segunda-feira, 22 de maio de 2017

Escrito por em 22.5.17 com 0 comentários

Tank Girl

Na década de 1990, houve um boom das revistas em quadrinhos, que vendiam como água, o que possibilitou o lançamento de vários novos títulos e o surgimento de várias novas editoras. Querendo pegar uma carona nesse sucesso, os estúdios de cinema começaram a negociar com as editoras de quadrinhos a adaptação de vários de seus personagens para a tela grande. E essa negociação não foi feita apenas com as gigantes DC e Marvel ou com a sensação do momento Image, mas também com todas as demais, não importando o que elas publicassem. Foi nessa onda que surgiram, por exemplo, um filme do Juiz Dredd estrelado por Sylvester Stallone, que, aqui no Brasil, teve seu título "traduzido" para apenas O Juiz; um filme do Timecop, estrelado por Jean Claude Van Damme, que eu aposto que poucos de vocês sabiam que era adaptação de uma história em quadrinhos; e um filme da Barb Wire estrelado pela Pamela Anderson, que estava fazendo um imenso sucesso na série Baywatch (também conhecida por aqui como SOS Malibu), então era meio óbvio que alguém fosse querer colocá-la em um filme qualquer para que as pessoas fossem vê-la independentemente do enredo ou do assunto.

Em comum, os filmes baseados em quadrinhos da década de 1990 tinham uma característica fundamental: eram todos muito ruins. Se, digamos, em 1997, você dissesse a um executivo do cinema que, em menos de vinte anos, os filmes de super-heróis seriam responsáveis pelas maiores bilheterias da história, ele riria da sua cara e chamaria a segurança. Barb Wire era inassistível. Rocketeer era uma afronta. Spawn: O Soldado do Inferno era uma aberração da natureza. Batman & Robin dispensa comentários. Os únicos que se salvam, na minha opinião, são Men in Black: Homens de Preto, que não conta, pois é de comédia e não de ação (o mesmo vale para O Máskara, que não é tão bom, mas também não é ruim) e o primeiro do Blade, embora se possa argumentar que, mesmo tendo sido lançado em 1998, ele já faça parte da leva dos anos 2000, pois tem muito mais características em comum com os filmes imediatamente posteriores a ele do que com os imediatamente anteriores.

Ainda assim, mesmo nenhum deles sendo verdadeiramente bom, é possível gostar de alguns, por diversos motivos. Eu gosto, por exemplo, de O Juiz, por três motivos: nostalgia, Stallone e Diane Lane. Também por três motivos, sendo um deles a nostalgia, eu gosto bastante de Tank Girl. Os outros dois motivos são os Saqueadores, um trabalho de maquiagem sensacional para a época, e a trilha sonora, que tem Belly, Veruca Salt, Hole, Bush, Björk, a música mais sensacional já gravada pelo Portishead, e uma versão fantástica de Joan Jett e Paul Westerberg para Let's Do It, de Cole Porter. Eu gostei tanto dessa trilha depois de assistir o filme que comprei o CD, e hoje quase todas as suas faixas estão gravadas no meu MP3. Ao ouvir essa da Joan Jett essa semana, fiquei com vontade de escrever sobre Tank Girl aqui pro átomo. E aqui estamos.


Nos quadrinhos, Tank Girl foi uma criação dos ingleses Jamie Hewlett e Alan Martin, que se conheceram em 1986, quando ambos eram universitários e Martin fazia parte de uma banda chamada The University Smalls, cuja principal música se chamava Rocket Girl, e havia sido escrita em homenagem a uma garota pela qual o vocalista da banda, Phillip Bond (que depois também se tornaria desenhista de quadrinhos), era apaixonado, a qual Martin achava que se parecia com uma das personagens da revista em quadrinhos Love and Rockets, por isso o apelido. Pouco tempo após se conhecerem, Martin e Hewlett começaram a fazer juntos um fanzine chamado Atomtan. Um dia, enquanto procuravam novas ideias, decidiram visitar um amigo em comum, que estava trabalhando como designer, e tentando criar um par de fones de ouvido que se parecesse com os usados pelos pilotos de tanques da Segunda Guerra Mundial. A casa desse amigo estava cheia de fotos de armas e veículos dessa época, e, enquanto esperavam para falar com ele, Martin e Hewlett se recordavam da música Rocket Girl, enquanto Hewlett rabiscava alguns rascunhos. Ele acabaria desenhando uma garota parecida com a de Love and Rockets, mas careca, seminua, e segurando uma arma gigantesca. Ao ver a ilustração, Martin acharia graça, e diria que estava faltando alguma coisa, entregando a Hewlett uma foto de um tanque. Hewlett desenharia a mesma garota sobre o tanque, e incluiria um logotipo no qual se lia "Tank Girl".

A dupla gostou tanto da ilustração que a publicou, como se fosse um anúncio, em uma das edições do Atomtan. Pouco tempo depois, eles seriam convidados para fazer parte da equipe da revista Deadline, uma nova publicação criada por Brett Ewins e Steve Dillon, desenhistas da famosa revista 2000 AD (na qual eram publicadas as histórias do Juiz Dredd), destinada a revelar novos talentos dos quadrinhos britânicos. Evidentemente, Martin e Hewlett decidiram que suas histórias seriam estreladas pela Tank Girl.

Os quadrinhos de Tank Girl eram, digamos, transgressores. A moça do título se vestia parcamente, estando quase sempre nua ou seminua, carregava armas gigantescas, morava em um tanque e era bissexual. Rapidamente, ela se tornaria um ícone da contracultura, e começaria a aparecer em pôsteres, camisetas, e até mesmo em roupas íntimas. Seus principais fãs eram os punks, que a consideravam um retrato do empoderamento feminino, e a comunidade LGBT, que chegou a usá-la como símbolo em uma passeata contra uma lei proposta pela então primeira-ministra Margaret Thatcher que proibia a abordagem de qualquer assunto que envolvesse homossexualidade em escolas e por agentes do governo.

A popularidade da personagem cresceu tão rapidamente que a Penguin Books, maior editora do Reino Unido, procurou a dupla e lhes ofereceu um contrato para que as histórias de Tank Girl fossem republicadas no formato de álbuns - "livros em quadrinhos", o formato preferencial de publicação de quadrinhos na Europa, diferentemente das revistas em quadrinhos vendidas em bancas dos Estados Unidos. Ao todo, três álbuns seriam publicados, todos no ano de 1989, trazendo todas as histórias que Martin e Hewlett haviam criado para a personagem, a maioria em preto e branco, mas algumas a cores. Os três álbuns teriam excelentes vendas, e acabariam traduzidos e publicados pela Penguin também na Espanha, Itália, Alemanha Ocidental, Escandinávia, Japão, Argentina e Brasil - embora não tenham chamado muita atenção, na época, por aqui.

Tank Girl era ambientado na Austrália (embora trouxesse toneladas de referências à cultura pop britânica do final dos anos 1980), e em um cenário pós-apocalíptico (embora jamais tenha ficado claro o que causou o apocalipse). Sua protagonista se chama Rebecca Buck, mas ninguém quase nunca se refere a ela pelo nome, de forma que, para todos os efeitos, ela é a Tank Girl - apelido que vem do fato de que ela mora em um tanque, que também é seu principal meio de transporte. Tank Girl é uma caçadora de recompensas, e, antes dos eventos dos quadrinhos, possui um lucrativo contrato com uma agência misteriosa, que pode ser ou não ligada ao governo; após cometer erros graves em duas de suas missões, ela passa a ser caçada pelas autoridades, com uma gorda recompensa sendo oferecida pela sua cabeça - o que não a impede de continuar realizando missões para quem pagar mais. Além de relativamente incompetente no que faz - exceto quando se trata de pilotar o tanque e explodir coisas - Tank Girl é ninfomaníaca, bissexual, dada a atos aleatórios de violência, e está quase sempre bêbada, além de não gostar muito de roupas, só se vestindo quando é absolutamente necessário.

O principal personagem secundário da história é Booga, o namorado de Tank Girl. Booga era um designer de brinquedos até um estranho acidente o transformar em um híbrido de homem e canguru. Pois é. Booga é totalmente devotado a Tank Girl, e não há nada que ela peça que ele não faça de bom grado. Ao longo das histórias, ele tem como colegas três bichos de pelúcia falantes, o coala gay Camp Coala, o rato Squaeky, e Mr. Precocious, que fala em inglês shakespeareano e se parece com um pequeno elefante cor de rosa, sendo, na verdade, um bilby, marsupial nativo da Austrália atualmente em risco de extinção.

Os personagens coadjuvantes incluem Stevie, aborígene dono de uma loja de conveniência ex-namorado de Tank Girl, que costuma arrumar algumas missões para ela, e de quem Booga tem ciúmes; Barney, moça que Tank Girl resgatou de um hospício; e três outras caçadoras de recompensas: Boat Girl, ex-patinadora artística profissional, cujo irmão foi morto por Tank Girl, que atualmente atua como cabeleireira de Barney e realiza missões usando um barco militar da época da Segunda Guerra Mundial; Jet Girl, mecânica talentosa que pilota um jato modificado por ela mesma, mas que é considerada extremamente chata por todos os outros personagens; e Sub Girl, amiga de infância de Tank Girl, melhor amiga de Jet Girl, e que pilota um submarino.

O sucesso dos livros da Penguin na Europa levaria várias editoras de quadrinhos norte-americanas a negociar sua publicação nos Estados Unidos; Martin e Hewlett acabariam fechando contrato com a Dark Horse (de Hellboy), que publicaria todas as histórias de Tank Girl, a cores, em uma minissérie de quatro edições mensais, lançadas entre maio e agosto de 1991. Essas quatro edições seriam reunidas em um encadernado, chamado Tank Girl: The Collection, lançado pela Dark Horse em outubro de 1993.

Até então, essas eram as únicas histórias existentes de Tank Girl - após saírem da Deadline, Martin e Hewlett se envolveriam em outros trabalhos, e não produziriam mais material inédito da personagem. Pouco após a estreia de Tank Girl na Deadline, entretanto, o editor da revista, Tom Astor, acreditando que a personagem daria um ótimo filme, começaria a tentar conseguir um contrato para levar Tank Girl para a tela do cinema. Ele conseguiria começar uma negociação com o estúdio New Line, que se arrastaria por anos antes de os executivos concluírem que não iria dar certo e engavetar o projeto.

Mas, em 1991, enquanto a New Line estava procurando um diretor, Rachel Talalay ganharia de presente de sua enteada as quatro edições de Tank Girl recém-lançadas pela Dark Horse. Talalay estava dirigindo seu primeiro filme, A Hora do Pesadelo 6: O Pesadelo Final, e sua enteada, fã da personagem, queria convencê-la a se candidatar para dirigir Tank Girl. Ela acabaria gostando da ideia, e, após o fim das filmagens de A Hora do pesadelo 6, entraria em contato com Astor. Após quase um ano sem receber uma resposta definitiva do editor, e ao saber que a New Line havia desistido do projeto, ela já estava se preparando para tentar comprar os direitos diretamente de Martin e Hewlett quando Astor voltou a entrar em contato com ela, dizendo que adoraria que ela dirigisse o filme, mas que eles agora teriam de encontrar um novo estúdio.

Talalay ofereceria o filme para a Amblin e para a Columbia, mas ambos rejeitariam a proposta. A Disney a procuraria se dizendo disposta a produzir o filme, mas aí ela é que rejeitaria, por acreditar que a Casa do Mickey não aceitaria um filme com o nível de violência e as piadas sexuais que ela acreditava serem necessárias para se fazer um filme fiel de Tank Girl. Pouco tempo depois, ela receberia uma proposta da MGM, que acabaria aceitando. Talalay trabalharia junto a Martin e Hewlett para criar o argumento do filme, que teria roteiro escrito por Tedi Sarafian (que, alguns anos mais tarde, escreveria O Exterminador do Futuro 3: A Rebelião das Máquinas).

Mesmo com a participação de Martin e Hewlett, o filme teria pouquíssimo a ver com as histórias em quadrinhos. Nele, o apocalipse foi causado pela queda de um cometa na Terra, o que acabou com quase toda a água do planeta (de antemão, portanto, já dá para saber que Boat Girl não estaria presente, embora Sub Girl faça uma pequena participação especial, sem ser identificada como tal). A pouca água que ainda resta é controlada pela megacorporação Water & Power (literalmente, "água e poder", embora o nome seja mais no sentido de "água e energia elétrica"), sediada na Austrália e comandada com mão de ferro por Kesslee (Malcolm MacDowell), que planeja controlar todos os depósitos de água do país, alguns ainda controlados por pequenos grupos rebeldes.

De um desses pequenos grupos rebeldes, fazem parte Rebecca (Lori Petty) e a pequena Sam (Stacy Linn Ramsower), que consideram uma à outra como irmãs. Rebecca faz pequenos ataques a postos e carregamentos da Water & Power, e sua base fica sobre um dos últimos poços de água que não pertencem à companhia; um dia, as tropas da Water & Power chegam para clamar também esse poço, destroem a base e acabam levando-as como prisioneiras, separando-as. Condenada a trabalhar como escrava em uma das fábricas da Water & Power, Rebecca se vê perseguida pelo Sargento Small (Don Harvey), mas faz amizade com Jet (Naomi Watts), técnica responsável pela manutenção dos jatos e tanques da companhia, e alvo de investidas do Sargento.

Mas os rebeldes não são a única preocupação da Water & Power: no deserto, vivem criaturas chamadas Saqueadores (Rippers, no original), que frequentemente atacam as instalações da empresa, causando grandes danos. Durante um desses ataques, Rebecca consegue escapar, e convence Jet a fugir com ela, levando um jato e um tanque, para encontrar Sam. As duas acabam sendo capturadas pelos Saqueadores, e descobrem que eles são híbridos de humanos e cangurus, criados para serem os soldados perfeitos, mas abandonados devido ao alto custo do processo, e que pretendem livrar o planeta da Water & Power. Junto com os Saqueadores Deetee (Reg E. Cathey), que ama música e poesia; T-Saint (o rapper Ice-T), sempre desconfiado e mal-humorado; Donner (Scott Coffey), apaixonado por esportes; e Booga (Jeff Cober), que acaba se tornando o namorado de Rebecca, as duas moças planejam um grande ataque à central da Water & Power, que pode livrar o mundo de seu domínio de uma vez por todas.

Um dos pontos altos do filme, como eu já disse, é a maquiagem dos Saqueadores, criada por Stan Winston, que trabalhou nas franquias O Exterminador do Futuro, Aliens e Jurassic Park. Quando a MGM perguntou a Talalay quem ela gostaria que fosse o responsável pela maquiagem, ela respondeu que Winston era o melhor; ela não acreditava, porém, que ele fosse responder ao contato do estúdio, e, quando ele respondeu, não acreditava que ele fosse aceitar fazer o filme, porque o orçamento era baixo e seu preço era alto. Winston, entretanto, ficaria empolgadíssimo com o projeto, e aceitaria cobrar a metade de seu preço normal, dizendo que os Saqueadores eram os melhores personagens nos quais ele já havia tido a oportunidade de trabalhar. Ao todo, oito saqueadores participam do filme, sendo os quatro já citados os principais, com falas e participação ativa, e os outros quatro, interpretados por dublês profissionais, fazendo apenas figuração e cenas perigosas. Todos os efeitos dos Saqueadores foram produzidos aplicando maquiagem e próteses aos próprios atores, sem o uso de animatronics ou de efeitos digitais; a maquiagem demorava quatro horas para ser aplicada, e contava com orelhas e rabo que podiam ser movidos por controle remoto, e com focinhos que se moviam de acordo com a boca nos quatro principais, mas eram fixos, e também podiam ser movidos por controle remoto, nos coadjuvantes. É importante notar que a aparência dos Saqueadores no filme é bem diferente da de Booga nos quadrinhos, onde ele é bem mais canguru que humano; isso ocorreria porque Talalay queria que as expressões faciais dos atores pudessem ser reconhecidas mesmo com a maquiagem, e pediria a Hewlett para redesenhar Booga para que ele ficasse mais parecido com um homem que com um canguru, modelo que então foi usado pela equipe de produção do filme.

O romance entre Tank Girl e Booga também teve de ser bastante amenizado para o filme, já que a MGM não aceitou que fosse mostrado abertamente um relacionamento entre uma mulher e um canguru mutante. Além de Booga entrar já tarde no filme, o romance acabou sendo apenas sugerido, e em somente uma cena, na qual Booga e Rebecca aparecem deitados em uma cama, realmente remetendo a um relacionamento romântico. Originalmente, essa cena teria Rebecca e Booga totalmente nus (cobertos apenas pelo famoso "lençol de filme", que cobre a mulher das clavículas até as coxas, mas o homem só da cintura para baixo), e uma roupa completa de "Saqueador pelado", incluindo um pênis de látex, foi fabricada. A cena até chegou a ser filmada assim, mas a MGM se recusou a lançar o filme com ela, e, não querendo cortá-la, Talalay a refilmou, com Rebecca de sutiã e calcinha e Booga totalmente vestido. É possível encontrar, porém, algumas fotos da produção que mostram o casal na cama usando apenas o lençol (embora não dê para ver o pênis, se é o que vocês estão querendo).

Essa não seria a única cena cortada por decisão da MGM: segundo Talalay, quase uma hora de filme ficou na sala de edição, porque o estúdio não concordou com o que ela havia filmado. Os principais destaques são uma abertura alternativa, que mostra o cometa se chocando com a Terra e uma Rebecca criança sobrevivendo ao impacto; quase toda a cena na qual Kesslee tortura Rebecca, da qual apenas uma pequena parte permaneceu no filme; e um final alternativo, no qual começa a chover (algo que não acontecia desde a queda do cometa), com o filme terminando com um gigantesco arroto de Tank Girl. O final que foi mantido no filme, aliás, é uma sequência de animação, apenas com as vozes dos atores. Essa não é a única sequência de animação do filme, com outra sendo exibida quando Rebecca e Jet fogem da Water & Power; o motivo pela qual elas foram incluídas é que o dinheiro acabou, e não seria possível produzir os efeitos especiais necessários caso elas fossem filmadas - ao invés de reescrevê-las, Talalay aceitaria a sugestão da MGM de fazê-las animadas. As cenas animadas foram desenhadas por Hewlett, e dirigidas por Steve Evangelatos.

Quando a trilha sonora estava sendo montada, Talalay e a MGM receberiam vários contatos de músicos querendo fazer pequenas participações no filme, mas recusariam com medo de essas participações chamarem mais atenção que o elenco original. No fim, eles acabariam aceitando apenas duas: Iggy Pop no papel de um homem misterioso chamado Rat Face, e Björk no papel de Sub Girl; pouco antes das filmagens, porém, Björk acabaria desistindo, e seria substituída pela atriz Ann Cusack.

Lançado em 31 de março de 1995, com orçamento de 25 milhões de dólares, o filme renderia pouco mais de 4 milhões nos Estados Unidos, e pouco mais de 6 milhões se for levada em conta a bilheteria internacional, o que fez com que ele fosse considerado um gigantesco fracasso de público. O filme também fracassaria dentre a crítica, que o consideraria amador, acelerado demais e com uma história muito fraca, embora as interpretações de Petty e McDowell tenham sido ocasionalmente elogiadas. O filme entraria para a história como um fiasco, e hoje costuma ser considerado um dos piores filmes já feitos - o que é um tremendo exagero não somente na minha opinião, mas na de um pequeno grupo que o transformou em cult.

Curiosamente, Tank Girl também costuma ser considerado um filme "verdadeiramente feminista", devido ao comportamento empoderado de Rebeca em oposição ao de outras protagonistas de filmes vistos como feministas, mas que muitas vezes possuem apenas uma aparência de empoderamento, enquanto no fundo somente reproduzem o comportamento considerado socialmente aceito para as mulheres. A ressalva das feministas - e de muitos fãs dos quadrinhos - é a necessidade de o filme estabelecer Rebeca como uma heroína tradicional, que quer salvar sua irmãzinha e se vingar dos vilões pela maldade que cometeram com ela (e acaba encontrando uma amiga e um amor ao fazê-lo), ao invés de permitir que ela seja apenas uma mercenária em busca de ganhos como nos quadrinhos.

Além de ganhar o ódio do público e da crítica, o filme também ficaria mal dentre a equipe de produção. Talalay não gostou do resultado final, principalmente devido à interferência da MGM; Martin e Hewlett o consideraram "uma experiência ruim" e "um ponto baixo em suas carreiras"; Watts hoje diz se envergonhar de ter participado dele; e Petty chegou a declarar que talvez ele tenha prejudicado sua carreira - embora, anos mais tarde, ela tenha declarado ser feliz por ter interpretado a personagem. Os únicos que parecem ter verdadeiramente gostado de participar do filme foram Winston, que até hoje tem uma roupa completa de Saqueador (talvez a que tem o pênis) em exposição em sua casa; e McDowell, que já declarou em várias entrevistas ter se divertido muito durante as gravações, e já elogiou repetidas vezes Talalay e Petty - McDowell, aliás, foi sugerido para o papel por Astor, que não acreditou que ele realmente fosse aceitar; como uma forma de agradecimento, ele sugeriria que o filme trouxesse uma referência a Laranja Mecânica, mais famoso filme da carreira do ator, que Talalay criou ao vestir Rebeca com uma roupa semelhante à do personagem Alex DeLarge na cena em que ela fica de guarda durante a noite na base rebelde.

O filme ganharia uma versão em quadrinhos, escrita por Peter Milligan e com arte de Andy Pritchett, lançada pela Penguin no Reino Unido três dias antes da estreia. Graças ao fracasso, porém, essa versão jamais seria lançada nos Estados Unidos, embora tenha sido lançada na Alemanha, Escandinávia e Japão.

Durante a produção do filme, Hewlett decidiria criar mais um álbum de Tank Girl; Martin não se mostrou interessado, e o roteiro acabou ficando a cargo de Milligan. Chamado Tank Girl: The Odyssey, ele seria lançado no Reino Unido, pela Penguin, em maio de 1995, e nos Estados Unidos, pela DC, através de seu selo Vertigo, na forma de uma nova minissérie em quatro edições mensais, lançadas entre junho e outubro de 1995. Nessa história, Barney enlouquece de vez e mata todos os personagens, menos Tank Girl, que se vê envolvida em uma viagem ao além para trazê-los de volta.

Após o lançamento de The Odyssey, Hewlett se juntaria a Damon Albarn, o vocalista do Blur, de quem é amigo de longa data (os membros do Blur chegaram até a participar de uma das histórias de Tank Girl) no projeto Gorillaz, sendo responsável pela aparência dos "membros da banda". Martin decidiria voltar a ser músico, e participaria de várias bandas, sem nunca conseguir o sucesso.

Uma segunda minissérie em quatro edições seria lançada pela DC, mais uma vez através do selo Vertigo, entre novembro de 1995 e fevereiro de 1996, chamada Tank Girl: Apocalypse!. Com o afastamento dos criadores da personagem, entretanto, o roteiro ficaria a cargo de Alan Grant, amigo de ambos, e a arte com Pritchett, Bond e Phil Gascoine. Após descobrir que está grávida de Booga, Tank Girl é convidada para uma superfesta - durante a qual descobre que a mesma é armação de um culto que planeja detonar mais um apocalipse, sendo que esse destruirá o planeta de vez.

No início da década de 2000, ocorreria uma súbita renovação de interesse pela Tank Girl. A editora norte-americana Titan Books compraria os direitos de publicação da personagem na América e relançaria seus quatro álbuns, na forma como foram originalmente lançados pela Penguin, em 2002, além de um encadernado de capa dura de Apocalypse! em 2003. As vendas, entretanto, não sairiam como o esperado, e a personagem voltaria a ficar alguns anos desaparecida.

O retorno de Tank Girl ocorreria em 2007, quando Martin decidiria voltar a escrever histórias da personagem. Entre maio e agosto daquele ano, a editora norte-americana IDW lançaria uma minissérie em quatro edições, chamada Tank Girl: The Gifting. Ao invés de uma história completa ao longo de toda a minissérie, porém, cada uma das edições trazia entre quatro e seis histórias curtas estreladas por Tank Girl, com arte do australiano Ashley Wood. A IDW publicaria uma nova minissérie em quatro edições, Tank Girl: Visions of Booga, entre maio e setembro de 2008; com roteiro de Martin e arte de Rufus Dayglo, a minissérie contava como Tank Girl e Booga se conheceram, e mostrava sua primeira aventura juntos, ambientada seis anos antes do início da série publicada na Deadline.

Ainda em 2008, Martin decidiria escrever um romance estrelado por Tank Girl, Tank Girl: Armadillo and a Bushel of Other Stories, lançado pela Titan Books, com a capa contando com arte de Hewlett; esse seria o segundo romance estrelado por Tank Girl, com o primeiro tendo sido a novelização do filme, escrita por Martin Miller e lançada em 1996 apenas nos Estados Unidos pela Penguin Books. Também em 2008 seria lançado, pela Titan Books, The Cream of Tank Girl, livro que continha apenas ilustrações feitas por Hewlett para as histórias da personagem, muitas delas inéditas.

Após Visions of Booga, Martin e Dayglo decidiriam formar uma parceria para quinze novas histórias de Tank Girl, que seriam publicadas na Judge Dredd Megazine, da editora Rebellion, entre setembro de 2008 e maio de 2010. Doze dessas histórias seriam lançadas nos Estados Unidos pela Titan Books, acompanhadas de arte inédita e histórias em prosa, na forma de uma minissérie em quatro edições, chamada Tank Girl: Skidmarks, entre novembro de 2009 e fevereiro de 2010; as outras três, também com bônus, seriam lançadas em uma edição especial, chamada We Hate Tank Girl, em janeiro de 2011. Martin e Dayglo também trabalhariam juntos em uma nova minissérie lançada em quatro edições entre março e junho de 2010 pela IDW, chamada Tank Girl: The Royal Escape, na qual Tank Girl e seus amigos são encurralados em uma cidade hostil, e devem encontrar uma forma de escapar; e em Tank Girl: Bad Wind Rising, minissérie em quatro edições lançada entre janeiro e junho de 2011 pela Titan Books, na qual o romance entre Tank Girl e Booga pode chegar ao fim após um ato impensado da garota.

Depois disso, minisséries de Tank Girl seriam lançadas regularmente pela Titan Books, sempre com roteiros de Martin. Em Tank Girl: Carioca, em três edições lançadas entre outubro de 2011 e janeiro de 2012, com arte de Mike McMahon, Tank Girl planeja se vingar de um ex-ídolo, que a humilhou publicamente em um programa de TV. Everybody Loves Tank Girl, em três edições lançadas entre julho e outubro de 2012, com arte de Jim Mahfood, continha doze novas histórias curtas. E em Solid State Tank Girl, em quatro edições lançadas entre junho e outubro de 2013, com arte de Warwick Johnson-Cadwell, Tank Girl enfrenta sua pior inimiga, a Anti-Tank Girl. Além dessas minisséries, a Titan Books lançaria dois encadernados, The Hole of Tank Girl, de setembro de 2012, que continha os três álbuns originais da personagem mais material bônus, e The Power of Tank Girl, de setembro de 2014, que continha as minisséries The Gifting, Visions of Booga e The Royal Escape.

Em 2015, Hewlett decidiria aceitar um convite de Martin para voltar a desenhar a personagem, e Martin decidiria fazer uma espécie de reboot da Tank Girl, passando a ignorar as histórias anteriores ao escrever as novas. A primeira minissérie desse reboot seria 21st Century Tank Girl (a "Tank Girl do Século XXI"), lançada em três edições pela Titan Books entre julho e agosto de 2015. Além de histórias curtas, cada edição trazia arte inédita, tiras em quadrinhos, mini-pôsteres, e até poemas de autoria de Martin. Além de Hewlett, contribuíram com arte para essa minissérie Bond, Mahfood, Johnson-Cadwell, Jonathan Edwards e Brett Parson.

Depois do reboot, Martin e Parson iniciariam um projeto ambicioso, uma mega-história apresentada em uma trilogia de minisséries, na qual Tank Girl vai cruzar a Austrália para descobrir quem é a imitadora que está sujando seu bom nome. A primeira minissérie da trilogia, chamada Tank Girl: Two Girls, One Tank, foi lançada entre junho e agosto de 2016; a segunda, chamada Tank Girl: Gold, entre setembro de 2016 e março de 2017. Ambas têm quatro edições cada, e foram lançadas pela Titan Books.

A terceira e última minissérie, por enquanto, só tem uma edição lançada, em maio de 2017, e se chama World War Tank Girl, porque Tank Girl planeja, por qualquer motivo, usar uma tecnologia experimental de viagem no tempo para retornar até a época da Segunda Guerra Mundial e lutar contra o Terceiro Reich. Depois de tudo o que ela já aprontou, nem sei se isso é tão estranho assim.

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