sábado, 30 de agosto de 2025

Escrito por em 30.8.25 com 0 comentários

A Muralha

Como eu disse aqui recentemente, em 2020 eu fiz uma série sobre novelas, que não foi planejada, no sentido de que eu não escolhi antecipadamente sobre quais novelas eu iria falar a cada mês, as escolhendo quando estava na hora de escrever cada post. Mas eu me lembro que, em determinado momento, eu cogitei falar sobre A Muralha e A Casa das Sete Mulheres, que não foram novelas, mas minisséries, marcando os posts na categoria Novelas mesmo assim. Não me lembro bem o porquê de eu ter desistido, provavelmente eu lembrei de novelas sobre as quais eu gostaria mais de falar do que dessas minisséries, mas o fato é que, como eu não falei mais sobre novelas, também não cogitei mais falar sobre as minisséries.

Quando eu estava escrevendo o post sobre Pantanal, entretanto, eu me lembrei desse fato, e achei que seria legal se, no próximo espaço disponível - ou seja, na primeira semana em que eu não tivesse um assunto escolhido com antecedência - eu realmente fizesse um post sobre A Muralha, uma minissérie que eu adorei, mesmo que realmente o colocasse na categoria Novelas. Pois bem, como vocês devem estar imaginando, o primeiro espaço disponível desde que eu tive essa ideia caiu no dia de hoje, que é dia de A Muralha no átomo!

No início da década de 1980, a Globo passaria a produzir minisséries, que seriam exibidas na faixa das 22h, substituindo séries e filmes norte-americanos que costumavam ocupar o horário, visando não somente economia, já que as taxas de licenciamento e os gastos com dublagem desses importados crescia a cada ano, mas também uma maior produção de material nacional que pudesse reverter em lucro e notoriedade para a emissora. As minisséries se diferenciariam das novelas não somente por terem bem menos capítulos - algumas têm apenas 4 ou 5, a maioria tem entre 20 e 30, enquanto uma novela pode ter mais de 200 - mas também por serem obras fechadas: uma novela vai sendo escrita e filmada enquanto seus capítulos estão indo ao ar, não sendo incomum que mudanças sejam feitas na história ou até mesmo no elenco no decorrer da exibição, motivadas por aceitação ou rejeição do público, ou aumento ou declínio dos índices de audiência; uma minissérie, por outro lado, já tem seu roteiro pronto quando as filmagens começam, e normalmente só vai ao ar depois que todos os episódios já foram filmados.

A primeira minissérie produzida pela Globo seria Lampião e Maria Bonita, de Aguinaldo Silva e Doc Comparato, estrelada por Nelson Xavier e Tânia Alves, com 8 capítulos exibidos entre 26 de abril e 5 de maio de 1982. Um grande sucesso de audiência e vencedora da medalha de ouro no Festival Internacional de Cinema e Televisão de Nova York, Lampião e Maria Bonita seria a primeira de três minisséries que a emissora havia programado para aquele ano, com Avenida Paulista, de Daniel Más e Leilah Assumpção, com 17 capítulos, estreando em 10 de maio, e Quem Ama Não Mata, de Euclydes Marinho, com 20 capítulos, estreando em 12 de julho, ambas também tendo boa audiência. Graças a elas, a produção de minisséries nos anos 1980 seria profícua, com uma média de três a cinco delas sendo exibidas por ano, dentre elas os grandes sucessos Rabo de Saia (1984), O Tempo e o Vento, Tenda dos Milagres, Grande Sertão: Veredas (as três de 1985) e Anos Dourados (1986). Como se pode notar, nem todas eram textos originais, com algumas sendo adaptações para a TV de clássicos da literatura brasileira.

A década de 1990 subiria ainda mais a barra: como as minisséries de sucesso eram mais facilmente vendidas para o exterior que as novelas, principalmente por terem menos capítulos, a Globo decidiria caprichar ainda mais em sua produção, com as minisséries dessa década, na qual as novelas ainda eram um produto, digamos, artesanal, não devendo em nada a grandes produções internacionais. Se destacam na década de 1990 as minisséries Desejo, Riacho Doce (ambas de 1990), O Sorriso do Lagarto (1991), As Noivas de Copacabana, Anos Rebeldes (ambas de 1992), Agosto (1993), Engraçadinha: Seus Amores e Seus Pecados (1995), Guerra de Canudos (1997), Dona Flor e Seus Dois Maridos, Hilda Furacão (ambas de 1998) e Chiquinha Gonzaga (1999). Algumas das minisséries da década de 1990 também eram quase "mininovelas", já que tinham bem mais capítulos que o normal para esse tipo de produção - Hilda Furacão teve 32, Chiquinha Gonzaga, 38, Riacho Doce, 40, e a mais longa da década foi O Sorriso do Lagarto, com 52.

Aqui chegamos no ponto que interessa, já que Chiquinha Gonzaga, exibida entre 12 de janeiro e 19 de março de 1999, inauguraria uma espécie de "faixa fixa de minisséries", entre janeiro e março, no que eram consideradas as "férias" da programação da Globo - desde meados da década de 1980, a faixa das 22h já não era majoritariamente ocupada por importados, e sim por programas produzidos pela própria Globo, a maioria deles humorísticos, que, entre janeiro e março, não eram exibidos, para que seus atores e equipes de produção não precisassem trabalhar 12 meses por ano. A Muralha, sobre a qual eu prometo que vou começar a falar daqui a pouco, seria a segunda a ocupar essa faixa, em 2000; nos anos seguintes, teríamos Os Maias (2001), O Quinto dos Infernos (2002), A Casa das Sete Mulheres (2003), Um Só Coração (2004), Mad Maria (2005), JK (2006) e Amazônia, de Galvez a Chico Mendes (2007). Como precisavam ficar no ar por três meses, essas minisséries também eram mais longas que o normal, tendo em torno de 50 capítulos cada; e é importante salientar que sua produção não implicava que outras minisséries também não fossem produzidas com outros destaques da década sendo Presença de Anita (2001, 16 capítulos), Hoje é Dia de Maria (2005, 8 capítulos), A Pedra do Reino (2007, 5 capítulos) e Aquarela do Brasil, que teve nada menos que 60 capítulos, sendo a mais longa minissérie da história e ocupando quase todo o segundo semestre de 2000, quando foi exibida entre 22 de agosto e 1 de dezembro.

Em 2001, com a estreia do programa Big Brother Brasil na faixa das 22h, as minisséries seriam definitivamente movidas para uma faixa ainda mais tarde, a das 23h, já ocupada por algumas minisséries que estrearam entre abril e dezembro em anos anteriores. Em 2008, com o grande sucesso do BBB e um declínio na audiência das minisséries de janeiro-março, a Globo reformularia a faixa, com Queridos Amigos tendo apenas 25 capítulos e sendo exibida entre 18 de fevereiro e 28 de março; essa seria a última minissérie produzida especificamente para ocupar as férias da programação, encargo que recairia somente sobre o BBB nos anos seguintes, com a minissérie de 2009, Maysa: Quando Fala o Coração, tendo apenas 9 capítulos, exibidos entre 5 e 16 de janeiro. Desde então, a Globo produz minisséries de forma esparsa, sempre as levando ao ar na faixa das 23h, podendo ser citadas como destaques Som & Fúria (2009), O Canto da Sereia (2013), e Justiça (2016). Desde 2011, também é comum a Globo pegar um filme do qual foi co-produtora e dividi-lo em 4 episódios, exibindo-o como uma minissérie, como, por exemplo, Chico Xavier (2011), Xingu (2012), O Tempo e o Vento (2013), Tim Maia: Vale o que Vier (2015), Elis - Viver é Melhor que Sonhar (2019) e Marighella (2023).

Pois bem, A Muralha, de Maria Adelaide Amaral, que teve 51 capítulos exibidos entre 4 de janeiro e 31 de março de 2000, foi produzida para comemorar os 500 anos do então chamado Descobrimento do Brasil. A minissérie seria inspirada em um livro também chamado A Muralha, escrito por Dinah Silveira de Queiroz, publicado em 1954, e que, por sua vez, originalmente foi publicado em capítulos semanais na revista O Cruzeiro, que contratou a autora para escrevê-lo em homenagem aos 400 anos da cidade de São Paulo. A minissérie da Globo seria a quinta adaptação desse livro para a televisão, com as outras quatro sendo novelas, cada uma produzida por uma emissora diferente: a primeira, ainda de 1954, pela TV Record, a segunda, de 1958, pela TV Tupi, a terceira, de 1963, pela TV Cultura, e a quarta, de 1968 e escrita por Ivani Ribeiro, pela TV Excelsior.

A muralha que dá título ao livro, às novelas e à minissérie é a Serra do Mar, cadeia montanhosa que se estende por cerca de 1500 km desde o Rio de Janeiro até o Rio Grande do Sul, que podia ser vista pelos portugueses que estavam desembarcando de seus navios, e era considerada um obstáculo intransponível para a colonização do interior do Brasil até bandeirantes que se aliaram a indígenas, liderados por Borba Gato, encontrarem uma trilha, que levou à descoberta de ouro e à Guerra dos Emboabas, um dos episódios mais sangrentos da história de nosso país, na qual centenas de indígenas morreram em um conflito travado de 1707 a 1709 entre dois grupos diferentes de colonizadores, um formado pelos bandeirantes paulistas que descobriram o caminho e outro por portugueses que vieram depois de olho nas riquezas recém-descobertas e se aliaram a colonos que viviam no nordeste. Muitos detalhes da Guerra dos Emboabas são obscuros devido à falta de registros, incluindo o próprio nome do conflito - sendo a teoria mais aceita a de que emboaba seria uma corruptela do termo em tupi para "invasores".

A Muralha é ambientada pouco antes da Guerra dos Emboabas, e narra os eventos que levaram ao conflito, mas de forma fictícia, usando apenas personagens inventados e situações que não temos como saber se realmente aconteceram ou não. A trama gira em torno da família do bandeirante Dom Braz Olinto, que mora na fazenda Lagoa Serena, já após transpor a Muralha, na então Vila de São Paulo dos Campos de Piratininga, que viria a evoluir até se tornar a cidade de São Paulo. Por opção da autora do livro, as verdadeiras protagonistas da histórias eram as mulheres; o papel das mulheres na colonização do Brasil jamais foi verdadeiramente abordado em nenhuma produção, o que fez com que o livro fosse considerado revolucionário na época, se tornando objeto de estudos das ciências sociais.

Na minissérie, Dom Braz (Mauro Mendonça) tem como principal negócio a captura e venda de indígenas como escravos, e, para isso, ele conseguiu fazer aliança com uma das tribos, que o guia pelos caminhos da floresta até terras jamais visitadas pelos colonizadores, onde ele ataca e sequestra indígenas que jamais tiveram contato com a chamada civilização. Dom Braz é casado com Mãe Cândida (Vera Holtz), que assume a administração da fazenda quando os homens estão fora; afetuosa porém contida, ela busca atender a todas as necessidades do marido e dos filhos, colocando as prioridades dos homens da fazenda acima de tudo, até mesmo da justiça e da religião, pois crê que essa é a única forma pela qual os Olinto conseguirão triunfar nessa terra inóspita.

Dom Braz e Mãe Cândida possuem quatro filhos. O mais velho, Leonel (Leonardo Medeiros), tem o pai como herói, segue todos os seus passos e acredita que essa é a chave para que a família tenha prosperidade; Leonel é casado com a meiga e sensível Margarida (Maria Luísa Mendonça), que tem saúde frágil e se ressente por não conseguir engravidar, já que, por seus critérios, seu casamento só será completo quando o casal tiver um filho. A segunda filha de Dom Braz, Basília (Deborah Evelyn), é mais forte e decidida, mas carrega uma mágoa muito maior: seu filho, Pedro, desapareceu na floresta quando tinha 13 anos de idade, acompanhando Dom Braz numa expedição; Basília culpa o pai pelo infortúnio, e, mesmo já tendo se passado muito tempo, acredita que o filho está vivo e será encontrado. Basília é casada com Afonso Góis (Celso Frateschi), melhor amigo de Leonel e que também acha que o método de Dom Braz é o melhor para obter sucesso na colônia. Já a caçula de Dom Braz, Rosália (Regiane Alves), é uma adolescente romântica e sem nada na cabeça, que não se importa com indígenas ou colônias, e quer viver um grande amor.

O filho que eu deixei por último é Tiago (Leonardo Brício), de certa forma o mais importante para a história. Educado pelos Jesuítas, Tiago tem pensamentos renascentistas e é contra a exploração dos indígenas, frequentemente entrando em conflito com o pai. Tiago também acredita que o futuro da família está na exploração do ouro, que ninguém nunca viu na colônia, sendo considerado, portanto, uma lenda e uma busca desnecessária. Com medo de que Tiago se case com uma mestiça, ou, pior ainda, com uma indígena, Dom Braz manda vir uma noiva para ele de Portugal, a doce Beatriz (Leandra Leal), que desembarca cheia de sonhos e completamente apaixonada pelo noivo que nunca viu - e que a despreza, vendo no casamento mais uma imposição estúpida de seu pai. Inicialmente pouco talhada à vida na colônia, ao longo da minissérie Beatriz vai se mostrando uma mulher de muita fibra, disposta a tudo para alcançar seus objetivos.

A família de Dom Braz se completa com Isabel (Alessandra Negrini), considerada por todos como sua sobrinha, mas com a suspeita de que seja sua filha. Mestiça de um português com uma indígena, Isabel é linda, forte e muito brava, se vestindo de armadura e indo para a floresta acompanhar Dom Braz, que a considera "seu melhor soldado", mais valente e competente que qualquer um dos homens do grupo. Isabel é apaixonada por Tiago, com quem tem uma relação de amor e ódio, já que, livre das amarras da sociedade, ela não se importa em demonstrar que quer ter relações sexuais com ele, que, a vendo como prima (e talvez irmã) e mulher solteira, fica incomodado com esse comportamento. Também merecem ser citados o indígena Apingorá (André Gonçalves), melhor amigo de Tiago e líder da tribo que fez aliança com os Olinto, que sabe ler e escrever em português e serve como guia de Dom Braz em suas expedições; e Aimbé (Enrique Diaz), mestiço e meio-irmão de Isabel por parte de mãe, que trabalha para Dom Braz mas se ressente de não ser tratado como branco como ela.

No mesmo navio que traz Beatriz (no primeiro capítulo) também vêm três outros personagens importantes: a prostituta Antônia (Cláudia Ohana), o ingênuo padre Miguel (Matheus Nachtergaele) e Ana (Letícia Sabatella), uma doce e meiga cristã-nova (nasceu judia mas se converteu ao cristianismo) que vem ao Brasil cumprir uma promessa e se casar com Dom Jerônimo (Tarcísio Meira), homem muito mais velho que ela e extremamente religioso. Vilão e um dos destaques da minissérie, Dom Jerônimo é um riquíssimo comerciante rival de Dom Braz, que, hipócrita, usa sua religiosidade como escudo para cometer todo tipo de perversão e ato indizível, sem que jamais suspeitas recaiam sobre ele. Em suas mãos, Ana sofrerá todo tipo de tortura, já que ele não acredita em sua conversão - de fato, o pai da moça se converteu e a entregou em casamento apenas para não ser queimado na fogueira - e planeja testar sua fé de formas que só a Inquisição sabe fazer, auxiliado por sua governanta, Leonor (Ada Chaseliov), tão cruel quanto ele.

Quando Ana chega ao Brasil, é recepcionada por Dom Guilherme (Alexandre Borges), dono de um engenho de açúcar que faz comércio com Dom Jerônimo e a abriga em sua casa antes de levá-la ao futuro marido; os dois se apaixonam, e, com a ajuda de Antônia, se encontram em segredo e tramam uma forma de libertar a moça de seu cativeiro. Antônia, que veio para a colônia achando que iria conseguir um bom casamento, já que aqui havia mais homens que mulheres brancas, consegue nada menos que cinco pretendentes: Mestre Davidão (Pedro Paulo Rangel), rico comerciante a quem ela rejeita por também ser cristão-novo; Dom Bartolomeu (Cecil Thiré), o ouvidor da capitania, enviado pela Coroa Portuguesa, que se orgulha de ter cursado Letras em Coimbra; Dom Gonçalo (Edwin Luisi), o barbeiro e dentista da Vila de São Paulo; Dom Cristóvão (Sérgio Mamberti), vereador que acredita que sua posição política lhe garante privilégios; e Dom Falcão (Emiliano Queiroz), o alfaiate e fofoqueiro local.

Enquanto não decide com quem vai se casar, Antônia se engraça com Bento Coutinho (Caco Ciocler), que vende os indígenas que Dom Braz captura; cafajeste e sedutor, Bento tem inveja da fortuna de Dom Braz, infiltra em sua equipe um espião (Irving São Paulo) e se aproveita de sua posição social para fazer negócios escusos com Frei Carmelo (Cacá Carvalho), religioso que adora mais ao dinheiro do que a Deus. Para desespero de Mãe Cândida, Rosália é perdidamente apaixonada por Bento, vendo nele seu príncipe no cavalo branco, que a levará para sua tão sonhada vida de princesa na colônia. Essa paixão faz com que a moça rejeite seu pretendente oficial, Vasco Antunes (Ângelo Antônio), filho de João Antunes (Carlos Eduardo Dolabella), bandeirante rival de Dom Braz, que planeja o casamento para unir as duas famílias; Vasco, porém, é apaixonado por Beatriz, e vive tentando convencê-la a abandonar Tiago, com o argumento de que ele não lhe dá atenção.

Já o Padre Miguel, que começa a trabalhar ao lado do mais velho e experiente Padre Simão (Paulo José), logo vê que sua ideia de como era a vida na colônia e a catequização dos indígenas estava em choque com a realidade, e acaba se apaixionando por Moatira (Maria Maya), indígena capturada durante uma das expedições de Dom Braz, vendida a Dom Jerônimo, que a estuprou seguidamente, e salva pelos padres, que a levaram para morar na igreja, onde planejavam ensiná-la a ler e escrever. No núcleo indígena, também merecem ser citados os personagens Genoveva (Ewriges Ribeiro), indígena que trabalha como empregada dos Olinto; os jovens Parati (João Pedro Roriz) e Tuiú (Patrick de Oliveira), que vivem em Lagoa Serena; e Caraíba (Stênio Garcia), pajé mitológico que viaja pelo Brasil visitando várias tribos e agindo como oráculo. Participações especiais incluem José de Abreu como o Inquisidor-Mór; José Wilker como Dom Diogo, governador geral da capitania; e Luís Melo como Dom Manuel Nunes Viana, português que vem ao Brasil lutar pelo fim da escravização dos indígenas, inspirado em um personagem real de nossa história.

Escrita por Maria Adelaide Amaral com colaboração de Vincent Villari e João Emanuel Carneiro, direção de núcleo de Denise Saraceni, e dirigida por Alexandre Avancini, Luiz Henrique Rios e Carlos Araújo, A Muralha contaria, em sua produção, com o apoio da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (FUNAI), com diversos indígenas participando como figurantes e extras, e pajés e caciques atuando como consultores, principalmente para a confecção de objetos cênicos, de adereços e das ocas. A minissérie seria quase que integralmente filmada nos estúdios da Globo no Projac, em Jacarepaguá, Rio de Janeiro, onde seriam contruídas a Vila de São Paulo, que ocuparia uma área de 10 mil km2, com mais de 450 caminhões de terra sendo usados para corrigir um desnível no terreno, e três aldeias indígenas, uma delas com quatro ocas totalmente funcionais - para construir as ocas, teria de ser recuperada a técnica da taipa de pilão, usada na época para fazer as paredes desse tipo de construção, hoje em dia não mais encontrada.

Lagoa Serena, considerada o mais trabalhoso de todos os cenários, seria construída em uma fazenda no município de Cachoeira de Macacu, no interior do estado do Rio de Janeiro; seriam construídos lá, do zero, um depósito de munições, uma senzala e a casa da família Olinto, que ocupava 320 m2. Para cenas envolvendo animais da fauna nativa, como araras, capivaras, onças, macacos e cobras, a produção contaria com o apoio do Ibama, que disponibilizaria uma bióloga e um veterinário que acompanhavam os animais durante as gravações. A cena da caravela que traz Beatriz, Antônia, Ana e o Padre Miguel de Portugal para o Brasil, exibida no primeiro capítulo, seria gravada em Pensacola, Estados Unidos, onde se localiza a Fundação Colombo, voltada à construção de réplicas de embarcações usadas na época das Grandes Navegações; a nau usada na minissérie, considerada a mais perfeita de todas as réplicas, também havia sido usada no filme 1492: A Conquista do Paraíso, de 1992.

Originalmente, Tarcísio Meira seria convidado para interpretar Dom Braz, mas, após ler alguns capítulos, pediria para interpretar Dom Jerônimo, pela oportunidade de interpretar um vilão, algo raro em sua carreira. Tarcísio acabaria fazendo um vilão memorável, que entraria para a galeria dos mais detestáveis da história da televisão. Outros atores extremamente elogiados seriam Alessandra Negrini, Leonardo Brício, Matheus Nachtergaele, que, no ano anterior, já havia conquistado a crítica com sua interpretação de João Grilo em O Auto da Compadecida, e Maria Maya, inicialmente alvo de boatos de que só havia sido escolhida para o papel de Moatira por ser filha do diretor Wolf Maya, depois criticada por, aos 18 anos, estar em um papel de forte apelo sexual, já que aparecia em três quartos de suas cenas com os seios à mostra, mas que, ao final, seria incensada e reconhecida como atriz de talento, infelizmente conseguindo poucos papéis de destaque depois de A Muralha.

A opção de Tarcísio pelo papel do vilão levaria a Globo a chamar Mauro Mendonça, que já havia interpretado Dom Braz na versão da TV Excelsior, de 1968, o que levaria à diferença de que, na versão da Excelsior, Dom Braz e Mãe Cândida seriam bem mais jovens, já que Mendonça tinha 37 anos e Fernanda Montenegro, que então interpretava sua esposa, 38, enquanto, na versão da Globo, Mendonça tinha 68 anos, e Vera Holtz, 46. Vale citar também como curiosidade que, na versão da Excelsior, Isabel era interpretada pela atriz Rosamaria Murtinho, na época com 35 anos (Alessandra Negrini na versão da Globo tinha 29), que era esposa de Medonça na vida real desde 1959. Outros nomes famosos da versão da Excelsior foram Gianfrancesco Guarnieri como Leonel, Nicette Bruno como Margarida, Nathalia Thimberg como Basília, Paulo Goulart como Bento Coutinho, Paulo Celestino como Mestre Davidão, Cláudio Corrêa e Castro como Dom Manuel, e Stênio Garcia, único além de Mendonça a participar de ambas as versões, como Aimbé.

A trilha sonora, inteiramente instrumental, seria composta por Sérgio Saraceni especialmente para a minissérie, com exceção da música de abertura, Floresta do Amazonas, de Heitor Villa-Lobos - a abertura, aliás, era bastante simples, mostrando um sobrevoo da Serra do Mar enquanto os nomes do elenco "passavam voando" em ordem alfabética; o logotipo mostrava a Serra do Mar conforme vista do litoral de São Paulo, com o nome "A Muralha" acompanhando a cadeia de montanhas. De forma incomum para uma trilha instrumental de uma minissérie, a trilha sonora de A Muralha seria lançada pela Som Livre, com o logotipo da minissérie na capa.

A Muralha superaria todas as expectativas da Globo em termos de repercussão e audiência, e acabaria vendida para Costa Rica, Chile, Guatemala, Letônia, Moçambique, Nicarágua, Paraguai, Peru, Portugal, República Dominicana e Venezuela. Em 2002, como parte de um teste da Globo para o formato, que acabaria não vingando, seria oferecida on demand em serviço de pay per view; no mesmo ano, seria lançada, de forma compactada, em DVD. A minissérie seria reexibida três vezes, a primeira em 2004, na própria Globo, em um compacto de 39 capítulos, e as outras duas, na íntegra, no canal Viva, em 2011 e 2013. Desde 2023, ela também se encontra na íntegra no catálogo do Globoplay.

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