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domingo, 8 de maio de 2022

Uma Rosa com Qualquer Outro Nome

Quem está acompanhando o átomo desde o início desse ano sabe que eu decidi fazer uma série mensal republicando contos que eu escrevi para o Crônicas de Categoria. Hoje teremos um para o qual eu tive a ideia enquanto conversava com uma amiga que tem um nome diferente e não gosta muito disso. Achei que ficou fofo.






Uma Rosa com Qualquer Outro Nome

Aparentemente, Shitara não tinha do que reclamar na vida. Rosto perfeito, corpo escultural, chamava atenção por onde passava. Tinha um bom emprego, morava em um bairro tranquilo, levava uma vida sem estresse. Só havia uma coisa que tirava Shitara do sério: seu nome. Quando crianças, ambos seus pais eram fãs dos Thundercats, e acharam que seria uma boa ideia colocar em sua única filha o nome da principal personagem feminina do desenho. Shitara nunca achou essa ideia tão boa assim, e morria de vergonha ao dizer o próprio nome a alguém – e de medo de ter de explicar caso esse alguém perguntasse o porquê de ela se chamar Shitara.

Por causa disso, sempre que alguém perguntava seu nome, Shitara dizia se chamar Luísa. Claro que havia ocasiões nas quais ela tinha de engolir o orgulho, como quando precisasse apresentar algum documento, mas, sempre que pudesse, ela se chamava Luísa. Shitara, ou melhor, Luísa, não era de manter relacionamentos longos, então ela também não se importava de dar esse nome aos rapazes com quem se relacionava.

Até o dia em que conheceu Jorge. Como sempre acontecia, da primeira vez em que se conheceram, ela se apresentou como Luísa. Mas, logo veio o segundo encontro, o terceiro, passou um mês, passaram-se dois, e Luísa, ou melhor, Shitara, começou a pensar em como faria se aquilo fosse realmente para a frente. Jorge era o primeiro homem com quem Shitara pensava em dividir o resto de sua vida, mas não conseguia criar coragem para revelar a ele que tinha o nome de uma personagem de desenho animado.

Quando o casal completou um ano juntos, Jorge fez uma surpresa a Shitara, ou melhor, a Luísa, e a pediu em casamento. Se disse completamente apaixonado, incapaz de imaginar outra mulher com quem quisesse passar o resto de seus dias. Por dentro, Luísa, ou melhor, Shitara, sentia a mesma coisa, mas, por fora, tudo o que conseguiu foi ficar de olhos arregalados, boca apertada, suando frio e imaginando que o prazo fatal para revelar seu nome se avizinhava. Seu “sim” foi tão tímido que a perplexidade de Jorge ao ouvi-lo não passou despercebida.

Diferentemente do que costuma acontecer, depois do sim, o relacionamento do casal começou a deteriorar. Shitara, ou melhor, Luísa, estava sempre nervosa quando estava com Jorge, porque não conseguia pensar em outra coisa a não ser a iminente revelação de seu nome. Um dia, concluiu que o casamento iria para as cucuias antes mesmo da cerimônia se as coisas continuassem assim, e decidiu que iria revelar a verdade na vez seguinte em que ele perguntasse se algo estava errado. Nem dois minutos depois de ela tomar essa decisão, ele perguntou. E Luísa revelou que se chamava Shitara, explicando todo o dissabor que sua vida havia sido até aquele momento por causa desse nome ridículo.

Jorge desandou a rir. Shitara meio que esperava essa reação, mas ele ria muito. Excessivamente. Não conseguia parar. O sangue de Shitara começou a ferver com essa audácia, a ponto de ela ameaçar levantar e ir embora, mas ele a pegou pelo braço, respirou fundo, e revelou por que estava achando tanta graça: ele também não se chamava Jorge. Seus pais haviam se conhecido na Argentina, e, querendo eternizar o momento para sempre, acharam que seria uma boa ideia colocar o nome de seu único filho de Alfajorge. De início, Shitara achou que ele estava de troça com a cara dela, mas, depois de ele mostrar seu RG, quem não conseguiu parar de rir foi ela. Depois que tiraram esse peso de suas costas, o relacionamento dos dois voltou aos trilhos.

Shitara e Alfajorge se casaram e vivem muito felizes. Ainda não pensam em ter filhos, mas já escolheram os nomes: se for menino, João, se for menina, Maria.

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