Ghidorah, The Three-Headed Monster
1964
Em 1956, a Toho lançou o filme Rodan, no qual um monstro alado de mesmo nome ataca uma cidade no sul do Japão após ser despertado por mineiros de um sono de milhões de anos. Rodan foi o primeiro filme de monstros da Toho a ser filmado em cores, também foi dirigido por Ishiro Honda, teve efeitos especiais de Eiji Tsuburaya e fez um relativo sucesso. Após Godzilla enfrentar Mothra, portanto, Rodan era a escolha óbvia para o filme seguinte.
Filme seguinte que seria produzido a toque de caixa: após o sucesso de Mothra vs. Godzilla junto à crítica, a Toho quis aproveitar o bom momento, e pediu a Honda e ao roteirista Shinichi Sekizawa que preparassem um novo filme de Godzilla para ser lançado ainda naquele ano.
O roteiro original de Sekizawa seguia a fórmula óbvia: Rodan despertava e atacava o Japão mais uma vez, ao mesmo tempo em que Godzilla retornava também para um novo ataque. Com dois monstros na mesma região, ambos acabariam se enfrentando. A Toho, entretanto, achou essa história muito parecida com a de Godzilla Contra-Ataca, e, já desde King Kong vs. Godzilla vinha pensando em uma nova fórmula: a de que Godzilla seria um herói, protegendo o Japão contra o ataque de monstros inimigos, ao invés de simplesmente lutar com eles porque ambos resolveram por acaso atacar a mesma cidade ao mesmo tempo.
Diante disso, Sekizawa reescreveria o roteiro criando um novo vilão, o monstro King Ghidorah, que tinha três cabeças, dois rabos e lançava raios elétricos pela boca. Ele não quis retirar Rodan do filme, porém, e decidiu que tanto Godzilla quanto Rodan enfrentariam Ghidorah. E aí, talvez pensando "por que não?", resolveu colocar Mothra no filme também, criando uma espécie de sentai de monstros.
Lançado em 20 de dezembro de 1964 com o título de San Daikaiju: Chikyuu Saidai no Kessen ("Três Monstros Gigantes: A Maior Batalha da Terra"), o filme começa com uma chuva de meteoritos, que atinge o Japão ao mesmo tempo em que um avião trazendo a Princesa Selina Salno (Akiko Wakabayashi), da nação de Segina, é destruído em pleno voo por uma bomba plantada por terroristas. O Professor Miura (Hiroshi Koizumi) parte com uma equipe para investigar os meteoritos, enquanto o Detetive Shindo (Yosuke Natsuki) e sua irmã, a jornalista Naoko (Yuriko Hoshi), recebem a visita da Princesa, que, para enganar os que planejavam atentar contra sua vida, não estava no avião. O responsável por tentar matar a Princesa é ninguém menos que seu próprio tio (Shin Otomo), que, ao saber que ela está viva, envia um assassino, chamado Malness (Hisaya Ito) para matá-la.
A Princesa faz ao detetive uma revelação bombástica: ela está possuída pelo espírito de uma habitante do planeta Vênus, e veio a nosso planeta para nos alertar de um evento cataclísmico - o ataque de um monstro conhecido como King Ghidorah, que destruiu toda a civilização de Vênus. Shindo acha que a Princesa está maluca, e até a leva a um psicólogo, mas todas as suas previsões se concretizam: primeiro, ela prevê uma erupção do Monte Aso, que acordará Rodan. Depois, ela prevê que Godzilla surgirá do mar e atacará um navio. Finalmente, enquanto a Princesa está no psicólogo, o meteoro que está sendo estudado pelo Professor Miura se revela um ovo, choca, e de lá de dentro sai ninguém menos que King Ghidorah.
Diante da ameaça tripla, o governo do Japão pede às Shobijin (Emi e Yumi Ito) que chamem Mothra. Como Mothra é uma mariposa esperta, ao invés de tentar deter os três monstros sozinha, ela decide convencer Godzilla e Rodan a se unir a ela para destruir Ghidorah - afinal, os três são nativos da Terra, enquanto Ghidorah é um invasor alienígena.
Além de ser retratado pela primeira vez como herói, Godzilla pela primeira vez teve a mesma aparência em dois filmes, já que a roupa usada por Nakajima nesse filme é a mesma que ele usou no anterior. Rodan, interpretado por Masaki Shinohara, ganhou uma nova roupa, mais colorida e mais leve que a usada pelo mesmo ator no filme original de 1956. Mas a maior atração do filme é mesmo Ghidorah, cuja roupa é vestida por Shoichi Hirose (que já tinha interpretado Kong). No roteiro original, tudo o que Sekizawa descrevia de Ghidorah era que ele tinha "três cabeças, dois rabos, e voz parecida com a de um sino". Partindo desse conceito, Tsuburaya produziria uma das roupas mais memoráveis do cinema japonês, tanto que longos debates aconteceram entre os fãs para tentar descobrir onde estava Hirose dentro da roupa. Uma curiosidade sobre Ghidorah é que, apesar de ele ter a mesma aparência desde sua concepção original, sua cor seria alterada: a cor dourada vista no filme foi sugestão de Honda; o modelo original era roxo com asas multicoloridas como as de uma borboleta.
O filme foi mais uma vez um grande sucesso de crítica, e é hoje considerado pelos fãs como um dos melhores da série. Isso ajudaria a cimentar de vez a ideia de que Godzilla deveria ser o herói, e não o vilão de seus filmes; aproveitando, a Toho faria de Ghidorah seu arqui-inimigo, apresentando-o como vilão em vários dos filmes subsequentes.
Godzilla vs. Ghidrah também teve uma versão norte-americana, lançada em setembro de 1965 pela Continental; dessa vez, porém, nenhuma cena nova foi gravada, apenas algumas cenas foram removidas, outras foram trocadas de ordem ou levemente modificadas, e a trilha sonora substituída por músicas ocidentais. Mais uma vez, a maior curiosidade ficaria por conta do título: em inglês, o filme se chama Ghidrah, The Three-Headed Monster - e, enquanto Ghidorah é sempre referenciado em japonês por seu nome completo (King Ghidorah), na versão em inglês ele é sempre chamado apenas de Ghidrah. A mudança no nome se deu para que ele ficasse mais parecido com "hidra", em uma referência ao fato de que Ghidorah tem três cabeças. De qualquer forma, foi a grafia norte-americana, e não a japonesa, que acabou sendo utilizada para o nome do filme no Brasil.
Invasion of Astro-Monster
1965
Com o sucesso das versões norte-americanas dos filmes de Godzilla, a Toho seria procurada por um estúdio dos Estados Unidos, a United Productions of America (UPA, criadora, dentre outros, do desenho do Mr. Magoo), que lhe ofereceria uma proposta de parceria: a UPA investiria dinheiro no filme, que, em contrapartida, contaria com um ator norte-americano no elenco, já pensado para agradar às plateias da América quando a versão da UPA fosse produzida.
A Toho aceitou o acordo, e pôs Sekizawa para escrever um novo roteiro. A princípio, Sekizawa pensou em mais um filme no estilo do anterior, com Godzilla, Rodan e Mothra se unindo para combater um monstro malvado. Depois, devido a problemas orçamentários, Mothra seria cortada do filme, e a Toho decidiria reaproveitar King Ghidorah como vilão. Ao invés de simplesmente fazer um novo ataque de Ghidorah, Sekizawa aproveitaria para criar uma trama fantástica, envolvendo invasores alienígenas e viagens no espaço, criando o primeiro filme de Godzilla com elementos da ficção científica clássica - que voltariam a ser explorados em ocasiões posteriores.
O filme começa com a passagem do Planeta X, que possui uma órbita errática, pelo nosso sistema solar. Japão e Estados Unidos decidem se unir para criar um foguete tripulado por dois astronautas, o japonês Fuji (Akira Takarada) e o norte-americano Glenn (Nick Adams), que viajará até o Planeta X, então "escondido" atrás de Júpiter, para explorá-lo. Lá eles descobrem que o planeta é povoado por uma raça conhecida como Xians, e que está sendo atacado por King Ghidorah - a quem os Xians chamam de Monstro Zero. Os Xians abrigam os astronautas durante o ataque, e pedem por ajuda: sabendo que Ghidorah já atacou a Terra, e foi detido por Godzilla e Rodan, eles pedem para que esses monstros sejam levados para seu planeta a fim de deter mais uma vez a ameaça; em troca, eles darão aos terráqueos um medicamento capaz de curar todas as formas de câncer. Fuji e Glenn retornam para a Terra satisfeitos por terem encontrado uma civilização amistosa e disposta a compartilhar um bem tão precioso - mas provavelmente sem a menor ideia de como transportarão dois monstros gigantes através do espaço.
Enquanto os astronautas e as autoridades lidam com esse dilema, o líder dos Xians (Yoshio Tsuchiya) aparece de surpresa na Terra, e diz ter vindo, justamente, capturar Godzilla e Rodan - o que deixa Fuji e Glenn desconfiados de suas intenções. Com os monstros capturados, o Xian retorna a seu planeta natal acompanhado de Fuji, Glenn e do cientista Dr. Sakurai (Jun Tazaki), que chegam bem no momento de mais um ataque de Ghidorah. Godzilla e Rodan são libertados e vencem a batalha, e os três terráqueos voltam para a Terra felizes não somente por terem ajudado, mas também porque agora Godzilla e Rodan estão no Planeta X, e não representam mais risco para a Terra.
Infelizmente, pouco depois do retorno dos astronautas, as verdadeiras intenções dos Xians se revelam: ou a Terra se rende ao Planeta X, que subjugará toda a sua população, ou eles usarão um dispositivo de controle mental - que já estavam usando em Ghidorah - para fazer com que Godzilla, Rodan e Ghidorah realizem múltiplos ataques que devastarão todo o planeta. Ah, sim, e o medicamento era falso. Enquanto os três monstros destroem o Japão, as autoridades lutam para descobrir uma forma de interromper o controle mental que os Xians têm sobre os monstros.
Com o título original de Kaiju Daisenso ("a grande guerra dos monstros"), o filme seria lançado no Japão em 19 de dezembro de 1965, e faria um sucesso moderado. Além de ser o primeiro filme de Godzilla a trazer elementos de ficção científica clássica, esse também seria o primeiro a reaproveitar cenas de outro filme da Toho - no caso, cenas de Rodan, usadas durante o ataque de Rodan ao Japão. Também seria o primeiro e único filme de Godzilla a ter uma cena de beijo, entre Nick Adams e a atriz japonesa Kumi Mizuno, que interpreta a principal personagem feminina da história, a misteriosa Namikawa.
Como Godzilla agora era um herói, a equipe de efeitos especiais criou mais uma roupa nova para Haruo Nakajima, com olhos maiores e mais expressivos, feições menos ameaçadoras e placas menores nas costas. Essa também era a roupa que dava maior mobilidade ao ator, o que era necessário para uma cena completamente dispensável: após vencer King Ghidorah no Planeta X, Godzilla faz uma "dança da vitória". Essa cena geraria uma espécie de precursor do meme no Japão, com várias publicações trazendo ilustrações e fotomontagens de Godzilla dançando ao lado dos demais atores do filme e de outras celebridades.
Durante as gravações, Adams disse todas as suas falas em inglês, para que não precisasse redublá-las para a versão norte-americana. Na versão japonesa, ele seria dublado por Goro Naya, enquanto na versão norte-americana Akira Takarada seria dublado por Marvin Miller. Aliás, diferentemente de Godzilla: King of the Monsters!, que manteve muitas das falas em japonês, a versão norte-americana, que se chama Monster Zero e foi lançada em 29 de julho de 1970, é totalmente dublada em inglês. Essa versão também possui uma nova trilha sonora e algumas cenas a menos - todas de pouca importância, como Godzilla destrunido casas, discos voadores voando e os Xians falando em sua língua nativa sem legendas.
Godzilla contra o Monstro Zero também seria o primeiro filme da série a ter uma "versão internacional", produzida pela própria Toho para lançamento na Europa e Ásia. Essa versão é idêntica à japonesa (assim como todas as versões internacionais dos demais filmes da Toho), mas tem diálogos dublados em inglês, para facilitar a tradução para outros idiomas e a exibição em países onde uma das línguas oficiais já é o inglês, como Reino Unido e Índia. Nesse caso, a dublagem em inglês foi a mesma da versão norte-americana, ponto previsto no contrato entre a Toho e a UPA.
Ebirah, Horror of the Deep
1966
Lançado em 17 de dezembro de 1966 com o título original de Gojira, Ebira, Mosura: Nankai no Daikettou ("Godzilla, Ebirah, Mothra: O Grande Duelo dos Mares do Sul"), esse filme tem um enredo bastante curioso: após o barco no qual trabalhava seu irmão, Yata (Tooru Ibuki), desaparecer misteriosamente no mar, o jovem Ryota (Tooru Watanabe) rouba um barco para encontrá-lo, ajudado por dois amigos (Choutarou Tougin e Hideo Sunazuka) e um ladrão de bancos em fuga (Akira Takarada). No meio das buscas, eles topam com o monstro gigante Ebirah (cuja roupa é vestida por Yu Sekida), que se parece com uma enorme lagosta. Após o ataque de Ebirah, o barco é destruído, e os quatro vão parar nas praias de uma ilha que não existe em nenhum mapa.
Logo os quatro descobrem que a ilha se chama Ilha do Diabo, e que é a base de operações da organização terrorista Bambu Vermelho, que a usa para fabricar água pesada que será usada em seus ataques. Os terroristas, liderados por um homem conhecido apenas como Comandante (Jun Tazaki), também descobriram, acidentalmente, um composto químico capaz de controlar Ebirah, e usam o monstro para evitar que a ilha seja descoberta. Como Ryota e seus amigos os descobriram, agora deverão passar o resto da vida trabalhando para a organização como escravos.
Durante sua estadia forçada, Ryota faz amizade com uma bela jovem, Dayo (Kumi Mizuno), e descobre que o Bambu Vermelho também escravizou vários nativos da Ilha Infante, que tentam, sem sucesso, mandar uma mensagem para que Mothra venha salvá-los. Ryota e Dayo decidem, então, agir em conjunto para escapar e fazer com que a moça leve a tal mensagem, mas, no meio de sua fuga, topam com ninguém menos que Godzilla dormindo em uma encosta. Ryota, então, decide acordar Godzilla (coisa que, apenas para ficar registrado, eu nunca faria) e colocá-lo para brigar com Ebirah, criando uma distração que possibilitará aos escravos da ilha escaparem.
Esse foi o primeiro de vários filmes de Godzilla nos quais a ação se passa em uma ilha misteriosa fora do mapa ao invés de em alguma cidade japonesa. Esse fato e o enredo curioso possuem uma explicação simples: originalmente, esse não seria um filme de Godzilla, mas de King Kong.
Desde o imenso sucesso de King Kong vs. Godzilla que a Toho negociava com os detentores dos direitos de Kong para poder usar o macaco em um novo filme, mas sempre sem sucesso. Enquanto negociava, a Toho pediu para que Sekizawa escrevesse um roteiro, para tentar convencer os executivos norte-americanos de que o filme era viável. Como as negociações se arrastavam, não havia nenhuma previsão de que os direitos fossem ser cedidos, e 1966 ainda não tinha nenhum filme de Godzilla previsto, o produtor Tonoyuki Tanaka decidiria reaproveitar esse roteiro, substituindo Kong por Godzilla, e a Ilha da Caveira, lar do gorila, onde o Bambu Vermelho montaria sua base de operações, por uma nova ilha chamada Ilha do Diabo. Curiosamente, Tanaka não faria esforço nenhum nessa substituição, o que resultaria em Godzilla, digamos, se comportando estranhamente - tirando uma soneca na encosta da ilha, "se apaixonando" por Dayo, lançando pedras para atacar ao invés de usar sua baforada radioativa, e agindo como se não reconhecesse Mothra, mesmo já tendo lutado contra ela e a seu lado em ocasiões anteriores.
Godzilla contra o Monstro do Mar seria o primeiro filme da série desde Godzilla Contra-Ataca a não ser dirigido por Honda, que já estava trabalhando em outro projeto, The War of the Gargantuas. Para substituí-lo, Tanaka escolheria Jun Fukuda, que, antes disso, só havia dirigido filmes policiais ou de comédia. Os efeitos especiais ficariam a cargo de Sadamasa Arikawa, supervisionado por Tsuburaya, que achava estar trabalhando muito e decidira delegar parte de seu trabalho a seus assistentes. Godzilla, mais uma vez, seria interpretado por Nakajima, que vestiria a mesma roupa usada no filme anterior.
O filme seria lançado nos Estados Unidos em 1967 com o título de Godzilla vs. The Sea Monster. Mais uma vez, o filme seria dublado e editado, ganhando uma nova sequência de abertura, uma nova trilha sonora e perdendo várias cenas, que fariam com que ele fosse quatro minutos mais curto. Essa seria a primeira vez, porém, na qual um filme de Godzilla não seria exibido nos cinemas norte-americanos, já que os responsáveis pela versão, a Walter Reade Organization, decidiriam negociá-lo para exibição direta na televisão. Assim como o anterior, esse filme também ganharia uma versão internacional da Toho, exibida na Europa e Ásia.
Para terminar, vale dizer que, se tivesse esperado mais um pouquinho, a Toho poderia ter usado esse roteiro em um filme de King Kong, já que, pouco depois do lançamento de Godzilla contra o Monstro do Mar, fecharia um acordo com a Rankin/Bass que levaria à produção de King Kong 2, lançado em 1967.
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