco irão usar para derrotá-los.

O item mais presente durante as fases são as placas de flores, quadrados aparentemente feitos de metal com a figura de uma flor, e que fazem as vezes de moedas do Mario: pegando 100 flores, Tico e Teco ganham uma vida extra. De vez em quando, pode ser encontrado um item semelhante, um quadrado de metal com a figura de uma estrela; pegando 20 estrelas, ganha-se uma vida extra. Muito raramente, Tico e Teco podem ganhar uma vida extra direto, caso encontrem uma estrela com a inscrição 1-UP. Tico e Teco têm, cada um, uma energia composta por três corações, perdendo um deles cada vez que recebem dano, e perdendo uma vida se ficarem sem nenhum; para recuperar corações, eles precisam coletar bolotas (uma espécie de castanha), sendo que a bolota comum recupera um coração e a bolota dourada recupera dois. Um item muito útil é a letra P, que aumenta a força de Tico e Teco e permite que eles carreguem maçãs e troncos sem sofrer os efeitos adversos de seu peso. Um não tão útil é o martelo, usado em apenas uma única fase para destruir blocos especiais e permitir que nossos heróis avancem. Caso Zipper seja encontrado sob uma caixa, Tico e Teco ficarão invencíveis por alguns segundos, enquanto a mosquinha os acompanha destruindo todos os inimigos que aparecerem. Monty, por outro lado, não é tão útil, e aparece em locais pré-determinados das fases para derrubar portas e permitir que Tico e Teco continuem avançando.

Uma das coisas mais legais de Chip 'n Dale Rescue Rangers é que as fases são em escala, com o tamanho dos objetos sendo proporcional ao tamanho reduzido de Tico e Teco - em uma das fases, por exemplo, eles se deparam com torneiras abertas, e não têm como passar pelo fluxo de água, devendo fechá-las; em outra, estão em uma biblioteca, escalando livros "gigantes" em relação ao seu próprio tamanho. Curiosamente, os inimigos, exceto os chefes, parecem não respeitar essa escala, sendo do mesmo tamanho que Tico e Teco, o que significa que Nimnul e Gatão tiveram muito trabalho na hora de selecioná-los.

Tico e Teco ganhariam ainda um segundo jogo produzido pela Capcom, Chip 'n Dale Rescue Rangers 2, lançado em 10 de dezembro de 1993, o último jogo Disney produzido para o NES pela Capcom e um dos últimos jogos lançados para o NES, o que fez com que ele se tornasse pouco conhecido. Diferentemente de Duck Tales 2, entretanto, Rescue Rangers 2 era mais do mesmo: praticamente as únicas diferenças eram gráficos redesenhados (Tico e Teco, por exemplo, são mais parecidos com suas versões do desenho), lutas contra os chefes mais elaboradas (no primeiro jogo, as lutas contra os chefes eram basicamente todas iguais, só mudando a aparência do chefe e o padrão no qual ele lançava seus projéteis), a possibilidade de se escolher entre Tico ou Teco no modo para um jogador, a adição de um novo item que aumenta a energia máxima de Tico e Teco para até cinco corações, e o fato de que as nove fases do jogo agora ocorrem de forma linear, não sendo possível escolher qual caminho seguir - apenas na última fase é permitido escolher a ordem na qual cada uma das três subseções será efetuada, antes da luta contra Gatão. No enredo, Gatão escapa da cadeia e rouba a Urna do Faraó, com a qual terá acesso a um exército de fantasmas, cabendo a Tico e a Teco impedi-lo de abri-la.

Para terminar, é preciso citar Chip 'n Dale Rescue Rangers: The Adventures in Nimnul's Castle, jogo para DOS produzido pela Hi Tech Expressions (responsável por Megaman e Megaman 3 para DOS - mas não por Megaman 2 porque ele não existe, vai entender) lançado em 1o de março de 1990, no qual Monty foi sequestrado pelo Professor Norton Nimnul e Tico, Teco e Geninha precisam salvá-lo. O jogo, para apenas um jogador, possui somente três fases: na primeira, Tico deve entrar e sair de buracos para fugir de um cão de guarda e de uma espécie de geleca que pinga do teto, até conseguir entrar no castelo de Nimnul; na segunda, Tico deve subir uma escadaria recolhendo parafusos (que serão usados por Geninha para consertar um avião que resgatará Monty) e os entregando para Teco; e, na terceira, Tico deve escalar cordas enquanto desvia dos ataques de uma invenção de Nimnul (que também é o chefe do primeiro jogo do NES) e recolhe mais parafusos para entregar a Teco. Aí Geninha constrói o avião, Monty é resgatado e o jogo acaba. Fim.
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