domingo, 9 de fevereiro de 2020

Escrito por em 9.2.20 com 0 comentários

Dragon's Lair

A primeira vez que eu tive conhecimento de que existia Dragon's Lair foi através de uma revista sobre videogames que eu comprava quando tinha uns 12 anos, chamada, muito apropriadamente, Videogame, que, em uma de suas edições, o trouxe na capa, se não me engano, porque naquela edição tinha um guia do jogo para NES. Algum tempo depois, descobri que existia um desenho de Dragon's Lair, que passava, se não me engano mais uma vez, na Bandeirantes; decidi assistir por curiosidade, e gostei muito. Na minha mente, a associação que eu fiz foi a mais óbvia: a de que primeiro existia o desenho, e o jogo foi feito baseado nele, assim como, por exemplo, Duck Tales.

Portanto, qual não foi minha surpresa, imaginem vocês, ao descobrir, muitos anos mais tarde, que foi exatamente o contrário: Dragon's Lair, na verdade, foi originalmente concebido para ser um jogo de arcades, e, na esteira de seu sucesso, foi produzido o desenho. Essa semana eu me lembrei dessa história, e, como é uma história interessante, achei que renderia um bom post. Assim, hoje é dia de Dragon's Lair no átomo!

Alguns de vocês podem achar que isso nem é tão interessante assim, já que, na década de 1990, também foram feitos desenhos baseados em games como Mario e Sonic, por exemplo, mas, na minha cabeça, Dragon's Lair não era famoso ao ponto de justificar um desenho - e, além do mais, foi um dos primeiros produzidos, sendo posterior apenas a Pac-Man, produzido pela Hanna-Barbera em 1982, e Saturday Supercade, programa produzido pela Ruby-Spears em 1983 que trazia segmentos baseados em Frogger, Donkey Kong, Pitfall e Q*Bert - mais uma vez, todos esses jogos são mais famosos que Dragon's Lair, portanto, antes que vocês perguntem por que exatamente Dragon's Lair recebeu a honra de virar desenho, basta saber que, ao contrário de todos os jogos citados até agora nesse post, Dragon's Lair praticamente já era um desenho.

Dragon's Lair foi uma criação de Rick Dyer, presidente da Advanced Microcomputer Systems. Para nós que moramos no Brasil, onde, até uns 25 anos atrás, tudo chegava atrasado, essa informação pode parecer um choque, mas, em 1978, seria lançado, nos Estados Unidos, o LaserDisc, uma espécie de CD do tamanho de um disco de vinil, que permitia a gravação não somente de músicas, mas também de vídeos. O LaserDisc usava exatamente a mesma tecnologia de leitura de dados por laser usada hoje em CDs e DVDs, podendo ser considerado um precursor de ambos - de fato, foi o aprimoramento da tecnologia do LaserDisc que levou ao lançamento do CD, em 1982, e é por causa da existência do LaserDisc que o CD se chama Compact Disc - ou seja, "disco compacto", porque ele é menor que o LaserDisc. O intuito do consórcio criador do LaserDisc, formado pela Philips, MCA e Pioneer, era que ele substituísse o videocassete, já que sua qualidade de imagem e som era muito superior à dos dois formatos existentes então, o VHS e o Betamax; o LaserDisc, porém, nunca conseguiu se firmar no mercado por dois motivos: primeiro, seus aparelhos (os LaserDisc Players) eram caríssimos se comparados aos videocassetes; segundo, era impossível gravar um LaserDisc sem uma máquina do tamanho de uma sala, o que significava que uma das características do videocassete mais populares dentre os consumidores, a de poder gravar os programas da TV para assistir depois, não existia nos LaserDisc Players. O LaserDisc seria um produto de nicho durante os anos 1980, experimentaria um boom de popularidade nos Estados Unidos durante os anos 1990, mas, com o lançamento dos DVDs, acabaria abandonado, com sua produção sendo oficialmente encerrada em 2001.

Quando ainda era uma novidade, entretanto, o LaserDisc sofreu experimentos nas mãos de diversas empresas, que estavam testando para o que mais ele serviria além de gravar filmes. Dentre essas empresas estava a Electro Sport, que inventou uma máquina de arcades chamada Quarter Horse, que, basicamente, era um simulador de apostas em corridas de cavalos - o jogador escolhia em qual cavalo queria apostar, e era exibido um vídeo de uma corrida, gravado no LaserDisc, para ver se o jogador acertava ou não; não havia qualquer tipo de prêmio por acertar, sendo tudo apenas por diversão - a própria máquina trazia o aviso for amusement only, "apenas para diversão". Lançado em 1981, Quarter Horse era bem ruinzinho, mas chamaria a atenção da Sega, que, em 1983, lançaria Astron Belt, considerado hoje o primeiro jogo lançado em LaserDisc, um shoot 'em up ("jogo de navezinha") no qual o jogador controla uma nave com a missão de se infiltrar no exército inimigo para destruir seu comandante, cujas imagens eram carregadas do LaserDisc para a memória, sendo muito mais detalhadas que as dos demais jogos da época.

Pois bem, Dyer viu Astron Belt em uma feira de tecnologia em 1982, e teve a ideia de produzir um jogo parecido, mas de aventura. No início da década de 1980, jogos de aventura para computador eram basicamente compostos apenas por textos, em um esquema parecido com os dos livros-jogos bem conhecidos pelos jogadores de RPG: o jogador ia lendo o texto e, em determinados momentos, podia tomar decisões, com cada decisão exibindo um texto diferente na tela do computador. Dyer teria a ideia de criar um jogo nesse estilo, mas que, ao invés de apenas texto, tivesse também imagens e músicas, que seriam acessadas no LaserDisc conforme o jogador fosse avançando. Dyer chamaria seu projeto de The Fantasy Machine (pois, trocando o LaserDisc, seria possível trocar a aventura, com cada máquina sendo capaz de rodar um número infinito delas), criaria sua primeira aventura, chamada The Secret of the Lost Woods, e a ofereceria a vários fabricantes. Todos eles recusariam.

A questão era que, por mais interessante que a ideia de Dyer fosse, a implementação não era a ideal: para todos os propósitos, The Secret of the Lost Woods era uma aventura de texto, só que com imagens e músicas, e os fabricantes não achavam que alguém iria querer ficar em pé durante horas, lendo, diante de uma máquina de arcades. Enquanto pensava em como poderia fazer para tornar seu projeto mais atraente aos olhos dos fabricantes e do público, Dyer decidiu ir ao cinema, assistir a um desenho conhecido em português como A Ratinha Valente (cujo título original em inglês é The Secret of NIMH, até bem parecido com o título do jogo que ele havia criado, talvez por isso ele tenha decidido assistir logo esse). Enquanto assistia ao desenho, Dyer teve uma epifania: para fazer sucesso, seu jogo deveria ter mais do que texto, imagens e música. Ele precisava ser um desenho animado, com a diferença de que o jogador poderia escolher seu destino, ao invés de apenas assisti-lo.

Dyer pegaria uma seção de The Secret of the Lost Woods, chamada The Dragon's Lair ("o covil do dragão") e começaria a trabalhar em como transformá-la em um desenho animado. Ele decidiria entrar em contato com Don Bluth, que já havia trabalhado para a Disney, e, não por acaso, era o diretor de A Ratinha Valente, para pedir dicas; Bluth ficaria tão empolgado com a ideia que os dois se tornariam amigos, e ele se ofereceria para fazer a animação do jogo. Como o orçamento do projeto era extremamente limitado, cerca de 1,3 milhão de dólares, Dyer e Bluth decidiriam fazer um desenho de um pouco menos de dez minutos - que, nas mãos dos jogadores, levando em conta morrer e retornar de checkpoints, poderia levar quase uma hora para ser concluído. Nem todas as cenas criadas para o desenho fariam parte da versão final; em alguns vídeos de divulgação e em um protótipo usado para testes, podem ser vistas pelo menos três cenas que não estão em lugar nenhum do jogo. O porquê de elas terem sido descartadas jamais foi divulgado oficialmente.

Na época, o método de animação mais comum consistia em filmar ou fotografar atores em determinadas posições para servir de modelo para os personagens do desenho. Com o orçamento apertado, os próprios animadores tiveram que posar para os papéis do herói do jogo, o cavaleiro Dirk, o Ousado (Dirk the Daring no original em inglês), e para um dos vilões, o Rei Lagarto; a princesa que seria salva por Dirk, conhecida como Princesa Daphne, teria como modelos várias garotas que os animadores encontraram em fotos da revista Playboy - segundo Bluth, sua principal fonte de inspiração para a aparência e as, digamos, medidas de Daphne seria a atriz Marilyn Monroe. Também para cortar custos, ao invés de serem contratados dubladores, as vozes dos personagens seriam feitas pelos próprios funcionários do estúdio - a voz de Dirk é do editor Dan Molina, que depois se transferiria para a Disney, onde voltaria a dublar em 2005, no papel do Peixe Fora D'Água de O Galinho Chicken Little; e a voz de Daphne seria da arte-finalista Vera Lanpher. Somente um dublador profissional seria contratado, o narrador Michael Rye. A trilha sonora e os efeitos sonoros ficariam a cargo de Chris Stone, da EFX Systems, amigo de Dyer.

O momento escolhido para o lançamento de Dragon's Lair não seria dos melhores: em 1983, o mercado de videogames entraria em depressão, com as vendas de consoles caindo assustadoramente, e uma previsão de que entre 25 e 50% de todos os arcades ("fliperamas") dos Estados Unidos iriam fechar antes do final do ano. Ainda assim, Dragon's Lair era uma novidade tão grande que Dyer não teve dificuldade nenhuma em conseguir um acordo com a Cinematronics, uma das principais empresas de arcades da época, responsável por sucessos como Armor Attack, Solar Quest e Tail Gunner, que, de quebra, conseguiu um acordo com a Pioneer para a produção dos gabinetes - cada gabinete seria equipado com um LaserDisc Player modelo LD-V1000 ou PR-7820, e cada jogo seria gravado em um LaserDisc especial, com apenas um lado gravável, sendo o outro reforçado com metal, para evitar que amassasse em caso de queda, algo infelizmente comum nos LaserDiscs.

Dragon's Lair seria lançado nos Estados Unidos em 19 de junho de 1983. No mesmo ano, ele seria lançado na Europa, não pela Cinematronics, mas pela Atari, que também o lançaria no ano seguinte na Austrália e Japão. Os modelos lançados na Europa tinham LaserDisc Players fabricados pela Philips, mais baratos por lá que os Pioneer; como esses LaserDisc Players usavam sistema PAL, e não o NTSC dos Estados Unidos, a Philips também teve de regravar os discos, usando uma matriz fornecida pela Cinematronics. Os discos da Philips também tinham apenas um lado gravável, mas não contavam com o reforço de metal do outro lado.

Desde seu lançamento, Dragon's Lair seria um sucesso monstruoso. Devido à tecnologia envolvida, cada crédito tinha que custar 50 cents, o dobro de um jogo de arcade comum, mas, mesmo assim, havia sempre filas para jogá-lo - imaginem a surpresa dos jogadores, acostumados com gráficos compostos por poucos pixels e com músicas monofônicas ao ver um jogo que era praticamente um desenho animado. O sucesso de Dragon's Lair era tão grande que a Cinematronics começou a produzir gabinetes com duas telas, uma na altura dos olhos do jogador, outra bem mais acima, para que quem estivesse na fila também pudesse assistir o desempenho de quem estava jogando. No auge da popularidade do jogo, estimava-se que cada jogador gastava em média 40 dólares antes de perder o interesse.

Infelizmente, esse sucesso todo também exigia muito dos LaserDisc Players: originalmente, eles foram projetados para ler um disco em sequência, do início ao fim, mas a natureza do jogo exigia que o canhão de laser ficasse indo e voltando, lendo vários trechos do disco fora de ordem, e as filas de jogadores ávidos faziam com que eles trabalhassem ininterruptamente, muitas vezes durante mais de 10 horas por dia, enquanto um filme normalmente leva cerca de duas. Isso fazia com que os LaserDisc Players, que inicialmente tinham vida útil de 50 mil horas de reprodução, quebrassem após cerca de 650 horas, com várias máquinas ficando inoperantes - muitas vezes em meio a uma sessão de jogo - e tendo de ter seu LaserDisc Player trocado com uma frequência que a Cinematronics não conseguia dar conta - provavelmente, a Cinematronics comprou mais LaserDisc Players da Pioneer que todos os consumidores domésticos somados. E isso não era um defeito dos Pioneer: na Europa, Austrália e Japão, os LaserDisc Players da Philips eram tão exigidos quanto os Pioneer nos Estados Unidos, e quebravam com a mesma frequência.

Dragon's Lair praticamente salvou os arcades da falência sozinho - estima-se que, em um ano, ele rendeu mais de 100 milhões de dólares, quantia absurda para a época, dos quais 32 milhões foram declarados como lucro pela Cinematronics, o que fez com que esse fosse seu jogo mais lucrativo - mas, como se diz, tudo o que vem fácil, vai fácil: no final de 1984, jogos ao estilo desenho animado em LaserDisc já não eram novidade, e até mesmo o jogo seguinte produzido por Dyer e Bluth, Space Ace, foi um imenso fracasso. Enquanto estava na crista da onda, porém, Dragon's Lair deu origem a diversos outros títulos parecidos, que também usavam LaserDiscs (dentre os quais se destacam Cobra Command, lançado em 1984 pela Data East, e Time Gal, lançado em 1985 pela Taito), vendeu uma tonelada de merchandising, foi adaptado para dezenas de versões caseiras, e deu origem ao desenho animado do qual eu falei lá no início do post - e que será abordado em breve. Antes, acho que cabe explicar a história e como se joga Dragon's Lair - ok, é um jogo que parece um desenho animado, mas e daí?

A história do jogo é bem simples: você controla, como já foi dito, o cavaleiro Dirk, o Ousado, que é corajoso mas um tanto atrapalhado, e tem que invadir um castelo para resgatar sua amada, a gostosa, digo, bela Princesa Daphne, sequestrada por um dragão (que em nenhum lugar do jogo tem nome, mas, depois, descobriremos que se chama Singe, que é algo como "queime" em inglês). Dirk não é controlado diretamente pelo jogador, e sim indiretamente: o gabinete conta com um direcional e um botão, e, enquanto assiste ao desenho, o jogador deverá mover o direcional ou apertar o botão de acordo com as instruções que aparecem na tela - ou seja, se aparecer um ícone com uma seta para a direita, o jogador deve colocar o direcional para a direita, se aparecer um ícone com uma espada, ele deve pressionar o botão, e assim por diante. Depois que a instrução é dada, o jogador tem cerca de um segundo para cumpri-la; se o fizer corretamente, o desenho avança para a cena seguinte, se não, é mostrada uma cena de morte (e Dirk pode morrer de mais de vinte formas diferentes, dependendo da cena em que o desenho está) com Dirk retornando do início da cena em que morreu. Dirk começa o jogo com cinco vidas, e, ao perder todas, o jogador deve colocar mais um crédito para poder dar continue.

Ao todo, incluindo as cenas de game over, o desenho tem cerca de dez minutos; jogá-lo inteiro do início até o final sem morrer nenhuma vez também leva cerca de dez minutos, mas porque algumas cenas são repetidas ou espelhadas - em um determinado momento, por exemplo, Dirk pula um buraco da direita para a esquerda, aí mais no final do jogo ele pula o mesmo buraco, mas da esquerda para a direita. O desenho é de altíssima qualidade, não deixando nada a dever a um Clássico Disney, e contém cenas memoráveis, como a da armadura de cavalo voadora, a do rio subterrâneo, a do Rei Lagarto, a da sala do chão quadriculado, e, evidentemente, a do resgate de Daphne no final. Além de bem bonito, o desenho também é bem engraçado, embora rir possa ser uma distração fatal.

Quando eu disse "dezenas de versões caseiras", eu não estava exagerando: em 1984, Dragon's Lair seria lançado para o computador Coleco Adam; em 1986, para Amstrad CPC, ZX Spectrum e Commodore 64; em 1989, para Amiga e MS-DOS; em 1990, para Atari ST e MacOS; em 1993, ele seria um dos principais jogos do Sega-CD, acessório lançado para que o Sega Genesis (Mega Drive no Brasil) pudesse rodar jogos em CD-ROM; em 1994, seria lançado para 3DO e Philips CD-I; em 1995 para o Atari Jaguar; em 1997 para Windows; em 2000 para Playstation 2 e Game Boy Color; em 2001 para Xbox; em 2007 para Playstation 3 e Xbox 360; em 2009 para Nintendo DS; em 2010 para Wii; em 2011 para PSP e Nintendo 3DS; em 2017 para Playstation 4; e em 2019 para Nintendo Switch e Xbox One. Todas essas versões são bem fiéis à do arcade, em gráficos e em jogabilidade (excetuando limitações gráficas, como nas do ZX Spectrum, Sega-CD e Game Boy Color); as versões caseiras, entretanto, costumam ser consideradas mais "fáceis", pois as instruções ficam um pouco mais de tempo na tela, e o tempo para o jogador reagir a elas também é maior.

As versões caseiras não seriam produzidas pela Advanced Microcomputer Systems, e sim por empresas licenciadas. As versões Amstrad CPC, ZX Spectrum e Commodore 64 seriam produzidas pela Software Projects, que, em 1986, pediu autorização para lançar um novo jogo para esses três computadores. Chamado Escape from Singe's Castle (extra-oficialmente conhecido como Dragon's Lair Part II), o jogo tem o mesmo esquema do original, com as cenas se sucedendo conforme o jogador executa comandos, mas, ao invés de um desenho animado, trazia cenas animadas com gráficos de 8 bits, como se fossem cut scenes; lançado em 1987, o jogo tem como enredo o retorno de Dirk ao castelo para pegar um pote de ouro (sabe-se lá o porquê). Em 1991, o jogo seria lançado também para Amiga, Atari ST, MS-DOS e Mac OS, produzido pela Readysoft, mas apenas o título seria idêntico: assim como no primeiro jogo (e, talvez, desconsiderando sua existência), a missão de Dirk no castelo é salvar Daphne, e todas as cenas animadas, feitas em gráficos de 16 bita, são diferentes das do jogo da Software Projects.

Em 1990, seria lançada uma versão de Dragon's Lair para o NES, produzido pela Motivetime e lançado pela CSG Imagesoft. Ao invés de uma versão do jogo original, porém, a do NES era um jogo totalmente novo, e de plataforma, ao estilo, digamos, de Castlevania. Dirk ataca seus inimigos não com sua espada, mas com armas de arremesso - no início do jogo, são adagas, mas, pegando itens, ele passa a arremessar machadinhas, bumerangues e outros tipos de arma. Todos os gráficos são feitos com sprites, e o de Dirk é enorme, bem diferente do padrão para a época. Além de se mover para a direita e esquerda (bem lentamente) e de arremessar armas, Dirk pode pular e se agachar; enquanto está agachado (o que é obtido pressionando o direcional para baixo), Dirk também pode se mover para a direita e esquerda e atacar (devendo o jogador pressionar o direcional para cima para que Dirk fique de pé novamente). Ao todo, o jogo tem sete fases, mais uma fase secreta na qual Dirk deve enfrentar o Rei Lagarto; ao final da sétima fase, Dirk enfrenta Singe e salva Daphne. Apesar de imensamente aguardado, o jogo seria extremamente criticado, sendo hoje considerado um dos piores jogos de NES de todos os tempos; dentre os principais motivos estão a lerdeza de Dirk, a extrema dificuldade das fases, e o fato de que Dirk não tem energia, morrendo instantaneamente assim que qualquer inimigo o toca. A Motivetime tentaria corrigir esses erros nas versões japonesa (lançada em 1991) e europeia (lançada em 1992), que possuem 256 kB de memória ao invés dos 128 kB da norte-americana; nelas, Dirk se move mais rapidamente e conta com um "medidor de armadura", que vai diminuindo conforme ele recebe dano, com uma vida só sendo perdida se Dirk já não tiver mais armadura quando for atingido - em compensação, novos inimigos foram adicionados a algumas fases, incluindo um chefe na primeira fase, que não tinha nenhum, e a dificuldade geral do jogo continua a mesma. As versões japonesa e europeia também contam com cut scenes exclusivas.

Em 1991, a Elite Systems produziria Dragon's Lair: The Legend para o Game Boy, também lançado pela CSG Imagesoft. Curiosamente, nesse jogo, não há castelo nem dragão, com Daphne sendo sequestrada pelo mago maligno Mordroc (que, alguns anos depois, descobriríamos ser o dono do castelo invadido no primeiro jogo). Para salvá-la, Dirk tem de recuperar os 194 fragmentos da Life Stone, espalhados pelo mundo por um feitiço. Bizarramente, o jogo não tem nenhum inimigo, e, portanto, Dirk não tem armas, podendo apenas se mover para a direita, a esquerda, e pular; seu objetivo é evitar perigos como espinhos, água com correnteza e buracos enquanto recolhe os fragmentos da Life Stone, até chegar na última tela do jogo, onde Mordroc será derrotado e Daphne será resgatada. Mais bizarramente ainda, o jogo não traz nenhuma indicação na tela quanto à energia e vidas restantes de Dirk, nem de quantos fragmentos da Life Stone já foram coletados, com essas informações só aparecendo na tela quando Dirk perde uma vida. Dirk começa o jogo com dez vidas, e perde uma toda vez que cai em um buraco, toca em espinhos, cai na correnteza, ou quando sua energia se esgota, perdendo energia quando é tocado por pedras, raios e outros perigos - e não sendo possível jamais recuperar energia. Não existem continues, com o jogador tendo de recomeçar do início caso perca as dez vidas. Ao todo, o jogo tem 11 fases. Um dos motivos de o jogo ser como é é que ele, na verdade, é uma versão modificada do jogo Roller Coaster, lançado em 1985 para o ZX Spectrum, que era um simulador de parque de diversões - se o jogador prestar atenção, vai reparar que, apesar da estética medieval, existem vários elementos que claramente eram montanhas-russas, rodas gigantes e carrinhos de bate-bate. Assim como o jogo do NES, Dragon's Lair: The Legend foi considerado um dos piores jogos de Game Boy de todos os tempos.

Também em 1991, Dragon's Lair ganharia sua primeira continuação "oficial", criada inteiramente por Bluth - Dyer decidiria se dedicar a jogos em CD-ROM, renomeando sua empresa para RDI Video Systems, e não se interessaria em trabalhar na sequência. Dez anos depois dos eventos de Dragon's Lair, Dragon's Lair II: Time Warp, lançado pela Leland Corporation, começa com Dirk e Daphne casados e com dez filhos; Mordroc decide sequestrar Daphne para se casar com ela, e Dirk deve seguir mais uma vez para o castelo, para salvá-la. Ao invés de se aventurar pelo castelo, porém, Dirk se aventurará pela história, com a ajuda de uma máquina do tempo falante, que o levará a vários períodos reais e fictícios em busca do mago. Ao ver que está prestes a ser derrotado, Mordroc põe um anel no dedo de Daphne que a transforma em um monstro, com Dirk tendo de removê-lo sem ferir sua amada. Mas espere! Depois disso tudo, o castelo começa a desmoronar, e Dirk e Daphne têm de fugir se não quiserem ter o mesmo destino de Mordroc, que morre soterrado. Michael Rye retornaria como narrador, e Dan Molina e Vera Lanpher repetiriam seus papéis como Dirk e Daphne; todas as outras vozes do desenho, incluindo Mordorc, a máquina do tempo, a mãe de Daphne e a Rainha de Copas, seriam feitas pelo dublador profissional Hal Smith.

Time Warp segue o mesmo estilo do Dragon's Lair original, sendo um desenho animado que avança conforme instruções realizadas pelo jogador. A produção do desenho começou em 1984, mas o fracasso de Space Ace e a falência da Cinematronics fariam com que ela fosse suspensa, só sendo retomada em 1988, quando Bluth fundaria uma empresa chamada Don Bluth Multimedia especialmente para produzi-lo. O desenho tem a mesma qualidade do primeiro, mas é mais comprido, tendo cerca de vinte minutos; terminá-lo sem morrer nenhuma vez, entretanto, mais uma vez leva cerca de dez minutos - isso porque, diferentemente do que acontecia em Dragon's Lair, em Time Warp nenhuma cena se repete, sendo todas as cenas do jogo únicas. Aliás, Time Warp tem três diferenças fundamentais em relação a Dragon's Lair: primeiro, ele é dividido em oito fases - na primeira, Dirk foge da ira de sua sogra até chegar no castelo, ao pegar a máquina do tempo, ele passa pela Pré-História, pelo mundo de Alice Através do Espelho, pelo Jardim do Éden, pela casa de Ludwig van Beethoven enquanto ele compõe uma sinfonia, pelo Egito Antigo, volta para o castelo, onde enfrentará a Daphne-monstro, e, na oitava, deve empreender sua fuga. Segundo, ao morrer, Dirk não volta do início da cena onde estava, e sim do início da fase, o que é meio frustrante. Terceiro, não há mais os ícones na tela, e sim instruções muito mais sutis: se a espada de Dirk brilhar, deve ser apertado o botão; se um objeto qualquer no canto direito da tela brilhar, deve ser pressionado o direcional para a direita, e assim por diante.

Outra característica de Time Warp é que, nas fases de 2 a 6, em determinados momentos, surgem na tela tesouros secretos, que Dirk deve pegar (pressionando o direcional na direção do tesouro antes de executar o comando que brilha na tela) para poder acessar a fase 7. Se deixar de pegar algum tesouro, ao final da fase 6 aparece um aviso na tela, e o jogo retorna do início da fase onde está o primeiro tesouro que Dirk não pegou. Isso é bastante irritante, principalmente porque o tesouro da fase do Beethoven é quase impossível de se pegar. Na verdade, isso foi uma invenção da Leland, já que, no planejamento original de Bluth, pegar os tesouros seria opcional, mas daria acesso a um final alternativo, no qual Dirk derruba o anel da mão de Mordroc antes de ele colocá-lo no dedo de Daphne, não precisando enfrentar a Daphne-monstro nem fugir do castelo desabando. Algumas versões caseiras dão a opção de jogar a "Director's Cut", modo de jogo que possui essa regra.

Talvez por ser mais difícil que o primeiro jogo, talvez por já não ser novidade quando foi lançado, Time Warp não fez muito sucesso, sendo considerado hoje o mais fraco dos três jogos da "Trilogia Don Bluth" (Dragon's Lair, Space Ace e Time Warp). Time Warp ganharia versões caseiras para Atari ST, Amiga, MS-DOS, MacOS, Philips CD-I, Windows, Playstation 3, Wii, Nintendo DS, Playstation 4, Xbox One e Nintendo Switch.

Em 1993, a Don Bluth Multimedia produziria uma versão exclusiva de Dragon's Lair para MS-DOS. Chamado Dragon's Lair 3: The Curse of Mordread e lançado pela Readysoft, o jogo colocava Dirk contra a irmã de Mordroc, chamada Mordread, que, querendo vingança pela morte do irmão, aprisionaria a casa do cavaleiro em um globo mágico, com Daphne e seus filhos lá dentro. Dirk, então, parte em uma jornada através do tempo para encontrar Mordread e recuperar sua família. A existência de uma nova viagem no tempo no enredo se deve ao fato de que o jogo é composto por duas fases que não foram incluídas na versão MS-DOS de Time Warp por falta de memória (Alice e Beethoven), mais três fases inéditas - uma originalmente planejada para fazer parte de Time Warp e depois descartada para que o jogo não ficasse muito comprido (no navio do pirata Barba Negra) e duas produzidas especialmente para esse jogo (não por acaso, a primeira e a última). Diz a lenda que Bluth teria decidido produzir esse jogo por ter ficado revoltado com a Digital Leisure, empresa responsável pela versão MS-DOS de Time Warp, que não incluiu as duas já citadas fases nela. Além de para MS-DOS, a Readysoft, que já tinha experiência com os sistemas, decidiria lançar The Curse of Mordread também para Amiga e Atari ST. The Curse of Mordread tem o mesmo estilo de jogo de Time Warp, com o jogador tendo que pressionar o direcional ou o botão de acordo com qual objeto que brilha na tela, mas as fases não possuem os tesouros especiais.

Também em 1993, a Motivetime produziria um Dragon's Lair para o Super Nintendo, lançado pela Data East. Assim como o do NES, era um jogo de plataforma, mas, aparentemente, a Motivetime aprendeu com seus erros: Dirk era bem mais ágil e veloz, usava como arma principal sua espada (embora ainda tivesse armas de arremesso, usadas como armas secundárias) e tinha uma energia, representada por escudos, que podia ser recarregada com itens. O jogo tem apenas quatro fases, cada uma com um chefe ao final, mas cada fase é dividida em subfases bem diferentes entre si, intercaladas por um mapinha que mostra a posição no castelo onde Dirk está, então, na prática, são 20 fases e quatro chefes. O jogo é muito mais "jogável" e tem gráficos muito mais bonitos que o do NES, mas é igualmente difícil e frustrante, tendo sido igualmente criticado; não chega a ser considerado um dos piores do Super Nintendo, mas também não tem muitos fãs.

No início dos anos 2000, alguns amigos de Bluth fundariam a Dragonstone Software, que produziria uma nova versão de Dragon's Lair para Windows, Xbox, GameCube e Playstation 2, chamada Dragon's Lair 3D: Return to the Lair, e lançada em 2002 pela UbiSoft. Trata-se de uma adaptação do jogo original de 1983, mas, ao invés de simplesmente acompanhar o desenho e executar instruções, o jogador tem total controle sobre os movimentos de Dirk, que é acompanhado por detrás do personagem, como em, por exemplo, Tomb Raider. Os gráficos do jogo usam cell shading, sendo parecidos com os de um desenho animado, e as fases seguem mais ou menos a mesma ordem do jogo original, mas com novas salas, inimigos e quebra-cabeças, sendo o jogo muito mais desafiador. Bluth produziria duas novas sequências de animação, para o início e o final do jogo. Além de sua espada, Dirk tem acesso a uma besta (aquele arco que dispara flechas com um gatilho) e a magias, realizadas através de Dragon Essences recolhidas durante as fases; Dirk também conta com uma barra de energia, somente perdendo uma vida quando ela se esgota, e uma barra de mana, usada para realizar magias. Espalhados pelas fases também estão 100 tesouros secretos, que dão acesso adicionais, como skins, quando recolhidos. Ao todo, o jogo conta com sete fases, cada uma com um chefe; o último chefe, porém, não é Singe como no jogo original e sim Mordroc - na primeira vez em que Dirk e Mordroc realmente se enfrentam.

O último jogo de Dragon's Lair lançado até hoje é Dragon's Lair III, produzido e lançado pela Digital Leisure para Windows em 2004. Basicamente, é uma versão de Dragon's Lair 3D na qual o jogador deve pressionar comandos como no Dragon's Lair original e em Time Warp, ao invés de controlar Dirk livremente - na melhor descrição que eu já li, "pegaram a filmagem de alguém jogando Dragon's Lair 3D, adicionaram ícones piscando na tela e disseram que era um jogo interativo". O lançamento de Dragon's Lair III se deveu a algum imbróglio jurídico entre Bluth e a Digital Leisure, aparentemente por causa do lançamento de The Curse of Mordread, mas eu não consegui entender direito os detalhes, nem encontrei fontes que os explicassem melhor. Seja como for, o jogo foi universalmente criticado, e teve baixíssimas vendas.

Antes que eu me esqueça, vamos falar do desenho, que foi um dos motivos de eu ter decidido escrever esse post. No auge da popularidade do Dragon's Lair original nos arcades, a Ruby-Spears procuraria Dyer e Bluth, interessada em criar uma série animada para ser exibida aos sábados pela manhã no canal ABC. Bluth aceitou, mas preferiu não se envolver com esse projeto, deixando tudo a cargo dos animadores da Ruby-Spears. O desenho é uma espécie de continuação do jogo, com Daphne já tendo sido libertada do castelo - mas ainda não estando casada com Dirk, sendo apenas seu interesse amoroso. Dirk vive várias aventuras no reino, algumas envolvendo o castelo e Singe (que ganhou esse nome para o desenho), outras não. Além de Dirk, Daphne e Singe, o desenho conta com personagens originais, que não estavam no jogo: o cavalo de Dirk, Bertram; o pai de Daphne, Rei Ethelred; o escudeiro Timothy; e Sir Hubert Blunt, cavaleiro que considera Dirk uma farsa e quer desmascará-lo; o Rei Lagarto e o Cavaleiro Fantasma, inimigos de fase no jogo, também aparecem no desenho.

Ao todo, o desenho teve 13 episódios, exibidos entre 8 de setembro e 1 de dezembro de 1984. Para estabelecer uma ligação com o jogo, a cada episódio, sempre antes da pausa para os comerciais, Dirk tinha uma decisão a tomar, e o narrador perguntava ao público "o que você faria?", com a decisão de Dirk sendo mostrada assim que o desenho retornava. O desenho fez um relativo sucesso, mas nada de excepcional, o que levou a ABC a não encomendar uma segunda temporada. Em 2003, o desenho seria adaptado para uma série em quadrinhos, lançada pela editora CrossGen, que não fez muito sucesso e teve apenas três edições publicadas; em 2006, a Arcana Studio aproveitaria alguns roteiros não usados pela CrossGen e lançaria uma nova série, de 4 edições.

Desde o lançamento do jogo original, porém, um dos sonhos de Bluth é produzir um longa-metragem de Dragon's Lair para os cinemas. Em 1984, um roteiro chegou a ser escrito por Alan Dean Foster, mas Bluth não tinha o capital para desenvolver o desenho com sua própria equipe, e nenhum estúdio se interessou em financiá-lo e distribuí-lo, o que fez com que o projeto fosse suspenso indefinidamente. Em 2015, Bluth e Gary Goldman iniciaram uma campanha no site Kickstarter para tentar financiar o projeto, mas não conseguiu atingir sua meta; no mesmo ano, eles decidiriam iniciar uma campanha em outro site, o Indiegogo, e dessa vez conseguiram o dobro do que estabeleceram como meta. Desde 2016, segundo Bluth, o desenho está "em produção", mas não há mais detalhes sobre em que etapa do desenvolvimento ele estaria.

Enquanto ele não sai, Dirk e Daphne aproveitam sua vida de casados. Fazendo dez filhos.

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