A Fórmula 1 do início da década de 60 ainda era bem parecida com a dos anos 50, mas foi nesta década que a categoria começou a ganhar a cara que tem hoje, com os fabricantes introduzindo modificações nos carros exclusivamente para melhorar seu desempenho em corrida. A primeira delas pode-se dizer que foi o motor traseiro, desenvolvido pela Climax e trazido para a Fórmula 1 pela Cooper, e que fez com que os carros pouco a pouco fossem abandonando o formato clássico das "baratinhas" dos anos 50, e se aproximando do "charuto" característico dos anos 60.
Modificações mais radicais, porém, ainda iriam demorar para surgir. A temporada de 1960 foi praticamente uma continuação da de 1959, com o australiano Jack Brabham, da Cooper, sendo o homem a ser batido. Ele ganhou cinco das dez corridas da temporada, se tornando bicampeão, e dando mais um título de construtores para Cooper. Em segundo lugar no campeonato veio seu companheiro de equipe, o neozelandês Bruce McLaren, que venceu a primeira corrida da temporada. O maior rival de Brabham, o inglês Stirling Moss, ficou em terceiro, guiando uma Lotus também equipada com motor Climax, e conseguindo duas vitórias. As dez provas do calendário de 1960 foram os GPs da Argentina em Buenos Aires, Mônaco nas ruas de Monte Carlo, Holanda em Zandvoort, Bélgica em Spa-Francorchamps, França em Reims, Inglaterra em Silverstone, Portugal em Boavista, Itália em Monza, Estados Unidos em Riverside, e mais as 500 Milhas de Indianápolis, também nos EUA. 1960, aliás, foi o último ano em que as 500 Milhas fizeram parte da temporada de Fórmula 1. Por total desinteresse dos pilotos e equipes, a FIA retirou a prova do calendário de 1961 para não mais voltar. Ironicamente, depois disso, vários pilotos da Fórmula 1 se interessaram em disputar a prova de olho no prêmio, principalmente os que guiavam pela Lotus.
Com os motores traseiros e modificações na aerodinâmica dos carros, as velocidades ficavam cada vez mais altas, o que começou a causar uma certa preocupação na FIA no que dizia respeito à segurança dos pilotos. Visando limitar as velocidades alcançadas, a Federação fez uma modificação no regulamento, reduzindo a capacidade dos motores para um litro e meio, e proibindo os supercompressores, que algumas fabricantes já começavam a trazer para a Fórmula 1. Tal decisão acabou beneficiando a Ferrari, que já estava acostumada a utilizar motores V6 (motor em formato de V com 6 cilindros) de 1,5l nas corridas de Fórmula 2. Deixando de lado seus preconceitos em relação aos motores traseiros, a equipe italiana decidiu desenvolver um V6 traseiro em ângulo de 120o. O carro onde este motor foi instalado era uma verdadeira obra de arte, e com ele a Ferrari dominou a temporada, vencendo cinco das oito provas, duas com o norte-americano Phil Hill, duas com o alemão Wolfgang von Trips, e uma com o italiano Giancarlo Baghetti. As três outras provas foram vencidas por pilotos da Lotus, a única das demais equipes a ter um motor decente, duas com Moss e uma com o escocês Innes Ireland. No final, a Ferrari foi a campeã dos construtores, e Hill se tornou o primeiro norte-americano campeão da Fórmula 1. Além da saída das 500 Milhas de Indianápolis, o GP da Argentina também deixou o calendário, e o de Portugal foi substituído pelo GP da Alemanha, em Nürburgring. Também foi em 1961 que o GP dos EUA passou a ser realizado em Watkins Glen, que se tornaria um dos mais importantes circuitos da categoria.
O ano de 1962 começou com a aposentadoria de Moss, que sofreu uma acidente enquanto testava um Lotus em Goodwood, Inglaterra. Após se recuperar, Moss ainda tentou voltar a correr, mas achou que já não estava mais em forma para isso, e decidiu parar. Talvez, se não fosse por este acidente, Moss finalmente teria sido campeão, pois, tendo trabalhado durante todo o ano de 1961 em seu novo carro, a Lotus começou a temporada apresentando a maior inovação tecnológica da Fórmula 1 desde o motor traseiro: o cockpit. A estrutura central do carro da Lotus, onde ficava o piloto, era toda formada por uma única peça, feita de alumínio, o que diminuía o peso do carro e melhorava sua aerodinâmica. Além disso, ele era impulsionado por um novíssimo motor Coventry-Climax V8. Grandes inovações às vezes vêm acompanhadas de pequenos problemas, porém, e durante a temporada o carro não se mostrou tão confiável quanto se pensava, o que fez com que o novo piloto da Lotus, o escocês Jim Clark, terminasse em terceiro lugar no campeonato, vencendo três corridas. O campeão foi o inglês Graham Hill, da BRM, que venceu quatro, também utilizando um novo motor V8. O campeonato de 1962 teve nove provas, com a inclusão do GP da África do Sul, em Prince George, e as mudanças do GP da França para Rouen-Les-Essarts e da Inglaterra para Aintree.
As corridas da França e da Inglaterra voltariam para Reims e Silverstone na temporada de 1963, que voltaria a ter dez provas com a inclusão do GP do México, na Cidade do México. A Lotus, finalmente tendo resolvido os problemas de seu carro, dominou a temporada, com Clark vencendo sete das dez provas, não subindo ao lugar mais alto do pódio apenas nos GPs de Mônaco e dos EUA, vencidos por Graham Hill, e no GP da Alemanha, vencido pelo também inglês John Surtees, da Ferrari.
Surtees seria campeão em 1964, após uma temporada onde a Ferrari devotou todas as suas forças a fazer um carro melhor que a Lotus de Clark. O time vermelho usou três motores diferentes durante a temporada, seu já conhecido V6, um novo V8 e até um experimental reto de 12 cilindros, e fez praticamente um carro novo para cada prova. Graças a esta persistência, Surtees venceu duas provas, mesmo numero de Graham Hill e uma a menos que Clark, mas seus resultados nas demais corridas foram suficientes para que ele assegurasse o título. Curiosamente, Surtees havia sido campeão mundial de motovelocidade quatro vezes na categoria 500cc (1956, 1958, 1959 e 1960), sendo até hoje o único piloto a conseguir o campeonato tanto na categoria máxima do automobilismo quanto da motovelocidade. No calendário, o GP da França foi mais uma vez para Rouen-Les-Essarts, o da Inglaterra passou para Brands Hatch, e o GP da Áustria, em Zeltweg, substituiu o da África do Sul.
O GP da Áustria sairia para o retorno do da África do Sul em 1965, que ainda teve a volta do GP da Inglaterra para Silverstone e a trasferência do GP da França para Charade. Outra condição reestabelecida foi o de carro imbatível da Lotus de Clark, que venceu seis das dez provas e se tornou bicampeão. Como a velocidade dos carros não parava de aumentar mesmo com as limitações de motor, a FIA decidiu rever o regulamento, e permitir para o ano seguinte motores de até três litros aspirados, ou até um litro e meio com supercompressores. O efeito colateral desta mudança foi um nivelamento por baixo na temporada de 1966. Não querendo projetar um novo motor, a Climax anunciou sua saída da Fórmula 1, o que levou a Lotus a ter de correr com um motor BRM do ano anterior modificado. A BRM, por sua vez, decidiu produzir um teoricamente superpotente H16 (em formato de H com 16 cilindros), mas que na prática se tornou muito pesado e inferior aos concorrentes. A Cooper também pegou um "motor velho", um Maserati V12, enquanto a Ferrari optou por adaptar seu V12 para 3 litros.
No meio desta confusão, quem se salvou foi Jack Brabham, o bicampeão de 1959 e 1960, agora em sua própria equipe, que levava seu nome. A Brabham corria com um motor Repco V8 adaptado de stock cars, que, no papel, era o menos potente de todos os de 3 litros, mas na prática se mostrou o mais leve e menos sujeito a quebras, o que permitiu que Brabham ganhasse quatro das nove provas, e chegasse ao tricampeonato. Aliás, falando em nove provas, o GP da África do Sul foi mais uma vez removido, o da Inglaterra foi de novo para Brands Hatch, e o da França voltou para Reims. Consistência no calendário não era propriamente uma marca no início da Fórmula 1.
Em 1967 a Lotus traria para a Fórmula 1 o motor Ford Cosworth V8, presente na categoria - com modificações, evidentemente - até hoje. O princípio do Cosworth era o mesmo do Repco, um motor de 3 litros leve e confiável. A diferença era que o Cosworth era feito especificamente para a Fórmula 1, enquanto o Repco era adaptado. Com ele, Clark venceria quatro corridas, e só não seria campeão porque o motor era aliado a um design inovador de chassis, onde o cockpit terminava exatamente atrás do piloto, e o motor era montado "aberto" ao invés de envolto pela estrutura tubular. Por ser um motor muito novo, ele acabou dando problemas em algumas provas. Brabham, que tinha tudo para ganhar seu quarto título, também decidiu fazer algumas experimentações no motor e na aerodinâmica de seu carro e, apesar de ter ganho duas provas, não conseguiu bons resultados nas demais. O campeão acabou sendo o neozelandês Denny Hulme, segundo piloto da Brabham, que também ganhou duas provas, mas foi mais consistente no restante da temporada. Um inusitado destaque da temporada foi o piloto John Love, da Rodésia, que chegou em segundo no GP da África do Sul pilotando um Cooper antigo, equipado com um motor Climax adaptado para 3 litros pelos mecânicos de Love, e que ainda levava dois tanques de combustível extra, para agüentar toda a corrida. Love iria vencer a prova, mas um defeito em um destes tanques extras fez com que ele tivesse que parar para abastecer a poucas voltas do fim. No calendário, além do retorno do GP da África do Sul, desta vez disputado em Kyalami, o GP da França passou para Sarthe, o da Inglaterra voltou para Silverstone, e foi incluído o GP do Canadá, em Mosport, para um total de 11 provas.
1968 seria um ano crucial para a Fórmula 1. A primeira mudança foi mais uma vez no calendário, que pela primeira vez teve 12 provas, com a volta do GP da Espanha, em Jarama, mais as já tradicionais transferências do GP da França para Rouen-Les-Essarts e da Inglaterra para Brands Hatch, e do Canadá para Mont-Tremblant. Após muitas modificações e testes, a Lotus conseguiu a confiabilidade necessária para seu carro equipado com o Cosworth V8, o que a transformou em uma equipe praticamente imbatível. Para confirmar a boa fase, ela contratou Graham Hill para fazer dupla com Jim Clark. Logo na primeira corrida da temporada eles fizeram uma dobradinha, com Clark em primeiro e Hill em segundo. Infelizmente, um mês antes da segunda prova, Clark sofreria um acidente fatal em uma corrida de Fórmula 2 em Hockenheim, Alemanha. Além de perder seu piloto principal, a Lotus ainda perdeu a exclusividade de seu motor, que também passaria a equipar as novas equipes McLaren e Matra. Temendo que todo o seu favoritismo fosse por água abaixo, Colin Chapman, o dono da Lotus, começou a trabalhar em modificações que dessem alguma vantagem aos seus carros, e chegou às hoje famosas "asas", os aerofólios (asas traseiras) e spoilers (dianteiras). O primeiro carro a ganhar spoilers foi o de Hill para o GP de Mônaco. Na corrida seguinte, na Bélgica, Brabham e Ferrari já apareceriam com aerofólios montados diretamente sobre o assento do piloto. Uma corrida depois, a Lotus já usava aerofólios como os de hoje, na época montados sobre a suspensão traseira, o que exigiu um redesenho completo da suspensão e da caixa de transmissão. Gostando da idéia, a Matra montou um spoiler sobre a suspensão dianteira, que melhorou muito o desempenho do carro, mas só podia ser usado em treinos, pois o deixava instável e exigia muito do piloto. Ao final da temporada de 1968, todos os carros já usavam asas, perdendo de vez o formato de "charuto", e começando a se parecer com carros de Fórmula 1.
Além dos aerofólios, 1968 marcou a entrada na Fórmula 1 dos patrocínios, finalmente permitidos pela FIA para dividir os custos com as equipes, que até então recebiam patrocínios "mascarados" de fornecedores como Shell e Firestone, desde que utilizassem seus produtos. A primeira equipe a conseguir um patrocínio foi justamente a Lotus, que apareceu para o GP da Espanha, segunda corrida da temporada, pintada de vermelho, branco e ouro, as cores da fabricante inglesa de cigarros Imperial Tobacco. A Lotus seria a campeã de construtores de 1968, e daria a Graham Hill seu segundo título mundial. Mas mesmo tendo o melhor carro, Hill travou uma disputa apertada com o escocês Jackie Stewart, piloto da francesa Matra, originalmente uma companhia de aviação, que levou para a Fórmula 1 tanques de combustível originalmente projetados para aviões, que permitiam que o carro fosse até 15 Kg mais leve com a mesma quantidade de combustível que os oponentes. A FIA, porém, considerou estes tanques inapropriados por questões de segurança, e anunciou que a partir de 1970 eles não seriam mais permitidos.
Chateada, a Matra decidiu que, ao final da temporada de 1969, iria se retirar da Fórmula 1, deixando sua tecnologia com Ken Tyrrell, o inglês diretor da equipe. Mas os franceses também decidiram que iriam se retirar em grande estilo, e não pouparam esforços para construir um carro campeão e dar o título a Stewart, que venceu seis das onze provas do campeonato. Onze porque os pilotos boicotaram o GP da Bélgica, alegando falta de segurança. A segurança, aliás, foi um dos temas recorrentes durante o campeonato, onde a FIA chegou até a proibir os aerofólios e spoilers depois de muitos acidentes nas três primeiras corridas. No final da temporada eles voltariam, desta vez com um regulamento próprio, que incluía restrições a comprimento, largura e altura, e determinava que eles fossem fixos nos chassis dos carros. 1969 também viu curiosos carros de Fórmula 1 com tração nas quatro rodas, abandonados depois que a downforce, a pessão aerodinâmica que "gruda" os carros no chão, se mostrou uma forma mais confiável de se conseguir estabilidade. Além da retirada do GP da Bélgica, o calendário viu um novo retorno do GP da Inglaterra para Silverstone, do da França para Charade, e do Canadá para Mosport.
Ao final da década de 60, a Fórmula 1 já era uma categoria de interesse mundial, onde novas tecnologias eram testadas a cada prova. Na década de 70, este conceito se firmou ainda mais. Mas isso fica para o próximo post.
Série Fórmula 1 |
||
---|---|---|
1960-1969 |
0 Comentários:
Postar um comentário