domingo, 12 de novembro de 2023

Escrito por em 12.11.23 com 0 comentários

Conan (II)

Desde que eu fiz o post para falar sobre os filmes do Homem-Aranha dirigidos por Sam Raimi eu penso em fazer um para falar dos filmes de Conan estrelados por Arnold Schwarzenegger - que eu até abordei no meu post sobre Conan, lá de 2008, mas sem muitos detalhes. Hoje será o dia em que eu vou transformar esse pensamento em realidade. Hoje, mais uma vez, é dia de Conan no átomo!

Na década de 1970, Conan era um herói de nicho. Suas aventuras escritas por Robert E. Howard eram publicadas em livros de formato brochura e papel barato, que não tinham destaque nas livrarias, e sua principal editora, a Lancer Books, pediria falência em 1973. A popularidade do personagem vinha principalmente dos quadrinhos da Marvel, que publicava duas revistas, Conan the Barbarian e The Savage Sword of Conan the Barbarian (a famosa A Espada Selvagem de Conan, no Brasil). O primeiro a pensar em fazer um filme do personagem seria o roteirista Edward Summer, que, em 1975, mostraria os quadrinhos da Marvel e algumas ilustrações de Frank Frazetta, responsável pelas mais famosas capas dos livros, para o produtor Edward Pressman, que decidiria aceitar o projeto. Pressman não conseguiria, entretanto, os direitos parta adaptar o personagem para o cinema, que pertenciam à falida Lancer Books, que os adquiriu do espólio de Howard em 1966.

Paralelamente à conversa entre Summer e Pressman, Glenn Lord, advogado do espólio de Howard e responsável pela preservação de todo o material do escritor - e que havia sido o responsável por negociar para que a Marvel tivesse os direitos de adaptar as histórias escritas por Howard para os quadrinhos - e L. Sprague de Camp, que passou a escrever as histórias de Conan após a morte de Howard, fundariam a Conan Properties Incorporated, que passaria a ser a detentora dos direitos autorais sobre todas as histórias do personagem e responsável por licenciar seus direitos para qualquer adaptação, mas, para que a empresa efetivamente se tornasse a dona desses direitos, precisavam de 100 mil dólares para solucionar a questão com a Lancer Books. Em 1977, graças ao sucesso de Star Wars, os estúdios de Hollywood passariam a procurar "aventuras heroicas ambientadas em terras de fantasia sobrenaturais", e, sentindo que conseguiria luz verde para um filme de Conan facilmente, Pressman concordaria em pagar os 100 mil se a Conan Properties lhe garantisse os direitos - pelos quais ele ainda pagaria 7.500 dólares.

Em 1978, o diretor John Milius, conhecido por fazer "filmes de macho", como Perseguidor Implacável e Magnum 44, ambos com Clint Eastwood, que já vinha pensando em fazer um filme ao estilo de Vikings, os Conquistadores, de 1958 com Kirk Douglas, ficaria sabendo do projeto para o filme de Conan e começaria a conversar com Pressman; diferenças criativas, entretanto, fariam com que ele não fosse contratado. O favorito de Pressman era Ridley Scott, que decidiria recusar o convite por ter acabado de filmar Alien: O Oitavo Passageiro, preferindo tirar férias. Pressman também tentaria contratar Frank Frazetta como "consultor visual", mas o artista não aceitaria; o produtor então contrataria Ron Cobb, que havia acabado de trabalhar em Alien, que faria alguns esboços de desenhos e pinturas antes de deixar a produção para trabalhar com Milius, que conseguiria convencer o produtor Dino de Laurentiis a financiar um filme de fantasia dirigido por ele, mas ainda sem nome ou roteiro.

Summer começaria a escrever o roteiro já em 1976, e chamaria para ajudá-lo Roy Thomas, roteirista de quadrinhos responsável pela revista Conan the Barbarian da Marvel. Summer e Thomas escreveriam um roteiro baseado na história Rogues in the House, de Howard, no qual Conan era contratado por um sacerdote suspeito para matar um feiticeiro supostamente maligno. Após assegurar os direitos, porém, Pressman conseguiria um contrato para a produção do filme com a Paramount Pictures, que exigiria um "roteirista de renome", contratando Oliver Stone. Stone descartaria o roteiro de Summer e Thomas e começaria um novo do zero, inspirado nas histórias Black Colossus e A Witch Shall Be Born, mas ambientado num futuro pós-apocalíptico, no qual Conan é contratado por uma Princesa para defender seu reino da invasão de dez mil mutantes. Na época, Stone estava lutando contra o vício em cocaína e antidepressivos, e Milius chamaria o roteiro de "um delírio febril inspirado pelas drogas, mas muito bom".

Além de bizarro e pouco parecido com uma história de Conan dos livros, o roteiro de Stone resultaria em um filme de quase quatro horas de duração que custaria 40 milhões de dólares, cifra absurda para a época - Star Wars custou 11 milhões - o que fez a Paramount desistir. Para manter o filme em pré-produção, Pressman pagaria a equipe do próprio bolso, recorrendo inclusive a um empréstimo bancário. Cobb, então, contaria a Milius que Conan estava sem diretor e sem estúdio, e o diretor procuraria Pressman para uma nova conversa; seu plano era convencer Pressman e de Laurentiis a serem co-produtores do filme de Conan, com ele como diretor - com a condição de que ele pudesse fazer modificações no roteiro para deixar o filme mais curto e mais barato. As negociações se arrastariam durante um ano, ao fim do qual ficaria acertado que de Laurentiis pagaria o empréstimo de Pressman e financiaria integralmente o filme, mas seria seu único produtor, enquanto Pressman abriria mão de qualquer receita gerada pelo filme, mas teria direito de veto quanto a mudanças no roteiro e precisaria aprovar qualquer escolha para o elenco. Milius seria confirmado como diretor, e Cobb como designer de produção, em 1979, mesmo ano no qual de Laurentiis conseguiria um contrato de distribuição com a Universal, que separaria um orçamento de 30 milhões de dólares, sendo 18 para a produção e 12 para a divulgação do filme.

Quando Summer e Pressman ainda estava negociando os direitos, eles começariam a pensar no elenco. Para o papel de Conan, os preferidos eram astros do cinema de ação da época, como Charles Bronson e William Smith, com o então estreante Sylvester Stallone e o ex-jogador de rugby Jethro correndo por fora. Mas, em 1976, os dois estariam em uma sessão fechada de O Homem dos Músculos de Aço, documentário sobre o mundo do fisiculturismo, e se impressionariam com os músculos e o carisma de Arnold Schwarzenegger. Pressman abordaria o então aspirante a ator após a sessão, e Schwarzenegger, que nunca tinha ouvido falar de Conan, se diria convencido por "sua abordagem discreta e sua força interior". Schwarzenegger seria contratado na mesma semana, receberia 250 mil dólares de adiantamento, e assinaria um contrato que o proibia de participar de outros filmes de fantasia enquanto Conan não estreasse nos cinemas; em entrevistas, ele diria estar confiante de que o filme seria seu passaporte de entrada para as grandes produções de Hollywood.

Quando de Laurentiis assumiu o projeto, entretanto, Schwarzenegger quase foi demitido. Segundo o ator, ele foi chamado para uma conversa com o produtor, e, assim que deu bom dia, de Laurentiis respondeu que ele não servia para o papel porque tinha sotaque, ao que Schwarzenegger respondeu "e daí? Você também tem". Furioso, de Laurentiis expulsou Schwarzenegger de sua sala, e exigiu que outro ator fosse contratado; foi Pressman quem fincou o pé, lembrou o produtor da cláusula contratual segundo a qual ele deveria aprovar mudanças no elenco, e bancou Schwarzenegger. Milius, de início, não tinha problemas com o ator - que, assim que chegou caracterizado ao set de filmagem, impressionou aos jornalistas por sua semelhança com os desenhos de Frazetta - mas achava que Conan tinha de ser mais atlético, o que obrigou Schwarzenegger a fazer uma dieta para ficar "menos fisiculturista" durante as gravações, perdendo 14 kg de massa muscular.

Além de Schwarzenegger, dois outros atores do elenco principal eram iniciantes: Gerry Lopez, que interpreta o ladrão e arqueiro Subotai, era campeão de surfe, e estava em seu segundo filme, sendo que, no primeiro, Os Três Amigos, dirigido por Milius, interpretou ele mesmo; Schwarzenegger e Lopez moraram juntos por um mês antes das gravações, para ensaiar suas falas e criarem um vínculo que tornasse a amizade de Conan e Subotai factível. Já Sandahl Bergman, intérprete de Valéria, era dançarina, e havia participado como parte do corpo de baile de várias produções do cinema e teatro, sendo recomendada por Bob Fosse, que dirigiu All That Jazz: O Show Deve Continuar. Lopez e Bergman seriam escolhidos pessoalmente por Milius, que alegaria que sua escolha levou em conta mais sua aparência e personalidade do que seu desempenho nos testes. Por "não conseguir manter uma constância no tom de voz", Lopez acabaria tendo suas falas dubladas pelo ator de teatro Sab Shimono; Schwarzenegger, mesmo com seu sotaque, não seria dublado por ninguém.

Dois grandes nomes do elenco, James Earl Jones e Max Von Sydow, seriam convidados sem precisar de testes, segundo Milius, para que eles inspirassem Schwarzenegger, Lopez e Bergman. Jones, que interpretaria o vilão Thulsa Doom, estava em no elenco de A Lesson to Aloes, em cartaz na Broadway, e sua agenda de gravações teve de ser montada para que não coincidisse com as apresentações; ele também se impressionaria com o carisma de Schwarzenegger, e decidiria dar ao novato dicas de interpretação e conselhos sobre como dizer suas falas. Já Von Sydow teria um papel pequeno, o do Rei Osric, que envia Conan para salvar sua filha do culto liderado por Doom.

Outro ator famoso do elenco, convidado diretamente por Milius, era Mako, que atua como narrador e interpreta o feiticeiro Akiro. Sean Connery e John Huston chegariam a ser cogitados por Milius para participações especiais, mas o diretor acabaria ficando com medo de estourar o orçamento. William Smith, que chegou a ser cogitado para o papel de Conan, acabaria interpretando o pai do cimério no começo do filme, com sua mãe sendo interpretada pela atriz alemã Nadiuska, e o Conan criança por Jorge Sanz, hoje considerado um dos mais proeminentes atores do cinema espanhol, mas que na época das filmagens tinha 11 anos. Os dois capangas de Doom, Throgrim e Rexor, seriam "interpretados" pelo fisiculturista dinamarquês Sven-Ole Thorsen e pelo ex-jogador de futebol americano Ben Davidson; a bruxa que tenta seduzir Conan ficaria com Cassandra Gava; e a Princesa Yasimina, a quem Conan precisa resgatar, seria a francesa Valérie Quennessen.

Como era de se esperar para uma produção da época, os personagens não são lá tão fiéis às suas versões originais dos livros. A maior crítica feita ao Conan do filme é que o dos livros não aceita de forma alguma perder sua liberdade e a busca de todas as formas quando preso ou escravizado, enquanto o do filme se resigna a ser escravo por uma boa parte de sua vida; críticos literários apontariam que o Conan do filme é "menos poderoso, menos falante e menos culto" que o dos livros. A Valéria do filme não é uma representação da Valéria dos livros, mas um amálgama dela com a pirata Bêlit, primeiro grande amor de Conan; a Valéria do filme também serve para suprir o arquétipo da "boa amazona", popular em filmes da fantasia da época: uma mulher guerreira, forte e independente, mas ainda assim submissa a um homem, normalmente por meio do amor. Já Thulsa Doom era um amálgama do vilão de mesmo nome, que não era das histórias de Conan, mas de outro dos personagens de Howard, o Rei Kull, com o feiticeiro Thoth-Amon; críticos de cinema da época comparariam o vilão ao líder religioso norte-americano Jim Jones, que levaria todos os seus seguidores ao suicídio - também é interessante notar que, nos livros, a idolatria a Set, que no filme é um culto marginalizado liderado por Doom, é uma religião aceita e estabelecida, a principal no reino da Stygia. O personagem Subotai não existe nos livros, e foi criado para suprir outro arquétipo popular, o do "parceiro do herói", alguém menos poderoso, mas mais atrevido e mais engraçado, que acompanha o personagem principal em suas aventuras; Milius daria a ele o mesmo nome do principal general de Gengis Khan.

O filme começa na Ciméria, terra natal de Conan, que, quando criança, vê seu vilarejo ser massacrado pelas tropas de Doom. Escravizado e levado para trabalhar em um moinho, Conan se torna um adulto musculoso, e é selecionado para se tornar gladiador; após fugir, ele decide viajar o mundo em busca de Doom para se vingar, sobrevivendo como ladrão, o que o leva a conhecer Subotai e Valéria. Presos após um roubo ousado, os três recebem uma proposta do Rei Osric, que pede para que salvem sua filha, a Princesa Yasmina, das garras de Doom. Subotai e Valéria recusam, mas Conan, ainda querendo sua vingança, parte sozinho para confrontar o vilão, quase morrendo em sua primeira investida. Seus colegas, então, decidem salvá-lo, levá-lo até Akiro, para restabelecer sua saúde, e acompanhá-lo em uma nova tentativa.

As filmagens começariam em outubro de 1980 na Inglaterra, por uma cena que deveria ser a abertura do filme, mas, por insistência de de Laurentiis, acabou se tornando a final; essa cena contaria com uma narração de Schwarzenegger das Crônicas Nemédias de Howard - que também são a introdução das histórias em quadrinhos da Marvel - mas de Laurentiis implicou tanto com o sotaque de Schwarzenegger que ela acabou ficando apenas com o texto exibido na tela - Milius chegaria a contratar o técnico vocal Robert Easton para ensinar Schwarzenegger a falar sem sotaque, mas ele não conseguiu. Após a filmagem dessa cena, a produção deveria seguir para a Iugoslávia, mas o turbilhão político causado pela morte do presidente Josip Broz Tito faria com que eles mudassem de ideia e fossem filmar no interior da Espanha; a mudança consumiria várias semanas, e as filmagens só poderiam começar em janeiro de 1981. A maioria dos cenários foi construída em estúdio, com as mais notáveis exceções sendo a vila ciméria, construída próxima à cidade de Segóvia, usando neve artificial; a cena da Roda da Dor, filmada em Ávila; e o encontro com a bruxa, filmada em Cuenca. A maioria das cenas externas seriam filmadas em Almería, que conta com desertos, praias e montanhas, além de construções ao estilo romano e mouro, que puderam ser adaptadas para passar por vários cenários diferentes.

A única grande estrutura construída para o filme seria o Templo de Set; Milius não queria gastar dinheiro construindo estruturas que só apareceriam por algumas cenas, e achava que usar pinturas, como era o comum na época, faria com que o filme parecesse falso, então a equipe de produção usaria miniaturas e efeitos de ilusão de ótica - colocando as miniaturas mais próximas da câmera do que os atores, para parecer que elas eram maiores que eles. Um total de oito miniaturas foram construídas por Emilio Ruiz, a maior delas a da cidade de Shadizar, que tinha 11 m2. Cobb, por sua vez, optaria por não usar a inspiração greco-romana que era comum em filmes da fantasia na época, decidindo mesclar elementos da Idade Média, do Império Mongol e dos Vikings; o resultado desagradaria os críticos, que diriam que a ambientação do filme não se pareceria com a Era Hiboriana de Howard, e sim com o que conhecemos da Idade do Bronze.

Os atrasos nas filmagens permitiriam que a equipe usasse o minijib, uma câmera controlada por controle remoto presa a um pequeno guindaste, criada pelo técnico de efeitos especiais Nick Adler quando ele trabalhou em O Dragão e o Feiticeiro, de 1981. Para aumentar as multidões sem usar extras, seriam usados manequins criados por Colin Arthur, que trabalhou no famoso Museu de Cera de Madame Tussaud, também responsável por fazer as partes decepadas de corpos humanos. Uma das cenas mais impressionantes, a da decapitação da mãe de Conan, contava com um modelo da cabeça da atriz Nadiuska, capaz de espirrar sangue e de mover os olhos, boca e língua através de cabos escondidos na neve. Para a cena em que Conan luta contra uma cobra gigante, foram criados três modelos, um que se movia usando cabos de aço e amortecedores hidráulicos, um estático, e um cuja cabeça era removível para a cena da morte. O abutre que Conan mata com uma dentada também era falso, feito de borracha com penas de abutres reais; os demais abutres da cena, porém, eram de verdade. De verdade também eram os cachorros, com um deles atacando Schwarzenegger e o ferindo com uma dentada, e os camelos, que tinham o mau hábito de sair correndo durante as cenas. Devido a três cenas envolvendo animais - uma na qual um cachorro é chutado, uma na qual um camelo leva um soco, e uma na qual um cavalo tropeça - a American Humane Association colocaria o filme em sua lista de "inaceitável devido a maus tratos com animais", se recusando a fornecer aquele selo de que "nenhum animal foi maltratado durante as filmagens".

Uma das cenas mais comentadas do filme seria a transformação de Thulsa Doom em cobra, que combinaria uma tomada de Jones totalmente imóvel, cobras reais e de mentira, miniaturas, uma estrutura de alumínio coberta com cera e "outros truques de câmera" para que a transformação ocorresse sem cortes perceptíveis. As espadas empunhadas por Schwarzenegger e Bergman tinham duas versões, uma mais pesada e elaborada, para closes, e uma mais leve e com menos detalhes, para as lutas; a espada usada por Bergman nas cenas de luta era feita de fibra de carbono e papel alumínio. Schwarzenegger, Bergman e Lopez receberam treinamento intensivo em uso de espadas e artes marciais, e cada cena de luta era ensaiada no mínimo 15 vezes antes da filmagem. Schwarzenegger tinha o hábito de ficar praticando sozinho por horas após as filmagens se encerrarem, e fez quase todas as suas cenas sem precisar de dublês - o que foi bem-vindo, porque a produção não conseguiu encontrar um dublê tão grande quanto ele. E uma coisa que não faltou no filme foi sangue, sendo usado sangue de animais dentro de sacos presos ao corpo dos atores, que se rompiam e o espalhavam quando atingido; Adler também criaria espadas especiais com um reservatório dentro, que espirravam sangue pela lâmina quando um botão no cabo era pressionado. Curiosamente, ao mesmo tempo em que os críticos reclamavam que o filme tinha sangue demais, alguns fãs protestaram que as batalhas do filme não era tão sangrentas quanto as descrições e ilustrações das histórias de Howard.

Por exigência de Milius, os efeitos especiais do filme foram reduzidos ao mínimo possível, com a maioria deles sendo apenas de embelezamento, como o brilho da armadura de Valéria. A cena na qual Subotai e Valéria enfrentam fantasmas foi criada combinando filmagens com animação; originalmente, a cena foi criada com efeitos especiais da Industrial Light & Magic, mas de Laurentiis achou que ela havia ficado muito parecida com a dos fantasmas de Caçadores da Arca Perdida, e teve medo de ser acusado de plágio. A empresa Visual Concepts Engineering, então, desenhou os fantasmas em células de animação e os combinou com as filmagens usando uma lente velha e gasta, para criar reflexos propositais e parecer que os fantasmas foram filmados junto com os atores. O resultado final ficou tão realístico que nem de Laurentiis acreditou que fosse animação.

Apesar do extenso envolvimento de de Laurentiis na produção, oficialmente ele não foi produtor do filme, delegando essa função a sua filha, Raffaella - Buzz Feitshans, parceiro de longa data de Milius, também seria co-produtor. Seria Raffaella quem escolheria o artista italiano Renato Casaro para fazer o cartaz do filme, claramente inspirado nas ilustrações de Frazetta, mas que trazia Conan e Valéria com as feições de Schwarzenegger e Bergman. Curiosamente, o cartaz seria alvo de muitas críticas, por ser "sexy demais para um filme de ação", pela tanga de Conan se parecer com uma sunga e por Valéria estar em uma "pose impossível" - havia uma lenda, inclusive, de que Casaro teria feito originalmente a tanga de Valéria ainda menor, e a aumentado por exigência dos executivos da Universal, mas os rascunhos mostram que ele sempre planejou fazê-la daquele tamanho.

Milius planejava que o filme, chamado Conan the Barbarian (Conan, o Bárbaro, no Brasil), estreasse nos Estados Unidos no Natal de 1981, mas os executivos da Universal, preocupados com a quantidade de violência no filme, pediram uma nova edição, que removeu closes da cabeça decepada da mãe de Conan, uma cena na qual Conan decepa o braço de um ladrão que tenta roubá-lo e outros atos de violência cometidos principalmente pelos cultistas de Doom, o que faria com que a versão final do filme tivesse 126 minutos nos Estados Unidos e 129 no restante do mundo - contra 140 da versão que teria estreado no Natal. A primeira exibição do filme nos cinemas seria em 19 de fevereiro de 1982, mas em apenas uma sala, em Houston, Texas; outras cidades teriam suas estreias ao longo das semanas seguintes, até que o filme fosse lançado nacionalmente, em 1400 salas, em 14 de maio. As filas para assistir seriam imensas, causariam engarrafamentos, e muitos cinemas teriam de dispensar espectadores por já estarem com a lotação máxima. A bilheteria total jamais seria divulgada pela Universal, mas estimativas falam entre 69 e 79 milhões de dólares, números de um grande sucesso para a época. A crítica ficaria extremamente dividida, com uma leve tendência para o negativo, com o filme sendo considerado "alienado" e "estúpido" - embora muitas dessas críticas possam ser creditadas ao excesso de violência, malvista no cinema da época. Também é interessante citar que Bergman ganharia um Globo de Ouro de Melhor Atriz Nova.

O sucesso nas bilheterias faria com que de Laurentiis se interessasse por financiar uma continuação, mais uma vez produzida por sua filha Raffaella. Ela entraria em contato com Milius, que diria não estar interessado em dirigi-la, e com os roteiristas da Marvel Roy Thomas e Gerry Conway, que escreveriam uma versão preliminar do roteiro. Após a recusa de Milius, de Laurentiis sugeriria à filha o diretor veterano Richard Fleischer, que já havia trabalhado em dois de seus filmes, Barrabás e Mandingo, e que curiosamente também havia dirigido Vikings, os Conquistadores, que fez apenas uma exigência: a de que o filme fosse menos violento e tivesse mais humor que o primeiro. Fleischer também decidiria não usar o roteiro de Thomas e Conway (que, entretanto, receberiam crédito como criadores da história), com o canadense Stanley Mann sendo contratado para reescrevê-lo. Mann manteria os personagens e a ideia central da história, mas mudaria todo o resto.

No segundo filme, que tem o nome de Conan the Destroyer (Conan, o Destruidor, no Brasil), Conan (Schwarzenegger) e seu parceiro, o ladrão Malak (Tracey Walter), são contratados para uma missão por Taramis, Rainha de Shadizar (Sarah Douglas), que promete que vai ressuscitar Valéria (ops, spoiler) se ele recuperar a joia conhecida como Coração de Ahriman, e escoltar sua sobrinha, a Princesa Jehnna (Olivia d'Abo), que é virgem, pré-requisito para poder tocar na joia, até o templo do deus Dagoth, onde ela será recolocada em seu lugar. Conan e Malak são acompanhados pelo capitão da guarda de Taramis, Bombaata (Wilt Chamberlain), que, sem que eles saibam, tem ordem de matá-los assim que Jehnna estiver com a joia. Como a joia está no castelo do poderoso feiticeiro Toth-Amon (Pat Roach), Conan decide pedir ajuda a Akiro (Mako), que foi capturado por uma tribo de canibais; ao resgatá-lo, eles acabam libertando também a guerreira Zula (a cantora Grace Jones), que decide acompanhá-los como agradecimento.

Além de Schwarzenegger e Mako, o único ator a estar nos dois filmes é Sven-Ole Thorsen, que interpreta outro personagem, o guerreiro Togra, e, para que não fosse reconhecido, usou elmo em todas as suas aparições; o astro da luta livre André the Giant também faz uma participação, sem receber créditos, como o avatar de Dagoth. Também é interessante notar que os personagens têm nomes iguais ou parecidos com os dos quadrinhos, mas características totalmente diferentes: Jenna, por exemplo, nos quadrinhos é uma ladra que tem um breve romance com Conan, enquanto Zula realmente é um guerreiro negro que decide acompanhar Conan após ser salvo de uma tribo rival, mas é homem - segundo Thomas, como o nome termina com a letra A, Mann pode ter imaginado que se tratava de uma mulher. Já Toth-Amon, que nos quadrinhos é o arqui-inimigo de Conan, tem uma participação pequena e pouco importante, sendo derrotado com facilidade; ele é interpretado no filme por outro astro da luta livre, Pat Roach, que também interpretou o mecânico nazista fortão que luta contra Indiana Jones em Caçadores da Arca Perdida.

Assim como ocorreu com o primeiro filme, várias cenas tiveram de ser cortadas a pedido da Universal, mas, dessa vez, não por causa de violência, e sim por conteúdo sexual - aparentemente, Fleischer não queria fazer um filme violento, mas não tinha problemas quanto a um filme sexy. Curiosamente, todas essas cenas envolviam Taramis, para caracterizá-la como uma devassa, e incluíam uma cena de sexo entre Taramis e Conan, Taramis seduzindo uma estátua, dando um tapa em Bombaata e agindo excitada depois, e sacrificando uma virgem para que Jehnna fosse a escolhida para recuperar a joia. Durante a gravação de uma cena na qual um camelo cai e se levanta, o animal não conseguia se levantar sozinho de forma alguma, e foram usados cabos de aço para colocá-lo de pé; ao fim da cena, Schwarzenegger pede desculpas ao camelo, o que Fleischer achou que combinava com a personalidade de Conan e decidiu manter no filme - essa cena acabaria cortada da versão exibida no Reino Unido por crueldade com animais, mas as desculpas de Conan seriam mantidas, ficando um pouco fora de propósito.

Conan the Destroyer seria o primeiro filme de d'Abo, na época com 14 anos, que se tornaria bastante famosa nos anos seguintes ao interpretar Karen Arnold na série Anos Incríveis, e de Chamberlain, ex-jogador de basquete dos Harlem Globetrotters e da NBA, de 2,16 m de altura, que não agradaria e não faria mais nenhum. Já Grace Jones estava em seu quinto filme, e no ano seguinte seria escalada para interpretar a Bond girl May Day em 007 na Mira dos Assassinos. Durante a seleção de elenco, o papel de Malak ficaria com David Lander, que começaria as filmagens mas não conseguiria seguir, devido a complicações causadas por sua esclerose múltipla, sendo substituído por Walter; Lander ainda conseguiria ter uma longa carreira como ator e dublador, e faleceria apenas em 2020, aos 73 anos.

Filmado integralmente na Cidade do México e arredores, a um custo de 18 milhões de dólares, o filme estrearia em 29 de junho de 1984 dividindo a crítica, que elogiaria principalmente a atuação de Grace Jones e o consideraria mais leve que o anterior, mas reclamaria do roteiro fraco e das atuações dos demais integrantes do elenco, inclusive Schwarzenegger, que, na opinião dos críticos, parecia pouco à vontade com o tom mais cômico do filme. A bilheteria total mais uma vez não seria divulgada, mas seria calculada entre 26,4 e 31 milhões de dólares, um sucesso moderado.

Pouco após Conan the Destroyer, Schwarzenegger ainda faria um terceiro filme de fantasia com de Laurentiis, no qual ele inicialmente interpretaria Conan, mas cujo roteiro seria alterado e seu papel acabaria sendo o de um bárbaro genérico. Esse filme, no Brasil, se chama Guerreiros do Fogo, mas originalmente, tem o nome de sua protagonista, Red Sonja, personagem criada por Thomas para os quadrinhos de Conan, inspirada em uma personagem criada por Howard para uma história que não era de fantasia medieval, mas uma ficção histórica ambientada no século XVI. A personagem se tornaria extremamente popular, de uma coadjuvante das histórias de Conan passaria a protagonista de sua própria revista, e, devido a suas origens e por obra da intrincada legislação de direitos autorais dos Estados Unidos, seus direitos também passaram a pertencer à Conan Properties.

A produção de um filme estrelando Sonja começaria em 1983, quando, após o sucesso de Conan the Barbarian, a MGM negociaria os direitos de adaptação com a Conan Properties, contratando o diretor Ralph Bakshi e o roteirista Clive Exton para o projeto. Dificuldades na produção causariam um atraso de um ano, durante o qual Conan the Destroyer seria lançado, e Bakshi desistiria. A MGM, então, recorreria a Dino de Laurentiis para que ele tentasse fazer a coisa andar; o produtor sugeriria Fleischer para a direção e George MacDonald Fraser para escrever o roteiro; Fraser aproveitaria muito da história de Exton, mas teria de fazer uma mudança fundamental: originalmente, nos quadrinhos, Sonja se encontrava com Conan, e os dois formavam uma dupla para cumprir a missão da ruiva; apesar de Schwarzenegger ter aceitado o papel, a Conan Properties não liberaria o personagem, que Fraser alteraria para "Lorde Kalidor", com uma participação muito menor que Conan teria.

No filme, após o irmão de Sonja rejeitar os avanços sexuais da perversa Rainha Gedren (Sandahl Bergman), a monarca decide assassinar não somente ele, mas toda a sua família. Apesar de sofrer violências indizíveis, Sonja (Brigitte Nielsen) sobrevive, e recebe a visita de um espírito que lhe confere magicamente habilidades de luta para que ela se vingue, com a condição de que ela jamais se entregue romanticamente a um homem que não a tenha derrotado em um combate justo. Algum tempo depois, as forças de Gedren, comandadas por seu assistente, Ikol (Ronald Lacey), atacam um templo onde a irmã de Sonja, Varna (Janet Agren), serve como sacerdotisa, e roubam um talismã que só pode ser manuseado por mulheres, mas que pode trazer o fim do mundo. Varna consegue escapar, e acaba se encontrando com Kalidor (Schwarzenegger), que promete que a ajudará a encontrar Sonja. Ao saber da história, Sonja decide confrontar Gedren para recuperar o talismã e obter sua vingança; Kalidor se oferece para acompanhá-la, mas ela recusa. No caminho, ela também encontra o mimado Príncipe Tarn (Ernie Reyes, Jr.), seu guarda-costas, Falkon (Paul L. Smith), e o guerreiro Lorde Brytag (Pat Roach), que a subestimam por ser mulher e se arrependem amargamente, mas, assim como Conan no primeiro filme, sua primeira tentativa de confrontar Gedren vai para o vinagre, e ela acaba sendo salva por Kalidor e aceitando sua ajuda para uma segunda.

Bergman seria a primeira escolha de de Laurentiis para o papel de Sonja, mas, temendo que a personagem ficasse muito parecida com Valéria, ela pediria para interpretar a vilã Gedren. De Laurentiis, então, conversaria com a canadense Laurene Landon, que ele acreditava ter o tipo físico ideal para o papel, mas desistiria após descobrir que ela já havia protagonizado um filme italiano muitíssimo parecido chamado Hundra, de 1983. Durante um bom tempo, o papel seria de Eileen Davidson, até que, oito semanas antes do início da filmagem, de Laurentiis veria Brigitte Nielsen na capa de uma revista de moda e ficaria impressionado com sua forma física. Nascida na Dinamarca, Nielsen, de 21 anos e 1,83 m de altura, trabalhava como modelo, e estava em Milão para uma sessão de fotos; como Red Sonja seria filmado na Itália, no Gran Sasso e nos arredores de Roma, de Laurentiis viajaria até lá e a convenceria a aceitar o papel, que abriria portas para que ela atuasse em filmes de grande sucesso como Um Tira da Pesada 2 e Rocky IV, quase estrelasse uma série da Mulher-Hulk, e se casasse com Sylvester Stallone - embora o casamento só tenha durado dois anos, entre 1985 e 1987.

Além de Bergman, que interpretaria Valéria em Conan the Barbarian e Gedren em Red Sonja, Roach também estaria em dois dos filmes, interpretando Toth-Amon em Conan the Destroyer e Brytag em Red Sonja, mas, além de Schwarzenegger, somente um outro ator estaria em todos os três: sim, ele, Sven-Ole Thorsen, que faria um dos dois guarda-costas de Brytag, sem nome no roteiro. Mais uma vez, apesar de seu extenso envolvimento com a produção, de Laurentiis delegaria a função de produtor, dessa vez para Christian Ferry. Graças a uma mexida de pauzinhos da MGM, a trilha sonora seria assinada pelo famosíssimo compositor italiano Enio Morricone; a dos dois filmes de Conan havia ficado a cargo de Basil Poledouris, indicado por Milius, que era virtualmente um desconhecido antes de Conan the Barbarian, mas conseguiu diversos trabalhos, principalmente em filmes de ação como Robocop e A Caçada ao Outubro Vermelho, depois de Conan the Destroyer.

Red Sonja estrearia nos cinemas em 3 de julho de 1985, e seria um gigantesco fracasso: com orçamento de 17,9 milhões de dólares, renderia apenas 6,9 milhões. Os críticos o considerariam sem graça, arrastado e com sérios problemas de elenco, e até Schwarzenegger, durante um bom tempo, o consideraria o pior filme de sua carreira. Os críticos também achariam curioso que Schwarzenegger, como um chamariz, receberia top billing - seu nome no cartaz e nos créditos vinha antes do de Nielsen - mesmo participando de menos da metade do filme.

Mesmo com o fracasso de Red Sonja, Raffaella de Laurenttis ainda planejava fazer um terceiro filme de Conan, chamado Conan the Conqueror, com lançamento previsto para 1987, e chegaria a conversar com os diretores Guy Hamilton e John Guillermin, e a encomendar um roteiro de Charles Edward Pogue. Schawrzenegger, porém, estava comprometido com as gravações de Predador e já seria um ator de mais sucesso, mais caro, o que faria com que Dino de Laurentiis não quisesse negociar um novo contrato com ele. Raffaella não desistiria do filme, entretanto, e consideraria chamar outro ator para substituir Schwarzenegger; por motivos vários, ela levaria dez anos trabalhando nesse projeto, até finalmente contratar Kevin Sorbo, então famoso graças à série Hércules. Sorbo, contudo, se diria desconfortável por ter que interpretar Conan, o que faria com que a equipe de produção mudasse o personagem para o Rei Kull, também criado por Howard, mantendo a mesma história. Com direção de John Nicolella e chamado Kull the Conqueror (Kull, o Conquistador, no Brasil), o filme estrearia em 29 de agosto de 1997, e seria um grande fracasso; Pogue se diria extremamente decepcionado com o filme, e alegaria que os executivos da Universal mexeriam no roteiro até que ele ficasse irreconhecível.

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