quinta-feira, 3 de abril de 2003

Escrito por em 3.4.03 com 0 comentários

Imediatismo

Primeiro, gostaria de pedir desculpas por não ter tido post aqui semana passada. Alguns compromissos impediram que eu me concentrasse para escrever, e Deus sabe o que sai desse teclado quando eu não me concentro. De qualquer forma, parece que o assunto anterior foi muito bem discutido nos comentários, e o assunto de hoje é o mesmo que eu iria expor semana passada, de forma que vocês não perderam nada.

Para aqueles que não sabem, eu sou formado em Direito. Durante minha estada na faculdade, convivi com alunos de todos os tipos - os que queriam mesmo exercer uma profissão jurídica, os que estavam fazendo Direito para não serem mais enganados por seus advogados (tá, eu também vou fazer medicina para não ser mais enganado pelo meu médico), e os que resolveram fazer Direito porque os pais obrigaram a fazer uma faculdade, e disseram para eles que direito era fácil.

Intervalo. Palavras de um professor meu do segundo grau: "Direito e Engenharia são profissões opostas. Engenharia é a faculdade mais difícil de se fazer, mas é a profissão mais fácil de se exercer, pois a matemática não muda. O Direito é a faculdade mais fácil de se fazer, mas é a profissão mais difícil de exercer, pois muda todo dia". Concordo com ele em parte (não acho que engenheiro seja uma "profissão fácil"). E quem acha que Direito é fácil deve tentar imaginar como estou me sentindo depois que o Código Civil TODO mudou 13 dias após meu último dia de aula.

Bem, voltando à vaca fria, tinha também um quarto tipo de aluno, o que não sabia o que era o Direito, e só começou a descobrir depois da primeira prova do primeiro período. Na sociedade brasileira isso é mais comum do que se pensa - afinal, temos que escolher a profissão que exerceremos talvez pelo resto da vida entre os 15 e os 17 anos, idade na qual nossos únicos interesses são videogame, festas e mulher pelada. Aí o sujeito fala "quero ser advogado", achando que tudo é uma beleza e vai ficar milionário. Alguns resistem bravamente, gostam do que descobriram ser o Direito e se tornam excelentes advogados, juízes, promotores, etc. Outros se cansam, abandonam e vão fazer outra faculdade. Até aí tudo normal, nenhum desses procedimentos é condenável.

Meu pai é professor de Direito há 17 anos. 90% da minha escolha profissional foi devida à admiração por ele, de achar legal aquela profissão tão esquisita, onde você deve combater outro profissional igualzinho a você, na frente de outro que também estudou tudo aquilo que você sabe, e, dos dois combatentes, quem tem o melhor argumento ganha. No início de fevereiro, começaram as aulas na faculdade onde meu pai leciona, e ele me contou estar chateado com um fato que ocorria nos primeiros períodos: enquanto ele explicava como funcionavam determinadas leis, alguns alunos exaltados bradavam que quem é safado tem mais é que ficar preso, que é um absurdo o Rodrigo Silveirinha não estar preso ainda, o Beira-Mar ter direito a visita de advogado, não existir pena de morte no Brasil, enfim, todas essas coisas que todos nós falamos diariamente, às vezes resultado de nossa inconformação com a atual situação, às vezes de brincadeira, às vezes por realmente achar que algumas leis estão erradas. O que acontecia era que, quando meu pai explicava que não podia ser desse jeito, que tinha uma lei regulamentando isso, que essa lei tinha que ser cumprida, patati-patatá, muitos deles se levantaram e disseram: "ah, o Direito é assim, é? Quer dizer que a gente tem que ficar de braços cruzados sem fazer nada? Então não quero mais ser advogado!", e iam embora, abandonando o curso antes mesmo de ter um contato mais prolongado com a matéria.

Na minha opinião, desistir de ser advogado porque se "descobriu" que mandar o Beira-Mar para Alcatraz não é possível equivale a desistir de ser médico porque se descobriu que os hospitais públicos não possuem medicamentos.

As pessoas hoje em dia vivem na cultura do imediatismo. Todo mundo quer viver um Big Brother, ficar 79 dias na piscina e no fim ganhar 500 mil Reais. Ninguém mais tem paciência pra fazer nada, pra aprender nada, pra exercer corretamente nenhuma profissão. É como o Nachsieben disse em seu comentário ao meu post anterior, nem mesmo para salvar um casamento as pessoas têm paciência, se separam logo e vamos para outro.

É claro que ninguém é obrigado a terminar uma faculdade de 5 anos para descobrir que não gosta daquilo e ir fazer outra. É claro que ninguém tem que ficar casado com uma pessoa que não ama mais só pra manter um casamento sem prazer. O problema é que, do jeito que as coisas estão, tá esquisito, não existe outra palavra. Um aluno que abandona a faculdade após 16 dias de aula só porque não vai conseguir fazer com que as leis mudem ao seu bel-prazer, um casal que se separa após 2 meses de casado porque ele raspava a manteiga e ela cortava (sim, eu conheço esse casal) são exemplos de uma sociedade doente, que dá extrema importância ao imediato, ao prazer pessoal, ao dinheiro fácil, e não se importa com quem está à sua volta.

Aí vêm os argumentos de que, que que adianta viver infeliz se podemos um dia morrer de bala perdida, e essas coisas todas. Nenhum deles me convence de que a única saída é agir de modo impulsivo, irracional, e às vezes até mesmo egoísta.

Não existindo mais paciência, não existe mais respeito. Ninguém estará disposto a escutar o que um professor tem a dizer, os filhos não darão mais valor aos pais que trabalharam duro para que eles ficassem em situação confortável. É como o caso do garoto cujo pai só tinha estudado até a quarta série, era dono de um botequim e milionário. Ele abandonou a escola, não havia força no mundo que o fizesse voltar, e ele tinha até um bom argumento: "pra que eu vou estudar, se meu pai não estudou e é rico?"

Nenhum sucesso acontece repentinamente, como uma explosão. Todos são resultado de uma luta árdua, algumas vezes de muitos e muitos anos, várias ações interligadas que culminam em um resultado satisfatório. É como diz aquele ditado infame, "o dicionário é o único lugar onde o sucesso vem antes do trabalho".

Tenham paciência. Vocês têm um cérebro para pensar, analisar as situações e determinar qual curso de ação será o mais vantajoso para o seu futuro. Para que agir de impulso correndo o risco de se estrepar depois?

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