segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

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Canoagem (I)

Hoje eu darei mais um passo rumo ao objetivo não-declarado de falar sobre todos os esportes do programa das Olimpíadas, falando sobre canoagem. Porque eu gosto de fazer esses posts que falam de um monte de esportes de uma vez só, e descobri que a canoagem proporcionaria um desse estilo. Então vamos lá.

Canoas de vários formatos e tamanhos eram usadas por diversos povos indígenas, de forma que é impossível determinar quem as teria inventado. Esses povos as usavam não somente para locomoção, mas também para pesca, comércio, e, evidentemente, para competições esportivas, para determinar quem seria o mais hábil no manejo da canoa. A canoagem como conhecemos hoje, entretanto, é um esporte recente, tendo surgido no final do século XIX no norte da Europa, especialmente na Holanda e na Dinamarca, onde várias cidades realizavam corridas de canoas durante festivais. Conforme essas corridas se popularizavam, começariam a surgir os primeiros clubes de canoagem, nos quais os amantes das canoas poderiam não somente apostar corridas, mas também usar suas canoas para remar um pouco e relaxar.

O foco, entretanto, era nas corridas, com as competições entre os clubes se tornando bastante comuns no início do século XX. Como de costume, cada clube determinava suas próprias regras, e, para pôr um fim nessa bagunça, começaram a surgir as federações nacionais, que estabeleciam regras unificadas para todo o país. O próximo passo, como vocês já sabem, era a criação de uma federação internacional, para que o mundo inteiro usasse as mesmas regras. Esse passo seria dado em 1924, quando as federações nacionais de Alemanha, Áustria, Dinamarca e Suécia se uniram e fundaram a Internationalen Repräsentantenschaft Kanusport, que, em 1946, com a adição de muitos novos membros, dentre eles os Estados Unidos, mudaria de nome para Federação Internacional de Canoagem (ICF, na sigla em inglês), sendo até hoje o órgão máximo da canoagem esportiva.

Hoje, a ICF conta com 157 membros, incluindo o Brasil, e regula um total de nove esportes que usam canoas. Sobre um deles, o polo a canoa, eu já falei, lá no post sobre polo. Os outros oito nós veremos a partir de agora.

Vamos começar pela canoagem sprint, também conhecida como canoagem de velocidade, o mais básico dos esportes de canoagem, descendente direto das corridas de canoas. Uma prova de canoagem sprint se parece bastante com uma prova de remo: na água, são demarcadas, usando boias, nove raias (ou oito, no caso das Olimpíadas). Em cada uma dessas raias se posicionará uma canoa, que pode ter um ou mais ocupantes, tocando, com sua frente, uma linha de largada imaginária, que cruza a primeira coluna de boias. A um sinal sonoro, os participantes começam a remar, e seu objetivo, sempre se mantendo em sua própria raia, é tocar com a frente da canoa antes dos demais uma linha de chegada imaginária, que cruza a última coluna de boias. Evidentemente, quem cruzar essa linha de chegada primeiro será o vencedor. Caso haja mais participantes do que raias, são realizadas provas classificatórias, com os competidores com os melhores tempos nestas se classificando para a final. As distâncias oficiais da ICF são 200, 500, 1.000 e 5.000 metros.

Competições de canoagem sprint reguladas pela ICF usam dois tipos de canoa. O mais conhecido do público é o caiaque, uma canoa fechada de origem esquimó, na qual o competidor se posiciona sentado. As principais características do caiaque são a de que ele possui um leme, com o qual é possível alterar a direção na qual ele está navegando, controlado pelos pés do competidor dentro do caiaque, e a de que seu remo possui duas pás, uma de cada lado, com o competidor remando alternadamente de um lado e do outro. Curiosamente, as pás do remo do caiaque não são retas, e sim possuem um formato semelhante ao de uma colher, para ajudar no deslocamento da água. Nas competições, as provas de caiaque são simbolizadas pela letra K, seguida do número de ocupantes do caiaque: K1 (um ocupante), K2 (dois ocupantes) ou K4 (quatro ocupantes). Caiaques são feitos de fibra de carbono e resina, e possuem comprimento máximo de 5,2 m (K1), 6,5 m (K2) ou 11 m (K4), largura mínima de 60 cm, e peso mínimo, sem o competidor, de 12 Kg (K1), 18 Kg (K2) ou 30 Kg (K4). Os remos são feitos de fibra de carbono ou fibra de vidro. O design geral do caiaque deve seguir normas estabelecidas pela ICF, existindo pouca variação entre um caiaque e outro em uma mesma competição.

O segundo tipo de canoa usado nas competições da ICF é bem mais curioso, e conhecido como canoa canadense. Criada, evidentemente, no Canadá, a a canoa canadense (que costuma ser chamada só de canoa para simplificar) é aberta, feita de kevlar e resina, e, ao remar, o competidor assume uma posição curiosa, chamada stride, com uma das pernas ajoelhada sobre a canoa e a outra posta à frente, dobrada de forma que o joelho aponte para o bico da canoa e a sola do pé toque totalmente sua superfície. O remo da canoa, feito de fibra de carbono ou fibra de vidro, só possui pá de um dos lados, sua pá é bem mais reta que a do remo do caiaque, e, durante toda a competição, o remador deverá remar do mesmo lado da canoa, podendo, porém, escolher o lado de sua preferência. A canoa não possui leme, devendo sua direção ser controlada com o próprio remo. Provas de canoa são simbolizadas pela letra C, existindo provas de C1, C2 e C4. O comprimento máximo da canoa é de 5,2 m (C1), 6,5 m (C2) ou 9 m (C4) e o peso mínimo é de 16 Kg (C1), 20 Kg (C2) ou 30 Kg (C4). Até o ano 2000, existiam normas gerais para as canoas (que, inclusive, determinavam largura mínima de 75 cm), mas hoje o design é livre, o que permitiu várias inovações que levaram a maior velocidade.

A canoagem sprint participou pela primeira vez das Olimpíadas em 1924, em Paris, quando foi esporte de demonstração. Na ocasião, participaram apenas duas equipes, a seleção canadense e o Clube de Canoa de Washington, dos Estados Unidos, em provas de C1, C2, C4, K1, K2 e K4 masculinas, na distância de 1.000 metros, em raias montadas no Rio Sena. O esporte passaria a fazer parte do programa oficial doze anos depois, em 1936, em Berlim, com provas de C1 e K1 1.000 m e de C2 e K2 1.000 m e 10.000 m, além de curiosas provas de K1 e K2 "dobrável" (usando caiaques feitos de material que podia ser dobrado para transporte) na distância de 10.000 m, também todas masculinas. As mulheres começariam a competir já na edição seguinte, em 1948, em Londres, com provas de K1 500 m. Até hoje, aliás, as mulheres só competem nas Olimpíadas em provas de caiaque, o que é motivo de muitos protestos por parte das praticantes de canoa. O programa atual das Olimpíadas tem provas masculinas de C1, K1 e K2 200 m, C1, C2, K1, K2 e K4 1.000 m, e femininas de K1 200 m, K1 e K2 500 m e K4 1.000 m.

Além de fazer parte das Olimpíadas, a canoagem sprint possui seu próprio Mundial, o Campeonato Mundial de Canoagem Sprint, realizado pela primeira vez em 1938, e então em intervalos irregulares até 1970, quando passou a ser realizado anualmente, exceto em ano de Olimpíada. Atualmente são disputadas no Mundial provas masculinas de C1, C2, K1 e K2 200 m e 500 m; C1, C2, C4, K1, K2 e K4 1.000 m; C1 e K1 5.000 m; e as curiosas provas de revezamento C1 e K1 4 x 200 m. No feminino, são disputadas provas de C1, K1 e K2 200 m; C2, K1, K2 e K4 500 m; K1 e K2 1.000 m; e K1 5.000 m; além do revezamento K1 4 x 200 m.

A ICF também regula a paracanoagem, que é, essencialmente, a canoagem sprint disputada por paratletas. As regras são as mesmas, com apenas duas diferenças: todas as competições são individuais (ou seja, apenas um competidor por canoa) e, ao invés de caiaque e canoa canadense, os dois tipos de canoa usados são o caiaque e a va'a, uma canoa de origem polinésia semelhante à canadense, mas que possui uma quilha lateral, presa a seu casco por dois suportes, que auxilia no equilíbrio da canoa e do atleta dentro dela. Assim como na canoa canadense, o remo da va'a só possui pá de um lado, e todas as remadas são feitas do mesmo lado; os atletas podem se posicionar na posição stride ou sentados, de acordo com sua classificação. Tanto no caiaque quanto na va'a, todas as provas oficiais de paracanoagem da ICF são disputadas na distância de 200 metros.

Assim como os demais esportes paralímpicos, a paracanoagem conta com um sistema de classificação para dividir os competidores, garantindo que todos possam competir em igualdade de condições. Os atletas da paracanoagem podem ser classificados em três níveis: L1, para os que possuem mobilidade plena dos braços, mas pouca mobilidade no tronco, o que dificulta seu ato de remar; L2, para os que possuem boa mobilidade no tronco e braços, mas pouca ou nenhuma nas pernas, como paraplégicos; e L3, para os que possuem boa mobilidade do tronco, braços e pernas, mas alguma condição que os desfavoreça nas competições com os atletas sem deficiência, como amputados que competem com próteses. Essa classificação é combinada com as letras K ou V para se determinar o código das provas de caiaque ou va'a, respectivamente, criando os códigos KL1, KL2, KL3, VL1, VL2 e VL3. Atletas da VL2, falando nisso, são aqueles que podem competir sentados ao invés de na posição stride.

A paracanoagem fará sua estreia nas Paralimpíadas no Rio de Janeiro, em 2016. Suas provas fazem parte, entretanto, do Campeonato Mundial de Canoagem Sprint, desde 2010. Atualmente, são disputadas no Mundial todas as 12 provas possíveis (KL1, KL2, KL3, VL1, VL2 e VL3 200 m masculinas e femininas); para as Paralimpíadas, entretanto, estão previstas apenas as seis provas de caiaque.

Vale citar, aliás, que existem provas de va'a sprint para atletas sem deficiência, que não são reguladas pela ICF, e sim pela Federação Internacional de Va'a (IVF), que possui 35 membros, incluindo o Brasil. A IVF possui um acordo com a ICF, segundo o qual a ICF pode organizar competições de va'a sprint paralímpicas, para ajudar no desenvolvimento do esporte, desde que não organize competições que não sejam paralímpicas. Não seria possível incluir provas de va'a nas Paralimpíadas, entretanto, porque a IVF ainda é considerada o órgão máximo das provas de va'a, e a IVF não é filiada ao Comitê Paralímpico Internacional.

Outro esporte regulado pela ICF é a maratona. As primeiras maratonas começaram a surgir na década de 1960, e consistiam em realizar um longo percurso, de mais de 100 Km, ao longo de vários dias, seguindo o curso de um rio. Muitas das provas criadas naquela época ainda existem, como a Maratona Internacional Devizes-Westminster, na Inglaterra, com 201 Km entre as cidades de Devizes e Westminster percorridos ao longo de quatro dias; a Maratona de Dusi, na África do Sul, com 120 Km percorridos em três dias, entre as cidades de Pietermaritzburg e Durban; e o Tour de Gudena, na Dinamarca, também com 120 Km, mas percorridos em dois dias, ao longo do Rio Gudena. Essas maratonas, entretanto, não são organizadas pela ICF, e sim por comitês locais.

A ICF passaria a reconhecer a maratona como um esporte de canoagem em 1975, após as federações nacionais de Grã-Bretanha, Irlanda, Holanda, Noruega e Dinamarca protocolarem um pedido para que ela passasse a regular a maratona internacionalmente. As primeiras competições da ICF, entretanto, só seriam realizadas em 1988, pois os membros de um comitê criado para definir as regras padronizadas da maratona passaria anos discutindo qual seria o melhor formato a ser adotado. Curiosamente, as regras adotadas pela ICF acabariam bastante diferentes daquelas das maratonas existentes até então, o que faria com que muitos praticantes passassem a se referir ao esporte regulado pela entidade como "maratona de canoas da ICF", para diferenciá-lo da maratona "clássica".

As maratonas da ICF podem ser realizadas com caiaques ou canoas canadenses, nas categorias K1, K2, C1 e C2, sendo que as provas das canoas canadenses são disputadas exclusivamente no masculino. Não há uma distância padrão a ser percorrida, mas a distância da prova deve ser sempre superior a 20 Km. A largada da maratona é em massa, ou seja, todas as canoas largam juntas, e o vencedor será aquele que cruzar a linha de chegada primeiro. Dependendo do número de participantes, várias classes podem competir juntas, cada uma com seu próprio vencedor - por exemplo, os K1 e K2 podem competir juntos, mas o primeiro K1 a chegar será o vencedor da classe K1 e o primeiro K2 a chegar será o vencedor da classe K2, não importa qual a posição de cada um na classificação geral da prova.

Para permitir que mais locais possam abrigar competições de maratona - afinal, nem todo mundo tem à disposição um rio de mais de 20 Km de extensão capaz de comportar várias canoas correndo simultaneamente - a ICF permite duas coisas que não existiam nas maratonas originais: primeiro, que o percurso seja em um circuito, com os participantes completando voltas - a Maratona de Crestuma, em Portugal, por exemplo, consiste em cinco voltas de 4,3 Km cada, totalizando 21,5 Km. Segundo, que a prova tenha as chamadas portages, trechos nos quais o competidor deve levar a canoa até terra firme, sair dela, correr carregando-a, e então colocá-la novamente na água, entrar nela e sair remando - a Maratona de Cesky Krumlov, na República Tcheca, tem 34 Km no total, mas nada menos que nove portages, algumas com trechos de mais de 100 metros. Essas duas "inovações" permitem que as maratonas da ICF sejam realizadas em lagos, represas, ou até pegando trechos de rios diferentes, o que, seguindo seu objetivo, aumenta o número de locais qualificados para receber uma maratona. A maioria das maratonas da ICF é realizada em um único dia, mas provas de mais de um dia, nos moldes das maratonas originais, também são permitidas pela entidade - a Descida de Avon, na Austrália, é realizada ao longo de dois dias, com 52 Km percorridos no primeiro e 72 Km no segundo.

Atualmente, a ICF luta para que a maratona seja incluída nas Olimpíadas, para tentar aumentar a popularidade do esporte. Com esse intuito, ela a incluiu como esporte convidado nos World Games de 2013, realizados em Cali, Colômbia, com seis provas de 20 Km (C1, C2, K1 e K2 masculino, K1 e K2 feminino) realizadas em uma represa, que, infelizmente, não atraíram muito público. Enquanto não entra nas Olimpíadas, a maratona da ICF possui dois campeonatos internacionais de renome, o Campeonato Mundial de Maratona, realizado a cada dois anos de 1988 a 1998 e anualmente desde então, e a ICF Classic Series, um conjunto de dez provas realizadas ao longo do ano nas quais os competidores vão somando pontos por sua classificação em cada uma, sendo coroado campeão de sua classe aquele que terminar a última com mais pontos. A Classic Series é um campeonato recente, tendo sido disputado pela primeira vez em 2015, e criado justamente para alavancar a popularidade da maratona e ajudá-la a ingressar no programa olímpico.

Parecida com a maratona é a canoagem oceânica, que, como o nome diz, não é realizada em rios, lagos ou represas, e sim no mar. A primeiras prova de canoagem oceânica da qual se tem registro foi pouco mais que uma maratona no mar, realizada em 1958 entre as cidades de Scottsburgh e Brighton, na África do Sul, com 46 Km de extensão. Embora essa prova tenha sido disputada anualmente (e o é até hoje), somente na década de 1970 é que o esporte começou a tomar projeção, com a estreia de mais duas provas anuais: uma entre Port Elizabeth e East London, também na África do Sul, com nada menos que 240 Km, realizada pela primeira vez em 1972; e a Molokai Race, disputada no Havaí desde 1976, em um percurso de 60 Km considerado o mais belo do mundo.

Um dos principais motivos para a alavancada na popularidade da canoagem oceânica foi a mudança no tipo de canoa utilizada: até a década de 1970, eram usados caiaques comuns, mas, desde então, são usados caiaques especiais conhecidos como surfskis. Criado na Austrália no início do Século XX para pescar ostras, e hoje feito de fibra de vidro e fibra de alumínio, o surfski é um caiaque mais estreito (com entre 40 e 50 cm de largura), mais longo (comprimento máximo de 6,5 m), bem mais leve (peso mínimo de 8 Kg), com um bico em forma de faca para furar as ondas e um "cockpit" aberto, o que faz com que o competidor pareça estar sentado sobre o caiaque, e não dentro dele. Devido a essas características, um surfski permite muito mais estabilidade nas águas agitadas do oceano, o que, por sua vez, permite que o competidor alcance maiores velocidades. O remo e o leme são iguais aos de um caiaque comum, assim como a técnica de remada. Competições da ICF são sempre realizadas de forma individual (ou seja, são todas K1).

Assim como a maratona, provas de canoagem oceânica não possuem distância padrão, mas devem sempre ter, no mínimo, 10 Km. A largada é em massa, e ocorre com todos os competidores na areia; a um sinal sonoro, todos correm para a água carregando seus surfskis, os colocam na água, entram neles e começam a remar. Na chegada, da mesma forma, o competidor deve levar o surfski até a areia, sair dele e correr carregando-o até um portal que determina a linha de chegada. Provas de canoagem oceânica são realizadas em um circuito demarcado com boias, e podem ter mais de uma volta em torno desse circuito.

A canoagem oceânica é regulada pela ICF somente desde 2010, o que faz dela o mais recente esporte regulado pela entidade. A maioria das provas ainda é organizada por federações nacionais, com poucas sendo organizadas pela ICF: o primeiro Campeonato Mundial de Canoagem Oceânica foi realizado apenas em 2015, e contou não somente com provas masculinas e femininas, mas também com uma prova paralímpica masculina, categoria L2 - na qual cada atleta contava com um "ajudante", que corria da areia até tocar em seu surfski, já posicionado na água, para que ele começasse a remar, e esperava o competidor chegar na areia e tocar nele para correr até a linha de chegada. Esse evento serviu como teste para que a canoagem oceânica também passasse a ser oficialmente uma modalidade da paracanoagem, mas até agora o comitê criado pela ICF não aprovou essa inclusão. A ICF também planeja criar uma Surfski World Series, campeonato com várias etapas nos moldes da Classic Series da maratona, mas ainda não há previsão de quando ele começaria a ser disputado.

Para terminar com os esportes de corrida, temos a curiosa corrida de barcos-dragão. Criados na China no Século III a.C., os barcos-dragão possuem esse nome porque são decorados na forma de um dragão, com uma cabeça de boca aberta na proa, uma cauda na popa, e escamas, garras e barbatanas pintadas ao longo do casco, sempre de forma bastante colorida. Originalmente, os barcos-dragão eram usados em festivais, participando de desfiles e de exibições de velocidade; aos poucos, esses festivais passaram a ter também corridas, e, quando visitantes dos países vizinhos passaram a criar seus próprios barcos-dragão para participar dessas corridas, um novo esporte surgiu.

A ICF só passaria a regular as corridas de barcos-dragão em 2000. Pelas regras da ICF, existem barcos de 10 e de 20 ocupantes, sendo que um dos ocupantes fica na popa, controlando o leme e sendo responsável pela direção do barco, e outro fica sentado na proa, tocando um tambor para marcar o ritmo das remadas; os demais (8 no barco de 10, 18 no barco de 20) serão os remadores, sentarão em duplas (4 remando de cada lado no de 10, 9 de cada lado no de 20) e remarão usando um remo de pá única, semelhante ao das canoas canadenses. Os barcos são construídos em madeira, fibra de carbono e resina. As distâncias oficiais da ICF são 200, 500, 1.000 e 2.000 metros. Assim como na canoagem sprint, os barcos-dragão competem em raias.

O Campeonato Mundial de Barcos-Dragão é organizado pela ICF a cada dois anos desde 2001, sendo que apenas os barcos de 20 ocupantes participam. Em 2005 e 2009, esse esporte fez parte dos World Games como esporte convidado, e, nesses anos, as provas disputadas nos World Games também contaram como Mundial - ou seja, o medalhista de ouro dos World Games foi também o campeão mundial em cada prova. A corrida de barcos-dragão é alvo de uma disputa entre a ICF e a Federação Internacional de Barcos-Dragão (IDBF), fundada em 1991, sediada na China, e que hoje conta com 74 membros, incluindo o Brasil. A IDBF, que é reconhecida pelo COI, se considera a única federação internacional reguladora das corridas de barcos-dragão, e luta para que a ICF deixe de organizar competições - como a ICF possui mais membros e mais prestígio junto ao COI, porém, essa luta tem se mostrado, até agora, infrutífera. A IDBF realiza seu próprio Campeonato Mundial a cada dois anos desde 1995, e não é raro que os mesmos competidores participem tanto do Mundial da ICF quanto do Mundial da IDBF.

Vamos começar agora os esportes de habilidade, com a canoagem slalom, criada na Suíça na década de 1940 para imitar as provas de esqui, só que usando canoas. Na canoagem slalom, o objetivo é descer um trecho de um rio com corredeiras, pedras e outros obstáculos, passando por dentro de portais durante o percurso - exatamente como se fosse um esquiador descendo a montanha em uma prova de slalom. Uma curiosidade interessante sobre a canoagem slalom é que, atualmente, quase todo os "rios" usados nas competições são artificiais, construídos usando muros de concreto e água canalizada. Essa prática teve início na década de 1970, e permitiu que países sem corredeiras naturais pudessem contar com locais capazes de abrigar treinos e até mesmo competições. Competições realizadas em rios naturais ainda existem, mas são cada vez mais raras, e a maioria delas conta apenas com atletas locais.

O percurso da canoagem slalom tem por volta de 1 Km de extensão, e conta com entre 18 e 25 portais (competições internacionais normalmente usam 18) espaçados no mínimo 2 metros entre si. Destes portais, 6 ou 7 são de cor vermelha, enquanto os demais são de cor verde. Os portais são feitos por dois postes cada, com o competidor devendo passar por entre eles, e não são fincados no fundo do rio, e sim presos a cabos de aço suspensos, que cruzam de uma margem à outra - ou seja, ficam "pendurados" sobre a cabeça dos competidores. Os competidores devem passar pelos portais na ordem em que eles são numerados, sendo que portais verdes devem ser vencidos no sentido da descida (o competidor vem descendo e passa pelo meio dos postes), enquanto portais vermelhos devem ser vencidos no sentido oposto (o competidor passa por fora do portal, faz a volta, passa por entre os postes subindo o rio e volta a descer passando por fora). Tocar um dos postes com o corpo, remo ou barco faz com que 2 segundos sejam adicionados ao tempo total do competidor, e vencer um portal no sentido errado ou deixar de passar por um dos portais faz com que 50 segundos sejam adicionados ao tempo total.

Uma competição de canoagem slalom consiste de três etapas. Na primeira, cada competidor tem direito a duas descidas, sendo que apenas o melhor dos dois tempos registrados valerá para sua classificação. Os 16 competidores com os melhores tempos se classificam para a segunda etapa, conhecida como semifinal, disputada em um percurso diferente, no qual cada competidor só terá direito a uma descida. Os oito com os melhores tempos passam para a final, disputada no mesmo percurso da semifinal, mais uma vez com apenas uma descida por competidor. Aquele que conseguir o melhor tempo na final será o vencedor. Atletas de ponta costumam conseguir concluir o percurso entre 80 e 120 segundos.

Assim como a canoagem sprint, a canoagem slalom usa dois tipos de canoa, o caiaque e a canoa canadense. A diferença é que, na canoagem slalom, a canoa canadense também é fechada, como o caiaque, para proteger melhor o competidor. Na canoa canadense, o competidor deve ficar ajoelhado (não em posição stride, e sim com ambos os joelhos tocando a superfície da canoa), enquanto no caiaque o competidor fica sentado. O remo da canoa canadense tem apenas uma pá, embora seja permitido ao competidor remar de ambos os lados da canoa, enquanto o remo do caiaque possui duas pás, uma de cada lado. O caiaque da canoagem slalom não possui leme, devendo todas as mudanças de direção serem feitas com o remo. As canoas e caiaques também são menores e mais leves que as da canoagem sprint, para facilitar as manobras: as C1 e K1 têm comprimento mínimo de 3,5 m, largura mínima de 60 cm e peso mínimo de 8 Kg, enquanto as C2 têm comprimento mínimo de 4,1 m, largura mínima de 75 cm e peso mínimo de 13 Kg - falando nisso, apenas C1, C2 e K1 competem no slalom. Tanto as canoas quanto os caiaques são feitos de kevlar, fibra de carbono e resina.

A canoagem slalom fez sua estreia nas Olimpíadas em Munique, 1972, mas ficou de fora das quatro edições seguintes, retornando apenas em Barcelona, 1992. À exceção do percurso de 1996, que usou um trecho do Rio Ocoee, próximo a Atlanta, cidade-sede daquela edição, todas as competições das Olimpíadas usaram percursos artificiais. Em todas as edições das Olimpíadas foram disputadas apenas provas de C1, K1 e C2 masculino e K1 feminino, mas a ICF já divulgou que, a partir de 2020, o C1 feminino substituirá o C2 masculino no programa olímpico, o que fará com que todas as provas da canoagem slalom olímpica sejam individuais - e finalmente dará chance às atletas do C1 feminino de lutar por uma medalha olímpica, algo que elas reivindicam há anos.

A canoagem slalom também possui outras duas competições internacionais organizadas pela ICF. A primeira é o Campeonato Mundial de Canoagem Slalom, disputado a cada dois anos de 1949 a 2005, e a partir de então anualmente, exceto em ano de Olimpíada. São disputadas no Mundial as provas de C1, C2 e K1 masculinas, C1 e K1 femininas e C2 mista, com cada canoa tendo um homem e uma mulher. Além das provas individuais (ou em duplas, no caso das C2) também são disputadas, exceto na C2 mista, provas por equipes, com os tempos dos três melhores participantes de cada país sendo somados para se determinar o vencedor - no total, portanto, são disputadas no Mundial 11 provas. A segunda competição internacional organizada pela ICF é a Copa do Mundo de Canoagem Slalom, realizada anualmente desde 1988, e que conta com cinco etapas, cada uma com cinco provas (C1, C2 e K1 masculina, C1 e K1 feminina), com os atletas somando pontos de acordo com sua colocação em cada etapa e aquele com mais pontos no final da última etapa sendo coroado campeão de sua prova.

Recentemente, a canoagem slalom ganhou uma variação batizada como extreme slalom, na qual, ao invés de cumprirem o circuito um por um, os competidores disputam baterias de quatro atletas cada, com o vencedor de cada bateria avançando para a fase seguinte, até a final, na qual o vencedor será o campeão. No início da prova, os atletas descem uma rampa de dois metros de comprimento, que conta com um portão automático como do esqui, e caem juntos na água, remando para tentar alcançar o primeiro portal antes dos outros; o extreme slalom é uma corrida, com o vencedor sendo quem cruzar a linha de chegada primeiro, e a preferência para passar em cada portal sendo de quem chegar nele primeiro. Além dos portais, o circuito conta com uma área na qual, ao passar por ela, cada um dos atletas deve fazer um eskimo roll, um movimento com o qual o caiaque gira em torno de seu próprio eixo, com o atleta passando por dentro da água. Contato físico e choques entre os caiaques são permitidos, mas penalidades em segundos são aplicadas em caso de abuso - assim como para os atletas que falharem em passar por um portal, passarem por um portal no sentido contrário, ou não fizerem o eskimo roll corretamente. O extreme slalom é disputado, no masculino e no feminino, apenas no K1. Os caiaques usados são menorezinhos e mais reforçados, com comprimento máximo de 2,75 m e peso mínimo de 18 kg. A estreia do extreme slalom ocorreu no Campeonato Mundial de Canoagem Slalom de 2015.

Outro esporte regulado pela ICF, parecido com a canoagem slalom, é a canoagem de águas vivas, também conhecido como canoagem de águas bravas. Assim como a canoagem slalom, a canoagem de águas vivas é disputada em corredeiras, sendo que a canoagem de águas vivas sempre é disputada em rios naturais e não possui portais; o objetivo de cada competidor, porém, é o mesmo: completar o percurso no menor tempo possível.

A canoagem de águas vivas usa os mesmos tipos de canoa da canagem slalom, C1, C2 e K1 (sendo as C2 exclusivamente masculinas), mas as canoas das águas vivas costumam ser mais resistentes, feitas com estruturas reforçadas, para aguentar a violência das águas e um eventual choque contra as pedras. A frente de todas as canoas e caiaques também é em forma de faca, como a frente do surfski, para ajudar a furar a água enquanto a canoa desce o rio. Essas características fazem com que as canoas sejam mais compridas e mais pesadas que as da canoagem slalom, com comprimento mínimo de 4,3 m (C1), 4,5 m (K1) ou 5 m (C2), largura mínima de 70 cm (C1), 60 cm (K1) ou 80 cm (C2), e peso mínimo de 10 Kg (C1 e K1) ou 15 Kg (C2).

Existem dois tipos de competição de canoagem de águas vivas, chamadas Classic e Sprint. As competições no estilo Classic tiveram início na década de 1940, usam percursos com de 6 a 10 Km de extensão, e cada descida leva por volta de 30 minutos. Já as competições Sprint foram inventadas na década de 1970, visando tornar o esporte mais atraente a novos competidores; os percursos usados são bem mais curtos, com entre 500 e 750 metros, e cada descida leva por volta de 2 minutos. Nas competições Classic, normalmente, cada atleta tem direito a uma única descida, com cada um entrando no percurso um minuto após a largada do anterior, e aquele que fizer o menor tempo será o vencedor. Já as competições Sprint seguem um formato parecido com as da canoagem slalom, com várias etapas que classificam os atletas com melhores tempos para a seguinte, cada competidor só entrando no percurso após o anterior concluí-lo, e o melhor tempo da final sendo declarado vencedor.

A principal competição internacional da canoagem de águas vivas é o Campeonato Mundial, realizado a cada dois anos de 1959 a 2001 e anualmente desde então. As provas de Sprint passaram a fazer parte do Mundial em 1973, e, em 2001, os campeonatos de Classic e de Sprint passaram a ser separados, com o de Classic ocorrendo sempre nos anos pares e o de Sprint sempre nos anos ímpares.

Para terminar, temos a canoagem estilo livre, na qual o objetivo é realizar manobras que valem pontos. Competições de canoagem estilo livre são realizadas em rios, em pontos conhecidos como playspots, que possuam ondas estacionárias. Cada competidor tem direito a três apresentações de 45 segundos cada, durante as quais deverá demonstrar três tipos de movimento: básicos (aqueles que todos os competidores devem conhecer), da competição (selecionados pela organização para aquela competição específica) e bônus (outros movimentos que o competidor queira adicionar à sua apresentação). Todos esses movimentos estão registrados em um documento da ICF, que, além de os listar por tipo, descreve como eles devem ser realizados para garantir a pontuação máxima. A apresentação é julgada por um painel de cinco árbitros, com a maior e a menor notas sendo descartadas; o vencedor será aquele que obtiver o maior somatório de notas após todos terem feito suas três apresentações.

Nas competições de canoagem estilo livre é utilizado um caiaque especial conhecido como playboat. O playboat é feito integralmente de plástico, o que faz com que ele seja a mais leve de todas as canoas usadas nas competições da ICF, com peso mínimo de apenas 5 Kg; isso, evidentemente, tem o propósito de garantir uma ampla gama de movimentos, alguns que, inclusive, arremessam o competidor no ar. O playboat também é bastante curto, com comprimento mínimo de 2 metros, e estreito, com largura mínima de 60 cm. O remo é idêntico ao do caiaque.

A canoagem estilo livre é regulada pela ICF desde 2006. Suas principais competições internacionais são o Campeonato Mundial, realizado a cada dois anos desde 2007, e a Copa do Mundo, realizada a cada dois anos desde 2008 - o que faz com que haja uma competição internacional de canoagem estilo livre organizada pela ICF por ano. A diferença entre o Mundial e a Copa do Mundo é que o Mundial possui uma única prova masculina e uma feminina, enquanto a Copa é composta de três etapas, com os competidores ganhando pontos de acordo com suas colocações e aquele com mais pontos ao final da terceira etapa sendo coroado campeão.

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