segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Escrito por em 26.8.13 com 0 comentários

Anjos da Noite

Eu já devo ter falado aqui que não sou, particularmente, muito fã de vampiros. Minha principal birra com eles é que o que deveria ser um monstro virou uma espécie de super-herói: cada vez mais, na cultura pop, vampiros são fortes, ágeis, rápidos, sedutores e imortais, e cada vez menos são amaldiçoados, famintos por sangue humano, devassos ou desprovidos de moral. Agora eles já nem queimam mais no sol, já não temem alho, cruzes ou água corrente, nem precisam dormir sobre a terra do local onde nasceram. Ou seja, tiraram tudo o que fazia do vampirismo uma maldição, e deixaram só as coisas boas. Assim é fácil querer ser vampiro.

Por conta disso, quando eu era adolescente, não era muoto fã do RPG Vampire: The Masquerade, embora gostasse muito de seus "irmãos" da editora White Wolf, Werewolf: The Apocalypse, Mage: The Ascension e Changeling: The Dreaming. Ainda assim, achava sua ambientação até bem legal - e, verdade seja dita, pelas regras do jogo os jogadores deveriam ser amaldiçoados, não é culpa do livro se muita gente não jogava direito - e sempre achei que, se a White Wolf resolvesse licenciá-lo para ser adaptado para um filme, seria um filme de vampiros de respeito. Infelizmente, isso nunca aconteceu.

Um dia, porém, li na finada Dragão Brasil que, sem o consentimento da White Wolf, um estúdio havia feito um filme sobre uma guerra entre vampiros e lobisomens tão parecido com o RPG que a editora os estaria processando, alegando mais de 80 "pontos de semelhança" entre o roteiro do filme e a ambientação do RPG e nada menos que 17 violações de direitos autorais por mostrar no filme elementos que pertenceriam à White Wolf, incluindo que o roteiro do filme seria plágio de uma história chamada The Love of Monsters, escrita por Nancy A. Collins e publicada em 1994 pela editora. Diante disso, claro que fiquei curiosíssimo para ver o filme, imaginando que iria encontrar lá tudo o que via no RPG.

Infelizmente, não foi o caso. Tudo bem que tem uma ou outra coisa parecida, mas, aparentemente, só os advogados da White Wolf souberam encontrar as tais 80 semelhanças e 17 violações. Entretanto, mesmo sem ter sido o filme de Vampire que prometia, o filme me agradou bastante, e ao que tudo indica não só a mim, já que gerou mais três continuações. Essa semana, me lembrei desse filme, e resolvi que seria legal escrever sobre ele aqui no átomo. O nome em português é meio ridículo, Anjos da Noite, mas realmente seria esquisito chamá-lo por aqui por uma tradução literal de seu nome original, Underworld, que significa "submundo". Vamos a um post sobre os anjos da noite então.

Ah, e o processo terminou em um acordo cujos valores jamais foram divulgados, caso alguém esteja interessado.

Anjos da Noite foi uma criação de três pessoas: Len Wiseman, que havia trabalhado como contra-regra em Stargate, Independence Day, Men in Black e na versão norte-americana de Godzilla; Danny McBride, dublê que havia feito algumas pontas como ator em filmes de comédia; e Kevin Grevioux, ator que, devido a seu tamanho, costumava interpretar capangas, guardas de presídio, guarda-costas e outras profissões que necessitassem de um sujeito grande e forte. Os três se conheceram em 1994, durante as filmagens de Stargate, e mantiveram a amizade ao longo dos anos. No início dos anos 2000, Grevioux apresentou aos amigos sua ideia de um filme, que mostraria uma guerra entre vampiros e lobisomens, ambas as raças vivendo dentre os humanos sem que nós soubéssemos. O mote do filme seria o surgimento de um novo tipo de criatura híbrida, um lobisomem vampiro, que seria caçado por alguns, protegido por outros. Grevioux nega que tenha tido essa ideia lendo ou jogando os RPGs da White Wolf, mas a editora desconfia que não tenha sido apenas coincidência.

Enfim, Grevioux e Wiseman se sentaram e escreveram a versão inicial do roteiro, que apresentaram a vários estúdios. Foi a pequena Lakeshore Entertainment (de Noiva em Fuga e Sobrou pra Você) que decidiu apostar neles, desde que o roteiro, considerado confuso, fosse reescrito. McBride, então, o reescreveu, recebendo o crédito como roteirista. Após receber a luz verde, Wiseman se ofereceu para dirigir, fazendo sua estreia como diretor. Grevioux se satisfaria com um papel no filme, além de crédito, junto aos outros dois, como criador da história - ele também criaria a adaptação para quadrinhos do filme, tão bem sucedida que lhe renderia um convite da Marvel para escrever uma minissérie dos Novos Guerreiros.

No filme, por ideia de Grevioux, que diz ter se inspirado no livro A Última Esperança Sobre a Terra (que daria origem aos filmes Mortos que Matam, Omega Man e Eu Sou a Lenda), o vampirismo e a licantropia não têm origens místicas, sendo causadas por dois vírus incuráveis: se um humano é infectado pelo vírus do vampirismo, se torna vampiro, se é infectado pelo da licantropia, se torna lobisomem - ou, na linguagem do filme, um lycan. Ambos os vírus são mutuamente excludentes, o que significa que vampiros não podem ser infectados pelo vírus da lincatropia e lycans não podem ser infectados pelo vírus do vampirismo.

A protagonista do filme é Selene (Kate Beckinsale, que depois do filme se casaria com Wiseman), vampira membro do clã dos Mercadores da Morte, cuja especialidade é caçar lycans. Antigamente, vampiros e lycans não se importavam muito com os humanos, caçando-os e dominando-os, principalmente por se considerarem superiores a eles. Os primeiros lycans, porém, eram pouco mais que animais, lobos enormes incapazes de assumir forma humana. Vendo que, se a situação continuasse do jeito que estava, em pouco tempo só existiriam lycans no mundo, os vampiros decidiram se unir, exterminar os lycans e se esconder dos humanos, fundando sua própria sociedade, que até hoje vive em uma espécie de Era Vitoriana, organizada em clãs e envolvida em disputas internas de poder. Atualmente, os poucos lycans que restam, já capazes de assumir forma humana, vivem escondidos, sendo caçados pelos Mercadores da Morte, e os vampiros só interagem com os humanos quando precisam se alimentar ou querem criar novos vampiros.

Selene possui também uma razão pessoal para caçar lycans, já que toda sua família foi dizimada pelos lobisomens, tendo sido ela adotada por Viktor (Bill Nighy), um dos mais poderosos anciãos vampiros, após o evento. A preferência de Viktor por Selene irrita o atual chefe dos Mercadores, Kraven (Shane Brolly), que não faz a menor questão de esconder seu ódio e desprezo pela vampira.

Selene, porém, acaba acidentalmente descobrindo uma informação surpreendente e importantíssima: os lycans estão atrás de um humano, Michael Corvin (Scott Speedman), que supostamente seria descendente direto de Alexander Corvinus, o primeiro homem a ser infectado pelos vírus do vampirismo e da licantropia - Corvinus não desenvolveu nenhuma das duas doenças, mas um de seus filhos, Marcus, foi o primeiro vampiro, enquanto o outro, William, foi o primeiro lycan. Segundo uma teoria do cientista dos lycans, Singe (Erwin Leder), ser descendente de Corvinus possibilitaria que Michael fosse infectado simultaneamente pelas duas doenças, se tornando um híbrido - e seu sangue possibilitaria que os lycans criassem um exército de híbridos, virando a maré da guerra e dizimando os vampiros.

Selene tenta alertar Kraven, que a ignora. Ao assumir as rédeas da situação, ela acaba se apaixonando por Michael e decidindo protegê-lo, mesmo com ordens expressas de Viktor para destruí-lo. Ao enfrentar tanto vampiros quanto lycans, Selene acaba descobrindo um monte de segredos sujos, inclusive o de que o ancião dos lycans, Lucian (Michael Sheen), tido há séculos como morto, está vivo, graças à ajuda de um vampiro traidor.

Lançado em 19 de setembro de 2003, Anjos da Noite seria um inesperado sucesso de público - com orçamento de 22 milhões de dólares, renderia 51 milhões apenas nos Estados Unidos - e alavancaria a carreira de Beckinsale, que, antes vista como eye candy (atriz bonita própria para papéis secundários) passaria a ser chamada para vários filmes de ação. A crítica, por outro lado, apesar de ter elogiado bastante o desempenho da atriz, o clima gótico e a bem construída mitologia, baixou o sarrafo no filme, dizendo que as interpretações eram acima do tom, os figurinos exagerados e o enedo pífio. Propositalmente, Anjos da Noite possui um final aberto e, com o bom público, Grevioux, Wiseman e McBride conseguiriam luz verde para um segundo filme.

Lançado em 20 de janeiro de 2006, Anjos da Noite: A Evolução (Underworld: Evolution), com roteiro de Wiseman e McBride e dirigido por Wiseman - Grevioux, envolvido com outros projetos, deixaria tudo nas mãos dos dois - começa imediatamente de onde o primeiro filme parou. Selene e Michael, em fuga, passam a ser perseguidos por Marcus (Tony Curran), libertado acidentalmente em meio à confusão do filme anterior, que pretende pegar um amuleto que está com Selene e, sem que ela saiba, é a chave para libertar William (Brian Steele), aprisionado por Viktor quando os vampiros decidiram exterminar os lycans. Se ele conseguir, será o início de uma nova era de terror para os humanos, já que Marcus pretende retornar as coisas ao estado em que estavam antes de os vampiros decidirem se esconder. Selene e Michael contarão com a ajuda de Lorenz Macaro (Derek Jacobi), líder de um grupo de mercenários dedicado a apagar todos os traços da presença de vampiros e lycans para que os humanos não descubram que eles existem, e do historiador vampiro Andreas (Steven Mackintosh), com quem Selene aprenderá mais sobre o passado dos vampiros, lycans e sobre seu próprio.

Filmado na Hungria, o segundo filme tem um clima totalmente diferente do primeiro, o que não melhorou em nada a impressão dos críticos, que o consideraram confuso, nada divertido e sem nada do que o primeiro tinha de bom exceto Beckinsale - especialmente criticado foi um filtro que fazia com que todas as cenas do filme tivessem um aspecto azulado. O público, porém, mais uma vez foi receptivo: apostando mais alto, a Lakeshore reservou um orçamento maior, de 45 milhões de dólares; com rendimento de 62 milhões só nos Estados Unidos, o lucro foi menor que o do primeiro filme, mas como o rendimento bruto foi maior, o estúdio também considerou o filme um sucesso.

Pouco antes do lançamento do segundo filme, Wiseman, em entrevistas, declarou que desde o início desejava que Anjos da Noite fosse uma trilogia, e que, se o segundo filme tivesse bom desempenho, o terceiro já estaria garantido pela Lakeshore. Durante a pré-produção, porém, Wiseman e McBride decidiriam fazer do terceiro filme não uma nova sequência, mas uma "prequência", ambientando-o antes do primeiro filme. Bem antes, na verdade: a intenção de Wiseman era contar como os vampiros e lycans surgiram, e por que se tornaram inimigos mortais.

Durante a pré-produção, Wiseman também decidiria se envolver em outros projetos, abrindo mão da direção e de escrever o roteiro, e ficando apenas como produtor do filme. O roteiro, então, ficaria a cargo de McBride, Dirk Blackman e Howard McCain, e a direção seria confiada ao designer de produção Patrick Tatopoulos, que faria sua estreia na função. Grevioux concordaria em repetir seu papel do primeiro filme, o lycan Raze, que teria um certo destaque na prequência.

Lançado em 23 de janeiro de 2009, Anjos da Noite: A Rebelião (Underworld: Rise of the Lycans) revela o passado de Lucian, primeiro lycan a conseguir assumir a forma humana. Nascido depois que os vampiros decidiram se organizar e exterminar os lycans, mas antes que eles decidissem se esconder dos olhos humanos de vez, Lucian, após seus pais seram mortos por vampiros quando ele ainda era um bebê, tem sua vida poupada por Viktor, que o cria não por bondade, mas por acreditar que, se escravizada, essa nova raça de lycans pode ser muito útil aos vampiros, atuando como guardas de seus locais de descanso e como seus agentes em meio à população humana durante o dia, quando os vampiros precisam se esconder da luz do sol.

Embora não seja tratado como um igual, Lucian tem o respeito dos vampiros até o dia em que se apaixona por Sonja (Rhona Mitra), a filha de Viktor. Como a união do casal é vista como blasfema, Lucian é sentenciado a viver o resto de sua vida encarcerado. Sonja, evidentemente, não se conforma, e trama com Andreas a libertação do amado. Lucian consegue fugir, mas Sonja é condenada por traição, ato que é o estopim para que o lycan decida reunir todos os de sua raça e começar uma guerra contra os vampiros.

Anjos da Noite: A Rebelião foi o primeiro da série a não terminar seu primeiro fim de semana no primeiro lugar da bilheteria (perdendo para Segurança de Shopping), e foi também o que teve o menor lucro líquido e o menor rendimento bruto: com orçamento de 35 milhões de dólares, rendeu pouco mais de 45 milhões nos Estados Unidos. A crítica também o considerou o pior de todos os três, criticando especialmente a direção de Tatopoulos, a interpretação de Mitra (a de Sheen, por outro lado, foi bastante elogiada) e a falta de um enredo próprio - segundo os críticos, quem não conhecesse a história dos outros dois filmes, não entenderia nada se visse somente esse.

Mesmo com esse desempenho ruim, a Sony, dona da companhia Screen Gems, que distribuía os filmes da Lakeshore Entertainment, decidiu investir em um quarto filme, pois não havia ficado satisfeita com a decisão de Wiseman e McBride de fazer uma prequência, achando que seria melhor se o segundo filme tivesse também uma continuação. McBride foi contra, mas Wiseman disse que aceitaria, desde que atuasse apenas como roteirista e produtor, e que não tivesse que criar a história sozinho. A Sony, então, designaria o roteirista John Hlavin, da série The Shield, para ajudá-lo a desenvolver a história.

O quarto filme acabaria tendo roteiro de Wiseman, Hlavin, Allison Burnett (de Outono em Nova Iorque) e ninguém menos que J. Michael Straczynski (de Babylon 5 e mais uma penca de outros seriados, filmes e desenhos de ação e ficção científica), e seria dirigido pelos suecos Måns Mårlind e Björn Stein, que haviam chamado a atenção da Sony com seu filme de terror Shelter, lançado em 2010 e estrelando Julianne Moore e Jonathan Rhys Meyers. Beckinsale seria convidada para interpretar mais uma vez Selene, mas acabaria sendo a única personagem da trilogia original a aparecer no quarto filme - sem considerar Michael, que aparece em flashbacks.

Lançado em 20 de janeiro de 2012, Anjos da Noite: O Despertar (Underworld: Awakening) começa nove dias após o final do segundo filme. Nesse meio tempo, os humanos tomaram conhecimento da existência dos vampiros e lycans (talvez por causa da bagunça que eles fizeram nos dois outros filmes) e decidiram exterminá-los em um evento que ficaria conhecido como Expurgo. Os poucos vampiros e lycans que sobreviveram foram capturados e usados como cobaias em experimentos científicos, incluindo Selene, mantida congelada por uma empresa chamada AntiGen, que busca uma cura para o vampirismo e a licantropia.

Anos após ser capturada e congelada, Selene é libertada por outra cobaia, que ela acredita ser Michael. Ela começa, então, a procurar por ele, e acabará fazendo uma importante descoberta. Em meio a suas aventuras, ela conseguirá a ajuda do policial humano Sebastian (Michael Ealy), que decide ajudá-la por ter sido casado com uma vampira antes do Expurgo, e do vampiro David (Theo James), que tem Selene como ídolo e tenta organizar os vampiros para retomarem seu lugar na sociedade, para desgosto de seu pai, Thomas (Charles Dance), que acredita que é melhor que os vampiros fiquem escondidos até o frenesi do Expurgo passar. Entre os antagonistas se destacam o Dr. Jacob Lane (Stephen Rea), chefe da AntiGen, que quer recapturar Selene, e o lycan Quint (Kris Holden-Ried), líder de uma matilha que está mais forte e organizada do que nunca, ao contrário do que os humanos e vampiros acreditam. Selene também descobre que, enquanto estava capturada, deu a luz a uma filha, Eve (India Eisley), que, assim como Michael, é uma híbrida.

Anjos da Noite: O Despertar mais uma vez conseguiu a maior bilheteria de seu fim de semana de estreia, e mais uma vez foi espinafrado pela crítica, que considerou a ação muito veloz e o enredo inexistente. Como público e crítica não se comunicam em filmes de ação, o quarto filme teve a maior bilheteria de toda a série, quase 62,5 milhões apenas nos Estados Unidos - infelizmente, também foi o mais caro de toda a série, custando 70 milhões, o que significou que não teve lucro, precisando da bilheteria internacional para se pagar.

Atualmente, o quarto filme também é o último. Pelo menos por enquanto, ainda não se fala em uma nova sequência, mesmo com o final do filme tendo deixado isso possível. Mas, como eles têm saído de três em três anos, talvez ainda seja cedo para desistir.

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