domingo, 21 de fevereiro de 2021

Escrito por em 21.2.21 com 2 comentários

Boris Karloff

Eu adoro filmes de terror antigos, daquela época em que a atmosfera era mais importante do que um monstro pular do nada na tela pra dar um susto em quem está assistindo, ou do que os personagens irem morrendo um por um em uma escala crescente de mortes nojentas. Eu gosto daqueles que hoje em dia não meteriam medo em ninguém, mas que pelo menos tinham bons roteiros, atuações inspiradas, e, o mais importante, clima de terror - aquele clima no qual você sabe que alguma coisa ruim vai acontecer, mas não quando.

Ano passado, no mês de outubro, pensei em fazer um Mês do Terror, falando sobre meus quatro atores preferidos desse tipo de filme. Acabou que eu desisti por achar que não seria legal passar um mês inteiro falando sobre atores. Continuei com vontade de escrever os posts, porém, de forma que decidi que, ao longo desse ano, os farei. Vamos começar hoje com aquele que é reconhecidamente um dos maiores atores da história do cinema, e que fez quase a totalidade de sua carreira no terror. Hoje é dia de Boris Karloff no átomo!

Karloff nasceu William Henry Pratt, em 23 de novembro de 1887, na então cidade de Dulwich, hoje parte da cidade de Camberwell, próxima a Londres, na Inglaterra. Seu pai, Edward John Pratt Jr., era funcionário do governo e filho de um inglês com uma indiana; sua mãe, Eliza Sarah Millard, terceira esposa de seu pai, era dona de casa e sobrinha de Anna Leonowens, que viveu durante um tempo na corte do Rei do Sião (atual Tailândia) e de quem as memórias serviram como base para o livro Ana e o Rei, de Margaret Landon, que, por sua vez, daria origem a um musical da Broadway chamado O Rei e Eu, posteriormente adaptado para o cinema e TV. William era o mais novo de nove irmãos, sendo que o mais velho de todos, John Thomas Pratt, se tornou diplomata e foi agraciado com o título de Sir.

A infância não foi fácil para William, que tinha as pernas arqueadas, língua presa e gaguejava. Com muita disciplina, ele mesmo se forçou a corrigir as três condições, mas, embora tenha conseguido se livrar da gagueira definitivamente, um chiado na fala o acompanhou durante toda a vida. Sua mãe faleceria quando ele ainda era bem pequeno, e ele seria criado por suas irmãs mais velhas. Após concluir o colégio, seu pai queria que ele, como o irmão, seguisse carreira diplomática, e o matriculou no King's College de Londres; William tinha outros planos, porém, abandonando a universidade em 1909 e viajando para o Canadá, onde trabalhou numa fazenda e em vários empregos que o faziam viajar pelo país, antes de decidir seguir a carreira de ator.

Ele começaria sua carreira de ator aos 24 anos, em 1911, no teatro canadense, após um convite de um produtor que se interessou por sua "aparência exótica". Não querendo que sua família descobrisse, ele aproveitaria a deixa para escolher o nome artístico Boris Karloff, unicamente porque soava "estrangeiro e exótico". Existem duas famosas histórias sobre a origem desse nome, mas ambas são incorretas: a primeira diz que Karloff teria inspirado seu nome no do personagem Boris Karlov, um cientista louco do livro The Drums of Jeopardy, de Harold MacGrath, mas que só seria publicado em 1920; a segunda diz que a inspiração seria o Príncipe Bóris de Karlova, do livro Domando o Destino, de Edgar Rice Burroughs, que só seria publicado em 1915. Há quem teorize que, na verdade, o que ocorreu foi o contrário, com MacGrath e Burroughs, após assistirem a alguma peça de Karloff ou visto seu nome em algum cartaz, gostando da sonoridade e decidindo batizar seus personagens com nomes parecidos. Em entrevistas, Karloff costumava dizer que seu sobrenome vinha de antepassados seus de origem eslava, mas não há qualquer indício de que ele tenha tido antepassados eslavos em nenhum dos dois lados da família.

Seja como for, Karloff começaria sua carreira na companhia de teatro Jeanne Russell, onde ficaria por cerca de um ano se apresentando em várias cidades canadenses; em junho de 1912, eles estavam em Regina quando um tornado devastaria a cidade, e ajudariam nos esforços de reconstrução. Depois disso, ele decidiria ir para os Estados Unidos, onde trabalharia por um tempo como responsável pelas bagagens de uma companhia ferroviária, até se juntar à companhia de teatro Harry St. Clair Players Co., onde ficaria por mais um ano, se transferindo depois para a Billy Bennett Touring Company. Entre as apresentações, Karloff arrumava serviços para complementar sua renda que sempre envolviam trabalho pesado, o que fez com que ele desenvolvesse uma dor crônica nas costas que o acompanharia pelo resto da vida, mas que fariam com que ele fosse dispensado e não precisasse se alistar para combater na Primeira Guerra Mundial.

Depois da Primeira Guerra Mundial, Karloff se transferiria para a companhia de teatro Maud Amber Players, que se apresentava na Califórnia, e que, no início de 1918, por causa da pandemia de gripe espanhola, encerraria suas atividades. Sem conseguir outra companhia de teatro, e sem dinheiro para viajar para outro estado, ele aceitaria um convite do produtor Joseph Paul Haggerty, de quem se manteria amigo pelo resto da vida, para fazer figuração no cinema, recebendo cinco dólares por cada filme no qual aparecesse. Karloff faria figuração em mais de vinte filmes mudos até ser convidado para seu primeiro papel com nome nos créditos, no seriado The Lighting Rider, de 1919, que teve 15 episódios, dos quais apenas trechos sobreviveram até hoje. Seu trabalho mais antigo ainda preservado é o faroeste The Masked Rider, também de 1919, seu segundo trabalho creditado - no caso, como o "mexicano número dois no saloon".

Devido à sua já citada "aparência exótica", aliás, Karloff normalmente era escalado para interpretar latinos, árabes, indianos ou índios. Entre 1919 e 1930 ele teria papéis de diferentes tamanhos e importâncias em nada menos que 64 filmes, não sendo creditado em apenas nove deles; seu primeiro papel de verdadeiro destaque seria o do sacerdote Dakart de Kama-Sita em The Hope Diamond Mystery, de 1921; também merecem ser citados seus papéis como um índio em O Último dos Moicanos (1920), o de vilão do filme The Cave Girl (1921), o do Marajá em The Man from Downing Street (1922), um hipnotizador em The Bells (1926), e o de, acreditem ou não, um guia africano em Tarzan e o Leão de Ouro (1927).

Karloff chegaria ao primeiro time em 1931, após atuar no drama O Código Penal, dirigido por Howard Hawkes, no qual interpretava um presidiário; ele havia interpretado esse mesmo papel no teatro, e convenceria os produtores a escalá-lo com um teste impecável. Sua atuação nesse filme lhe renderia um convite para interpretar um chefão da máfia em Scarface, que acabaria só sendo lançado em 1932, devido a problemas com a censura. Ao todo, em 1931 ele estaria em 14 filmes, onze deles atuando em pequenos papéis, quatro deles sem créditos. Dos outros três, um seria O Código Penal e um seria Sede de Escândalo, indicado ao Oscar de Melhor Filme, no qual interpretaria um repórter sem ética. O outro seria Frankenstein.

O Monstro de Frankenstein seria o papel que marcaria a carreira de Karloff - não seria exagero nenhum dizer que é seu único papel conhecido pela maioria do público atual. Ao ser escalado, Karloff já havia atuado em exatos 80 filmes, e estava com 44 anos, idade considerada tardia, mesmo na época, para um ator alcançar o sucesso. As gravações seriam extremamente extenuantes, já que o figurino de Karloff incluía uma complexa maquiagem, que levava cerca de duas horas para ser aplicada, uma roupa com enchimento, consideravelmente quente, e sapatos elevados que pesavam 5 kg cada, que não somente aumentavam a altura do ator, mas também contribuíam para seu andar tonitruante. A performance de Karloff, que faria um monstro simultaneamente ameaçador e digno de pena, algo que não estava previsto no roteiro, entraria para a história, se tornando a representação padrão do Monstro de Frankenstein a partir de então - o mesmo acontecendo com sua maquiagem, de testa quadrada, olhos profundos e parafusos no pescoço, que se tornaria tão icônica que seria para sempre associada à imagem do monstro. Criada por Jack P. Pierce, a aparência do monstro seria registrada pela Universal, que recebe royalties toda vez que alguém faz um Monstro de Frankenstein parecido.

Enquanto Frankenstein estava sendo finalizado e estreava, Karloff faria pequenos papéis em três filmes, que estreariam em 1932. Com as estreias de Frankenstein e Scarface, ambos imensos sucessos de bilheteria, a Universal decidiria apostar no ator, e o escalaria para Mundo Noturno (também de 1932), no qual ele interpretou o dono de uma casa noturna. O sucesso de Mundo Noturno lhe renderia seu primeiro filme como astro principal, A Casa Sinistra (também de 1932, na época os filmes eram produzidos de forma muito veloz) outro filme de horror, assim como Frankenstein, dirigido por James Whale, no qual ele interpretava o estranho mordomo mudo da tal casa sinistra, na qual viajantes têm de se refugiar durante uma tempestade.

Ainda em 1932, Karloff seria creditado como o astro principal em A Máscara de Fu Manchu e em A Múmia, no qual interpretaria o sacerdote Imhotep, mumificado no Antigo Egito e trazido de volta à vida na época atual. Isso faria com que Karloff se tornasse o único ator a interpretar dois dos hoje considerados Monstros Clássicos da Universal, e o grande sucesso de A Múmia faria com que ele ficasse marcado pelo resto de sua carreira como um ator de filmes de horror, sendo mais convidado para atuar em produções desse gênero do que nas de outros.

Em 1933, Karloff retornaria pela primeira vez à Inglaterra, para as gravações de O Zumbi, no qual interpretaria um arqueólogo que julga ter descoberto o segredo da vida eterna. Ele ficaria preocupado com a reação de seus irmãos, mas se surpreenderia quando eles o parabenizariam pela carreira e pediriam para tirar fotos com ele, inclusive permitindo que uma foto de todos os irmãos reunidos fosse usada pela imprensa; o episódio agradaria Karloff, que contaria essa história com orgulho a amigos e em entrevistas até o fim da vida.

Em 1934, ele estaria em duas produções nas quais não seria o astro principal, o filme de guerra A Patrulha Perdida, dirigido por John Ford, no qual sua performance seria elogiadíssima, e o drama A Casa de Rotschild. Mas seu palco principal era definitivamente o terror, com Karloff tendo atuações extremamente elogiadas em O Gato Preto, inspirado no conto de Edgar Allan Poe, e em O Dom da Alegria, ambos lançados em 1934; em ambos, Karloff contracenaria com outra lenda do horror, Bela Lugosi, que interpretou Drácula no filme clássico da Universal. Karloff e Lugosi voltariam a se reunir para mais um filme inspirado em um conto de Poe em 1935, O Corvo; no mesmo ano, Karloff voltaria a ser dirigido por Whale a ao papel que impulsionou sua carreira em A Noiva de Frankenstein. Ainda em 1935, Karloff faria O Mistério do Quarto Escuro, no qual interpretaria dois irmãos gêmeos, sendo um maligno que quer matar o outro para tomar sua posição; em 1936, ele interpretaria um homem executado e trazido de volta à vida em O Morto Ambulante, e ele e Lugosi atuariam mais uma vez juntos no filme de ficção científica O Poder Invisível.

Em 1934, passaria a ser aplicado o Motion Picture Production Code, uma espécie de regulamento pelo qual os estúdios se comprometiam a "pegar leve" com os filmes de terror, que estavam sendo considerados muito pesados. O "Código", como ficaria conhecido, ficaria em vigor até 1968, e, a partir de 1936, começaria a ser reforçado, com a quantidade de filmes de terror no restante da década de 1930 caindo consideravelmente. Com isso, Karloff se dedicaria a outros gêneros, como ficção científica, espionagem e faroeste; curiosamente, em seu maior sucesso da época, Mr. Wong, Detetive, ele interpretaria um chinês, usando um estilo de maquiagem hoje condenado e conhecido como yellow face. Mr. Wong, Detetive chegaria aos cinemas em 1938, e, no ano seguinte, ganharia duas continuações também de grande sucesso, O Mistério de Mr. Wong e Mr. Wong no Bairro Chinês, com a saga se concluindo em 1940 com Noite de Terror e Condenado à Morte.

Em 1939, a Universal relançaria Drácula e Frankenstein nos cinemas, e, animada com a bilheteria, resolveria voltar a investir no terror com O Filho de Frankenstein, no qual Karloff repetiria o papel do Monstro, contracenando com Lugosi e com outro grande nome do cinema, Basil Rathbone - um dos gritos de horror de Karloff nesse filme seria adicionado à biblioteca de efeitos sonoros da Universal, e é usado até hoje em cenas de mortes repentinas em filmes do estúdio. Ele e Rathbone contracenariam novamente em Torre de Londres, também de 1939, no qual Karloff interpretaria um carrasco. Em 1940, ele contracenaria mais uma vez com Lugosi em Sexta-Feira 13, e estrelaria o filme de espionagem Espiã Fascinadora, ao lado de Margaret Lindsay. Em 1941, ele faria um cientista obcecado com a ideia de se comunicar com a esposa morta em Os Mortos Falam, e atuaria mais uma vez ao lado de Lugosi, dessa vez na comédia O Palácio dos Espíritas. Ao todo, contando com os que eu citei aqui, entre Frankenstein e O Palácio dos Espíritas, Karloff atuaria em nada menos que 44 filmes, na maioria deles sendo creditado como o ator principal.

Em 1941, Karloff aceitaria um convite do escritor Joseph Kesselring para voltar ao teatro, atuando na Broadway na peça de humor negro Este Mundo é um Hospício, no papel de um gangster que faz plástica para não ser reconhecido, mas acaba ficando parecido com Boris Karloff (isso mesmo), de forma que todo mundo acha que ele é o ator. A peça foi um grande sucesso, ficando em cartaz durante três anos. O diretor de cinema Frank Capra negociaria os direitos de adaptação ainda em 1941, e planejaria filmar com Karloff no papel, mas, como ele estaria indisponível justamente por causa da peça, e Capra tinha um prazo para concluir o filme, acabaria escalando o ator Raymond Massey, que era um pouco parecido com Karloff. Os termos da negociação estipulavam que o filme só poderia estrear quando a peça saísse de cartaz, então, apesar de ter sido filmado em 1941, o filme só estrearia nos cinemas em 1944.

Ironicamente, 1944 também seria o ano do retorno de Karloff aos cinemas, em dois filmes de terror: Climax, baseado em O Fantasma da Ópera, e A Mansão de Frankenstein, no qual Karloff interpretava não o Monstro, e sim o Dr. Gustav Niemann, que planejava repetir a experiência do Dr. Frankenstein (com Glenn Strange no papel do Monstro). Karloff ficaria extremamente insatisfeito com esse filme e com a sanha da Universal em continuar insistindo em seus monstros clássicos, mesmo sem ter bons roteiros; A Mansão de Frankenstein, que, além de um novo Monstro de Frankenstein, tinha um vampiro e um lobisomem, seria seu último filme pelo estúdio - que continuaria, sem ele, lançando filmes para a "Franquia Frankenstein", hoje todos considerados filmes B.

Em 1945, Karloff seria convidado pelo produtor Val Lewton para fazer três filmes pela RKO; o primeiro, O Túmulo Vazio, no qual ele interpreta um homem que desenterra cadáveres do cemitério para vender a estudantes de medicina, seria um imenso sucesso, e sua última parceria com Lugosi. Os outros dois, A Ilha dos Mortos, no qual a população de uma ilha grega é atemorizada por uma vampira, e Asilo Sinistro (lançado em 1946), no qual interpretava o diretor de um sanatório que se opunha a reformas feitas pelo novo dono, seriam sucessos moderados. Depois da Segunda Guerra Mundial, aliás, os filmes de terror teriam uma acentuada queda na audiência, e Karloff decidiria mais uma vez tentar se estabelecer em outros gêneros, participando, em 1947, da comédia O Homem de 8 Vidas (que seria recentemente refilmada como A Vida Secreta de Walter Mitty, com Ben Stiller) no papel de um psiquiatra; do filme noir Emboscada, no qual interpretaria um estilista com problemas psiquiátricos; e do drama histórico Os Inconquistáveis, no qual interpretaria um chefe indígena.

Durante o restante da década de 1940, ele faria apenas pequenas participações em filmes para o cinema, mas seria presença frequente em programas de rádio. Em 1949, ele se dedicaria a gravar séries de TV, primeiro repetindo seu papel em uma adaptação de Este Mundo é um Hospício para o The Ford Theatre Hour, depois participando de dois episódios do The Chevrolet Tele-Theatre, e então gravando um episódio para o Masterpiece Playhouse, no qual interpretava o Tio Vanya, da peça de mesmo nome, e um para o Lights Out, esses dois últimos somente indo ao ar em 1950. Ainda em 1949, ele seria apresentador e astro principal da série Apresentando Boris Karloff, que teria 13 episódios, cada um com uma história diferente e todos de terror, apresentados simultaneamente no canal de TV ABC e no rádio. Entre 1949 e 1953, ele também participaria de seis episódios da série de TV Suspense, que sempre trazia histórias nas quais seus protagonistas estavam em situações de vida ou morte.

Em 1950, ele retornaria ao teatro, interpretando o Capitão Gancho em Peter Pan. Também em 1950, ele estrearia um programa semanal na rádio novaiorquina WNEW; por incrível que pareça, era um programa infantil, durante o qual ele contava histórias e charadas, intercaladas com músicas infantis. Devido à sua fama, mesmo sendo um programa infantil, grande parte do público era de adultos. Entre 1951 e 1957, ele também estaria em três episódios da série de TV Lux Video Theatre, e, entre 1951 e 1958, estaria em três episódios da série Studio One.

Karloff voltaria ao cinema em 1951, com um papel secundário no terror O Tirano. No ano seguinte, em O Castelo do Pavor, ele interpretaria um convidado de um nobre austríaco dono de um castelo onde as pessoas desaparecem misteriosamente. Na TV, ele participaria de episódios das séries Schlitz Playhouse of Stars, Curtain Call e CBS Television Workshop, nesse último interpretando Dom Quixote. No teatro, ele estaria na peça A Andorinha, sobre a vida de Joana D'Arc, atuando ao lado de Christopher Plummer e Julie Harris; por sua atuação, Karloff seria indicado ao Tony Award, o mais importante prêmio da Broadway. Em 1953, ele estaria em mais episódios de séries de TV, participando de um episódio de Hollywood Opening Night e de dois cada de Robert Montgomery Presents, ABC Album e Tales of Tomrorrow (essa de ficção científica).

Em 1954, ele viajaria pela primeira vez para a Itália, para gravar O Monstro da Ilha, e para a Índia, onde gravaria Sabaka, O Demônio de Fogo. Também em 1954, ele ganharia o papel do protagonista na série de TV britânica Colonel March of Scotland Yard, interpretando, em 26 episódios, um investigador especializado em crimes considerados impossíveis; no primeiro episódio dessa série, Karloff contracenaria com outro grande nome do cinema de terror, Christopher Lee. Nos EUA, ele participaria de dois episódios da série Climax (que não tinha nada a ver com o filme de mesmo nome no qual ele já havia trabalhado) e, em 1955, participaria de um episódio cada das séries The Elgin Hour, The United States Steel Hour, The Alcoa Hour e The Best of Broadway, nessa última mais uma vez repetindo seu papel em uma refilmagem de Este Mundo é um Hospício. A Andorinha também seria adaptado, com Karloff repetindo seu papel, para um episódio exibido em 1957.

De 1955 a 1962, Karloff se dedicaria muito mais à TV que ao cinema; além de participar dessas séries todas, ele gravaria o filme para a TV A Connecticut Yankee, de 1955, no qual interpretaria o Rei Arthur, e seria um convidado regular nos programas de maior sucesso da NBC: o game show Who Said That?, no qual ele se posicionava em uma cabine e citava frases que os participantes tinham de adivinhar por quem foram ditas; The Gisele MacKenzie Show, no qual, em um dos episódios, ele cantou a canção Those Were the Good Old Days, dos Damn Yankees; e The Red Skelton Show, no qual ele participava de esquetes de comédia, em um deles recriando Frankenstein em versão cômica ao lado de outro dos maiores nomes do cinema de terror, Vincent Price.

Em 1958, Karloff participaria de dez episódios da série de TV The Veil, que jamais iriam ao ar porque a companhia que a produzia faliu; a série seria lançada em VHS na década de 1990, entretanto, e logo se tornaria cult. Entre 1958 e 1962, ele também estaria em um episódio cada das séries Suspicion, Telephone Time, The DuPont Show of the Month, The Dickie Henderson Show, Shirley Temple's Storybook (no qual interpretou um padre), The Gale Storm Show: Oh! Susanna (no qual apareceu como ele mesmo), Route 66 (no qual ele interpretou pela última vez o Monstro de Frankenstein, já aos 75 anos), em dois do General Electric Theater, e em três do Playhouse 90, além de gravar três filmes para a TV, um deles uma nova refilmagem de Este Mundo é um Hospício. Em 1960, ele se tornaria apresentador da série Thriller, que teria duas temporadas e 67 episódios, sempre com histórias de crime, mistério e horror. A série faria tanto sucesso que ganharia uma versão em quadrinhos, pela Gold Key Comics, com cada edição contendo uma introdução apesentada por um personagem desenhado à imagem de Karloff; a revista seria lançada em outubro de 1962 com o nome de Boris Karloff's Thriller, mas, na terceira edição, foi renomeada para Boris Karloff's Tales of Mystery, e seria publicada até fevereiro de 1980.

No final da década de 1950, Karloff faria alguns filmes de terror de sucesso moderado, como A Ilha do Terror (1957), O Estrangulador (1958), e Corredores de Sangue (também de 1958), no qual contracenaria mais uma vez com Lee. O principal destaque dessa época seria O Castelo de Frankenstein (também de 1958), curioso filme ambientado em 1970 no qual ele interpretaria o neto de Victor von Frankenstein, o criador do Monstro na história original, que, preso a uma cadeira de rodas e obcecado por repetir o experimento do avô, cria um monstro com seu próprio rosto; o filme, conhecido internacionalmente como Frankenstein 1970, não era muito bom e não fez muito sucesso, mas se tornaria famoso por ser o último filme de Frankenstein que Karloff faria no cinema. 

Karloff voltaria ao cinema com força total em 1963, com um gordo contrato com a American International Pictures, inaugurado com uma versão terrir (estilo não muito comum que mistura terror e comédia) de O Corvo, levemente baseado na obra de Edgar Allan Poe, dirigido por Roger Corman e no qual ele contracenaria mais uma vez com Price. No mesmo ano, ele faria mais um filme de Corman, Sombras do Terror; participaria do episódio O Wurdalak, do filme de terror em três segmentos Black Sabbath: As Três Máscaras do Terror, dirigido por Mario Bava; e estaria em mais um terrir, Farsa Trágica, dirigido por Jacques Tourneur e no qual ele contracenaria mais uma vez com Price, que interpreta um ladrão de sepulturas que, incapaz de continuar fornecendo corpos para seus clientes, decide "produzi-los", se é que vocês me entendem. Como parte do contrato com a AIP, ele faria uma pequena participação na comédia A Praia dos Biquínis, em 1964; no ano seguinte, ele interpretaria Naum Whitley em Morte para um Monstro, inspirado em A Cor que Caiu do Céu, de H.P. Lovecraft. Seu último filme com a AIP seria a comédia Fantasma de Biquini, de 1966.

Em 1966, Karloff voltaria à TV em três séries de grande sucesso: ele interpretaria um marajá em um episódio da série James West; vestido de mulher, fingiria ser a mãe da protagonista em um dos episódios de A Garota da U.N.C.L.E.; e, em um dos episódios de Os Destemidos, interpretaria um professor de literatura que acredita ser Dom Quixote. Ele também dublaria o famoso personagem Grinch no especial de Natal da CBS Como o Grinch Roubou o Natal; como o episódio foi gravado e lançado em disco de vinil, Karloff ganharia um Grammy Award de Melhor Álbum Infantil - curiosamente, porém, a principal canção do especial, You're a Mean One, Mr. Grinch, foi gravada não por Karloff, e sim pelo dublador norte-americano Thurl Ravenscroft, que não foi creditado nem no especial, nem no álbum, o que levaria a canção a ser creditada a Karloff em diversas ocasiões. Outro trabalho que costuma ser erroneamente creditado a Karloff é a voz de Tony, o tigre mascote dos Sucrilhos Kellog's; na verdade, o dublador original do personagem, um funcionário de uma agência de publicidade cujo nome se perdeu no tempo, era fã de Karloff, e tentou imitar sua voz ao dublar o comercial.

Além do disco do Grinch, Karloff gravaria vários outros dedicados ao público infantil, o primeiro, Three Little Pigs and Other Fairy Stories, lançado em 1962, mesmo ano no qual ele faria a voz do narrador em uma versão de Pedro e o Lobo com música da Orquestra da Ópera de Viena. Ao longo da década de 1960, ele lançaria Just So Stories, com histórias de Rudyard Kipling (o criador do Mogli); o disco de "histórias da Mamãe Ganso" Mother Goose Nursery Rhymes; The Hunting of the Snark, inspirado na obra de Lewis Carroll; e dois volumes da série Tales of the Frightened, que traziam histórias de terror para crianças. Sem ser para o público infantil, ele gravaria o papel principal de A Tragédia de Cimbelino, versão narrada em LP da obra homônima de William Shakespeare, lançada em 1962.

O Grinch também não seria o primeiro trabalho de dublagem de Karloff, que, também em 1966, mas antes do especial da CBS, dublaria um ratinho em No Mundo Encantado dos Sonhos; no ano seguinte, ele teria mais um trabalho de dublagem, como o Barão Boris von Frankenstein em A Festa do Monstro Maluco. Também em 1967, ele atuaria em Sob o Poder da Maldade, como um hipnotizador que cria um aparelho capaz de hipnotizar qualquer pessoa, mas que sua esposa decide usar para obrigar um jovem a cometer crimes, filme que seria considerado o último grande sucesso de sua carreira. Em 1968 ele faria uma nova participação em The Red Skelton Show, participaria de um episódio da série Os Audaciosos, e estrelaria o filme Na Mira da Morte, que trazia duas histórias separadas que convergiam no final, a de um rapaz com problemas mentais que mata toda a sua família e a de um ator de filmes de horror aposentado que decide aceitar um último papel; Karloff, evidentemente, interpretava o ator, personagem que o diretor Peter Bogdanovich planejou que fosse uma espécie de homenagem.

Diferentemente do personagem de Bogdanovich, porém, aos 80 anos, com dores quase insuportáveis nas costas - que fizeram com que, desde o início da década de 1960, vários de seus papéis no cinema fossem alterados para que ele pudesse gravar a maior parte de suas cenas sentado em uma cadeira de rodas - e sofrendo de enfizema pulmonar - que faria com que ele tivesse que usar cilindros de oxigênio nos intervalos das gravações - Karloff se recusava a se aposentar, e assinou um contrato para gravar quatro filmes com o produtor mexicano Luis Enrique Vergara: Serenata Macabra, A Câmara do Terror, A Serpente do Terror e Invasão Sinistra. As cenas envolvendo Karloff, em todos os quatro filmes, seriam filmadas em 1968 em Los Angeles, dirigidas por Jack Hill e em sequência, com os filmes sendo finalizados no México, e somente sendo lançados após a morte do ator, dois em 1970 e dois em 1971. Karloff também gravaria um filme espanhol, El Coleccionista de Cadáveres, em 1967, que também somente seria lançado após sua morte, em 1970.

Seu último filme lançado enquanto Karloff ainda estava vivo seria o excelente A Maldição do Altar Escarlate, de 1968, no qual ele contracenaria com Christopher Lee e Barbara Steele, no qual ele interpretava um especialista em ocultismo que investigava um culto de feitiçaria no interior da Inglaterra. Pouco após o final das filmagens, ele teria uma crise de bronquite, e seria hospitalizado no Hospital Rei Eduardo II, em Sussex, Inglaterra. Enquanto estava internado, Karloff desenvolveria uma pneumonia e não resistiria, falecendo no dia 2 de fevereiro de 1969, aos 81 anos. Atendendo a um pedido do próprio ator, seu corpo seria cremado, de forma que não existe túmulo para visitação, apenas uma pequena placa no cemitério de St. Paul, em Londres. Ao todo, ao longo de sua carreira, Karloff atuaria em 204 filmes.

Karloff seria casado oficialmente nada menos que seis vezes; seu primeiro casamento ocorreria ainda no Canadá, com uma colega de sua companhia de teatro, Grace Harding, com quem ele se casaria em 1910. O casamento duraria apenas até 1913 quando ela pediria o divórcio, alegando que ele era adúltero. Dois anos depois, em 1915, ele se casaria com outra atriz, Olive de Wilton, assim como ele, uma inglesa que morava no Canadá, com quem ficaria casado até 1919. Em 1920, ele se casaria com a norte-americana Montana Laurena Williams, de quem se divorciaria em 1922. Em 1924, se casaria com Helene Vivian Soule, com quem ficaria até 1928. Em 1930, se casaria com Dorothy Stine, de quem se separaria em 1946, para se casar no dia seguinte, numa capela em Las Vegas, com a melhor amiga de Stine, a atriz Evelyn Hope, com quem ficaria casado até sua morte. Tido como mulherengo e acusado frequentemente de adultério, Karloff pode ter tido um número indeterminado de amantes e concubinas - segundo Harding, entre 1913 e 1915 ele morou na mesma casa que a atriz Margot Beaton, embora nunca tivesse se casado oficialmente com ela.

Na década de 1940, um comediante começaria a se apresentar em Nova Iorque com o nome de "Tony Karloff, o filho de Boris Karloff"; nenhuma das ex-esposas de Karloff assumiria a maternidade, e Karloff, embora jamais tenha reconhecido a paternidade, jamais a negou, nem fez qualquer esforço para que o comediante tivesse de deixar de usar o nome ou de alegar que fosse seu filho. Para todos os efeitos, sua única filha, Sara Jane Pratt, nasceria de seu quinto casamento, com Dorothy Stine, no mesmo dia que o pai, 23 de novembro, mas em 1938; nesse dia, curiosamente, Karloff, que já tinha 51 anos, estava filmando O Filho de Frankenstein, e correu para o hospital ainda maquiado e vestido como o Monstro, inclusive assustando um transeunte no caminho. Ele sempre se referiria à filha como "o melhor presente de aniversário que já recebeu".

Sara mudaria legalmente seu nome para Sara Karloff, mas Karloff jamais o faria, assinando William Pratt até o fim de sua vida - quando fosse permitido, ele costumava assinar "William H. Pratt a.k.a. Boris Karloff" (sendo a.k.a. a abreviação de also known as, expressão em inglês que significa "também conhecido como"). Ele também nunca faria questão de se naturalizar norte-americano, permanecendo cidadão britânico até sua morte, mesmo tendo vivido a maior parte de sua vida nos Estados Unidos.

Na imaginação de muitos, graças a seu papel em Frankenstein, Karloff era um homem grande e forte, mas, na realidade, era bem magro e tinha 1,80 m, altura que não pode ser considerada excepcional. Na juventude, teve porte atlético, tendo jogado críquete pelo Enfield Cricket Club, de Londres, que ainda tem em suas paredes fotos do ator quando era jogador; uma foto sua disputando uma partida contra o também futuro ator C. Aubrey Smith decora uma das paredes de um dos mais famosos campos de críquete do mundo, o Lord's Cricket Ground, também em Londres, desde 2004 - tendo sido pendurada em ocasião da comemoração do primeiro título nacional do Sussex, time mais antigo do país, do qual Smith foi jogador. Outra grande honra póstuma recebida por Karloff é a de que ele é o único ator presente na estampa de três selos diferentes do serviço postal dos Estados Unidos, sendo dois deles na mesma série, a dos monstros clássicos da Universal, de 1997, na qual ele aparece como Frankenstein e Imhotep - os outros quatro selos dessa série trazem Lon Chaney como o Fantasma da Ópera, Lon Chaney, Jr. como o lobisomem, Bela Lugosi como Drácula, e Ben Chapman como o Monstro da Lagoa Negra. O terceiro selo, na verdade, pertencia a uma série de 2003 que homenageava profissionais da maquiagem, mas trazia Karloff sendo maquiado por Pierce.

Ao contrário de seus papéis, Karloff era um homem doce, gentil, extremamente educado, que adorava crianças - de 1940 a 1965, praticamente todo ano ele se vestiu de Papai Noel para entregar presentes a crianças hospitalizadas no Natal. Durante as filmagens de Frankenstein, ele faria amizade com a atriz Marilyn Harris, que interpretava a garotinha que se assusta com o Monstro na beira de um lago; os produtores temiam que, quando ela visse Karloff caracterizado como o Monstro, ficaria assustada, mas, assim que ele saiu do camarim, falou com ela, que reconheceu sua voz e correu para abraçá-lo, fazendo questão de ir no mesmo carro que ele até o local das filmagens - tanto Karloff quanto Marilyn contariam essa história em diversas entrevistas, com Marilyn sempre enfatizando que "andou de carro com o Monstro".

Apesar de sua extensa carreira, Karloff jamais beijou uma colega de elenco em nenhuma cena de seus filmes; muitos atribuem isso ao fato de que ele atuava majoritariamente em terror, mas outros atores do gênero, como Price e Lee, tiveram várias cenas de beijo, e até de sexo, durante suas carreiras. Karloff jamais se mostrou contra beijar em cena, e atribuía a falta de beijos em seus filmes ao fato de que, por suas características físicas, ele não era visto como branco, e beijos interraciais eram extra-oficialmente proibidos no cinema na época em que ele atuava.

Karloff foi membro fundador do Screen Actors Guild, que é tipo o sindicato dos atores dos Estados Unidos; na época, os atores eram praticamente explorados pelos estúdios, que queriam impedir a qualquer custo que um sindicato se formasse, e, para isso, chegaram a grampear o telefone da casa de Karloff; sabendo desse fato, ele passou a somente usar telefones públicos para tratar assuntos do sindicato, o que fazia com que ele sempre tivesse uma grande quantidade de moedas nos bolsos. Karloff também é uma das poucas celebridades que tem duas estrelas na Calçada da Fama de Hollywood, no caso, uma em homenagem a seus trabalhos no cinema, na Vine Street, outra em homenagem a seus trabalhos na televisão, na Hollywood Boulevard.

Para encerrar, uma curiosidade bizarra: quando Karloff faleceu, o jornal The New York Times usou uma foto do Monstro de Frankenstein para ilustrar a matéria que serviria de seu obituário - só que a foto não era de Karloff, e sim de Glenn Strange em A Mansão de Frankenstein.

2 comentários:

  1. Não imaginava que ele tinha feito isso tudo!A parada da foto do obituário foi sinistra!

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  2. Filmes de terror deste ator maravilhoso, assistia na minha infância, na TV com transmissão em preto e branco, apavorantes mas excelentes.

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