segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Escrito por em 17.2.14 com 1 comentário

Trenó

Em época de Olimpíada de Inverno, sempre me dá vontade de escrever sobre algum esporte de inverno. Da última vez, foi sobre esqui. Hoje, eu vou escrever sobre trenó.

BobsledBem, na verdade, não existe um esporte chamado "trenó". Esse foi só o título genérico que eu arrumei para reunir três esportes que usam trenós - o bobsled, o luge e o skeleton. Na Europa, os três são coletivamente conhecidos como tobogã, mas eu achei que esse nome podia dar uma ideia errada sobre o assunto do post. Seja como for, chega de frivolidades, e vamos a um post sobre o trenó esportivo.

Trenós são usados pela humanidade praticamente desde sempre: lá no antigo Egito, por exemplo, eles eram usados para carregar as pedras enormes que seriam usadas para construir as pirâmides e outros monumentos. Em países frios e cheios de neve e gelo, como os escandinavos, trenós eram o equivalente das carroças, sendo puxados por cães ou cavalos - ou, conforme a lenda do Papai Noel, renas - para levar pessoas e cargas de um lado para o outro. Não demoraria muito, portanto, para alguém com espírito esportivo decidir subir em um trenó e descer uma montanha montado nele, tentando fazer o percurso no menor tempo possível.

Os registros das primeiras "corridas de trenó", no qual cada um montava no seu e disputava quem chegava primeiro - e vivo - datam do Século XV, na Noruega. Essas corridas, entretanto, eram disputadas apenas por recreação, sem nenhum registro de que houvesse campeonatos de trenó ou competições esportivas. O uso do trenó no esporte só começaria bem mais tarde, no final do Século XIX.

Na época, o uso do trenó para descer montanhas e se divertir já tinha se espalhado para outros países nevados, como Áustria e Suíça. Como na Suíça também estava na moda andar de esqui, o empresário Caspar Badrutt teve a ideia de criar um resort de inverno, na cidade de Sankt Moritz - mesma que, mais tarde, seria sede das Olimpíadas de Inverno de 1928 e 1948. Resorts não eram exatamente uma novidade no final do Século XIX, mas todos os que existiam eram de verão - hotéis em locais ensolarados para onde os europeus poderiam fugir no inverno e praticar atividades como natação, esqui aquático e esportes de praia. A ideia de Badrutt era fazer a mesma coisa, mas na neve, oferecendo quartos aconchegantes, comida farta e locais apropriados onde os hóspedes pudessem esquiar e andar de trenó.

Inaugurado em 1870, o resort de Badrutt se tornou um grande sucesso, mas acabou criando um problema inesperado para a cidade: achando que as pistas oficiais, construídas tendo o esqui como referência, não eram desafiadoras o bastante, alguns jovens ingleses começariam a andar de trenó pelas ruas da cidade - cheia de ladeiras que, no inverno, ficavam escorregadias com a neve e o gelo - colocando os pedestres em risco. Não aguentando mais ouvir reclamações dos moradores de St. Moritz, mas também não querendo perder seus hóspedes ingleses, que eram os que mais davam retorno financeiro, Badrutt decidiria construir uma pista própria para trenó, que imitasse as características das ruas da cidade.

Assim surgiria a Descida de Cresta, assim chamada por ficar dentro dos limites do vilarejo de Cresta, vizinho a St. Moritz. Com 1.212,5 metros de comprimento, dez curvas e aberta ao público em 1884, a Descida de Cresta, que existe até hoje - e foi a pista oficial de skeleton das duas Olimpíadas disputadas em St. Moritz - foi a primeira das modernas pistas de competição de trenó, e permitiu que o esporte se desenvolvesse realmente como tal, com competições oficiais ao invés de meras brincadeiras. Mais que isso, foi graças à Descida de Cresta que surgiria, em 1887, o SMTC, o Clube de Trenó de St. Moritz, primeira entidade dedicada a codificar os esportes que se valessem de um trenó.

O primeiro dos três esportes de trenó a surgir foi o luge. A principal característica do luge, que o diferencia dos outros esportes de trenó, é que, nele, o atleta se posiciona deitado de costas, com a barriga para cima (posição também conhecida como decúbito dorsal ou supino) e os pés voltados para a frente do trenó. Essa posição advém do fato de que o luge é uma evolução natural das primeiras corridas de trenó, nas quais os competidores se posicionavam sentados com os pés voltados para a frente do trenó - exatamente como os que desciam de trenó somente por diversão. Deitado, o atleta cria menos atrito com o ar, permitindo que o trenó alcance uma velocidade maior do que se seu condutor estivesse sentado.

O luge surgiu antes mesmo da Descida de Cresta, quando seus adeptos ainda competiam pelas ruas de St. Moritz. No início, os trenós usados tanto para diversão quanto para competição eram idênticos aos usados para transporte, o que significa que mudar a direção para onde eles estavam indo era extremamente difícil - assim como freá-los, o que costumava ser feito tirando os pés do trenó e colocando-os no chão - já que, normalmente, os trenós eram compostos de um bloco rijo de madeira ao qual as lâminas eram aparafusadas. Para poder descer melhor pelas ruas da cidade sem trombar com os meios-fios e outros obstáculos, seus praticantes começaram a desenvolver mecanismos através dos quais os trenós pudessem ser guiados e freados com mais facilidade, o que acabou levando a mudanças no design dos próprios trenós, até se chegar ao modelo que existe hoje. Como muitas dessas mudanças foram introduzidas simultaneamente, não há como precisar quem teria sido o "inventor" do trenó de luge.

Com a inauguração da Descida de Cresta, os praticantes do luge começaram a usá-la para suas competições, embora ainda usando apenas o nome "trenó" ou "tobogã". A primeira menção ao nome "luge" data apenas de 1905; a palavra "luge", no dialeto da Sabóia, região que hoje fica na França, mas já foi disputada historicamente por França, Suíça e Itália, significa, simplesmente, "trenó". Talvez porque alguma pessoa influente do esporte fosse de lá, esse seria o nome escolhido para batizar o esporte quando, em 1913, foi fundada, na Alemanha, a Federação Internacional de Esportes de Trenó, que regulou o luge até 1935, quando foi absorvida pela Federação Internacional de Bobsled e Tobogã, que, por sua vez, foi responsável pelo esporte até 1957, quando, graças a uma disputa entre os representantes do luge e do skeleton, os do luge decidiram sair e criar sua própria federação, a Federação Internacional de Luge (FIL), que regula o esporte até hoje. Contando com apenas 13 membros europeus em 1957, a FIL conta hoje com 53 membros de quatro continentes (talvez nada surpreendentemente, nenhum da África), inclusive o Brasil, que não tem neve nem gelo suficiente para ter uma pista de luge, mas conta com vários atletas que moram e competem no exterior, representando nosso país em competições internacionais.

Curiosamente, o luge pode ser disputado nas categorias simples, com apenas um atleta por trenó, ou duplas, com dois atletas por trenó, um deitado em cima do outro. As lâminas do trenó devem ter no máximo 1,20m de comprimento, entre 1,5 e 5 cm de largura e no máximo 3 cm de altura, e serem presas ao trenó por, no mínimo, 4 parafusos. O trenó não tem comprimento máximo, mas tem largura máxima de 55 cm, com distância máxima de 45 cm entre as lâminas. O trenó pode ser feito de qualquer material, embora hoje quase todos sejam feitos de fibra de carbono, material mais leve e resistente que a madeira dos primeiros modelos. O trenó pode ter uma espécie de "banquinho" para acomodar o bumbum dos atletas, mas esse item é opcional; o trenó de duplas, por sua vez, deve ter, obrigatoriamente, um apoio para os pés do atleta que vai por cima, que não pode ter mais que 33 cm de comprimento. O trenó de simples deve pesar entre 21 e 25 Kg, enquanto o de duplas pesa entre 25 e 30 Kg.

O trenó do luge é guiado através de um mecanismo presente sob as pernas do atleta - no caso das duplas, do atleta que vai por cima, por isso o apoio para os pés. Para não intereferir na aerodinâmica, não é necessário que o atleta levante as pernas para fazer o trenó mudar de direção, basta virar as pernas levemente para a direita ou esquerda para que o trenó também vire levemente para a direita ou esquerda. Como o trenó desce em alta velocidade - alta mesmo, de todos os esportes de trenó, o luge é o mais veloz e perigoso, com os atletas alcançando uma média de 140 Km/h, o recorde sendo 154 Km/h - e a pista possui inclinação nas curvas, essa mudança de direção é extremamente sutil, não precisando ser tão acentuada como a de um carro, por exemplo.

Para evitar que o atleta entre com velocidade demais na curva, saia direto da pista e morra - o que, infelizmente, também acontece de vez em quando, com um atleta da Geórgia tendo perdido a vida durante o treinamento para as Olimpíadas de Inverno de 2010 - o trenó do luge também possui um sistema de freios, acionado por pressão dos ombros do atleta - no caso das duplas, do atleta que vai embaixo, ou seja, o de cima guia e o de baixo freia. Pressionando o ombro direito contra o trenó, o atleta faz com que o lado direito perca velocidade, pressionando o ombro esquerdo, é o esquerdo que perde. Para frear os dois lados simultaneamente, o que não é feito durante a prova, apenas ao final, basta levantar um pouco a cabeça, pressionando o trenó com o meio das costas.

A FIL permite que o luge seja disputado tanto em pistas naturais quanto artificiais, considerando, inclusive, que essas são duas modalidades diferentes do esporte. Pistas artificiais são como a Descida de Cresta e as pistas que vemos nas Olimpíadas: têm a aparência de um tobogã, curvas inclinadas, são construídas em madeira e concreto e seu gelo é resultado de refrigeração artificial. Já as pistas naturais se assemelham a pistas de esqui, sem muros ou curvas inclinadas, somente com neve e gelo naturais, e marcações nos locais onde as curvas devem ser feitas. Por causa disso, a forma de se guiar o trenó na pista natural é bastante diferente, com o atleta contando com uma espécie de rédea, que puxa para os lados para mudar a direção do trenó, e podendo frear colocando tanto as mãos quanto os pés no chão, com as sapatilhas contando com travas especiais. Existem poucas pistas naturais no mundo, e a maioria dos praticantes prefere as artificiais, de modo que a maioria das competições é hoje disputada em pistas artificiais.

LugeA forma de definição de uma competição de luge é bem simples: um a um, os atletas ou duplas descem a pista, com o tempo começando a contar do momento em que o trenó se põe em movimento até o momento em que cruza a linha de chegada. O atleta começa a prova sentado no trenó, e toma o primeiro impulso com a ajuda de duas hastes nas laterais da pista; depois disso, ele ainda tem direito a quatro "remadas" - usando as mãos para dar mais impulso à descida - antes de deitar no trenó e começar a guiá-lo. Cada competição de simples é disputada em quatro descidas, com os tempos sendo somados - em cada descida subsequente, o tempo do atleta começa a contar do registrado na descida anterior - sendo que, na quarta e última, os atletas descem em ordem inversa de classificação, com o melhor descendo por último. Depois que todos os atletas se apresentarem, o que tiver percorrido o percurso em menos tempo é declarado o vencedor. A competição de duplas segue o mesmo esquema, mas são apenas duas descidas para cada dupla.

Além dos eventos de simples e de duplas, o luge conta também com uma prova de revezamento, na qual cada equipe é composta por um atleta masculino, uma atleta feminina e uma dupla masculina; um dos atletas desce primeiro e, assim que alcança a linha de chegada, é dada a largada para o seguinte, com o terceiro largando assim que o segundo cruza a linha de chegada. O tempo não é contado separadamente para cada membro da equipe, e sim de forma contínua, desde o momento em que o primeiro começa a correr até o momento em que o terceiro cruza a linha de chegada - por isso o nome "revezamento".

A principal competição internacional do luge é o Campeonato Mundial, disputado anualmente desde 1955 nas categorias simples masculina, simples feminina e duplas masculinas, contando também desde 1989 com a categoria revezamento. Anualmente desde 1977, ocorre também a Copa do Mundo de Luge, que atualmente conta com nove etapas. Enquanto o Campeonato Mundial é disputado em uma única cidade-sede, como as Olimpíadas, a Copa do Mundo é composta de nove competições em nove cidades diferentes, com os atletas ganhando pontos de acordo com a sua colocação e, ao final das nove etapas, aquele que tem mais pontos sendo declarado campeão. Todas as etapas da Copa do Mundo têm competições de simples masculinas, simples femininas e duplas masculinas, mas apenas seis etapas têm a competição do revezamento.

O Campeonato Mundial e a Copa do Mundo são sempre disputados em pista artificial, existindo, também, o Campeonato Mundial de Pista Natural, disputado a cada dois anos desde 1979 nas categorias simples masculina, simples feminina e duplas masculinas, e desde 2001 na categoria revezamento. Finalmente, o luge faz parte do programa das Olimpíadas de Inverno desde 1964, mais uma vez nas categorias simples masculina, simples feminina e duplas masculinas, com o revezamento tendo feito sua estreia na edição deste ano de 2014. Os países mais fortes nas competições de luge são a Alemanha (país com o maior número de pistas artificiais no mundo), a Áustria e a Itália (sendo que a Itália costuma se sair melhor nas competições de pista natural que nas de artificial).

Pouco após a inauguração da Descida de Cresta, surgiria um segundo esporte de trenó, inventado, mais uma vez, pelos jovens ingleses. Embora eles reconhecessem que descer pela pista era bem melhor do que descer pelas ruas da cidade, alguns achavam que descer deitadinho, com os pés virados para a frente, não tinha muita emoção, e o bom mesmo era se jogar de cabeça. Esses audazes começaram, então, a descer a pista deitados de bruços no trenó, com a cabeça virada para a frente. Logo, em homenagem à pista, este estilo se tornou conhecido como cresta, para diferenciá-lo do luge.

Assim como o luge, o cresta também usava, no início, um trenó de madeira e difícil de ser controlado. Para não sair batendo de cabeça durante a descida, logo os praticantes começaram a trabalhar em modificações, até que, em 1892, o inglês L.P. Child surgiu com um trenó feito de metal, com um sistema de direção e frenagem e sem vários componentes que ele considerava inúteis para a descida. O nome oficial que Child deu parta o trenó foi American, mas, como ele lembrava o desenho de uma caixa torácica humana, seus amigos logo o apelidaram de skeleton (palavra que significa "esqueleto" em inglês). O nome pegou, e passou a ser usado oficialmente para o esporte.

Ou quase. Na verdade, hoje se considera que o cresta e o skeleton são dois esportes diferentes, sendo que o skeleton usa uma versão aperfeiçoada do trenó de Child, é regulado pela Federação Internacional de Bobsled e Tobogã (FIBT) desde 1923, e é disputado em várias competições ao redor do mundo, enquanto o cresta usa um trenó mais semelhante ao tradicional, é regulado pelo SMTC, e só é disputado na Descida de Cresta. Além disso, alguns mais supersticiosos não gostam de chamar o esporte de skeleton, o que faz com que, em alguns países, ele seja conhecido simplesmente como tobogã - por isso sua federação é a Federação Internacional "de Bobsled e Tobogã", e não "de Bobsled e Skeleton".

Seja como for, a principal característica do skeleton, que o diferencia dos demais esportes de trenó, é a de que o atleta se posiciona deitado de bruços, com a barriga para baixo (posição também conhecida como decúbito ventral) e a cabeça virada para a parte da frente do trenó. Por causa disso, o capacete do skeleton é bem mais protegido que o do luge, parecendo um capacete de automobilismo e contando com acessórios como uma tira que segura o queixo, para que a boca não se abra durante a prova, e aplicação de líquido anti-embaçante e anti-aderente na viseira, para que gelo que se solte da pista não cegue o atleta. Falando nisso, o skeleton é disputado somente em pistas artificiais, e normalmente usa as mesmas pistas construídas para o luge. Ao contrário do que possa parecer, o fato de o atleta descer de cabeça não aumenta a velocidade do trenó, já que, no skelton, a média de velocidade fica em torno dos 115 Km/h.

O skeleton só é disputado na categoria simples, masculina e feminina (aparentemente, colocar dois atletas deitados de bruços um em cima do outro para descer uma ladeira em um trenó não deu certo), mas alguns campeonatos têm uma prova por equipes, nas quais os atletas de uma mesma equipe (normalmente 4 ou 6, e normalmente equipes mistas, com o mesmo número de homens e mulheres em cada equipe) descem um de cada vez, com seus tempos sendo somados para se determinar a equipe vencedora. Diferentemente do luge, o atleta não começa a prova deitado no trenó, e sim de pé, correndo para colocá-lo em movimento e deitando-se nele assim que a descida da pista começa. O tempo é contado desde o momento em que o atleta começa a correr até quando ele cruzar a linha de chegada; cada competição conta com quatro descidas nas quais os tempos são somados, sendo que somente os 20 melhores ao final da terceira descida participam da quarta, descendo do pior para o melhor classificado.

O trenó do skeleton é feito de metal, e, portanto, mais pesado que o do luge - para os homens, seu peso máximo é de 43 Kg, enquanto para as mulheres é de 35 Kg. O trenó deve ter entre 80 cm e 1,20 m de comprimento e entre 8 e 20 cm de altura. Não há largura máxima, mas a distância entre as lâminas deve estar entre 34 e 38 cm, e deve haver no mínimo 7 cm de trenó para cada lado a partir do local onde cada lâmina está aparafusada. Atualmente, o trenó não pode ter nenhuma parte móvel, então a mudança de direção é feita apenas com o atleta mudando o peso do corpo para a direita ou para a esquerda com movimentos dos braços e da cabeça, e a frenagem é feita com os pés, com as sapatilhas contando com travas especiais - ao fim da descida, a frenagem também pode ser feita com os braços, que, durante a prova, devem ficar perpendiculares ao corpo.

A principal competição do skeleton é a Copa do Mundo, que, assim como a do luge, é dividida em etapas, no caso seis (sendo que uma dessas etapas é composta de duas provas, para um total de sete). Cada atleta recebe pontos de acordo com sua colocação em cada prova, e, ao final das sete, aquele com o maior número de pontos é declarado campeão. As mesmas etapas servem tanto para a disputa da Copa do Mundo masculina quanto para a da feminina, embora a "etapa dupla" de cada uma seja diferente - na última edição, por exemplo, a etapa que contou com duas provas para as mulheres foi a de Lake Placid, enquanto a dos homens foi a de St. Moritz. A Copa do Mundo masculina é disputada anualmente desde 1986, e a feminina, desde 1996. O skeleton também faz parte do Campeonato Mundial da FIBT, competição disputada anualmente, exceto em ano de Olimpíada de Inverno, desde 1930. O skeleton masculino estreou em 1982, o feminino em 2000, e as equipes mistas em 2007.

Em relação às Olimpíadas de Inverno, o skeleton fez parte das duas edições sediadas em St. Moritz, em 1928 e 1948, mas depois, sendo considerado "muito perigoso" pelas autoridades da época, foi removido do programa - na verdade, é apenas o fato de que o atleta desce de cabeça que faz com que o esporte pareça perigoso, já que, como vimos, o luge alcança velocidades bem maiores e causa bem mais acidentes, inclusive fatais. O fato de ficar fora do programa olímpico fez com que o skeleton tivesse um desenvolvimento bem mais lento que o luge e o bobsled, e esse esporte poderia até ter sumido se a FIBT não tivesse investido maciçamente em seu desenvolvimento a partir da década de 1980. Graças aos esforços da FIBT, o skeleton voltou ao programa olímpico em 2002, sendo disputado, desde então, nas categorias masculina e feminina. Os países mais fortes do skeleton são Alemanha, Estados Unidos e Canadá.

E, finalmente, chegamos ao bobsled, também conhecido em inglês britânico como bobsleigh (pois "trenó", em inglês norte-americano, é sled, mas em inglês britânico é sleigh, pronunciado "slêi"), e também conhecido aqui em casa como "foguetinho" (o nome pelo qual minha esposa insistiu em chamá-lo até eu adotar também).

Assim como o luge e o skeleton, o bobsled também surgiu em St. Moritz, quando os jovens ingleses (sempre eles), provavelmente sem nada de melhor para fazer, resolveram amarrar dois trenós um atrás do outro, criar um trenó para quatro ocupantes, e usá-lo para descer as pistas de esqui e as ruas da cidade. Ao longo do tempo, como de costume, foram introduzidas as inovações, como uma rédea para que o primeiro ocupante do trenó pudesse guiá-lo e uma alavanca para que o último pudesse freá-lo. O nome do esporte veio do fato de que, durante a descida, os ocupantes se balançavam para a frente e para trás, visando aumentar a velocidade - to bob, em inglês, é uma espécie de gíria, que vem do verbo to bobble, "balançar"; por isso, o trenó no qual os ocupantes se balançam é o "bob-sled".

SkeletonComo o bobsled era um "trenó coletivo", com a sua popularização começaram a surgir clubes de bobsled, o primeiro em St. Moritz, em 1897. Em 1923, clubes da Suíça, França, Canadá, Estados Unidos e Grã-Bretanha se uniram para fundar a Federação Internacional de Bobsled e Tobogã (nome, como eu já disse, pelo qual os esportes de trenó são coletivamente conhecidos na Europa), que tinha o intuito de regular todos os esportes de trenó, mas, após um racha, ficou só com o bobsled e o skeleton. Hoje, a FIBT conta com 63 membros dos cinco continentes, incluindo o Brasil. O grande número de membros, muitos deles países onde nem há neve, vem do fato de que o bobsled é o mais popular dos esportes de trenó, graças, principalmente, à fama alcançada na década de 1990 pela equipe da Jamaica, que, contrariando a lógica, não só se classificou para as Olimpíadas de Inverno de 1988 - história que pode ser vista, com algumas liberdades poéticas, no filme Jamaica Abaixo de Zero - como também voltou nas quatro edições seguintes, abrindo caminho para outras nações tropicais tentarem a sorte no bobsled.

O primeiro campeonato de bobsled do mundo foi disputado também em St. Moritz, mas não na Descida de Cresta, já que, no início, as corridas de bobsled eram disputadas em pistas retas como as de esqui, sem as curvas presentes nas pistas construídas especialmente para trenós, pois era muito difícil manter um trenó de quatro ocupantes estável nesse tipo de pista. Com a popularização do luge e do skeleton, porém, os praticantes do bobsled foram ficando com vontade de também competir nas pistas artificiais, e o trenó sofreu várias modificações para torná-lo mais estável, aerodinâmico e seguro.

Por causa disso, o trenó do bobsled, hoje, se parece menos com um trenó e mais com, bem, um foguetinho. Os trenós possuem partes feitas de metal, de fibra de carbono e de diferentes plásticos, e contam com uma proteção frontal - que, além de resguardar as pernas do primeiro ocupante, ajuda na aerodinâmica - e com aletas laterais móveis usadas pelos demais ocupantes durante a corrida que vem antes da descida, que são depois recolhidas para não causar atrito com o ar - assim como no skeleton, no bobsled todos os atletas começam fora do trenó, correndo para empurrá-lo e entrando e assumindo suas posições rapidamente quando a descida começa. Com exceção do "piloto", os demais ocupantes ficam bem encolhidinhos, quase em posição fetal, também para não afetar a aerodinâmica do conjunto. O "piloto", aliás, que é sempre o primeiro ocupante, tem a missão de "dirigir" o trenó, o que é feito através de um sistema de argolas plásticas presas a cabos; puxando a argola da esquerda, o trenó vira levemente para a esquerda; puxando a da direita, ele vira levemente para a direita. Diferentemente do luge e do skeleton, que só têm um par de lâminas e a mudança de direção é feita mudando o lado do trenó que tem mais peso, o bobsled conta com quatro lâminas, duas na frente e duas atrás, e o sistema de direção realmente vira as lâminas da frente para o lado desejado; por causa disso, guiar um bobsled é mais difícil do que parece, já que, devido à velocidade (em média 120 km/h), virar muito as lâminas pode fazer até com que ele saia da pista. O último homem do trenó, conhecido em inglês como brakeman (o "homem do freio"), é o responsável por frear o trenó, o que é feito através de uma alavanca, e jamais é feito durante a descida, apenas após o trenó passar a linha de chegada. Como não há freio durante a descida, os ocupantes costumam virar o corpo para os lados, para a frente e para trás em diferentes momentos da pista, buscando reduzir ou aumentar a velocidade do trenó ou facilitar a tomada das curvas.

Originalmente, existiam trenós de até seis integrantes, mas, desde 1930, a FIBT regula apenas o de quatro ocupantes (conhecido como Four-Man Bob), o de dois ocupantes (o Two-Man Bob) e o de um único ocupante (conhecido como Monobob). Competições de Monobob e de Two-Man Bob são disputadas no masculino e no feminino (com o trenó de duas ocupantes sendo conhecido como Two-Woman Bob); competições de Four-Man Bob, em teoria, são mistas, mas, nas competições profissionais, todos os trenós contam com quatro ocupantes homens.

Até 1952, não existia limite de peso no bobsled, o que fazia com que os trenós fossem praticamente de chumbo e tivessem integrantes bem gordos, já que o trenó mais pesado desce mais depressa; por causa disso, quando resolveu, naquele ano, instituir um limite de peso, a FIBT o fez levando em conta o peso somado do trenó e de seus integrantes: um Four-Man Bob com os quatro ocupantes tem peso máximo de 630 kg, um Two-Man Bob com os dois ocupantes tem de pesar até 390 kg, um Two-Woman Bob com as duas atletas não pode ultrapassar os 340 kg, e um Monobob, contando com o peso do piloto, deve pesar no máximo 100 kg no masculino e 80 kg no feminino. Para que ninguém fique em desvantagem, as equipes costumam colocar lastro na parte da frente dos trenós, para que eles sempre alcancem o peso máximo. Em relação às dimensões, as únicas obrigatórias são distância de 67 cm entre as lâminas, 3,8 m de comprimento para o Four-Man Bob e 2,7 m para o Two-Man Bob, o Two-Woman Bob e o Monobob.

A prova do bobsled é praticamente a mesma coisa da de luge e da de skeleton - usando, inclusive, a mesma pista: a equipe sai correndo no começo, entra no trenó antes da descida, e tem de guiá-lo para chegar à linha de chegada no menor tempo possível, tempo esse que é contado do momento em que a equipe se põe em movimento até o momento em que o trenó cruza a linha de chegada. Mais uma vez, uma competição de bobsled é composta de quatro descidas, com o tempo de todas sendo somado para se determinar o vencedor e apenas os melhores disputando a última descida, na qual descerão do pior para o melhor colocado. Embora seja um esporte de equipes, a participação no bobsled não é limitada a uma equipe de cada país, sendo que, se um mesmo país tiver mais de uma equipe em uma mesma prova, suas equipes serão referenciadas como "Alemanha 1" e "Alemanha 2", por exemplo.

Assim como no skeleton, a principal competição do bobsled é a Copa do Mundo, que conta com nove etapas, com os pontos de cada equipe em cada etapa sendo somados para se determinar o campeão. A Copa do Mundo é realizada desde 1985 para os homens (tanto no Four-Man Bob quanto no Two-Man Bob), e desde 1995 para as mulheres. O bobsled também faz parte do Campeonato Mundial da FIBT (que, até 1982, era o Campeonato Mundial de Bobsled), com o Four-Man Bob tendo estreado na primeira edição, em 1930 (que só teve esse evento), o Two-Man Bob no ano seguinte, e a competição feminina somente em 2000. Finalmente, o Bobsled esteve presente em todas as edições das Olimpíadas de Inverno exceto a de 1960, com o Four-Man Bob tendo estreado em 1924, o Two-Man Bob em 1932 e o Two-Woman Bob em 2002. Os países mais fortes no bobsled são Alemanha, Suíça e Estados Unidos.

Um comentário:

  1. Muito bom o artigo! Acho que ficou faltando só contar um detalhe interessante: no mundo todo existem apenas 17 pistas de luge, bobsled e skeleton! Localizadas em apenas 11 países. O que significa que dos 63 países praticantes dos esportes a trenó, pelo menos 52 tem que enviar seus atletas para treinar no estrangeiro.

    ResponderExcluir