quarta-feira, 16 de abril de 2008

Escrito por em 16.4.08 com 0 comentários

Veruca Salt

Houve uma época em que a Mtv prestava. Antes de quem faz a programação decidir que o canal seria quase que integralmente dedicado a atrações de gosto duvidoso destinadas ao público jovem, a Mtv era apenas o que seu próprio nome sugere: um canal de música. Evidentemente, não como os canais de música das TVs por assinatura digitais, que ficam mostrando uma tela preta enquanto tocam música; a Mtv era um canal de clipes. Da hora em que entrava no ar até a hora que saía, eram mostrados os mais variados clipes, entremeados por um ou outro comercial, e apresentados por um ou outro VJ à frente de um chroma key e agitando os braços como se tivesse complexo de helicóptero. Bons tempos.

Apesar de apresentar clipes o dia inteiro, a Mtv nem sempre os fazia de modo aleatório, já que alguns de seus programas eram temáticos. Assim, tínhamos um programa dedicado ao heavy metal, outro dedicado ao hip hop, e até um dedicado a clássicos do rock. O meu preferido ia ao ar de madrugada, e atendia pelo nome de Lado B. Dedicado às chamadas bandas "alternativas", foi através dele que conheci muitas bandas que ou entraram na minha lista de preferidas ou não o fizeram por pouco, como Curve, Placebo, The Rentals, Superchunk, Seahorses, e o tema do post de hoje, Veruca Salt.



Eu só tenho dois discos da Veruca Salt, e, na minha opinião, infelizmente só um deles, Eight Arms to Hold You, presta. Por outro lado, é um disco que eu absolutamente adoro, e que só não fez buraco porque o material do qual são feitos os CDs é bastante resistente. Foi este que eu comprei primeiro, e que acabou me levando a comprar mais um, American Thighs, do qual eu infelizmente não gostei tanto assim. Ainda assim, eu gosto tanto de Eight Arms to Hold You que não tenho nenhuma dificuldade em listar a banda dentre minhas favoritas, mesmo não tendo acompanhado seus lançamentos há mais de dez anos.

Isso porque, embora ainda exista, a Veruca Salt teve uma existência bastante atribulada, e hoje praticamente já não tem nada a ver com o que era quando lançou o disco que eu tanto gosto. A banda foi formada em 1992 na cidade de Chicago, quando as vocalistas e guitarristas Nina Gordon (a loura) e Louise Post (a morena) foram apresentadas por uma amiga em comum, a atriz Lili Taylor (da série A Sete Palmos). Como ambas já tinham a idéia de formar sua própria banda, decidiram fazer uma espécie de "banda em condomínio": ambas comporiam separadamente e cada uma cantaria suas próprias músicas, com a outra atuando como backing vocal; nas raras ocasiões em que compusessem juntas, ambas cantariam juntas. O que poderia parecer uma fórmula maluca acabou foi dando muito certo, já que os críticos viam na harmonia entre Gordon e Post a maior força da Veruca Salt. Como nenhuma banda é composta apenas de duas vocalistas/guitarristas, após um ano e meio compondo elas escalaram o irmão de Nina, Jim Shapiro, para a bateria, e seu amigo Steve Lack para o baixo. O nome da banda veio de uma das personagens do filme A Fantástica Fábrica de Chocolate, a menina riquinha que acha que pode comprar tudo o que quiser.

Com um monte de canções, todos os instrumentos necessários ao rock and roll e um bom nome, a banda começou a se apresentar em festivais locais. Nem dez shows eles tinham feito quando chamaram a atenção do produtor Jim Powers, da gravadora independente Minty Fresh, que lhes ofereceu um contrato. Como este é o sonho de qualquer banda iniciante, Gordon e Post imediatamente aceitaram, e, em 1994, saía o primeiro single da Veruca Salt, o da música Seether.

Seether fez um enorme sucesso, se tornando uma das músicas mais tocadas nas rádios alternativas de Chicago, o que rendeu à banda um convite para abrir os shows do Hole, banda de Courtney Love, viúva de Kurt Cobain. Enquanto excursionava com o Hole, a banda gravou seu primeiro álbum, American Thighs, lançado ainda em 1994. Também graças aos shows do Hole, a Veruca Salt acabou chamando a atenção de David Geffen, dono de uma das mais famosas gravadoras dos Estados Unidos. American Thighs fez tanto sucesso que ganhou um Disco de Ouro; os críticos, porém, foram bem menos receptivos que os fãs, fazendo poucas resenhas favoráveis, e acusando a banda de ser pouco mais que uma cópia mal-feita de outras que faziam sucesso na época.

Felizmente, poucos parecem ter dado ouvidos a estes críticos, já que a popularidade da banda não parava de crescer, com Seether se tornando um sucesso também na Mtv americana. Sentindo o interesse de Geffen pela banda, a Minty Fresh tentou segurá-los o máximo possível, inclusive lançando um EP de dez minutos e três músicas, chamado Victrola, em 1995. As investidas de David Geffen eram fortes, porém, e ainda naquele ano a Veruca Salt assinava com o sonho de todas as bandas de rock da época. Para evitar complicações por quebra de contrato, a Geffen concordaria que a Minty Fresh lançasse mais um EP, Blow It Out Your Ass, It's Veruca Salt!, em 1996.

Enquanto EPs eram lançados e contratos assinados, Gordon e Post trabalhavam nas músicas que fariam parte do segundo álbum da banda, Eight Arms to Hold You, lançado em 1997. Embora tivesse um som bem mais "pesado" que seu antecessor, EAtHY foi o ponto alto da carreira da banda, recebendo um bom número de críticas favoráveis e rendendo mais um Disco de Ouro. Duas faixas, Volcano Girls e Shutterbug, foram tocadas à exaustão nas rádios e na Mtv, e a primeira até se tornou uma espécie de cartão de apresentação da banda. Alegando motivos pessoais, pouco após o lançamento de EAtHY Shapiro deixou a banda, sendo substituído por Stacy Jones, ex-baterista da banda Letters to Cleo. No auge do sucesso, a Vercua Salt, infelizmente, começaria a desmoronar.

Em 1998, foi a vez de Nina Gordon, alegando querer seguir carreira solo, deixar a banda, o que causou um enorme desentendimento entre ela e Post. A saída de Gordon acabou resultando até mesmo na não-renovação do contrato com a Geffen, mas Post não se deixou abater: contratou três músicos novos, o guitarrista Stephen Fitzpatrick, a baixista Suzanne Sokol e o bateirista Jimmy Madla, e prosseguiu fazendo shows, sendo ela agora a única vocalista e compositora da Veruca Salt. Somente no ano seguinte a banda conseguiria um novo contrato, desta vez com a bem menor Beyond Records. O terceiro álbum, Resolver, só seria lançado no ano 2000, coincidentemente quase simultaneamente com Tonight and the Rest of My Life, o primeiro trabalho solo de Nina Gordon, lançado pela Outpost Records. Para felicidade de Post, Resolver foi muito bem recebido, com críticas favoráveis e boa vendagem, embora nem tenha chegado perto dos números alcançados na época em que Post e Gordon trabalhavam juntas.

Mas a banda parecia sofrer de uma espécie de maldição que afastava seus membros após cada lançamento, já que, pouco tempo após Resolver ir para as lojas, Sokol abandonou a banda, sendo substituída por Gina Crosley, amiga de longa data de Post. Com esta nova formação, em 2001 a Veruca Salt partiu para uma turnê no Reino Unido, e lá acabou chamando a atenção de uma gravadora australiana, a Embryo Records. Como o contrato com a Beyond já estava perto do fim, a Embryo conseguiu um acordo para lançar Resolver e o single Born Entertainer na Austrália, o que ocorreu em 2002. O sucesso foi tanto que a banda fez uma turnê pela Austrália, tocando em alguns shows junto com Placebo e Coldplay, e acabou lançando em 2003 mais um EP pela Embryo, com o curioso nome de Officially Dead.

Após quase um ano de turnê pela Terra dos Cangurus, a Veruca Salt retornou aos Estados Unidos para mais um show, onde apresentou algumas músicas inéditas, e mais uma mudança de formação: saíam Crosley e Madla, entravam o baixista Solomon Snyder e o baterista Michael Miley. Esta formação só duraria até a gravação de mais um EP, Lords of Sound and Lesser Things, de 2005. Mais uma vez sem gravadora, a banda optou por produzir este EP de seu próprio bolso, vendendo-o em seus shows e através de seu website. Ao sair em turnê para divulgar suas novas músicas, a formação da banda contava com Post, Fitzpatrick, a baixista Nicole Fiorentino - substituída em alguns shows por Mareea Patterson - e a baterista Kellii Scott - substituída em alguns shows por Zach Ingraham. De qualquer forma, foi a formação Post, Fitzpatrick, Fiorentino e Scott que entrou no estúdio para gravar IV, quarto e mais recente álbum de sua conturbada carreira, lançado em 2006 pela gravadora independente Sympathy For The Record Industry.

Após o lançamento de IV, a banda saiu em uma nova turnê, que dura até hoje, interrompida apenas para a gravação de um cover de Burned, de Neil Young, para um álbum beneficente em favor da prevenção do câncer de mama. Post e Fitzpatrick parecem ser mesmo os únicos membros fixos, já que em alguns shows Fiorentino é substituída por Eva Gardner, e em outros Scott o é por Toby Lang. Post e Gordon praticamente não se falam mais, e a carreira solo da segunda não está muito melhor que a de sua antiga banda, já que Gordon teve até mesmo um disco cancelado antes de seu lançamento em 2004, e apenas em 2006 conseguiu gravar um novo álbum, Bleeding Heart Grafitti, pela Warner Bros.

Talvez Veruca Salt seja um bom exemplo de como uma briga entre amigos pode destruir completamente um projeto. Eu não sei qual foi o motivo que levou Post e Gordon a se separarem, mas garanto que se a Veruca Salt tivesse seguido com suas duas vocalistas faria mais sucesso que ambas estão fazendo agora separadas. De qualquer forma, EAtHY fica como legado, e como amostra de como a carreira da banda poderia ter sido.

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