Torchwood é mais uma criação de Russell T. Davies, responsável pela série nova do Doutor e também pela da Sarah Jane. Antes de começar a trabalhar em Doctor Who, ele começaria a planejar uma série voltada para o público adulto, que misturasse ficção científica e estilo policial, com o título provisório de Excalibur. Quando Davies foi convidado para trabalhar em Doctor Who, abandonou essa ideia, guardando o que já havia inventado até então.
No final de 2005, porém, Stuart Murphy, diretor do canal a cabo BBC Three, estava procurando uma série de ação voltada para o público adulto, pois tinha um horário vago à noite, quando elementos como sexo e drogas já podiam fazer parte da programação sem sofrer com a classificação indicativa. Murphy chegou a comentar sobre o assunto com Davies, que lhe ofereceu sua série, voltando a trabalhar nela.
Enquanto voltava a planejar a série, Davies teve uma ideia: durante as filmagens da primeira temporada da série nova de Doctor Who, a BBC havia criado um pseudônimo para a série, Torchwood, na verdade um anagrama de Doctor Who - se você reparar, as palavras "torchwood" e "doctorwho" usam as mesmas letras, mas arrumadas em ordem diferente - para que as filmagens pudessem acontecer sem a presença de curiosos, e informações sobre a série não vazassem para o público - para todos os efeitos, era Torchwood que estava sendo filmada, não Doctor Who. Davies havia adorado esse nome, primeiro por ser um anagrama, segundo porque, em sua opinião, ele se parecia mesmo com um nome de uma série, e não com uma palavra inventada apenas para despistar a mídia. Querendo aproveitar o nome, ele decidiu fazer de sua série um spin-off de Doctor Who, e incluiu, na segunda temporada, várias referências ao "Instituto Torchwood", para estabelecer um laço forte entre as duas séries antes que o spin-off estreasse.
No universo de Doctor Who, o Instituto Torchwood é uma organização mais ou menos ao estilo Men in Black, cujos integrantes estão cientes da existência de alienígenas e seres sobrenaturais. Sua principal missão é evitar a interferência desses seres na sociedade humana e vice-versa, resgatando tecnologia alienígena que tenha caído em mãos humanas, impedindo que alienígenas ou seres sobrenaturais desgarrados exponham sua existência ao mundo ou restaurando o estado anterior das coisas caso esta exposição já tenha ocorrido. Torchwood, a série, acompanha a equipe que atua na cidade de Cardiff, capital do País de Gales - estando posicionada diretamente sobre uma fenda temporal, Cardiff é extremamente sujeita a eventos bizarros, o que faz com que a equipe esteja sempre cheia de trabalho.
A equipe é composta pela pesquisadora Suzie Costello (Indira Varma), responsável por catalogar e descobrir como funciona a tecnologia alienígena reunida durante as missões; o médico Owen Harper (Burn Gorman), responsável não somente pela saúde da equipe, mas pela autópsia em criaturas encontradas pela equipe ou nas vítimas das mesmas; a gênio da computação Toshiko Sato (Naoko Mori), responsável por qualquer coisa que envolva computadores, como pesquisar o passado de uma vítima ou rastrear o paradeiro de uma criatura; Ianto Jones (Gareth David-Lloyd), o faz-tudo da equipe, que atua como recepcionista na agência de turismo que serve como fachada para o Instituto, reúne equipamentos que possam ser necessários às missões e limpa a bagunça depois que a equipe retorna; e o líder da equipe, Capitão Jack Harkness (John Barrowman), personagem que havia estreado na primeira temporada da série nova de Doctor Who, um trambiqueiro do Século LI cuja convivência com o Doutor e Rose fez com que ele se tornasse uma pessoa melhor, e um estranho evento, com que ele se tornasse imortal - a verdadeira origem e o passado de Jack são secretos para o restante da equipe, que muitas vezes não compreende por que ele toma determinadas decisões, ou por que justamente ele tem de ser o líder.
No primeiro episódio, as ações da equipe acabam chamando a atenção de uma jovem policial, Gwen Cooper (Eve Myles), que acaba, acidentalmente, envolvida em uma de suas missões. Jack acaba vendo alguma coisa nela que justifica que, após Suzie decidir deixar a equipe, ele escolha Gwen para o seu lugar. Ela atua, assim, não somente como o famoso personagem que faz a ligação entre a série e seus espectadores - como ela não conhece nada do Instituto Torchwood ou sobre a existência de alienígenas e seres sobrenaturais, conforme ela aprende os telespectadores aprendem junto com ela - mas também como o catalisador da mudança - Gwen tem um estilo de vida totalmente diferente dos demais membros, se recusando a abrir mão de sua vida pessoal em nome do serviço, principalmente porque tem um noivo, Rhys Williams (Kai Owens); isso faz com que sua posição e suas decisões nas missões muitas vezes conflitem com as dos demais membros, levando ou ela a reconsiderar suas escolhas ou eles a reavaliar sua conduta.
A primeira temporada de Torchwood estrearia na BBC Three no dia 22 de outubro de 2006, e teria um total de 13 episódios de 40 minutos cada. Como planejado por Murphy e Davies, a série seria muito mais adulta do que Doctor Who, explorando temas como homossexualidade e uso de drogas e não mascarando a violência - ainda assim, se comparada a séries norte-americanas também consideradas "para adultos", Torchwood é até inocente, sem nudez gratuita ou violência exacerbada; segundo Davies, eles estariam se comportando como adolescentes se incluíssem o sexo e a violência apenas para dizer que a série era adulta, opinião que eu acho que serve como uma cutucada para diversos produtores de séries dos Estados Unidos. Também vale citar como curiosidade que, apesar de ser um spin-off e de trazer muitos elementos de Doctor Who, a série, por decisão de Davies, não podia de forma alguma ser descrita como "Doctor Who para adultos", já que era desejo da BBC que ela tivesse uma identidade própria.
Seguindo os moldes de Doctor Who Confidential, a BBC produziu uma série de documentários em 14 episódios chamada Torchwood Declassified. O primeiro iria ao ar quatro dias antes da estreia da série, e explicaria quem são os personagens e qual é a missão do Instituto Torchwood; a partir daí, cada episódio iria ao ar imediatamente após o fim de cada episódio de Torchwood, trazendo elementos como cenas de por trás das câmeras e curiosidades da produção. Diferentemente de Doctor Who Confidential, cujos episódios tinham entre 30 e 40 minutos, cada episódio de Torchwood Declassified tinha apenas 10 minutos, e era usado como uma espécie de tapa-buraco entre o final do episódio e o início do programa seguinte.
A primeira temporada dividiu a crítica, com alguns considerando a série a melhor coisa já produzida pela BBC e outros dizendo que ela era fraca e apelativa. Dentre o público, porém, a série seria um imenso sucesso, se tornando uma das maiores audiências da BBC Three de todos os tempos. Curiosamente, esse sucesso todo não se reverteria plenamente em ganho para o canal, já que, ao dar a luz verde para uma segunda temporada, a BBC transferiria a série para o canal BBC Two, que conta com mais assinantes e é considerado "mais importante" que o BBC Three.
Também de forma curiosa, apesar de a série ser voltada para adultos e exibida tarde da noite, muitos de seus espectadores eram adolescentes ou até mesmo crianças. Ao saber disso, a BBC pediu para que a série sofresse uma pequena mudança: apesar de seus episódios ainda terem temática adulta, as cenas mais pesadas já não eram essenciais ao enredo central dos episódios que as incluíam. Isso permitiria que a BBC editasse os episódios, criando uma versão "própria para menores", que ia ao ar no dia seguinte e mais cedo.
A segunda temporada mais uma vez teria 13 episódios de 40 minutos cada, o primeiro estreando em 16 de janeiro de 2008, quase um ano após o final da temporada anterior - tempo gasto adequando a série a uma nova equipe de produção e aos novos padrões definidos pela emissora. Agora já sendo uma série de sucesso, e não apenas uma nova aposta da BBC, Torchwood atrairia muito mais atenção da crítica - e da comunidade artística, o que permitiu que vários atores famosos, como Alan Dale (de Lost) e Richard Briers (de The Good Life) aceitassem ou se oferecessem para participações especiais em seus episódios. Junto com a segunda temporada, Torchwood Declassified também retornaria, com mais 13 episódios de 10 minutos exibidos imediatamente após o fim de cada episódio de Torchwood.
Na segunda temporada a equipe continua a mesma, com Jack, Gwen, Owen, Toshiko e Ianto lidando com mais casos misteriosos envolvendo alienígenas e seres sobrenaturais. Rhys continuaria como personagem recorrente - inclusive finalmente se casando com Gwen em um dos episódios. Martha Jones (Freema Agyeman), personagem que, assim como Jack, estreou em Doctor Who, também participaria de três episódios seguidos como membro em treinamento do Instituto Torchwood.
O sucesso da segunda temporada foi ainda maior que o da primeira, o que fez com que a BBC "promovesse" a série mais uma vez, levando-a do BBC Two para seu canal principal, na TV aberta. Infelizmente, essa mudança ocorreria bem na época em que a BBC estava passando por dificuldades financeiras e reduzindo o orçamento de Doctor Who e As Aventuras de Sarah Jane.
A chegada de Torchwood ao canal, porém, estava sendo vista como uma coisa boa: a BBC tinha um "buraco" na sua programação de julho, quando tradicionalmente a audiência é mais baixa, e a inclusão de uma série de sucesso na grade poderia contribuir para que novos anunciantes se interessassem pelo horário, gerando mais receita para o canal. Devido a esse plano e à contenção de despesas, a BBC pediria a Davies que a terceira temporada de Torchwood tivesse apenas cinco episódios, o que também possibilitaria que ela fosse exibida de segunda a sexta, como uma minissérie, e não semanalmente. Esse plano desagradou imensamente a Barrowman, que chegou a declarar em uma entrevista que se sentia como se a série estivesse sendo punida, e não premiada, ao finalmente fazer sua estreia no canal principal da BBC.
Para reforçar a ideia de que era uma minissérie, a terceira temporada, exibida entre 6 e 10 de julho de 2009, teria um subtítulo, Torchwood: Children of Earth. Seus episódios seriam mais longos que os das temporadas anteriores, com por volta de 53 minutos cada; por causa disso, e também para não quebrar a continuidade - como uma boa minissérie, cada episódio era continuação direta do anterior - não foram produzidos novos episódios de Torchwood Declassified, exceto um especial de 30 minutos incluído quando a temporada foi lançada em DVD.
Children of Earth trouxe muitos personagens novos, que não permaneceram na série, servindo apenas aos propósitos de seu enredo, e uma importante mudança na equipe: Toshiko e Owen saíram no último episódio da segunda temporada, sendo substituídos por Rhys; além disso, Ianto também deixa a equipe, no quarto episódio da minissérie, reduzindo-a a três membros, Jack, Gwen e Rhys. Seu enredo envolve uma raça alienígena que planeja levar embora todas as crianças da Terra, e a equipe liderada por Jack descobrindo que isso faz parte de uma conspiração maior, encoberta há anos pelo governo. Ao tentar desmascarar a conspiração, a equipe se torna renegada, e precisa enfrentar não só os alienígenas, mas também seus próprios ex-chefes.
A minissérie teve índices de audiência tão expressivos que surpreenderam até mesmo Jay Hunt, o diretor do canal, que, após seu encerramento, decidiu telefonar para Davies e parabenizá-lo pessoalmente. A crítica também foi receptiva, elogiando a temporada e considerando-a melhor que as duas primeiras. Com tanto sucesso, a BBC desejava que uma quarta temporada começasse a ser produzida o mais rápido possível, mas ainda enfrentava sérios problemas financeiros. Hunt, então, decidiu repetir a tentativa feita com Doctor Who na década de 1990 e procurar um parceiro norte-americano para produzir a série.
A princípio, Hunt procuraria a Fox, mesmo canal que havia exibido o filme de Doctor Who. Devido à premissa da série e a seu desempenho junto à audiência, a Fox até se mostrou interessada, mas exigiu que a quarta temporada fosse um reboot, para que o público norte-americano não ficasse perdido em meio aos acontecimentos, algo que Davies considerou inaceitável, já que os eventos de Children of Earth deixariam excelentes condições para prosseguir com a história a partir de lá. Após o contato com a Fox não resultar em acordo, Hunt seria procurado por um executivo do canal a cabo Starz, que estava mesmo procurando uma nova série que pudesse elevar sua audiência. Não só o Starz aceitaria investir em Torchwood como também não faria nenhuma restrição criativa a Davies, impondo apenas uma única condição: que a nova temporada fosse filmada nos Estados Unidos e contasse com atores norte-americanos.
Com isso, a equipe ganharia dois novos membros, os agentes da CIA Rex Matheson (Mekhi Phifer) e Esther Drummond (Alexa Havins), que se unem a Jack, Gwen e Rhys para desvendar o mistério dessa temporada. Outros personagens de destaque são Oswald Danes (Bill Pullman), pedófilo que se torna celebridade ao se livrar da morte por injeção letal, e Jilly Kitzinger (Lauren Ambrose), sua relações-públicas. Dentre os atores famosos que fazem participações especiais estão C. Thomas Howell (de um monte de filmes dos anos 80), Wayne Knight (de Jurassic Park), Ernie Hudson (o Winston dos Caça-Fantasmas), Dillon Casey (o Noah de The Vampire Diaries), Dichen Lachman (a Sierra de Dollhouse), Nana Visitor (a Kira de Deep Space Nine) e John de Lancie (o Q de Jornada nas Estrelas: A Nova Geração).
A quarta temporada estrearia em 8 de julho de 2011 no Starz, e uma semana depois na BBC. Com 10 episódios de 45 minutos cada, ela também teria um subtítulo, Torchwood: Miracle Day, referência ao mistério que a equipe de Jack tem de desvendar: um belo dia, se descobre que ninguém mais na Terra pode morrer, o que acarretará em problemas sérios para a economia global e para a própria sustentabilidade da vida no planeta se não for revertido - o que gera, evidentemente, um dilema moral e uma discussão sobre a inevitabilidade da morte. Jack, Gwen e Rhys são levados para os Estados Unidos por Rex, logo após serem atacados por mercenários contratados pelo governo norte-americano, que acredita que a ex-equipe de Torchwood tem algo a ver com a imortalidade geral, e lá deve descobrir o que está acontecendo.
Como ocorreu com o filme de Doctor Who, Miracle Day teve uma audiência bombástica no Reino Unido, mas apenas mediana nos Estados Unidos. A crítica também ficou bastante dividida, com a britânica se rasgando em elogios e a norte-americana descrevendo a série como "decepcionante". A única preocupação comum de fãs e críticos foi o distanciamento que a série pareceu ter tomado de Doctor Who: até então, Torchwood era conhecida por sua continuidade interligada com Doctor Who, o que, embora não fizesse com que os eventos dos episódios de uma série fossem mencionados nos da outra, pelo menos estabelecia sem sombra de dúvida que ambas eram ambientadas no mesmo universo; os eventos de Miracle Day, entretanto, mudaram completamente o mundo, mas não fizeram nem sombra na sexta temporada da série nova do Doutor, que, teoricamente, tinha de estar ocorrendo simultaneamente.
No geral, a BBC considerou a quarta temporada um grande sucesso, e se mostrou favorável à produção e uma quinta. O desempenho da série nos Estados Unidos, porém, faria com que a Starz não se interessasse em continuar como parceira. Hunt ainda tentaria uma nova parceria, mas, em outubro de 2012, Davies declararia que, "por razões pessoais", a série estaria entrando em um hiato indefinido. No momento, ela segue "em espera", ainda não cancelada, mas sem expectativa de uma nova temporada tão cedo.
0 Comentários:
Postar um comentário