Vamos começar pela que teve a carreira mais longa, os Sneaker Pimps. A banda teria sua gênese no final dos anos 1980, quando o guitarrista Chris Corner e o tecladista Liam Howe, ainda adolescentes, se conheceriam na cidade onde moravam, Hartlepool, na Inglaterra, e decidiriam montar um duo de música eletrônica chamado F.R.I.S.K. Na época, estava começando a surgir o estilo hoje conhecido como trip hop, e os dois decidiriam produzir e gravar por conta própria um EP, chamado Soul of Indiscretion, lançado em 1990. O EP faria um relativo sucesso e garantiria um contrato com a Clean Up Records, pela qual eles lançariam mais dois EPs, F.R.I.S.K., de 1991, e World as a Cone, de 1992. Sem conseguir emplacar músicas nas rádios nem um contrato para o lançamento de um LP, eles decidiriam desfazer o duo e passar a trabalhar como DJs e como produtores de outras bandas com contrato com a Clean Up.
Em 1994, através da Clean Up, eles conheceriam o compositor Ian Pickering, e decidiriam contratá-lo para escrever músicas para uma nova banda, que eles decidiriam chamar de Sneaker Pimps, nome tirado de um artigo escrito pela banda Beastie Boys para a revista Grand Royal Magazine, sobre um homem cujo emprego era encontrar e comprar tênis (sneakers, em inglês) raros para colecionadores. Corner e Howe contratariam o baixista Joe Wilson e o baterista Dave Westlake, e gravariam algumas músicas com Corner nos vocais, mas chegaria à conclusão de que as músicas ficariam melhores com uma voz feminina. Seu empresário, então, indicaria Kelli Dayton, que, na época era vocalista da banda The Lumieres. Corner e Howe assistiriam a um show dela em um pub, e concluiriam que a voz dela era exatamente o que estavam procurando, convidando-a logo após esse show.
Kelli aceitaria e gravaria uma demo de 6 Underground, que seu empresário usaria para conseguir para os Sneaker Pimps um contrato com a gravadora Virgin, para gravar seu primeiro álbum, Becoming X, lançado em agosto de 1996. Com nada menos que cinco músicas de trabalho - Tesko Suicide, Roll On, 6 Underground, Spin Spin Sugar e Post-Modern Sleaze - o álbum começaria como um sucesso moderado, mas ganharia tração ao ser lançado nos Estados Unidos, em fevereiro de 1997, quando o clipe de Spin Spin Sugar se tornaria um dos mais exibidos pela Mtv. Somando as vendas do mundo inteiro, Becoming X venderia mais de um milhão de cópias, rendendo um Disco de Ouro no Reino Unido e chegando à posição 111 na parada da Billboard. Sua turnê de lançamento duraria dois anos, e incluiria vários shows conjuntos com Aphex Twin, um dos DJs que atraíam mais público na época.
Oficialmente, os Sneaker Pimps eram apenas Kelli, Corner e Howe, com Wilson e Westlake, mesmo também participando da turnê, sendo considerado músicos contratados. Durante a perna da turnê nos Estados Unidos, Howe alegaria cansaço e retornaria à Inglaterra, sendo substituído por vários músicos nos shows seguintes; algumas notícias diriam que ele havia deixado a banda, mas ele negaria, e aproveitaria para trabalhar na produção de um álbum de remixes, chamado Becoming Remixed, lançado em março de 1998.
Ao voltar da turnê, Howe e Corner decidiriam montar seu próprio estúdio, chamado Line of Flight, no qual eles produziriam e gravariam não somente os próximos lançamentos dos Sneaker Pimps, mas também álbuns de outras bandas de música eletrônica do Reino Unido. Também alegando cansaço, Kelli pediria para passar um tempo viajando, e, ao retornar, teria uma grande surpresa: enquanto produziam o segundo álbum dos Skeaker Pimps, devido à ausência de Kelli, Corner mais uma vez faria os vocais durante os ensaios. Quando Kelli retornasse, seria informada que, diferentemente do que aconteceu no primeiro álbum, a dupla achava que as músicas do segundo pediam uma voz masculina, simplesmente demitindo a moça e transformando os Sneaker Pimps em um duo. A Virgin, que havia contratado a banda graças à presença de Kelli, não concordaria com a mudança e cancelaria o contrato, o que faria com que o segundo álbum dos Sneaker Pimps fosse lançado pela Clean Up.
Kelli, por sua vez, não se abalaria com a demissão: conseguindo um contrato com a gravadora One Little Indian, ela seguiria carreira solo, usando o nome Kelli Ali, em homenagem a seu pai, que havia acabado de falecer. Ela lançaria três álbuns, Tigermouth, de 2003, Psychic Cat, de 2004, e Rocking Horse, de 2008, todos de música eletrônica e com sucesso moderado na Europa, rendendo os hits Kids, Inferno High Love, Teardrop Hittin' the Ground e Hot Lips, esse último um grande sucesso nas rádios do Reino Unido. Sua primeira turnê solo, em 2003, seria abrindo para o Garbage. De 2008 para cá, ela trabalharia principalmente colaborando com outros cantores, como Ozymandias e o duo Cult With No Name, e se envolveria com cinema, produzindo o longa metragem Ghostdriver, para o qual também faria a trilha sonora, sendo seu último lançamento um álbum também chamado Ghostdriver, de 2021.
Voltando aos Sneaker Pimps, seu segundo álbum, Splinter, seria lançado em outubro de 1999, apenas com Corner e Howe como membros fixos, e as demais posições sendo preenchidas por músicos contratados, incluindo, mais uma vez, Wilson e Westlake. Talvez nada surpreendentemente, o álbum falharia em repetir o sucesso do primeiro, teria apenas uma música de trabalho (a faixa-título), e não renderia uma turnê própria, apenas uma em conjunto com o Placebo, ao final da qual o duo também seria demitido da Clean Up.
Diante do insucesso, Corner e Howe decidiriam voltar a investir na carreira de produtores, até conseguirem, inesperadamente, um contrato com a pequena gravadora Tommy Boy Records. Eles aproveitariam para gravar mais um álbum, Bloodsport, lançado em janeiro de 2002, que teria como músicas de trabalho KiroTV e Loretta Young Skills. Esse seria o último álbum com a participação de Wilson e Westlake, que, talvez cansados de serem creditados como músicos contratados, decidiriam se dedicar a outros projetos.
Após o lançamento de Bloodsport, Corner e Howe gravariam várias músicas originalmente criadas para um quarto álbum dos Sneaker Pimps, mas que, sem um contrato com uma gravadora, seriam engavetadas. Corner começaria a compor as músicas para serem a trilha sonora de um longa animado chamado Blind Michael, que também seria cancelado. Algumas dessas músicas, ainda em versão demo, vazariam na internet, e seriam apelidadas pelos fãs, coletivamente, como SP4. Após o vazamento, Corner tentaria concluir algumas delas e as lançaria como sendo de uma banda chamada IAMX - na verdade um projeto solo de Corner, que incluía uma turnê que combinava música, imagens projetadas e realidade virtual.
Em 2006, novas músicas em versão demo vazariam na internet, cantadas por uma vocalista não identificada, e ganhariam o apelido de SP5 Demos. Durante muitos anos, haveria uma discussão sobre se essas faixas realmente haviam sido gravadas pelos Sneaker Pimps, até que os próprios Corner e Howe confirmariam que se tratava de um projeto que eles começaram mas abandonaram, e que alguém pegou um MiniDisc que eles haviam gravado e levou para a Rússia, onde as músicas primeiro seriam tocadas em um bar local, depois vazadas na internet.
Corner e Howe passariam os anos seguintes trabalhando como produtores, DJs e fazendo remixes, com Corner de vez em quando fazendo shows com o IAMX, até que, em 2015, começariam a surgir rumores de que os Sneaker Pimps iriam voltar com um novo álbum. Corner confirmaria a informação em 2016, mas os verdadeiros trabalhos de gravação começariam apenas em 2019. Durante a pandemia, versões de luxo de Becoming X, Splinter e Bloodsport seriam lançadas, em preparação para o novo álbum.
Com o nome de Squaring the Circle, o quarto álbum dos Sneaker Pimps seria lançado em setembro de 2021 pela gravadora Unfall Productions. Cinco de suas 16 faixas estavam presentes nos SP5 Demos, com a vocalista misteriosa sendo identificada como Simonne Jones; outras três eram remixes de músicas lançadas originalmente por um projeto paralelo de Howe, semelhante ao IAMX, chamado Ape Mink Press. Squaring the Circle faria pouco sucesso, e seria considerado apenas mais do mesmo pela maior parte da crítica. Desde seu lançamento, Corner e Howe voltariam a trabalhar como produtores; ainda não há planos para o lançamento de um novo álbum.
Agora vamos para a que teve a carreira mais curta, o Scheer. Assim como os Sneaker Pimps, o Scheer é uma banda britânica, que teve sua gênese no final dos anos 1980 quando dois adolescentes se conheceram e decidiram tocar juntos. A diferença é que, no caso do Scheer, esses amigos moravam em Derry, Irlanda do Norte, e não tinham interesse em música eletrônica, querendo montar uma banda de rock pesado, cuja principal inspiração era o Metallica. Esses amigos eram o guitarrista Paddy Leyden e o baixista PJ Doherty, apelido Doc.
Como não podiam montar uma banda de rock sozinhos, os dois colocaram anúncios em publicações locais, através das quais conheceram o guitarrista Neal Calderwood e o baterista Joe Bates. Já com o nome de Scheer, os quatro começariam a tocar em pubs e casas noturnas do Condado de Londonderry em 1990, inicialmente com Doc como vocalista. Um dia, eles conheceram Audrey Gallagher, nascida em uma pequena cidade curiosamente chamada Moneyglass, que também estava tentando começar uma carreira como cantora, e acharam que seu estilo vocal, meigo e sussurrante, faria um contraste apropriado com o som pesado do grupo, poderia se tornar sua marca distintiva e ajudar a banda a chamar atenção de algum empresário. A estratégia daria certo, e, com Audrey nos vocais, o Scheer conseguiria contratos para shows em casas noturnas de toda a ilha da Irlanda.
Durante um show em Belfast em 1993, um representante da pequena gravadora irlandesa SON procuraria a banda e ofereceria um contrato para gravar um single, que seria oferecido às principais rádios alternativas da Irlanda do Norte. Para esse single, a banda escolheria Wish You Were Dead, que rapidamente se tornaria um grande sucesso na cena alternativa irlandesa. O sucesso da música nas rádios animaria a SON a gravar um EP, chamado Psychobabble, com quatro faixas, lançado em 1994. A música de trabalho desse EP, Howling Boy, também seria um grande sucesso nas rádios alternativas.
Rapidamente o Scheer começava a se tornar uma das bandas mais pedidas nas rádios da Irlanda, o que chamou a atenção de uma gravadora bem maior, a 4AD, com quem eles assinaram contrato em abril de 1995. Doc não concordava com os termos do contrato, achando que ele seria desfavorável à banda, e decidiu sair antes da assinatura, sendo substituído pelo baixista Peter Fleming, indicado por Audrey. O primeiro lançamento do Scheer pela 4AD seria mais um EP de quatro faixas, que eles decidiriam chamar de The Schism ("o cisma", aquilo que acontece quando os membros de um grupo se desentendem e um ou mais decidem sair), lançado ainda em 1995.
Após o lançamento de The Schism, o Scheer sairia em turnê pelo Reino Unido, onde conseguiria bons públicos e resenhas extremamente favoráveis da crítica. Em seus shows, eles cantariam algumas das músicas lançadas em seus EPs e algumas das que estavam gravando para seu primeiro álbum, Infliction, que seria lançado em maio de 1996. Infliction traria versões regravadas, com novos arranjos, de Howling Boy, Screaming (ambas do EP Psychobabble), Baby Size (do EP The Schism) e Wish You Were Dead, que seria a segunda música de trabalho do álbum, entre Shéa e Demon, a mais elogiada pela crítica.
Infliction dividiria a crítica, que notaria que ele tinha duas metades muito bem definidas, a primeira mais pesada, a segunda mais melódica, e, apesar de elogiar fortemente o desempenho de Audrey, comparada a Kristin Hersh, do Throwing Muses, e a Alison Shaw, dos Cranes, consideraria o álbum "promissor, mas inconsistente". Apesar de o álbum entrar para o Top 100 do Reino Unido, na posição 83, as vendas também seriam abaixo do esperado pela 4AD, com a gravadora colocando a culpa nas escolhas da banda para as imagens de capa - um ferimento suturado na capa, um carrapato sugando sangue na contracapa.
Após o lançamento de Infliction, o Scheer sairia em outra turnê pelo Reino Unido, e, em 1997, voltaria a estúdio para começar a gravar seu segundo álbum. Aí seria a vez de Audrey e Leyden darem razão a Doc e acharem que o contrato com a 4AD era muito desfavorável à banda - que praticamente não recebia nada pelos singles de Shéa, Wish You Were Dead e Demon, lançados, respectivamente, em 1995, 1996 e 1997. Sem conseguir chegar a um acordo, o que impossibilitava a realização de novos shows e o lançamento do segundo álbum, eles decidiriam romper o contrato com a 4AD no início de 1998. A banda ainda tentaria conseguir marcar novos shows por conta própria, mas uma série de desentendimentos entre os membros fariam com que eles decidissem se separar, em outubro de 1998.
Com o fim da banda, Leyden decidiria fundar uma nova, chamada Vertigo Bird, com um som mais suave, que lembrava o dos Cocteau Twins. Já Fleming passaria a ser o baterista do trio Pulszar, formado por Annette Quinn e pelas irmãs Aisling e Kerri Ann Gallagher - que, apesar da coincidência, não são parentes de Audrey (e nenhuma das três é parente de Noel e Liam Gallagher, do Oasis, caso alguém esteja se perguntando). Falando em Audrey, ela e Calderwood decidiriam fundar, acreditem ou não, um duo de música eletrônica, chamado Lima, que não faria sucesso; Calderwood logo desistiria e decidiria abrir seu próprio estúdio de gravação, o ManorPark Studios. Após o fim da Lima, Chris Agnelli, do duo Agnelli & Nelson, encontraria uma fita demo da banda jogada no armário da BBC Radio Ulster, e, adorando a voz de Audrey, decidiriam convidá-la para uma colaboração. Assim, ela começaria uma extremamente bem sucedida carreira na música trance, providenciando vocais para faixas de nomes famosos do estilo, como John O'Callaghan, tyDi e Ashley Wallbridge, estando na ativa até hoje e já tendo participado de mais de 30 álbuns, o mais recente sendo Going Home, do duo canadense SMR LVE, lançado em 2023.
Mas o Scheer ainda teve um "capítulo póstumo": após romper contrato com a 4AD, a banda entraria na justiça pelo direito de lançar as canções que já haviam gravado de forma independente, com o resultado sendo favorável a eles e saindo no final de 1999. Assim, em maio de 2000 sairia o segundo álbum do Scheer, apropriadamente chamado ...And Finally, financiado pela própria banda e lançado através do selo Schism Records, criado especialmente para isso. ...And Finally seria bem recebido pela crítica, que consideraria que o som do Scheer havia evoluído, e lamentou o fim da banda, afirmando que ela tinha potencial para se tornar muito mais se tivesse tido a chance. Sendo lançado de forma independente, o álbum não teve músicas de trabalho nem vendas suficientes para transformá-lo em destaque - talvez porque novamente tenha uma capa, digamos, de mau gosto, mostrando dois pés com uma etiqueta no dedão, como os de um cadáver no necrotério.
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