segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

Escrito por em 18.1.16 com 0 comentários

Portishead

Assim como todo adolescente, eu também tive minha fase deprê - aquela na qual a gente fica triste e, ao invés de fazer coisas que nos deixem felizes, resolve fazer coisas que nos deixem ainda mais tristes, especialmente ouvir aquelas músicas bem tristes, que dão vontade de cortar os pulsos. Bem na época da minha fase deprê, coincidentemente, estava surgindo uma das bandas responsáveis pelas músicas mais tristes já criadas nesse planeta (pelo menos que eu conheça), o Portishead. Não me lembro como eu conheci o Portishead, acredito que tenha sido através da Mtv, mas o fato é que, quando precisei de uma música triste, soube a quem recorrer.

A fase deprê passou, mas, como as músicas do Portishead não são somente tristes como também muito boas, continuei ouvindo-as de vez em quando. Outro dia, inclusive, ouvindo meu já muitas vezes citado MP3 em modo aleatório, uma delas tocou, e me deu a ideia de fazer um post sobre a banda. Assim sendo, hoje é dia de Portishead no átomo.

O Portishead seria formado pela vocalista Beth Gibbons e pelo tecladista Geoff Barrow, que se conheceram no início da década de 1990, acreditem ou não, em uma empresa pública que oferecia emprego a desempregados, na cidade de Bristol, Inglaterra. Gibbons, nascida em Devon em 1965 e criada em uma fazenda, havia saído de casa aos 22 anos para tentar fazer carreira como cantora, mas, após várias tentativas, ainda não havia conseguido se firmar. Já Barrow, nascido em Somerset em 1971, trabalhou em vários estúdios desde a adolescência, como assistente de produção, assistente de mixagem e operador de cassete, chegando a trabalhar com bandas como Massive Attack, Depeche Mode e Primal Scream. No final dos anos 1980, Barrow já era bastante conhecido do meio, havia produzido uma faixa de um álbum do músico inglês Tricky, escrito canções para Neneh Cherry, tentado ser baterista em algumas bandas, e até trabalhado como DJ em clubes noturnos.

Ainda assim, as coisas não estavam fáceis para Barrow em 1991, o que o levou a procurar um emprego formal. Enquanto esperava para ser atendido, ele começou a conversar com Gibbons, que logo lhe contou seus planos. Barrow, então, propôs a Gibbons que ambos formassem uma dupla, ao estilo dos Pet Shop Boys, Erasure ou Eurythmics, mas para tocar trip hop, estilo de música eletrônica que estava surgindo na época e que muito lhe agradava. Gibbons topou, e ambos deixaram a fila do desemprego para começar a trabalhar em sua banda - que ganharia o nome de uma cidade vizinha a Bristol, onde Barrow havia morado desde os 11 anos, quando ocorreu o divórcio de seus pais.

Barrow entraria em contato com dois amigos, o guitarrista Adrian Utley e o engenheiro de som Dave McDonald, e começaria a escrever as canções em parceria com Gibbons. Barrow e McDonald optariam por usar técnicas experimentais de gravação e mixagem, samplers de músicas de filmes de espionagem da década de 1960, e até mesmo um teremin, instrumento musical que faz um som sinistro muito utilizado em trilhas sonoras de filmes de ficção científica antigos. Para mostrar seu trabalho às gravadoras, Barrow e Gibbons, ao invés de gravar uma fita demo, optaram por um método nada convencional: produziram e atuaram em um curta-metragem, To Kill a Dead Man ("para matar um homem morto"), que não tinha diálogos, deixando a trilha sonora, composta por suas canções, bastante em evidência. McDonald exibiria o curta para vários executivos, e o trabalho da dupla chamaria a atenção da gravadora Go! Beat, que os contrataria para a gravação de um álbum.

O primeiro álbum do Portishead, Dummy, seria lançado em agosto de 1994, trazendo uma cena de To Kill a Dead Man na capa. Ao todo, seriam lançadas três músicas de trabalho: Numb (cujo single seria lançado antes do álbum, em maio de 1994, ajudando a chamar atenção sobre a banda), Sour Times e Glory Box. Oficialmente, na época do lançamento, a banda era composta apenas por Gibbons e Barrow, mas Utley, que particiou de 9 e co-escreveu 8 das 11 faixas do álbum, seria incorporado ainda em 1994, transformando a dupla em um trio.

O álbum seria lançado sem muitas pretensões, mas alcançaria um grande sucesso, sendo extremamente elogiado pelas publicações especializadas e ganhando o Mercury Prize, prêmio conferido pela associação das gravadoras do Reino Unido e da Irlanda para o melhor álbum do ano gravado por artistas de um desses dois países, em 1995. O som de Barrow seria descrito pela revista Rolling Stone como "narcótico", e os vocais de Gibbons como "fúnebres mas sensuais", e a NME declararia que o álbum era "sublime, mas muito, muito triste". A banda também seria indicada ao Brit Awards de 1995 na categoria Melhor Artista Novo, mas perderia para o Oasis.

Dummy alcançaria o segundo lugar da parada dos mais vendidos do Reino Unido, e renderia ao Portishead um Disco de Ouro. Embora não tenha feito tanto sucesso fora de seu país de origem, se tornou uma espécie de queridinho da cena underground nos Estados Unidos, com o clip de Sour Times sendo um dos mais exibidos nas madrugadas da Mtv. Esse sucesso ajudaria a estabelecer o trip hop na cena musical, levando ao surgimento de muitas outras bandas desse estilo - e, curiosamente, faria com que muitos pensassem que o Portishead havia criado o trip hop, o que não era verdade, já que outras bandas, incluindo o Massive Attack, considerado seu precursor, já faziam trip hop há vários anos.

O surgimento dos "imitadores" levaria a um atraso no lançamento do segundo álbum da banda, já que Barrow procuraria um som diferente daquele que já estava popularizado como trip hop. Chamado simplesmente Portishead, o segundo álbum seria lançado em 30 de setembro de 1997, mais uma vez pela Go! Beat, mas com distribuição internacional da London Records - que também havia sido responsável por lançar Dummy nos Estados Unidos.

Portishead teria três músicas de trabalho, All Mine, Over e Only You, e seu som seria considerado mais maduro e "mais perturbador" pela crítica especializada. O álbum alcançaria a posição 21 do Top 200 da Billboard, mas não venderia o suficiente para receber certificação.

Ainda em 1997, a banda faria um show no Roseland Ballroom, em Nova Iorque, no qual tocaria suas músicas acompanhada de uma orquestra. Esse show daria origem a um álbum ao vivo, chamado Roseland NYC Live, e, em 2002, seria lançado em DVD, acompanhado de muitos extras, como clipes e a versão integral de To Kill a Dead Man.

Em 1999, após encerrar a turnê de seu segundo álbum, o Portishead gravaria Motherless Child, com Tom Jones, para um dos álbuns do cantor. Depois disso, eles começariam um longo hiato, segundo Barrow, "para se dedicarem a projetos pessoais". Eles só reapareceriam em fevereiro de 2005, participando de um concerto realizado em Bristol para arrecadar fundos para as vítimas do tsunami na Ásia em 2004. Na ocasião, Barrow declararia que eles estavam trabalhando no terceiro álbum, mas as primeiras músicas desse novo trabalho só seriam divulgadas em agosto de 2006, através de uma rede social, e, mesmo assim, Barrow declararia que elas eram apenas rascunhos, e sua divulgação não significava que elas fariam parte do álbum após o corte final. Somente no final de 2006 é que o Portishead voltaria aos estúdios, para começar as gravações do terceiro álbum e gravar um cover de Un Jour Comme un Autre, de Serge Gainsbourg (conhecido pela erótica Je t'Aime... Moi Non Plus), incluída no álbum-tributo Monsieur Gainsbourg Revisited.

No final de 2007, a banda anunciaria que seu terceiro álbum, Third ("terceiro", em inglês), já estava em fase de pós-produção, para ser lançado no ano seguinte. Em seguida, eles participariam do festival All Tomorrow's Parties, em Minehead, Inglaterra, no qual tocariam cinco faixas de Third, suas primeiras músicas inéditas em dez anos. Em janeiro de 2008, o Portishead sairia em turnê para divulgar o álbum, e acertaria sua participação no festival Coachella, nos Estados Unidos, único show da turnê realizado fora da Europa.

Third seria lançado em 27 de abril de 2008, mesma data da apresentação do Portishead no Coachella. Lançado pela Island Records no Reino Unido, Mercury Records nos Estados Unidos, e pela Universal no restante do mundo, o álbum se distanciava do trip hop, e seu som podia ser classificado como rock experimental. A banda usaria sintetizadores analógicos, e tentaria soar o mais diferente possível do estilo que a tornou consagrada - segundo Barrow, a única coisa em comum entre Third e os dois álbuns anteriores da banda seriam os vocais de Gibbons. A ousadia daria certo: Third seria eleito um dos melhores álbuns do ano pela crítica especializada, alcançaria o segundo lugar da parada britânica e o sétimo no Top 200 da Billboard, e renderia mais um Disco de Ouro. Suas músicas de trabalho seriam Machine Gun, The Rip e Magic Doors, mas vale citar também a primeira faixa do álbum, Silence, que conta com uma introdução narrada em português brasileiro - Barrow pegaria um trecho em inglês de uma palestra sobre a importância do número três na religião wicca, pediria para que um amigo brasileiro o traduzisse para o português e o gravaria recitando o trecho traduzido, sabe-se lá o por quê.

Um mês após o lançamento de Third, Barrow declararia estar muito empolgado, cheio de material novo, e que o quarto álbuym deveria ser lançado, no máximo, em 2010. Ainda não o foi até agora, mas a banda está em turnê contínua desde meados de 2011, tendo participado de festivais como o All Tomorrow's Parties e o Glastonbury Music Festival. Depois de Third, a banda ainda lançaria duas outras músicas, Chase the Tear, de dezembro de 2009, cuja renda da venda do single foi integralmente revertida para a Anistia Internacional, e SOS, cover do ABBA incluído na trilha sonora do filme High Rise, lançado em 9 de outubro de 2015.

Em janeiro de 2012, Barrow, em entrevista à Rolling Stone, declararia que a banda estava trabalhando no quarto álbum, mas que ele estimava que ainda levaria uma década para que ele ficasse pronto. Pode ter sido uma brincadeira, mas, com 11 anos de intervalo entre o segundo e o terceiro álbuns, nunca se sabe.

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