Josie e as Gatinhas é um dos filmes mais engraçados que eu já vi na minha vida. Eu não sei se é engraçado mesmo ou se eu é que sou meio bobo, mas toda vez que eu assisto de novo, morro de rir. E o que eu mais gosto é que é um filme de comédia feito depois do ano 2000, mas que não tem uma só piada escatológica ou sexual, o que é uma senhora proeza. Ok, tem uma piada quase sexual, mas é feita com um trocadilho, sem gente pelada. Falando nisso, aliás, diferentemente de outros filmes baseados em desenhos da Hanna-Barbera, esse não é infantil, o que possibilita piadas muito melhores.
O curioso é que, antes de ver o filme, eu nunca tinha dado muita bola para Josie ou suas Gatinhas. Eu assistia muito ao desenho, mas até aí nada de mais, já que quando eu era pequeno esses desenhos da Hanna-Barbera passavam sem parar. Quando o filme estreou nos cinemas, em 2001, eu até fiquei curioso para saber como eles tinham transposto o desenho para a tela grande, mas não a ponto de comprar um ingresso. Foi só em 2005, quando eu estava mudando de canal sem nada para fazer, e o filme iria começar em instantes na TNT, que eu decidi assistir. Gostei tanto que decidi comprar o DVD quase que imediatamente, nem que fosse só para ver como era o filme com seu som original. Como o filme não está dentre os mais bem cotados, foi um DVD barato, e, portanto, uma excelente relação custo-benefício.
E por que Josie e as Gatinhas são o tema do post de hoje? Por que de vez em quando eu acho o DVD no meio da minha coleção, e penso algo como "este filme daria um bom post para o átomo", e hoje eu resolvi materializar esta vontade. Um motivo tão bom quanto qualquer outro, já que o blog é para falar das coisas que eu gosto, e eu absolutamente adoro este filme.
Mas, antes de falar especificamente do filme, vamos falar das Gatinhas. Diferentemente do que parece, Josie e sua banda não foram criadas pela Hanna-Barbera para o desenho, mas pelo cartunista Dan DeCarlo, um dos mais famosos desenhistas norte-americanos da década de 1950, também criador da bruxinha Sabrina - aquela do seriado com a Melissa Joan Hart. DeCarlo criou a personagem Josie em 1958, inspirado em sua própria esposa, também chamada Josie, e tentou vendê-la na forma de tirinha para alguns jornais, mas, como nenhum se interessou, ele decidiu criar histórias mais longas, que pudessem ser usadas em revistas em quadrinhos, e oferecê-las para a Archie Comics, que publica as famosíssimas (pelo menos nos Estados Unidos) revistas do personagem Archie e sua turma, e para a qual já havia feito alguns trabalhos.
A editora gostou muito das histórias criadas por DeCarlo, e decidiu lançá-las em uma revista bimestral chamada She's Josie, cujo primeiro número foi lançado em fevereiro de 1963. Além da personagem-título, a doce e racional Josie, os quadrinhos contavam com suas duas melhores amigas, a loura lindíssima mas meio burrinha Melody e a morena intelectual Pepper; os namorados de Josie e Pepper, chamados Albert e Socks; o rival de Albert, Alexander, e sua irmã gêmea, Alexandra. A partir da edição 14, a revista passou a ser mensal, e foi renomeada para apenas Josie. Essas primeiras histórias eram na verdade muito parecidas com as da turma do Archie, e nelas Josie ainda nem tinha sua banda. Também era comum que personagens da turma do Archie aparecessem nas histórias de Josie, e vice-versa.
A revista de Josie foi relativamente popular até a metade da década de 1960, quando começou a sofrer uma queda nas vendas, até que, no final daquela década, já não vendia quase nada, e corria o risco de ser cancelada. Felizmente para a ruivinha, o destino bateu à sua porta: a Archie Comics havia licenciado seus mais famosos personagens para a Filmation, que produziu um desenho chamado The Archie Show, onde Archie e seus amigos tinham uma banda (chamada "The Archies"). O desenho se tornou um dos mais famosos da época, e sua canção-tema, Sugar, Sugar, cantada por Ron Dante e Toni Wine, alcançou o primeiro lugar da parada da Billboard. Sem querer ficar para trás, a Hanna-Barbera, principal concorrente da Filmation, procurou a Archie Comics, perguntando se eles não queriam licenciar algum outro personagem para eles. A Archie Comics viu neste pedido uma excelente oportunidade para reformular a revista de Josie e então licenciá-la para a Hanna-Barbera, ganhando mais dinheiro com uma persoangem que já estava meio esquecida.
Assim, na edição número 42, de agosto de 1969, Josie terminou seu namoro com Albert e conheceu o cantor Alan M, com quem começou a ter um caso, despertando a ira de Alexandra, que também era apaixonada por Alan. Na edição 45, talvez influenciada por Alan, Josie convidou Melody para formar uma banda, que logo ganhou uma terceira integrante, a negra Valerie, recém-chegada à cidade. Alexander, para não ficar sem função, foi promovido a empresário da banda, para desespero de sua irmã. Albert, Socks e Pepper não tiveram a mesma sorte, e acabaram desaparecendo da revista sem maiores explicações. Foi nesta edição que a revista mudou de nome para Josie and the Pussycats, mostrando pela primeira vez Josie e suas duas amigas com seu "uniforme" de gatinhas (que está mais para oncinhas, mas tudo bem). A partir de então, as histórias envolviam Josie e as Gatinhas viajando para tocar em diversos pontos do país, sempre levando Alexander, Alexandra e Alan M consigo. A revista foi publicada até a edição 106, de outubro de 1982, quando vendas baixas fizeram com que ela fossem cancelada.
Em 1993, o sucesso das reprises do desenho no Cartoon Network levou à publicação de uma edição especial, mas esta não deu origem a uma nova série; ao invés disso, Josie e seus amigos passaram a aparecer em histórias publicadas na revista Archie & Friends, onde, inclusive, a banda ganhou uma nova origem, em uma espécie de reboot. Josie e as Gatinhas foram publicadas nesta revista até a edição 104, de 2005, fazendo ainda algumas aparições na revista em estilo mangá de Sabrina, the Teenage Witch. Atualmente, Josie não está tendo novas histórias, mas as antigas, inclusive as da era pré-Gatinhas, costumam ser republicadas de vez em quando.
Pois bem, voltemos agora a 1969, quando a Hanna-Barbera procurou a Archie Comics, que deu uma nova carreira a Josie para que o estúdio do Zé Colméia pudesse produzir um desenho de banda para concorrer com The Archie Show. Antes mesmo de começar a produção do desenho, a Hanna-Barbera contratou um estúdio para formar uma banda que cantaria as músicas do desenho, além de dublar as três protagonistas e de eventualmente se apresentarem como Josie as Gatinhas na vida real, buscando com isso conseguir um sucesso ainda maior que o de Sugar, Sugar. A escolha da banda ficou a cargo do produtor Danny Janssen, que, após promover um concurso que contou com mais de 500 inscritas, acabou por contratar a cantora Cathy Dougher para o papel de Josie, Patrice Holloway para o de Valerie, e a futura Pantera Cheryl Ladd para interpretar Melody.
Curiosamente, quando Janssen apresentou as escolhidas, o estúdio exigiu que ele substituísse Holloway, pois eles haviam decidido que seria melhor se as três protagonistas fossem brancas, e já haviam até produzido algumas cenas onde Valerie não era negra como nos quadrinhos. Janssen felizmente achou isso um absurdo, e se recusou a trocar sua escolhida, mantendo sua posição até que a Hanna-Barbera cedesse e fizesse Valerie negra como era originalmente. Graças a isso, Valerie se tornou a primeira protagonista negra de um desenho animado na história da TV norte-americana.
O desenho Josie and the Pussy Cats estrearia no dia 12 de setembro de 1970, sendo televisionado nas manhãs de sábado na CBS - curiosamente, o mesmo canal que transmitiu The Archie Show, que acabou sendo cancelado um ano antes da estréia de Josie. Muito mais parecido com um desenho do Scooby Doo do que com os quadrinhos que o originaram, o desenho mostrava a cada episódio Josie, Valerie e Melody, acompanhadas de Alan, Alexander e Alexandra, viajando para fazer um show em algum lugar, quando acontecia algum evento que as obrigava a solucionar um mistério, deter um criminoso ou qualquer coisa desse tipo que a Hanna-Barbera adorava fazer em quase todos os seus desenhos. Como se já não bastasse ter de lidar com os vilões da semana, Josie ainda tinha em Alexandra uma antagonista terrível, sempre disposta a roubar seu namorado Alan e atrapalhar o show das Gatinhas. Durante cada episódio, Alexandra e seu gato Sebastian sempre tramavam algum plano para alcançar um destes objetivos ou ambos, mas que no final sempre dava errado - normalmente por culpa do gato - e a deixava em posição vexatória.
Apesar de ter tido bons índices de audiência, o desenho só teve uma temporada, de 16 episódios, que se encerrou em 2 de janeiro de 1971. Durante o ano de 1971 foram ao ar reprises, e então, para 1972, a Hanna-Barbera produziu uma nova temporada. Mas até hoje não se sabe onde eles estavam com a cabeça quando o fizeram.
Batizada de Josie and the Pussy Cats in Outer Space, a nova temporada mostrava Josie e seus amigos perdidos no espaço, graças a uma maquinação de Alexandra, e tendo que encontrar o caminho de volta para a Terra. Em cada episódio, os personagens se envolviam com uma raça alienígena, os ajudava a resolver algum problema, e recebiam sua ajuda para voltar para a Terra, quando então eram desviados do curso por algum evento, e começava tudo de novo. Normalmente, Josie e as Gatinhas cantavam uma música ou duas por episódio, mas não era a banda montada para a primeira temporada que executava as músicas, mas músicos contratados especialmente para cada episódio. O desenho incluiu um novo personagem, Bleep, um alienígena que falava em uma linguagem que só Melody conseguia compreender. A audiência desta segunda temporada foi baixa, a animação era considerada inferior à da primeira, e, após 16 episódios e um ano de reprises, a CBS não encomendou uma terceira temporada, o que fez com que a Hanna-Barbera desistisse dos personagens.
Os personagens de Josie e as Gatinhas ainda fariam uma participação especial em um episódio de Os Novos Mistérios de Scoby Doo, em 1973, antes que a Hanna-Barbera desistisse deles. A primeira temporada foi reprisada na década de 1980 na NBC, e ambas as temporadas foram reprisadas na década de 1990 no Cartoon Network e depois do ano 2000 no Boomerang, quando ele ainda passava desenhos antigos. E, para quem estiver curioso com o destino da banda montada para a primeira temporada, elas gravaram 16 músicas para o desenho, dez das quais foram reunidas em um disco lançado em 1970, considerado de boa qualidade, mas que não fez um sucesso assim assombroso. Depois disso a banda se separou, e cada integrante foi cuidar da sua vida.
Em 2000, a Universal manifestou interesse em fazer uma adaptação do desenho animado para o cinema, e contratou os diretores e roteiristas Harry Elfont e Deborah Kaplan para trabalhar no projeto. Ao contrário do que eu ouvi falar por aí, a Universal não decidiu fazer o filme da Josie por causa do sucesso do filme do Scooby Doo, o que seria inclusive impossível, Já que Josie and the Pussycats foi lançado em 2001, e Scooby Doo em 2002.
Seja qual for o motivo pelo qual resolveram fazer um filme da Josie, o fato é que Elfont e Kaplan resolveram não serem muito fiéis ao desenho, preferindo fazer um filme de comédia para toda a família. Assim, somos apresentados a Josephine "Josie" McCoy (Rachael Leigh Cook), Melody "Mel" Valentine (Tara Reid) e Valerie "Val" Brown (Rosario Dawson), mais conhecidas como As Gatinhas, uma banda de pop-rock da pequenina cidade de Riverdale (por um acaso a mesma cidade onde são ambientadas as histórias da turma do Archie nos quadrinhos). Como toda banda, As Gatinhas sonham com o sucesso internacional, mas o máximo que conseguem é fazer pequenos shows locais agenciados por seu empresário Alexander Cabbot (Paulo Constanzo). Além de conviver com a frustração, As Gatinhas ainda têm de aturar o deboche das meninas mais populares do colégio, e as ironias da irmã de Alexander, Alexandra (Missi Pyle). Praticamente, o único que acredita em seu talento é o cantor folk Alan M (Gabriel Mann), secretamente apaixonado por Josie, que também é secretamente apaixonada por ele.
Um dia, a sorte das Gatinhas muda radicalmente, e o sucesso bate à sua porta. Tudo porque um misterioso acidente aéreo vitimou a boy band Dujour (algo como "da vez" em francês, uma brincadeira com a alta rotatividade das boy bands da época), os maiores astros da música de então. Incumbido pela dona da Gravadora Mega Records, Fiona (Parker Posey), de encontrar uma nova banda até a manhã do dia seguinte, o ex-empresário do Dujour, Wyatt Frame (Alan Cumming), acaba literalmente pegando a primeira que vê pela frente. Assim, as Gatinhas assinam contrato com a Mega Records e são levadas para Hollywood, onde a gravadora muda seu nome por razões de marketing para Josie e as Gatinhas, e seu primeiro álbum se torna um sucesso instantâneo, transformando-as em celebridades da noite para o dia.
Mas mal sabem as Gatinhas que na verdade tudo é parte de um plano maligno: Fiona planeja inserir mensagens subliminares nas músicas da banda, que transformarão os jovens que as escutarem em zumbis consumistas. O Dujour descobriu este plano acidentalmente, e teve de ser eliminado. Josie também o descobre, e cabe a ela impedir Fiona antes que as Gatinhas tenham o mesmo destino.
O filme tem um clima meio nonsense, e vários momentos ótimos, como o próprio Dujour, uma gravadora que quer dominar o mundo, e uma Hollywood dominada pelo merchandising: depois que as Gatinhas chegam à cidade, praticamente toda cena tem um nome ou logotipo de uma empresa famosa - 73 delas são citadas no filme por opção dos roteiristas, sem que nenhuma tenha pago um só centavo de merchandising. O filme aproveita para fazer críticas ao consumismo e às gravadoras, e ainda traz centenas de referências à cultura pop - em uma das melhores, é anunciado que Drew Barrymore, Cameron Diaz e Lucy Liu assinaram contrato para viver Josie e as Gatinhas no cinema.
Assim como a Hanna-Barbera fez com o desenho, a Universal também montou uma banda para tocar as músicas que seriam exibidas no filme. A banda, formada por alguns músicos contratados e com os vocais de Kay Hanley, da banda Letters to Cleo, não aparece no filme - onde, evidentemente, as músicas são "cantadas" por Rachael Leigh Cook - e, diferentemente do que ocorreu para o desenho, nem se apresentou como Josie e as Gatinhas em lugar algum. Em comum com a do desenho, porém, esta também só lançou um álbum, a trilha sonora do filme, que conta com treze faixas, dentre as quais duas do Dujour e um cover da música de abertura do desenho.
Embora tenha tido críticas bastante favoráveis, o filme das Gatinhas custou 22 milhões de dólares, e rendeu 14,5 milhões, sendo considerado um fracasso de bilheteria. O DVD e a trilha sonora venderam bem, mas nada que animasse a Universal a investir em uma continuação.
Portanto, oficialmente, Josie e as Gatinhas estão aposentadas, podendo ser encontradas apenas em reedições de suas histórias e em reprises de seus desenhos e filme. Foram aproveitar o sucesso, depois de suas contribuições à cultura pop do século XX.
0 Comentários:
Postar um comentário